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COPYRIGHT © 2012 LUIZA LOBO. COORDENAGAO EDITORIAL ALI ERTO SCHPREJER PRODUCAO EDITORIAL PAULO CESAR VEIGA ‘CAPA MARCELO MARTINEZ I LABORATORIO SECRETO, RLVISAO ARGEMIRO DE FIGUEIREDO Fate liv segue a grata atualizada pelo novo Acordo Ortogréfico sda Lingua Portuguesa, ema vigor no Brasil desde 2009, CIP-BRASIL. CATALOGAGAO-NA-FONTE, SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ S697¢ Sousindrade, 1832-1902. (© Gusesa/ Joaquim de Sousandrade (Soustadsade) ;introducio, Oorganizasio, notes, glossilo, fixagio e atualizagdo do texto da edigdo londrina, Luiza Lobo ; xevisio técnica, Jamar Moraes. - Rio de Jonciro : Ponteio ; Sie Lufs, MA : Academia Maranhense de Letras, 2012, 1 edigao atualizada S72p.:23.em, Inclutbibliogratia ISBN 978-85-64116-16-0 1. Pocsia brasileira, I. Lobo, Luiza, 1948-. 1, Titulo. 12-2868, CDD: 869.91 ‘CDU: 821.13 ACADEMIA MARANHENSE DE LETRAS Rua da Paz, 84 - Centro ~ CEP 65020-450 “Tel: (98)3231-3242 ~ So Luls MA aml@academfamaranhense.org.br PONTEIO f UMA MARCA EDITORIAL DA DUMARA DISTRIBUIDORA DE PUBLICAGOES LTDA. ‘TODOS OS DIRFLTOS DESTA EDICAO RESERVADOS A DUMARA DISTRIBUIDORA DE PUBLICAGOESTTDA Rasa Nova Jerusalém, 345 CEP 21042-235 ~ Rio de Jancio - R) Tels (2102249-6418 onteiogponteiaedicoes.com-be ‘wwscponteioedines.com br Osditcitos desta edigdo estéo protegidtos pel F proibida a reprodugde total au parcial sem a eapressa antnicla d 4.3(81)-1 610, de 19.2,1998, 10 15 20 Canto Secunpo! OGuEsA 171 CANTO SEGUNDO 1858 ‘Ao meu companheiro de melhores dias V. C. F. de Saboia Opalescem os céus — clardes de prata — Beatifica luz pelo ar mimoso Dos nimbos d’alva exala-se, tao grata Acariciando 0 coragao gostoso! Oh! doce enlevo! oh! bem-aventuranca! Paradiseas manhis! riso dos céus! Inocéncia do amor e da esperanga Da natureza estremecida em Deus! Visio celeste! angélica encarnada Co’ a nitente umidez dombros de leite, Onde encontra amor brando, almo deleite, F da infancia do tempo a hora foi nada! A claridade aumenta, a onda desliza, Cintila co’ o mais puro luzimento; De purpura, de oiro, a croa se matiza Do tropical formoso firmamento! Qual um vaso de fina porcelana Que de através sol alumiasse, Qual os relevos da pintura indiana £o oriente do dia quando nasce. Uma por uma todas se apagaram. As estrelas, tamanhas e tao vivas, Qual os olhos que Kinguidas cativas, Mal nutridas de amores, abaixaram. FT tect aS 25 Aclaram-se as encostas viridantes, A espreguicar-se a palma soberana; Remonta a Deus a vida, 4 origem dantes, Amiga e matinal, donde dimana. Acorda a terra; as flores da alegria 30 Abrem, fazem do leito de seus ramos Sua gloria infantil; alcfon’ em clamos Passa cantando sobre o cedro ao dia Lindas loas boiantes; 0 selvagem Cala-se, evoca doutro tempo um sonho, 35 Ecurvaa fronte... Deus, como é tristonho Seu vulto sem porvir, em pé na margem! Talvez a amante, a filha haja descido, Qual esse tronco, para sempre 0 rio — Ele abana a cabeca co’ 0 sombrio 40 Riso do fris da noite entristecido. “Vagas eternas, se escondeis no seio Alguma coisa que, de mim, procuro Neste afa mudo, solitario, obscuro, Embalancai, adormecei, — jé creio... 45 “Cante o nauta a partida na alvorada, Retina a amarra o cabrestante opresso, Rajam chamas fornalhas abrasadas, Erga-se e trema 0 carro do progresso!” E qual 0 corvo taciturno voa 50 Atravessando o rio sobre o vento, O vapor fumegando, num momento Rente a riba direita alveja a proa: Caminha ousado nas vermel| rodas Que espanejam ao longe: aos sons ruidentes 55 60 65 70 75 80 CanTo SEGUNDO! O Guesa | 73 Saem da brenha 4s alterosas bordas, ‘am olhando os indios inocentes. Além, do rio sencobriu na volta O balcao ideal, onde altas frontes Duas nagdes debrugam! nao séo montes, E Tabatinga que ao Império escolta: Presidio imaginario! tais aurora Miragens pinta nestes céus albores — Ja da terra, que afasta-se e descora, Ao movimento sencobriu co’ as flores. “Desco a corrente mais profunda e larga Que se ha visto rasgar de pranto a face Da terra de misérias! outra nasce Na dor dos homens, porém negra, amarga: “Quando, voltando dos festins culpados A alma vA, prostituta arrependida, S6 tragos da fortuna que é partida Sao, dos olhos que choram, encontrados; “Ou quando a que nasceu para ser nossa Vemos em bracos doutrem delirando; Ou meiga patria, esperangosa e moga, Do seu timulo as bordas solugando.” Gela na Cordilheira'; hartas costelas Descarnam ribas; 4 corrente afoita Chamaloteiam ondas ledas, belas, ‘Amplas de sombras largas. Sobre a moita Nestas noites alvissimas destio, Felizes nos desertos, encostada