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aa Willi lh itt QDR eere eC Oe pode resolver os problemas da Gol? anova geracao de gurus EXAME FIM? CAPA | crise Uma crise econdémica sem precedentes. Uma situacao politica que beira 0 insustentavel. Novos desdobramentos da Operacaéo Lava-Jato mostram cada vez mais indicios de que o PT ea presidente Dilma Rousseff se beneficiaram da corrupcao na Petrobras. Nao esta facil enxergar como a presidente conseguira chegar ao fim do mandato FLAVIA FURLAN © 0uca.a reportagem na versio digital de EXAME PASSAGEM DE FERNANDO COLLOR DE MELLO PELA PRESIDEN ‘CIADA REPUBLICA NO INICIO DA DECADADE'90 mos:rou que um grande escindalo de corrupgdo € uma recessio eco- némica sio a combinacao perfeita para abreviar um man- dato presidencial. Duas décadas ¢ meia depois, outro ocupante do Palacio do Planalto se vé ds voltas comos ‘mesmos problemas. Nas tlkimas semanas, as movi mentagdes da Operacao Lava-Jato, que investigam uma rede de corrupgao entre a Petrobras e grandes empreiteiras para abastecer ilegalmente partidos politicos, aproximaram-se perigosamente da presidente Dilma Rousseff. Primeiro foi a prisao de Joao San- tana, o marqueteiro das campanhas do PT que teria recebido dinheiro ilegal no exterior. Depois foi a delacdo premiada de quatro ex-executivos da construtora Andrade Gutierrez, citando pagamentos a fornecedores da campanha de Dilma em 2010.0 terceiro fato — e mais surpreendente — foi o vazamento da suposta delagio de Deleidio do Amaral, senador petistae ex-lider do governo no Senado, icando que Dilma teria tentado exercer influéncia para obstruir a Lava-Jato. Por fim, o depoimento forcado do ex-presidente Luiz Indcio Lula da Silva na Policia Federal sé trouxe a certeza de que as investigagSes chegario a qualquer ‘um. Em meio 20 turbilhao, foram divulgados dados que mostraram um tombo "de 3,8% da economia em 2015. A combinacao bombistica jé apareceu de novo. E cada vez mais gente comeca a apostar que o desfecho — a interrupcio do ‘mandato presidencial — também seri o mesmo. A pergunta: ela aguenta? esta altura, os analistas politicos tém sido mais e mais enfiticos. A consulto- ria americana Eurasia, que avalia risco politico, elevou de 40% para 55% a pas- sibilidade de saida forcada de Dilma antes do fim de 2018, quando oficialmente terminaria seu governo. A rentincia ¢ uma possibilidade mais distante, dado 0 perfil psicolégico da presidente. Os caminhos seriam, ento, a aceitacdo do pe- dido de impeachment em avaliaco na Camara dos Deputados ou o processo de impugnagio do mandato que tramita no Tribunal Superior Eleitoral. A expec tativa é que ambos tenham um desfecho até o final deste ano. “Acuado pelas deniincias e limitado em sua capacidade de reagir, o governo ficou ainda mais enfraquecido. Precisa se reinventar ou acabar”, diz o cientista politico Murillo de Aragio, presidente da consultoria Arko Advice. 16 de marco de2016 185 CAPA | crise BT asco cor sneer eet 0 destino dapresidente agora depende dos des- dobramentos da Lava-Jato. Hi exatos dois anos, 0 grupo de procuradores, policiais federais e juizes com sedeem Curitiba, no Parané, uniu-se para des. vendar o esquema de corrupgio que tomou a Pe- trobras. Servidores do alto escalio da estatal, em: preiteirose umsenador daRepiiblica foram presos (na manha de 8 de marco, o empresério Marcelo Odebrecht foi condenado a 19 anos de prisao, jun: tamente com outros envolvidos no caso). Deputa dose ministros sao investigados. Um ex-presiden te da Repiiblica foi lerado adepor de modo forgado. A operacéo ganhou tamanha proporgio que levan- tou suspeitas sobre o envolvimento