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Heranças Coloniais No Atual Ensino de Música Na Licenciatura - TCC LIMA
Heranças Coloniais No Atual Ensino de Música Na Licenciatura - TCC LIMA
JOÃO PESSOA
2023
Manuela Azevedo Correia de Lima
JOÃO PESSOA
2023
Catalogação na publicação
Seção de Catalogação e Classificação
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________
Prof. Dr. Luís Ricardo Queiroz
Departamento de Educação Musical - UFPB
_________________________________________________
Profª Dra. Carla Pereira dos Santos
Departamento de Educação Musical - UFPB
__________________________________________________
Prof. Dr. Fábio Henrique Gomes Ribeiro
Departamento de Educação Musical - UFPB
AGRADECIMENTOS
À Gláucia, Vó Jura, Pedro, Bruno, Rose, Thainá, Guiga e Kátia minha família, por
todo o suporte, atenção, paciência, companheirismo, carinho e acolhimento durante todo
esse processo. Vocês são muito sagrados e amados!
À minha maior saudade, tia Rosedeth, que não esteve presente em corpo, mas se faz
presente em memórias e em ações que reverberam até hoje. Sem você eu não seria tanto!
A minhes amigues querides, por segurarem a minha mão e vibrarem com cada
conquista minha como se fosse delus.
Ao meu querido orientador, Luis Ricardo, por ter aceitado fazer parte dessa
empreitada, pela inspiração na escolha do tema deste trabalho através das excelentes
pesquisas decoloniais nas quais o mesmo se dedica há muitos anos. Obrigada pelas dicas,
acolhimento e encorajamento que me ajudaram a concluir mais essa etapa da minha vida.
À professora Carla Santos e ao professor Fábio Ribeiro, pelo suporte e carinho de
sempre ao longo do curso e por prontamente terem aceitado fazer parte da banca avaliativa.
Sem vocês esse curso e esse trabalho não seriam os mesmos!
Aos professores Vanildo Marinho, Carla Santos, Fábio Ribeiro e Eliane Ribeiro pela
orientação e acolhimento durante a minha participação no Programa Institucional de Bolsas
de Iniciação à Docência (PIBID) e no Programa de Residência Pedagógica (PRP) da UFPB,
os quais me proporcionaram vivenciar outras práticas docentes e suas maravilhas,
dificuldades, reflexões e transformações. À Dani Gramani e Sabrina, que me desafiaram
como cantora e me fizeram sair da zona de conforto e crescer como profissional.
Aos meus amigos da graduação, em especial Elen Firmino e Franciele Galdino, com
quem convivi intensamente durante os últimos anos, pelo companheirismo e pela troca de
experiências, parceria e paciência ao longo dessa etapa. “Tamo junta”, pretas!
À Mirela Coelho pelo olhar carinhoso, o constante encorajamento, os empurrões, a
paciência e uma crença em mim que me faz acreditar em todas as possibilidades.
E a todas as pessoas que estiveram comigo nessa caminhada, e que contribuíram
diretamente ou indiretamente para essa realização.
RESUMO
Nos últimos anos, graças a profundas reflexões de estudiosos sobre os processos educacionais
desenvolvidos no Brasil, pudemos observar o aumento do número de estudos sobre as
influências da colonialidade em modelos educacionais adotados em diversos contextos
educacionais, sobretudo no ensino superior em música. Seguindo essa tendência diagnóstica e
reflexiva, esta monografia tem como objetivo geral compreender o repertório e as
metodologias de ensino-aprendizagem abordadas nos componentes curriculares voltados para
o estudo de teorias e regras, estrutura e análise de peças e períodos contemplados na formação
ofertada pela Licenciatura em Música da Universidade X. O objetivo geral desdobra-se ainda
nos seguintes objetivos específicos: identificar as disciplinas que são voltadas para o estudo
de teorias e regras, estrutura e análise de peças e períodos composicionais da história da
música; realizar o levantamento do repertório e metodologias de ensino-aprendizagem
utilizados nas disciplinas de teorias e regras, estrutura e análise musical ofertadas pelo curso
de licenciatura em música da universidade x; analisar possíveis influências da colonialidade
na escolha dos repertórios e nas propostas pedagógicas das disciplinas de prática e análise
musical. O trabalho foi realizado com base em uma pesquisa qualitativa, descritiva e
documental de fonte primária pautada na análise dos planos de curso de oito disciplinas
oferecidas pela licenciatura em música da universidade X, elencadas de acordo com os
seguintes critérios: 1. Serem voltadas majoritariamente para o estudo de teorias e regras,
estrutura e análise de peças e períodos composicionais da História da Música; 2. Serem
compartilhadas entre os cursos de bacharelado e licenciatura em música da universidade X. A
partir da análise dos dados coletados, foi possível verificar, em consonância com a literatura
da área, a utilização predominante de compositores e saberes europeus nas disciplinas
selecionadas, assim como a aplicação majoritária de aulas descritas como “expositivas”. Tais
resultados corroboram com análises anteriores sobre as influências da colonialidade nos
processos de formação superior em música das universidades brasileiras, explicitando a
necessidade de fomentar e executar rupturas decoloniais e ressignificações nos processos e
práticas pedagógicas utilizadas, resultando em uma formação mais compatível com a nossa
própria pluralidade cultural.