A montaria do indio, abandonada, Na indoléncia cantando desce 0 rio. a rne es 85 90 95, 100 105 110 TMA EL OURO O Baden ali vai naquela errante Ihinha verde — portos venturosos Cantando a tona d’gua, os tio mimosos Simplices cora¢ées, o amado, o amante. Encantados lé vao, as grandes zonas Dum outro mundo, a amar, a ouvir cantando: Oh, ninguém sabe o encanto do Amazonas Ao sol, ao luar, as Aguas deslumbrando! Esta € a regido das belas aves, Da borboleta azul, dos reluzentes ‘Tavées de oiro, e das cantilenas suaves Das tardes de verao mornas ¢ olentes; A regio formosa dos amores Da aragaranea flor, por quem doudeia, Fulge ao sol 0 rubi dos beija-flores, E ao luar perfumado a ema vagueia. Ao longe as praias de cristal sespagam, Vibrando a luz, e os bosques semaranham, Cabeleiras dos ventos, que as assanbam; — As feitorias os seus tetos tragam: Sao muitos arraiais, aces diversas, Sao filhos do écio, que ora despertaram Na ambigao varia (as multidées dispersas Do arau’ medroso as Aguas se arrojaram); Tumultuados volyem as areias, Esquadrinham, revolyem, amontoam, Com a sede dos que da terra as veias De suor nao regam, vozes nfo entoam Na sossegada lavra, esperancosas ‘Tangendo o boi do arado. O povo in 115 120 130 135 140 CanTo Secunpo]O Gursa 175, O coragao ao estupro abre ignorante Qual as leis dos cristéos as mais formosas. Mas, 0 egoismo, a indiferenca, estendem As eras do gentio; e dos passados Perdendo a origem cara estes coitados, Restos de um mundo, os dias tristes rendem. Quanta degradagao! Raziio tiveram Vendo, os filhos de Roma, todos barbaros Os que na patria os olhos nao ergueram, Nem marcharam a sombra dos seus ldbaros. O estrangeiro passa: que lhe importa A magnélia murchar, se ele carece ‘Tao sé dalgumas flores?... Anoitece Num sono aflito a natureza morta! Julgai do que dois séc’los embrutecem — E li esto a dancar (que a mais nao podem) Porque do sol que nasce ainda Ihes sobem, No sangue os raios — amo-os... me entristecem... Que mentirosos génios predestinam, Deus clemente! nos quadros do Amazonas, ‘Tanta miséria ao filho destas zonas Onde em salmos os dias matutinam! Mas, que dangas! nao sao mais as da guerra, Sacras dangas dos fortes, rodeando A fogueira que estala e a, que inda aterra, Vitoria os hinos triunfais cantando: ao choram Quando os olhos altivos the Ao prisionciro, enfurecide aos grit Do vencedor que insulta seus a Manes, que para além das serras foram. FO | MNMUESATVAN LO OBGUNDO 145 Crepitante cauim girava ardente Eos guerreiros na gléria deliravam, Solene e vasto 0 circulo cadente Onde valor 0s chefes assopravam No sacro fumo, rebramando 0 espago 150 Oh, como eram selvagens os seus gritos La no meio da noite dos recitos, Sombrio a balangar pendente o braco! Selvagens — mas tao belos, que se sente Um barbaro prazer nessa meméria 155 Dos grandes tempos, recordando a histéria Dos formosos guerreiros reluzentes: Em cruentos festins, na varia festa, Nas ledas cagas ao romper da auroras EA voz profunda que a ribeira chora 160 Enlanguescer, dormir saudosa sesta, A voz das fontes celebrava amores! As aves em fagueira direcao Alevantando os voos, trovadores Cantavam a partir 0 coragao! 165 Selvagens, sim; porém tendo uma crenga; De erros ou boa, acreditando nela: Hoje, se riem com fatal descrenga Ea luz apagam de Tupana-estrela. Destino das nagdes! um povo erguido 170. Dos virgens seios desta natureza, Antes de hayer coberto da nudeza O cinto ¢ o coragao, foi destruido: Canto SEGuUNDO/O Guesa | 77 E nem pelos combates tio feridos, Tao sanguinirias, barbaras usancas; 175 Por esta religido falsa d’esp'rangas Nos apéstolos seus, falsos, mentidos. Ai! vinde ver a transicao dolente Do passado ao porvir, neste presente! Vinde ver do Amazonas 0 tesoiro, 180 A onda vasta, os grandes vales de oiro! Imensa solidao vedada ao mundo, Nas chamas do equador, longe da luz! Donde fugiu o taberndc’lo imundo, Mas onde ainda nao abre 0 braco a cruz! 185, “Vejo, opresso dum mau pressentimento, A lanterna, os quatro olhos a noitinha Fazendo esgares ftinebres, sozinha Da verga a olhar e a se mover co’ 0 vento... “Ola! que apaguem! temos belos astros 190 Que os caminhos alvejam sobre o rio, E vigilante o pratico gentio, E falam rodas pela luz dos mastros!” Abalroam a noite sonorosa Longas vozes ondeando nas soidées; 195 Ressoa a margem, taciturna, umbrosa, Dialvoradas cantadas nos serdes. Amava o Guesa errante esses cantares Longinquos a desoras nas aldeias; Se aproximava, triste, dos lugares 200 ‘Tio saudosos: POV! io 210 215 220 230 AT ANTO SBGUNDO “Saltemos nas areias. — Porém, que é isto®! peste! que descoras, Depravas