da presidente Dilma. “A Lava-Jato entrou numa fase de acelera- fo das investigagdes que amplia os riscos para a presidente”, diz Christopher Garman, chefe de pesquisa para mercados emergentes da Eurasia, Outro determinante para uma possivel saida da presidente éa falta de apoio generalizado—da base politica fragmentada, do setor produtivo e de gran: de parte da populacio. “Nunca vio Brasileom uma auséncia de lideranca politica como a que temos hoje”, diz Rubens Menin, dono da construtora MRV. Por anos, Dilma insistiu sistematicamente numa agenda de estimulo a demanda que nio deu certo. Tornou o crédito mais fécil e barato, subsidiou a compra de microondas e carros ¢ injetou dinheiro em setores escolhidos da iniciativa privada. Conse- suiu apenas levar i alta da inflacdo e a uma divida plblica explosiva. Hoje, o pais enfrenta o que deve se tornar a maior crise econémica de sua histéria, conforme mostra a reportagem que comeca na pé sina 92, Neste ano, deverd haver ainda mais recessfio emaisdesemprego, ingredientes certos para engros- sar 0 coro contra apresidente. Uma pesquisa exclu- siva para EXAME, realizada pelo instituto Ipsos, mostra que a maioria dos brasileiros acredita que a situagio financeira pessoal vaificar melhor se a pre sidente sair do governo. “E nesse ponto que vemos OS CAMINHOS ABERTOS A Operagio Lava-Jato acelera o fim do ciclo do PT no poder. Cresce o risco de interrupgdo do mandato de Dilma i ° ESTAGIO AINFLUENCIADALAVAJATO PRAZO Desespeitos Loi de Giaciodeunacomiscto | Segundo a delacio do senator Decidio | Paraa consitoria Resronsabildade Fscale | paraavaiar as acusactes, | doAmaral,Dimateraexercdoinfuéncia | Eurasia, oprocesso envalvimento no esquema | ouviradefesae votaro | politcana operacdo Porisso.deoutados | deveserfnaizado de corupcdo da Petrobras | pecico deimpeachment | poden votarconta presidente até api Dae Cred penis —— Abusodepatepoiteo, | Insturdodoorocess, | ApristodomarqueiodeDiima, sso | A conutorieEuaso BRR cconimicoetraudena | comcoletade provas Santana, em23 de evereio,troure mois | cade que oprocesio ETEMERCTSE) campanha presidenial | edepoimento de indicos de imequlardades no pagamento | deveserfinaizado e204 testemunhas de despesas acamoanha ca presidente | no segundo semeste OQUEPODEVIRDENOVO Biter ae b 06 Cae 0 © SA eae ‘As denancias ce Delco do Amaral (Os analstas polticas enxergam como ‘A possibile ficogitada devi 8 deriam gera novo processo de ‘mens provive a possbiidade de ‘ausEncia d presidente Dima a festa impeachment na Cbmara. Os pedidos renunca de presidente Dia Rousset 450 y 207 | 204 207 ~*~ ro 2014 207 “4 ase sf 113,70 Dror ES E PODE FICAR PIOR A répida deterioracéo do cenério econémico colocouem evidéncia temas que nem sequer eram cogitados hd um ano ‘T)DEPRESSAO 2) INFLACAO DESCONTROLADA © aproundanento dos problemas Apes da ecesto, a deteroracdo odelevar aeconomia 20estigioce do cuadro politicos fiscalea 208 Sit aS 1% SESS, DE:9,2% E OUTRAS QUEDAS HISTORICAS NO MUNDO (0 QUE DIFERENCIA RECESSAO E DEPRESSAO RECESSAO ‘O.QUE E period de queda acentuada dos investimentos, da producdoindustal, das importecdes e das boas. Mas com ‘queda modesta no consumo das familias, das exportardos o da taxa de desemprego ‘COMPORTAMENTO DO PIB Reducdo média de 2% OQUEE periodo de queda ‘acentuada no consumo. ‘Asimportacoes chegam a despencar 10%. Os investimentos tambem caem dois digits. (Odesempregosobe rapidamente COMPORTAMENTO DO PIB Reducdo mécia de 3,2% (© QUE E no hé um consenso sobre 0 conceito de depressdo, ‘Alguns economistas consideram ‘apenas uma queda acentuada no PIB. Outros relaconam com uma queda bbrusca dos precos COMPORTAMENTO DO PIB Reducdo acima de 10% TRES CRISES ECONOMICAS QUALIFICADAS COMO DEPRESSAO ESTADOS UNIDOS — DECADA DE 1930 Na sequenciacda quebra da Vatiara0 do PIB ern) bolsa en 1929, uma queda 130 121933 mundial no consume dos t Tash rodutos americanosarrascu a indisria dos Estados Unidos. 