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A alegoria no “Sermão de Santo António aos Peixes”

Entende-se por alegoria uma representação concreta de algo abstracto. O “Sermão de Santo
António aos Peixes” está associado a este conceito, pois o padre António Vieira, quando fala aos peixes,
na verdade é aos homens que se dirige, sendo os peixes metáfora dos homens.

Assim, o orador, à semelhança de Santo António, foi pregar aos peixes já que os homens não o
ouviam: “ […] quero hoje, à imitação de Santo António, voltar-me da terra ao mar, e já que os homens
se não aproveitam, pregar aos peixes […]”.

O pregador destaca quatro peixes e atribui-lhes defeitos, como é o caso da arrogância personificada
pelos roncadores (“É possível que sendo vós uns peixinhos tão pequenos, haveis de ser as roncas do
mar?!”), do parasitismo relativamente aos pegadores (“ […] sendo pequenos, não só se chegam aos
outros maiores, mas de tal sorte se lhes pegam aos costados, que jamais os desferram.”), da ambição
demonstrada pelos voadores (“Não contente com ser peixe, quiseste ser ave […]”) e da traição
caracterizada pelo polvo: “[…] monstro tão dissimulado, tão fingido, tão astuto, tão enganoso e tão
conhecidamente traidor!”.

É evidente, então, a crítica dirigida aos homens através dos peixes, cujas virtudes são, por
contraste, metáfora dos defeitos humanos. Isto mostra, então, a superioridade dos peixes
relativamente à natureza humana: “Oh grande louvor verdadeiramente para os peixes, e grande
afronta e confusão para os homens!”. Por outro lado, os seus vícios são directamente metáfora dos
vícios dos homens, evidenciando o orador, de forma alegórica, os maiores defeitos humanos: “Mas para
que conheçais a que chega a vossa crueldade, considerai, peixes, que também os homens se comem
vivos assim como vós.”. Eis aqui uma crítica implícita à exploração social.

Podemos, assim, concluir que o sermão é uma sátira social, que se serve da alegoria, recurso que
auxiliou o padre António Vieira na crítica à exploração dos homens, exercida, sobretudo, pelos colonos
sobre os índios, e ainda na crítica aos holandeses que pretendiam apoderar-se da Baía.

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