dalma o instinto, que os perfumes Alegram, divinizam, sobre os cumes Das trescalantes flores destas horas! “E eu vi, longe daqui, a morte ao seio Da familia feliz despedacando, Rotos 0s lagos do mais puro enleio, A virtude, a beleza solucando! “O siléncio caiu, fez-se a tapera Na Concérdia dos cantos e os amores... Magalhaes, Magalhies, na primavera Partiste — ¢ em teus jardins ja murcham flores!” Na mata de mil anos 0 crescente, Qual errante caipora que divaga Pelas sombras dos troncos, docemente Seus infantes clardes recolhe e apaga. ‘Ardem os fogos no areal de milhas Ondulando nos ares, espalhados Por entre acervos dovos ¢ as vasilhas Em que aos raios do sol sao depurados. Vio e vém os caboclos vagabundos, Bébados riem-se diante das fogueiras Ou balangam-se em libricas maqueiras, Nestes odores podres-nauseabundos. Penetremos aqui nesta barraca — Da candeia fargila uma luz morta “través da nuvem de poeira opaca As claridades ldbregas aborta, Ora, o Guesa que sempre se sentia Revestido do signo, e sem do insano 235 240 245 250 260 Canto UNDO! O GUESA!79 Zeno ser filho, entao lhe acontecia Deixar 0 manto etéreo e ser humano. Fle atendeu. Mas, breve, lobrigando Das armas e do altar a melhor gente, Foi levado da elétrica corrente, Flor de ldtus ante ela relutando: Pois, tao grande é a forga dos exemplos Que dao homens aos candidos (infancia: Seguir aos sdbios crendo, na ignorancia Aes prostibulos vao, vindo dos templos. ‘Talo filho do Sol, peregrinando Ass, dos mundos a atragio risonha, No barracdo pernoita; e acorda estando Qual quem da sociedade senvergonha. — Eli perdeu-se no pegao pampeiro, Quando 0s indios mais varios doidejavam. E este canto veridico e grosseiro Em toada monétona alternavam: (MUGURANA hist6rica:)* — Os primeiros fizeram As escravas de nds; Nossas filhas roubavam, Logravam E vendiam apés. (TECUNA a sembalar na rede e querendo sua independén — Carimbavam as faces Bocetadas em flor, Altos seios carnudos, Pontudos, Onde ha sestas de amor. sili! bimrinntemicenin heehee? Canto Secunpo|OGursa | 81 (MURA comprada escrava a onze tostdes:) — Por gentil mocetona, Olha o vigério! a face da tecuna Com que maos carinhosas afagando! Boa prata de lei. 295 Guai! como a véstia santa abre-se e enfuna Oua saia de chita Lasciva evolugao, se desfraldando! 265 Bonita, Dava pro-rata el-rei. ‘Uma torceu o pé, junto a candeia Sentada esta, cantando ao seu profeta; (TUPINAMBA ansiando por um lustro nos maus PORTUGUES! Outra ao Guesa arrebata, enlaca, enleia — Currupiras os cansem 300 Em voltas cintilantes qual a seta! No caminho ao calor, 270 Parintins orelhudos, (NEPTUNUS SANCTORUM entrando pestilente:) Trombudos, Dos desertos horror! — Introibo, senhoras, ‘Templos meus flor em flor Sio-vos olhos quebrados, (Coro dos indios:) 305 Danados — Mas 0s tempos mudaram, Nesta noite de horror! 275 Ja nao se anda mais nu: Hoje o padre que folga, (Padre EXCELSIOR, respondendo:) Que empolga, — Indorum libertate Vem conosco ao tatu. Salva, ferva cauim 310 Que nas veias titila (LAGUAIBUNUGU conciliador; coro em desordem:) Cintila 280 — Eram dias do estanco, No prazer do festim! Das conquistas da Fé Por salvar tanto impio (Coro das indias:) Gentio... — A grinalda tegamos — Maranduba, aban 315 As cabegas de lua: Oaca! iaci-tata! Tatd-ird, 285 Do agudo ao grave, memichié destoa, Glorias da carne crua! Entrando frei Neptunus ventania: Psiu! macaca veloz, Macu-Sofia’, (Velho UMAUA prudente:) Medindo-lhe o capuz, de um salto voa! 320 — Senhor padre coroado, Faga roda com todas... E 4 vao! ¢ ld vao! pernas e bracos A catinga ja fede! 290 A revirar Macu, que solavancos . De sede Que o frade leva, aos trancos ¢ barrancos, s, palmas, cassos! Entre aplausos ge Suguaranas ‘stio doudas! $21 OGuxsa| Canto Srcunpo: 325 330 335 340 345 350 355, (ABREU LIMA murmumando o vae victis romano:) — Sao sagradas as fontes, Lede as leis, dom Vital: Vinte milhées de lebres Com febres Causa dum pantanal. (Coro cfnico dos vigdrios:) — Macaxera! Oucha! Quaqud! Coraci! quer perder Nestes tons tao noturnos! Alburnos Do olho morto sem ver! (Perulera sacerdotisa matando reis de Franca:) — Cum espirito tuo Sao Coatis sacristaos, Dea Elisa é vigdria Yankaria Das... magnetizacaos! (Vigdrios, ébrios saindo do tatuturema, insultam sagrados titmulos; a Voz:) — Escarremos imundos Nestas trevas! — Jeova Dai, 6 negro vampiro, Ao delirio ‘Teu em luzes fara! (GONGALVES DIAS falando dos mares:) — Vio nas conchas envoltos “Vio campa os tatus; Vao dervixes aos banjos; S6 anjos Vao com flor a Jesus? (Falando dos sepulcros, GOMES DE, SOUSA, DR. VILHENA ¢ Deus é X no horizonte?.. 