13% (0 PIB acumulou perda de 29% 8% FINLANDIA — DECADA DE 1990 ‘A Fininia atau imestimento na década de 80 devido 20 rescimento europeue a uma taxa de cimbio fra efavorvel asa stuacdo mudou com Pn a desacleracto mundial “us 0 aumento das taxes de juro F334 pela Europa na década de 90 VariacS0 do PIB (em %) 1990 9578021993, ‘GRECIA — DECADA DE2000 0 govero grego gastou muito ra década de 2000 e, quando sarees AEN, actse de 2008estourou howe 20829 ‘uma reducdo dos impostos que fez a divida publica explodir. ‘Com a fuga des investidores, «esbancos gregos comecaram a passa’ por dificuldades: 204 2016° As “89% 16 de marco de 2016 197 CAPA | crise epee Pres pre tes O RISCO DA PARALISIA O ECONOMISTA ANTONIO DELFIM NETTO DIZ QUE A QUEDA BRUSCA DOS INVESTIMENTOS JA ESTA CRIANDO AS CONDICOES PARA UMA ESTAGNACAO NO PAIS FLAVIA FURLAN economista Antonio Delfim Netto, que foi mi- nistro da Fazenda, da Agricultura e do Plane- jamento nas décadas de 60, 70 e 80, jé viveu tempo suficiente para afirmar que o Brasil supera suas crises. Mas, desta vez, segundo ele, nao sera nada fécil. Coma queda naconfianca dos empresarios edas fami- Tias quanto ao futuro do pais, o investimento caiu a pon- to denem sequer repor a depreciacao da infraestrutura. “Estamos criando as condicbes de uma estagnagao eco- némica”, diz. “E nio vamos sair dela de maneira ficil, sambando.” De acordo com Delfim, o Brasil precisa focar os investimentos e as exportagdes. Além disso, precisa se livrar de desequilibrios constitucionais e en- contrar uma nova forma deser administrado. “No pre sidencialismo imperial que tivemos até agora, a tarefa maior foi reeleger-se", afirma. “Esta provado que isso no funciona.” Confira na entrevista a seguir. A rrecessio recente serd a pior que o Brasil jé enfrentou? Uma qualificacZo quantitativa é dificil. Masndo hiamenor diivida de que este éum momento critico e que poucos na histéria se aproximaram dele. Apenas para repor a depre- ciacdo dainfraestrutura e produzir crescimento econémico, & necessirio investir em torno de 15% do PIB a0 ano. 0 Brasil ndo ests conseguindo nem isso e estdcriando as con- digdes para uma estagnacio do crescimento. E nio vamos sair dela de maneira facil, sambando. © que explica essa crise? Em2014, ficou visivel um desequilibrio implicitona Cons: tituigdo. Nao € possivel que, em 1988, féssemos tio sdbios para decidir tudo 0 que fosse necessirio — seria como to- mar um aviao, colocar no piloto automético e voar sem atentar que a querosene acabaria, o que provocaria sua queda. O desequilibrio apareceu quando 0 governo nio entendeu a redugo dramitica do crescimento, o que derrubou as receitas. Comoas despesas sao quase todas indexadas, 0 governo passou a produzir déficits. © primeiro ano da presidente, em 207, foi de ‘crescimento. O que deu errado?