1. INTRODUÇÃO 9
2. COLONIALIDADE DA FORMAÇÃO EM MÚSICA NO BRASIL: REVISÃO E
FUNDAMENTAÇÃO 12
2.1 AS RAÍZES CONSERVATORIAIS DA FORMAÇÃO EM MÚSICA NO BRASIL 12
2.2 COLONIALISMO X COLONIALIDADE 14
3. A FORMAÇÃO SUPERIOR EM MÚSICA NO BRASIL: DIMENSÕES
HISTÓRICAS E PERSPECTIVAS CONTEMPORÂNEAS 17
3.1 HISTÓRICO GERAL 17
3.2 A FORMAÇÃO SUPERIOR EM MÚSICA POPULAR 18
4. TRAÇOS DE COLONIALIDADE NOS REPERTÓRIOS DO CURSO DE
LICENCIATURA EM MÚSICA 22
4.1 PERFIL E OBJETIVOS DO CURSO 22
4.2 O PERFIL PROFISSIONAL 24
4.3 OS CONHECIMENTOS E SABERES CONTEMPLADOS 24
4.4 ANÁLISE DOS PLANOS DE CURSO DAS DISCIPLINAS SELECIONADAS 26
4.4.1 Objetivos, conteúdos e metodologia 26
4.4.2 O repertório adotado 30
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 36
REFERÊNCIAS 37
ANEXOS 41
9
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos tempos, a área de Educação Musical no Brasil vem expandindo suas
pesquisas em relação aos processos de formação e profissionalização de professores de
música. Juntamente com essas pesquisas, alguns questionamentos acerca dos saberes
abordados nas graduações superiores em música estão sendo produzidos e provocados pelos
professores, pesquisadores, profissionais e estudantes da área. Enquanto 100% das faculdades
pesquisadas por Queiroz (2020, p. 170) oferecem cursos de bacharelado ou licenciatura em
música com ênfase na música erudita, apenas cerca de 25% dessas mesmas instituições
ofertam formalmente cursos de graduação em música popular. Apesar de a oferta desses
cursos ter aumentado com o tempo, alguns autores e estudos da área vêm chamando atenção
para a pequena participação concreta dos saberes ditos “populares” nos processos oficiais de
formação. Sobre isso, Queiroz (2020) apresenta os seguintes dados:
Quanto à ênfase dada a cada uma dessas categorias, erudita e popular, nos cursos
existentes, mais uma vez é nítido o domínio da primeira, cerca de 87% dos
conhecimentos e saberes ofertados pelos cursos/habilitações denominados de cursos
de música, tanto nos bacharelados quanto nas licenciaturas, são relacionados
diretamente ao universo da música erudita. (QUEIROZ, 2020, p. 170).
Esses dados destacam que, nas graduações em música ou mesmo nos cursos nomeados
como graduação em música popular, a maior parte dos conteúdos oficialmente adotados
institucionalmente durante todos os cursos deriva de ideais e padrões de execução e escuta
pertencentes à música erudita. A influência desses saberes tende a ter um peso importante na
formação de futuros profissionais e professores, o que gera um reflexo na sua vida
profissional, influenciando diretamente no modo como a música é ensinada, executada e
apreciada pelos estudantes de música das mais variadas camadas de ensino.
Como cantora profissional, professora de canto e de musicalização atuante no mercado
há mais de quinze anos, quase que exclusivamente no campo da música popular, tive a
oportunidade de trabalhar com diferentes manifestações culturais, compositores e grandes
nomes da música popular paraibana e brasileira. É inegável a influência dos vários povos que
deram origem à nossa população nas camadas mais profundas da nossa música, assim como
na cultura do nosso povo em suas nuances mais plurais e democráticas.
Quando ingressei no curso de licenciatura em música, no entanto, a minha experiência
foi bem diferente. No lugar da ampla possibilidade de saberes musicais de diferentes origens,
pude constatar a influência majoritária dos saberes eruditos e suas origens eurocentradas ao
longo da minha formação superior, observando-a também na formação dos meus colegas
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acadêmicos e suas habilitações nos mais variados instrumentos. Foi possível constatar
também a pouca vivência teórica e prática dentro da música popular brasileira e local, em
termos de análise e prática individual ou em conjunto. Na verdade, apenas pouquíssimos
docentes demonstravam algum tipo de preocupação em diversificar as obras e compositores
trabalhados, abarcando manifestações culturais de um espectro étnico mais amplo.