360 365 370 375 380 385 Canto SEGUNDO! O GuEsA 183 — Governistas dao lei —Tendo a rama a ciéncia, A consciéncia Da uva A queda vereis (A que torceu o pé:) — Geme em Venezuela Alexandre-Sumé; Voz dos ermos, andando, Ensinando, Com seu canto de fé. (Vated'EGAS e NEPTUNUS, caretas ¢ trocadilhos:) — Repartia Sao Pedro Os tesoiros da Sé: — Deo date quem pode, Promode Dilatagao da Fé, (Regatées negociando & margem:) — Ha de dar 0 compadre Pelo espelho ‘arua Trinta libras de goma Na soma... —Nio, carina, ndo dé, (DESALMADO negociante passando lavoiras para a Praia Grande; JOOES-sem-terra cantando 4 viola: — ‘Suprimentos, madamas, Desta casa terao; Paguem desconhecidos Maridos!..? — Do, lan, dro, la, don, drao. (LAZARO DE MELO! da sobredita escola:) Moedas trinta! ea cabega Quer de quem nos criou... Se dd mais eapitio, 390 395 400 410 415 420 Bequimao’ Risca, 6 Governadé! (Desconsolados agiotas e comendadores:) — De uns arrotos do demo, No revira se haver... — Venha a nés papelério Do emporio, E de Congo o saber. (Damas da nobreza:) — Nao percisa prendé Quem tem pretos phherda E escrivao pescrevé; Basta ta... 3 Burra douro e casé. (Escravos agoitando as milagrosas imagens:) — S6 jd so senhozinhos Netos d’imperads: Tudo preto ta forros Cachorro ‘Tudo branco ficou! (GEORGE e PEDRO, liberdade-libertinagem:)° — Tendo nés cofres piblicos, Livre-se a escravidio! Comam ratos aos gatos! Pilatos Disse, lavando a mao, (Principes declinando do tesoiro em favor da instrugao priblica:) ‘Tribos ha que nao pagam Ao seu legislador, Patriotas honrados, Amados, S6 da patria ao amor. 425 430 435 440 445 (Comitentes dando graus em disparates Canto SeGunpo|O Gugsa 185 (Ministro portugués vendendo titulos de honra a brasileiros que nao tent:) — Quem de coito danado Nao dird que vens tu? Moeda falsa és, esturro Caturro, Dexceléncia tatu! (TLMON DATENAS lendo CAMOES e VIRGILIO:) — Morrer ‘morte macaca’ Pelo ‘engenho central? Careceis... d’Hoyer-alma Aurea palma E de S4-canavial! (Moral educagao pratica:) — A mulher, é Jovita; O homem, Bennettetao: Oh! faz Hudson-manbusiness, Freeloves; Amazonas, poltrao! (Titulares protestando:) — Compra-tit’lo azeiteiro Conde-acende tatu: Todos sto com inveja Da vieja Lufsa-C'reca-Fi-Fu! Ora, Simao Samério Compra apést’lo-poder De curar, pondo a mao, Maranhio De sol, lua e mulher! (Alvissareiras no areal:) ‘Tanto quorum concorre, Que nem mumbro ji tem: 460 465 470 475, 480 Medalhées, embolados Doirados, Pigas!... vejam quem vem! (Ecos das muvens:) — HA trovées no Parnaso, Sao dos cumes a luz; Quando vem Fomagata’, Em cascata ‘Terra-inundam tatus! (Voz dogmtica de fora:) — Luso-hispano-brasilio Antro de Belzebus! Lacio em fim!... Reis, da raga Da graca; Reis, dos antros... da luz! (CUNHAMBEBE rugindo:) — Missiondrio barbado Que vens Id da misao, Tu nao vais A taberna, Que interna ‘Tens-na em teu coragio! (RODRIGO, das naus de COLUMBUS ‘Passando-se para outros deuses:) — A Crist6vao os escudos? Com Mafoma me pus! Era “a que marinheiro Primeiro Visse terra.” nao luz! (VIOLA rindo:) — Deste mundo do diabo Dom Cabral se apossou, esta noite Arabia Astrolabia Desde entao se bailou. 490 495, 500 505 515 520 (Novo core, enternecendo:) — Nos rochedos ululam Na saziio dos cajus, Amazonas: fagueiros Guerreiros Véo pintados e nus. (STAEL pelo amor; NAPOLEAO escarreirando reis d'Ibéria:) — Bigamo mor, qual pensas Sera maior mulher? — Campo p'ra ser arado, Ao Estado A que bravos mais der! (D.JOAO VI escrevendo a seu filho:) Pedro (credo! que sustos!) Se ha de ao reino empalmar Algum aventureiro, O primeiro Sejas... toca a coroar! a Patriarca:) — Quem que faz fraca gente, Calabar-Camario? Ou santelmos delitios, Ou sirios Das gargantas do Cao? (2° Patriar — Bronzeo estd no cavalo Pedro, que é fundador; B! é! é! Tiradentes, Sem dentes, Nao tem onde se pér! (OG Eu nasci no deserto, » rodando:) Sob o sol do equador; TRALEE RE NS REREeD SERED At MOTE COEDS, 525 530 535 545 3 As saudades do mundo, Do mundo... Diabos levem tal dor! Das guardas nacionais os comandantes, O nobre escravocrata, que ¢ barao, Qs poetas do amor, mimos de amantes, Ali rendiam preitos a funcao. Abria asa 0 juiz do Sorimaua As donzelinhas nao apresentadas: Como, pois, ao sinal que deu tuxaua, Aamor fugirem tao amedrontadas! Dé fora um promotor republicano Vil caiguma aos mutuns e jacamins, Que selevam gritando num insano. Desnorteado saltar; mas, nobres fins. Ea multidao apinha-se ao em torno Amostrando as cabegas nos ubis, Range abalado o fumarento forno, A algazarra infernal toca 0s zénites! (Goro das indias:) — Stsivei, rei de flores, Lindo Temandaré, Ruge-ruge