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I.

Os Códigos
Um código vem a ser a organização sintética, sistemática e científica,
estabelecida por via legislativa, de certo ramo de Direito.
A palavra portuguesa código é de origem latina; deriva de “códex”. Códex
designava entre os romanos uma coleção de leis como os “códices”
gregoriano, hermogeniano e teodosiano, substituídos em 592 pelo “códex”
de Justiniano. Mas não se tratava de verdadeiros códigos, na acepção
moderna da palavra. Tratava-se de fundamentalmente de simples
compilações de leis. Esta estrutura, basicamente de uma coleção, que não
é própria dos códigos contemporâneos, manteve-se através dos tempos até
aos séculos XVIII e XIX.
Dado que deparámos com uma constante evolução social, económico e
cultural, de tempos em tempos e, principalmente, em momentos de
renovação tecnológica ou política há a necessidade de proceder à
reelaboração de certo ramo de Direito. Por exemplo, no Direito civil ou no
Direito penal pontualmente ou por razões de carácter político ou ideológico
pode se fazer estudos mais ou menos complexos com a finalidade de se
fazer alterações pontuais, à luz de princípios que se entende deverem ser
consagrados nesse ramo. Este corpo orgânico de regras respeitantes a certo
ramo de Direito é que constitui um Código. Diz-se codificação o fenómeno
tendente à renovação do Direito em observância a uma ideia de
sistematização científica e especializada.
A codificação, no sentido próprio da palavra, teve início no início do século
XIX. Os códigos assim entendidos não se confundem com os seus
antecedentes históricos, também por vezes chamados “códigos”, mas que
eram meros repositórios, em si não vinculativos, ou conjuntos alheios à
ideia de especialização.
. Código Civil de 1867
O Código Civil de 1867 é um código que resulta de uma enorme evolução
que ocorreu na Europa no século XIX principalmente em França e que
influenciou muitos países como a Espanha, Itália e também Portugal.
O Decreto de 8 de Agosto de 1850 encarregou o jurisconsulto António Luís
de Seabra (a quem foi atribuído mais tarde o título de Visconde) de
organizar um projecto de Código Civil, ao mesmo tempo que nomeava uma
comissão de professores universitários para ir apreciando e revendo, em
colaboração com Seabra, os trabalhos que este fosse apresentando. O seu
trabalho foi tão meritório que o Código de 1867 ficou conhecido como o
Código de Seabra. Teve como fonte as tradições jurídicas e ideológicas da
época, os ensinamentos estrangeiros (Código de Napoleão, o da Prússia,
Áustria e Sardenha), mas também se inspirou nas Ordenações filipinas e em
leis extravagantes.
É deste conjunto de elementos, sem evidentemente desprezar o muito de
original existente na obra do Visconde de Seabra, que provém a substância
do seu Código, até ao qual chegaram, canalizadas pelas vias acabadas de
referir, ideias do Direito Romano, do Direito Canónico, do jusnaturalismo
racionalista do século XVIII e do liberalismo individualista que impregnou a
legislação portuguesa a partir de 1832 (Mouzinho da Silveira).
Mercê da ação dessas fontes, e porque era esse o pensamento dominante
na época, o Código de 1867 apresenta-se como fundamentalmente
individualista. Ele tem, além de muitos outros méritos, o de haver
traduzido de forma consciente uma filosofia, hoje – pode-se dizer –
superada, mas que o seu autor soube introduzir nos preceitos que gizou e
redigiu. Essa filosofia manifesta-se logo no plano do Código e traduz-se
também na maneira como a generalidade das instituições está regulada. O
individualismo romanista como que se manteve, depurado e exagerado
pela feição que lhe deram os princípios da Revolução Francesa.
. Código Civil de 1966
Em 1944 resolveu-se proceder à revisão do Código Civil de 1867. Sendo
Ministro da Justiça, na altura, o Prof. Vaz Serra publicou-se para o efeito o
Decreto-lei nº 33 908, de 4 de Setembro. Mandou que se procedesse a
estudos para rever o Código Civil, visto que este se mostrava desadequado
e desatualizado face à realidade do século XX. Além disso, alguns
jurisconsultos já tinham identificado questões técnicas que deviam ser
resolvidos.
Decidida a revisão do Código Civil, foi publicada em Outubro do mesmo ano
(1944), sendo novo Ministro da Justiça o Prof. Cavaleiro de Ferreira, a
Portaria nº 10 756, que fixou certas normas sobre a preparação do projecto
de novo Código, estabelecendo designadamente que essa preparação seria
confiada a uma comissão de jurisconsultos. Esta comissão ficou de início
constituída pelos catedráticos das duas Faculdades de Direito do país então
existentes (Lisboa e Coimbra), servindo de Presidente o Prof. Vaz Serra.
Em 1954, sendo o Ministro da Justiça, o Prof. Antunes Varela, este
desenvolveu grande esforço no sentido de ultimação do Código. Promoveu
a elaboração de articulados sobre matérias em que ainda não existiam; e
promoveu bem assim, na fase final, a revisão e coordenação dos diferentes
anteprojetos parciais, na qual colaborou o Prof. Pires de Lima. A versão final
do Projecto de Código Civil veio a ser transformada em texto legal pelo
Decreto-lei nº 47 344, de 25 de Novembro de 1966, onde se fixou como
início da sua vigência em Portugal o dia 1 de Junho de 1967. Este Diploma
legal foi tornado extensivo às então Províncias Ultramarinas pela Portaria
nº 22.869, de 4 de Setembro de 1967. Entrou em vigor em Cabo-Verde,
enquanto Província ultramarina, a 1 de Janeiro de 1968.
O Código Civil de 1966 teve como fontes principais o Código anterior e a
abundante legislação avulsa entretanto publicada, bem como a principal
bibliografia jurídica ao tempo existente, em especial a portuguesa, a alemã,
a italiana e a francesa.
Depois do Código de Seabra tinham surgido no horizonte europeu, além
doutros, dois códigos civis de excepcional importância – o código civil
alemão (BGB) e o Código Civil italiano, entrados em vigor respectivamente
em 1900 e 1942, o primeiro mais rígido e severo, o segundo mais dúctil e
atraente. As literaturas jurídicas dos dois países, que desses códigos
receberam forte impulso, influenciaram bastante a elaboração doutrinária
portuguesa e o ensino ministrado nas Faculdades. Esses códigos tiveram,
portanto, reflexo no Código de 1966.

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