- A partir de 2012 houve uma forte intervencio na eco- nomia, um excesso de voluntarismo por parte do go- ‘verno. Tudo porque se buscava algo razoavel: modici- dade tarifiria. A presidente Dilma atingiu 0 apice da aprovacio quando fazia tudo errado. As pessoas nao entendiam as implicacées daquilo. Mas no era um jo- 0 de damas. Era um jogo de xadrez em que a rainha i ser comida. E foi o que aconteceu. © que precisaria ser revisto na ConstituigSo? O ajuste nio pode comecar apenas pelo corte de gastos pelo aumento de impostos. Precisa comegar também ppelas propostas que vio restabelecer a confianga da sociedade no fururo do pais, atacando o problema das aposentadorias e das vinculacdes. Dilma conseguiria recuperar a confianca? Até hoje eu lutei muito para que sim. A melhor coisa que 0 Brasil poderia ter é Dilma assumir seu protago- nismo, afastar-se de um pedago do PT que no com- preende o Brasil construir uma base de apoio. Mas eu tenho diividas se ela conseguira. Temos umacombina- ¢o de um presidencialismo que nio preside e que se diz de coalizio, mas nio coaliza E quais seriam as saidas para isso? Esgotou-se uma forma de administrar o Brasil. O pro- ‘blema é muito maior do que fim de um ciclo politico. (Ojideal seria termos um parlamentarismo, com eleicio distrital e regra de barreiras para a eleicao. Ou o meio ‘caminho, que a Franga encontrou, que tem um primei- ro-ministro que, quando nao da certo, o presidente troca. No presidencialismo imperial que tivemos até agora no Brasil, a tarefa maior ¢ reeleger-se. Est pro- vado que o modelo néo funciona, Como o Brasil pode ter um novo ciclo econémico? $6 temos de imitar o que ja deu certo em outros paises. E focar os investimentos e as exportagées. Vale lembrar que o Brasil j4 deu muito certo: cresceu no periodo co- Jonial, estagnou no Impérioe depois cresceu durante a Repiiblica.E um pais que disse a um menino de 14 anos que ele seria imperador. E qual foi a resposta dele em discurso? “Prometo aos brasileiros que vou controlar as “ > PRONTAS PARA SER USADAS ASSIM QUE A POLITICA CLAREAR verno e sua base aliada sobre os rumos para 0 Brasil. “Para evitar um agravamento da inflagaoe renovar a confiancados investidores, alguns seto- res socioecondmicos terio de fazer sacrificios”, dizoeconomista americano Werner Baer, da Uni- versidade de Illinois. “E nao esta claro como isso possivel enquanto estivermos na situago ica etual.” Dito isso, 0 diagndstico do que fazer para tiraro pais daccrise nao é um mistério. 0 eco- nomista alemao Jens Arnold, responsivel pelas anilises do Brasil na OCDE, considera que, do ponto de vistaeconémico, as saidas para oimbri- lio sio ficeis. “Por isso, nfo imaginei que a crise fosse tomar a dimensio que tomou’, afirma Ar nold, “Nao era possivel pensar que haveria tanta 100 | wowsexame.com incapacidade de gerar um consenso politico em torno das reformas necessérias para o pais.” E quais seriam essas reformas? No curta prazo, fixaio de uma regra para o crescimento das des- esas pablicas é uma delas. Dessa forma, a conta no cresceria muito emmomentosde bonancaeco- némica e seria possivel economizar para periodos mais dificeis. Além disso, é preciso elevar a idade minima de aposentadoria dos brasileiros paraalgo mais préximo damédia de 64 anos dos paises mais ricos. Hoje, a idade média aqui é de 52 anos para mulheres e de 55 para homens, algo insustentivel Outra medida seria rever as regras de reajuste do salério minimo: 0 valor do piso quase dobrou nos Ultimos anos, ja descontada a inflacdo. E, se essa crise vaitirar mais produtividade da economiabra- sileira, ¢ preciso pensar em como retomé-lanomé- dio prazo, Para isso, o pais precisa cortar os nés burocraticos. Ou seja, o receituério é plenamente conhecido. A crise pode ser a motivacao para que finalmenteas mudangas acontegam. Tudo isso po- deria ter sido feito antes, claro, mas nio foi. Nao esté restando alternativa senfo um ajuste foreado — a um custo imenso para a sociedade brasileira Como pais, nao soubemos evitar os desmandos na economia e suas consequéncias. £ torcer para que o fim da agonia esteja proximo.a

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