estas asas De brasas... Cuidaru, cereré. (WAYANORICKENS, fumando e assoprando nas caras:) — No cachimbo-conselho, Qual um porco a roncar, Enroscava olho e rabo Odiabo Em cornudo sonhar, 570 575 580 Canto Secunpo]O Gugsa | 89 (Sdbios olhando do vértice do solar paralaxe pelo telescépio do equador:) — Venus fica, pasando Pelo disco do sol, Mosca; 0 angulo obtuso, Confuso Qual num olho um tergol. (Abvissareiras no areal:) — Aos céus sobem estrelas, ‘Tupa-Caramuru! E Lindoia, Moema, Coema, Ba Paraguacu; — Sobem céus as estrelas, Do festim rosicler! Idalinas, Verbenas De Atenas, Coragées de mulher; — Moreninhas, Consuelos, Olho-azul Marabas, Palidez, Juvenilias, Marilias Sem Gonzaga Tomas! (Arraia mitida, nas mathas; AGASSIS-UIARA:) — Que violentam-se elipses, Ora, na ode infernal! = Vénias*... dias dentrudo.., Mais crudo Foi do Templo o mangual. —Nus, disformes, quebrados, Neos, rijos, sem dé! = Venias... gira, baniua, Acariua Doce mocororé, (Natitas pescando rimas no rio:) Contradigées do Eterno: 9910 GUESA! CANTO SEGUNDO 590 595 600 605 610 615 620 Luzes, do pantanal; Do lodo, o homem; das ostras, As pérolas; De ’stercticio’, o rosal. (Velho UMAUA, profundo:) — Foge de Jurupé, Caraibabé-tim, Que malino faz festas Qual estas E urari fez assim! (Vate d’EGAS e MURUCUTUTU-GUAGU arredondando os olhos:) — Pai Humboldt o bebia Com piedoso sorrir; = Mas, se ervada taquara Dispara, Cai tremendo o tapi...i...ir! (Risadas). (Politicos fora e dentro:) — Viva, povo, a reptiblica, © Cabrilia feliz! = Cadelinha querida, Rendida, Sou monarco-jui...i...iz. (Risadas). — Prole, stidito, heranga De senhor Alfonsim! Del-rei religiao, Servidao Eo rabicho do Chim! = Referenda o ministro, Moderando 0 poder: ‘Toma, assina a meu rogo, Diogo, Por yo no saber leer: (BRUTUS do iiltimo circulo do Inferno de DAN Oh, sero ma i 625 630 635 640 645 650 Canto Secunno!O Gursa | 9L César, que inda ha de vir, Quem, descendo do trono, A seu dono Diga, ao povo, subir! (Inocéncia real; maliciosa populaga:) — Faco-os condes, viscondes, Fazer mais eu nem sei; Tenho muita piedade! = Saudade ‘Temos s6 de ser rei. (Discussito entre os mestres de formas e formas:) — Redondilhas menores... = Per Guilherme e Nassau! Res, non verba, senhores Doctores, Quer destados a nau! (A india luz amortecendo ao sopro dos bailadores:) — Com tatus quebra-frechas, Sé a vivis: a: Ou tereis mundo tétrico; Elétrico Nunca no barracao! (Um URSO e um GALO apagando a tiltima brasa e consolidando-se duo in uno tatus: — Sao deletricidade ‘Tempos, mundo do fim = Sio as manchas solares, Dos ares A alumiar tudo assim! (Um delegado em cismas:) — Reina a paz em Varsévi Mas, a guerra a chegar, Recrulamos arraus, 660 665 670 675 680 Pica-paus, Quando a luz, se apagar. (Vates summos:) — Sao as Negras-Agulhas, Sao, secundum Mattheum, (Tupungatos trés tombos) Colombos, Tamoiosque quae-meum. (NEPTUNUS:) — Os poetas plagiam, Desde rei Salomao: Se Deus cria — procriam, ‘Transcriam — Mafamed e Sultéo. (Coro dos beatos pasmadores:) — Setecentas mulheres, Mais trezentas, milhar! Ao ar livre, nos montes, Nas fontes, Ou a beira do mar! (Risadas). (Vates summos:) — Ha de o mundo curvar-se Ante a trina razdo: Sol dos incas p'ras palmas, Pras almas Jesus Cristo e Platao. (Titulares aguentando o barraciéio:) — Roda, ipi! tirana Do governo central, Qual coroa ao em torno Do corno — Apis-deus", carnaval! 685 690 695 700 710 Canto Segunpo! OGurSA 193 (EXCELSIOR:) — Leem destinos dos povos? Dom Aguirre os conduz Mefistés"' justigados, Tornados Dos jesuitas'? lundus! (Beatos pasmadores:) — Branca estitua de Byron Faz cegueira de luz? = Breu e brocha a criada! E borrada: O, 6, 6, Ferraguz"! (Risadas). (Pasmadores tmpios:) — Lamartine é sagrado? Se nao tem maracas, O, 6, 6! — vibram arcos Macacos. ‘Tatus-tupinambas. (Futricas invadindo alheios Edens:) — Do Amazonas e 0 Prata O divércio se faz Nestes campos Parises Felizes... Cascavel, Satanas. (AMAZONAS belicosas melhorando a genesiaca superstigdo:) — Terra humana, primeiro. Deus fez Eva; ¢ entio, Paraiso sendo ela Tao bela, o homem Adio, (Guerreiros brancos:) Sobre os montes @incenso Dois obuses estio, 720 725 730 745 Meio do Eden os gomos Dos pomos, ‘ome d’Eva em Adao (UMAUA desprendendo 0 cinturdo antropéfago e com ele tocando para Sora curumis-guesas e cunhantés:) — Indios corsos, potiras! Fujam Jurupari"! Xcomungado Vitério, Infusério Do senhor do urari, (XEQUES" farejando; cunhanmucus escondendo ao GUESA:) — Que a justica nao fuja; Aqui vai... acola... = Que em tatus vos transforme, Denorme Rabo, Fomagatd! — Com sentenga lavrada Eo tal 6rfao ld est: = Juizes maus, o menino Divino Dentre vés surgirél (© GUESA desgostoso:) — Numa roda de araras Meta-os Jurupari! Enquanto eu circunciso, Sem riso, Vou chorando daqui. (CURRUPIRAS iangendo a vara de queixadas:) — DEzequiel roda dolhos, ‘Niagaras de luz!” Passa 0 Guesa alto 0 brado, Amontado Na legiaio dos tatus! 750 755 760 770 775 780 Can10 SEGUNDO! O Gutsa 195, (Virtuosas sem esperanca:) — Sergue um fumo denxofre, Quando 0 demo se foi: Nesta calma podrida Da vida Ser sem ele é que déi.. (Major JONATAS, filosofando do ventre da baleia:) Ora... acécias recendam, Meia-noite dormente! Quiau! faz galo da serra! Uh! berra Sapo-boi na cor... nte! (Sussurro), (Meiga MUND’RUCU, convidando a ordem:) — Coitadinha baniua, Novo cacto de amor, Chora aos brados da festa Molesta Seu noivado de dor. (NEPTUNUS e EXCELSIOR discutindo:) ~ Hierdglifos-mosaicos Sao, do papa-mané; = Alta lucubragao, Barracao; Guarani, guarand, (POTIFAR-CATU:) — Tem José rota capa, ‘Tonto cérebro o sol, No mar brincam estrelas Tio belas Qual 0 peixe no anzol. (Pajé mund'rucu, instruindo ¢ bailando) As eseravas da lua, Trmazinhas do mar, 785 790 800 805 810 als Calipigias Citeras... Deveras, Anda o Olimpo a bailar! (Sombra de rei TEODORO errando pelo teto:) — Vede, cinco de oitubro, Negro mar em furor, Sobrenada, nesta arca Da Parca, Do abissinio o amor! (Espirito de PATROCLO per BRISEIS sibilando por baixo da terra:) — Dos amigos preserva ‘Teus mimosos tajés; Ou 0 amor, fogo-ardido, Perdido Co’ os amigos terds, — (Admirado grupo de virtuosas @ porta-coro:) — O maridos, 6 virgens, Que honra tendes num triz, Sois da carne e do osso Do nosso Rei o franco Sio Luis!!! (Cunhanmucus, respondendo as virtuosas:) — Vibram bifidas linguas, Caninana e goaimém:; Fazem coro pistilos Sibilos, As comadres de bem, (Doutos pensativos:) — Maram nha despropésito Acorrer: fatd-o¢u, ‘Tacon’ morepotara, Ibi-quara... Berd berab, Macut 820 825 830 835 840 845, Canto Segundo! O Gursa 197 = Parand defluindo Fez a voz maranhé... Raia o sol qual comenda, Resplenda Sobro império da ra! — Musa paradisiaca Jé no Eden floriu, Bananeira-ciéncia, Sapiéncia Que o Senhor proibiu. (SPIX e MARTIUS:) — Dos seis dias genésicos Vem toda esta fungao, = Fez-se luz, mar e mundo Rotundo; Criador, criagio. (MACU sonhando:) — Se 0 amor, vice-versa Logro do ar, me cansou, ‘Tupa que mais nao cria, Recria, Ver que em gozos ficou. (Sussurro.) (Doctor PURUPURU, doctor BORORO:) — Mais valera castrato, Nem haver candiru; = Oh! tremei dessa ondina Que ensina Ao turiua-tatu! O Sio Pedro de Roma! 0 indio é manso, Que vai subindo 0s rios, for iro A fugir das ciencias, qual o ganso Dos regatées, por entre o eacaueiro Hesiod lai hrm insshanh net hnni incrle 850 855, 860 870 (EL GRA-CA® nomeando um secretéi Moderno missiondrio 0 desinquieta E corrompe: de Amor € sacristao, Que em latim nao escreve os d’Anchieta Cantos aos céus; mas, civilizagao. (Titulares em grande gala:) — De ema o beijo, trombejo; = No agro, o flagro, 0 barao! — Toirarias no globo, Do lobo, Da onga, 0 cabro, 6 cabrao! (TIMON DIATENAS nido vendo nos climas 0 enfraquecimento dos povos:) — Guai! senhores, Lucullus'*? F de pato este arroz! - Procriais indigestos; E honestos Foram vossos avés! (ORELLANAY” a influéncia de UIARA; Martinez* vendados olhos chegando do ELDORADO:) — Meu compadre, Manoa E Manaus? ’i vereis, "{ vereis do oiro o império! O império Dos escravos ¢ os reis. io; el vizir das copas explicando a grag ‘ — ‘Que alvas asas nao bata O cisne dentre nds. = Por nos ser do partido, Querido. HA presente esta noz. (SAO JOAO nao vendo a sanguindria culpa nos carapands:) — Co’ a Besta apocaliptica ‘Tu nao fornica 880 885 890 895 900 905 CANTO SEGUNDO! O GuEsa 199 Antes coices e biles, Aquiles, Dela, nunca os crachas! (BANIUA tristinha:) — LA na foz do Madeira Os velhinhos sao réus, ‘Toda a taba cantando, Dangando, Alvejando troféus. (Coro das cabegas:) — Escanchada nos galhos Dorme agora, Macu, Por que os sonhos de Flora Na aurora Floresencham-the o uru...u. (Risadas). (Antropéfago UMAUA, a grandes brados:) — Sonhos, flores e frutos, Chamas do urucari! Ja se fer cai- Jacaré! Viva Jurupari! (Escuridao. Silencio.) (Egipciaca ESFINGE do deserto:) — (Pessoal, nao res publica, ‘Titular... lar-titu: S6 em vés crendo 0 povo: Deste ovo Que fazeis?... Uh! Uh! Uh!) Canicular delirio! paroxismos Do amazénio sarau! pulavam, suavam, Na cintura fantistica brandeavam Qual magnetiz: ‘do ante os abismos! 910 915 920 925 930 935 Baixa tuxaua satiro e alteia Aos tangeres finais na india avena Carpindo a se finar, e danga e acena, ‘Tupi! vampiro em volta da candeia! Dissolugao do inferno em movimento! Qual as fozes, mugindo as dguas belas, Volvem-se em laivas negras e amarelas, Despojos de onga, Foi um s6 momento! — Viva Jurupari! — Tem-se apagado A luz. Caiu a treva. Entao sescuta Na densidao da sombra, em que se oculta, Fungar, gemer 0 escéndalo espojado. Porque, se a vox. a amor est sujeita, E lei por uso do tatuturema Que, onde pés-se a mao, a presa feita, Ninguém se fuja ou se conhega ou tema. Entio, ent&o praticam-se do incesto Os mais leonilios, mais brutais horrores! Qual a repercussio no império infesto, De Gomorra novissima os amore: Eestale a corda que feriu tais sons! — Deixo eu este assunto depravado: Que desculpem-me o triste recitado Do que as bordas se vé do Solimé Chamem eles, embora, louco ao sabio Que os cancros sociais descobre a luz; Cumplice é quem protrai, torcendo o labic A aqueles para os quais veio Jesus; Quem deixa.a corrupgao lavrar oculta; Quem por lei do interesse, ou cobare Canto SeGuNDo!OGurSA | 101 940 Nao vé que a humanidade se sepulta E que a patria decai dia por dia. Vede Azevedo, 0 sacerdote honrado, Simb'lo da igreja e mais nao sendo exemplo No clero inglério, obscuro, detestado, 945, Que ai sombreia ao brasileiro templo: F que nao vale de virtude o espelho Se nao for a do Deus espada e luta, Nem doutrinas sencravam d’Evangelho Em frouxos ritos, mas verdade bruta. 950 Os derradeiros fogos do ocidente Jorram laminas de oiro sobre a massa Da viva treva, liquida, luzente — O rio Negro sussurrando passa. Em luzeiros rebenta a espuma errante 955 Qual moitas de rubis por sobre as cristas Negras da vaga trémula, oscilante, Vistoso canitar de mil conquistas. meigo e doce o olhar, meiga a saudade Que do trono de sombras vaporosas, 960 Dos altos montes e as etéreas rosas Contemplativa nos despede a tarde, De colina em colina a Cachoeira, Qual a serpente de coral ruidosa, Desce ao vale, onde a tribo ja repousa 965 Livre em scios de mae hospitaleira As filhas de Manara os membros leves Na onda estio, convulsos, bronzeados: A luz viokicea dos creptise'los breves, malladoss Ondulando co! 08 peixes ¢ 970 975 980 985 990 995, Ledas ld vao batendo em roda a vaga E cantando em seus jogos inocentes: — Dangam & flor da abencoada plaga; Voltam as chogas da montanha ausentes. Oh! como as noites de Manaus so tristes As cismas na soido dos infelizes! Quando tu, esperanga, nao existes Com teu belo horizonte de matizes, Saudade minha... — Estéo, densa a ribeira, Fogueiras longe os indios acendendo; Ruge ao lado, dos grémios da palmeira, Ara selvagem, maracé tremendo Das maos @’ignoto piaga ali detido Ante os destinos seus, da tribo extinta Do egoismo ao contato, co’ o gemido Que geme o indio inocente, ¢ a dor Ihe pinta. Nao é a cobra, que descendo estronda, Ou da 4gua o génio, que do Solimées Ao Branco” se dirija a noite, a onda Percorrendo... pavor dos coragGes... Falam do rio... qual a vox das chamas De uns labios, que beijar a patria areia Vem a desoras — candida sereia, Quio formosas memérias nao reclamas! Talvez de Ajuricaba’! a sombra amada Que vem, deixando os ttimulos do rio, Nas endechas da yaga solugada Gemer ao vento dos desertos frio: } | Canto Secunpol OGursa | 103 Onga exata, erma planta do terreiro, Que ainda acorda a bater os arredores 1000 Ao repoiso da noite do guerreiro, Noite donde nao mais surgem albores. Talvez. Lobo dAlmada”, 0 virtuoso Cidadao, que esta patria tanto amara, A chorar, das reliquias vergonhoso 1005 Que a ingratidao as trevas dispersara: Foia queda do cedro da floresta Que faz nos céus o vacuo para as aves, Que nao encontram na folhagem mesta Dos perfumes os ninhos inefaveis — 1010 Oigamos... 0 fervor de estranha prece, Que no siléncio a natureza imita De nossos coragées... aquém palpita... Além suspira... além, no amor floresce... Porque eu venho, do mundo fugitivo, 1015 No deserto escutar a voz da terra: — Eu sou qual este Ifrio, triste, esquivo, Qual esta brisa que nos ares erra. Nozas aos Canros| OGuesa | 521 Notas ao Canto II 1. Cordilheira — Il, 77; XI, 325, 398, 774; XIL, 20, 69, 362, 435, 537, 696. Ver Andes. Ver andeo. Ver andino. Ver Serra. 2. “Danga de Tatuturema” — 249-84; 301-523; 540-843; 852-905: trecho satiri- co representando 0 Inferno amaz6nico, com radical mudanga de métrica para o limerick — 0 qual também pode ser interpretado como versos romanticos dividi- dos; cada estrofe € precedida de didascdlia, ou indicagao para a movimentacéo dos atores, em prosa e entre parénteses. O tatuturema é uma danga em louvor de Jurupari, o deus civilizador dos indigenas da regio amazénica do alto Solimées, num ritual provavelmente dos tecuna. Consiste na iniciagao sexual 4 maturidade, coletiva, quando mogas e rapazes se recobrem de peles de tatu, animal importante para sua cultura; tatuturema — 343, 923; tatus — 278; tatu-tupinambés — 7025 tatu — II, 643, 749; X, 2066; turiua-tatu: 843. Ver Jurupari. O Guesa vé 0 rito como sinal da decadéncia dos indigenas. 3. Macu-Sofia, Macu (Macunaima) — 287, 290, 815, 832, 890: herdi civilizador das tribos indigenas do norte do Brasil. 4, Lazaro de Melo — 386: traidor de Bequimao; Lazaros de Melo —X, 3021. Ver Bequimao. 5. Bequimao —- 390: Manuel Beckman, senhor de engenho, atualmente consid- cerado heréi, pois promoveu uma rebelido contra 0 monopélio do comércio portu- gués, que foi reprimida pelo capitio e governador Gomes Freire de Andrada com pena de morte por enforcamento, ocorrido em 10 de novembro de 1685. 6. George (Washington) e Pedro (Il), liberdade-libertinagem — 410; Pedro — 410, 501, 514; S40 Pedro — 369, 844. 7. Fomagata — 461; Fomagata — II, 732; VI, 324: 0 poeta alterou 0 acento da palavra para rimar com “acold” ¢ “estar” (Il) e “da” (VI): Fomagata ou Bochica era a representagéo do Sol ou heréi civilizador da mitologia muisca ou chibcha, do planalto central de Bogoté. Ele tinha rabo, um sé olho e quatro orelhas, lancava fogo pela boca, era cruel e foi morto pelo deus do ar; veio do leste com sua esposa, a feiticeira Huitaca, criadora do mal (como Pandora). No poema, ¢ a representacao de Dom Pedro II. 8. = Vénias — 577, 582: 0 poeta utiliza aqui o recurso grafico do duplo travessio, indicando uma segunda voz teatral de dilogo, tanto neste primeiro Inferno, a “Danga de Tatuturema” (I), quanto no segundo, o “Inferno de Wall Street” (X). 9. ‘stercticio — 590: Estercticio, discipulo de Esquirol e autor de um tratado de 1840 sobre a terapia “moral” da loucura nos manicémios franceses. 10. Apis-deus — 684: deus Apis, boi sagrado dos antigos egipcios, considerado a encarnagio de Osiris ou Pta e representado por um homem com cabeca de boi. 5221 O Guesal Notas Aos CANTOS A inversio da ordem dos nomes ¢ um recurso utilizado em todo 0 poema pare obter métrica ou rima, por vezes levando & criagao de neologismos ¢ hipérbatos. LI. Mefistés — 688: Mefisto ou Mefistéfeles é 0 deménio no poema Fausto, de Goethe. O poeta alterou o acento para Mefist6 para obter o hexassilabo no verso em limerick. 12, Jesuitas — 690; IIT, 798; X, 2008, 2271, 2336, 2957, importante ordem re- ligiosa no Brasil. Ver Loyola. 13. Ferraguz — 696: personagem de Ferragus, chef des dévorants (1833), ro- mance de Honoré de Balzac. 14, Jurupari — 723, 740, 899, 9185 LII, 617: herdi civilizador dos aborigines do norte do Brasil. Ver tatuturema. 15. Xeques — 727s V, 383; IX, 60; X, 1929, 1935: sacerdotes muiscas ou chibchas, tribos conquistadas pelos incas, que perseguem o guesa para sacrificé-lo a0 final do suna ou caminho sagrado, dando origem a um novo ciclo de 185 luas, = indiccio, conforme as epigrafes ao poema. A regido de San Juan de los Llanos, alt citada, situa-se no antigo reino de Granada, Colombia. Ver burglar. 16, Lucullus — 859: general romano cuja biografia, Vida de Lucullus, foi escrita por Plutarco em latim, no século La.C. 17. Orellana — 864; III, 739: Francisco de Orellana (Trujillo, Espafia, 1511-<- 1546) penetrou, com sua expedigao, pela foz do Orinoco, viajou ao Amazonas ¢ escreveu sobre a lendaria tribo das amazonas, as icamiabas; fundou Guayaquil e fo: governador da provincia de Culata, no Equador, em 1538. 18. Martinez — 86 organizou uma excursio com um grupo de guerrilheiros por ele treinado pare fundar uma nova civilizagdo nas Américas, numa regiio da Amaz6nia chamada Eldorado, o império mitico dos incas. 19. El Gra-Ca (El Grand-Kan, no orig.) — 870: seria O Grio-Kan, Gengis Kan, imperador dos mongéis no século XIII. Marco Polo menciona 0 imperador Kuble Kan, neto de Gengis Kan. 20. Branco — 988: Estado do Rio Branco, desbravado por Lobo d’Almada, fun- dado em 1882, Rio Branco é um afluente do rio Negro. Ver Lobo dAlmada. 21. Ajuricaba — 994: chefe da tribo manads, que habitava préximo a Manaus. No século XVIII ele resistiu fortemente a escravizagao dos indigenas pelos portu- gueses, na Amaz6nia, Preso e levado a Belém para julgamento, preferiu o suicidio a escravido, langando-se acorrentado as Aguas do rio Amazonas. -feréncia a Emiliano Martinez, aventureiro mexicano que 22, Lobo d’Almada — 1002: aventurciro portugués que introduziu gado bovino € equino nas planicies da regido do Rio Branco, apés a fundacao do forte de Sic Joaquim, em 1787. Ver Rio Branco.

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