Evidenciando ainda mais a problemática, também foi possível observar uma
aproximação tendenciosa dos conteúdos e metodologias a um modelo eurocentrado-ocidental
nas abordagens musicais do curso, acompanhada do consequente apagamento das mais
variadas linguagens da música popular brasileira, nordestina e paraibana. Até quando citados,
personagens da cultura popular eram meramente introduzidos como coadjuvantes no
processo, quase nunca com o protagonismo e a titulação compatíveis com o seu valor
histórico-cultural. Todo esse cenário despertou uma inquietação pessoal com relação aos
processos formativos dos futuros licenciados, inclusive o meu próprio, que foi se acentuando
a cada nova disciplina e conteúdo abordado, ainda muito distantes das movimentações de
cultura popular que existiram durante a formação e ainda fervilham na cultura do povo
brasileiro, sendo o curso justamente voltado para a formação em música. Mas que música
seria essa?
Tais observações acabaram despertando algumas inquietações acerca dos
direcionamentos pedagógicos do curso de licenciatura em música da universidade X e suas
propostas de formação e vivência musical, sobretudo o panorama das peças e compositores
abordados pelas disciplinas de prática e análise musical ofertadas ao longo do mesmo, tendo
em vista a importância da carga horária das mesmas no processo de formação dos futuros
licenciados em música popular. Por isso, entender de forma crítica onde e de que maneira
esses saberes majoritariamente eruditos estão se concentrando e permeando o ensino da
música é um movimento importante para uma análise consistente e consciente dos nossos
processos de formação como educadores. Sendo assim, esse trabalho visa responder a
seguinte questão: qual o repertório e as metodologias de ensino-aprendizagem adotadas
nas disciplinas de estudo de teorias, regras, estrutura e análise musical das licenciaturas
em música da Universidade X?
Como objetivo geral, o trabalho tem a pretensão de examinar o repertório e as
metodologias de ensino-aprendizagem abordadas nas disciplinas voltadas para o estudo de
teorias e regras, estrutura e análise de peças e períodos composicionais da História da Música
das licenciaturas em música da Universidade X. Tal objetivo geral desdobra-se ainda nos
seguintes objetivos específicos: 1. Identificar as disciplinas que são voltadas para o estudo de
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1. Contraponto Modal;
2. Contraponto Tonal;
3. Harmonia Tonal I;
4. Harmonia Tonal II;
5. Estruturação e Análise I;
6. Estruturação e Análise II;
7. Estruturação e Análise III;
8. Estruturação e Análise IV.
Os planos de curso das turmas foram escolhidos como dados documentais por
apresentarem informações oficiais sobre as disciplinas, escritas pelos professores das mesmas,
publicizadas e disponibilizadas de forma online através do sistema integrado de gestão de
atividades acadêmicas da instituição. Dentre as várias informações dos planos, podemos
encontrar: dados gerais da turma, programa do componente curricular (objetivos,
conteúdos, habilidades e competências), metodologia do ensino e avaliação, cronograma
de aulas e avaliações e referências básicas e complementares.
A coleta dos mesmos foi realizada entre 28/10/2021 e 09/11/2021, durante o período
letivo suplementar 2021.1 da instituição, através de acesso e download em PDF direto do
sistema. As turmas foram consultadas por nome no campo de “Pesquisa” da plataforma. Ao
clicar no menu de cada turma, foi possível acessar a aba “Plano de Curso” e realizar a coleta
dos planos mais atualizados disponibilizados pelo sistema para as disciplinas correspondentes.
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Através dos planos de curso, serão analisadas informações dos programas dos
componentes curriculares, mais precisamente dos objetivos, conteúdos e metodologia do
ensino e avaliação de cada turma. Nesses campos, estão disponíveis informações sobre as
peças, compositores e metodologias abordadas ao longo do curso.
Tais informações serão listadas e classificadas de acordo com seu período histórico e
país de origem. A partir daí, será possível observar o panorama geral da origem das peças e
compositores adotados nas disciplinas, além das metodologias preteridas na aplicação das
aulas, informações essas que serão correlacionadas com as teorias sobre colonialidade e
ensino superior de música no Brasil.
Este trabalho organiza-se em três capítulos, sendo assim divididos: I) Colonialidade da
formação em música no Brasil - revisão e fundamentação, no qual trazemos os principais
trabalhos produzidos na área divididos em textos diagnósticos e propositivos. II) A formação
superior em música no Brasil: dimensões históricas e perspectivas contemporâneas, onde
descrevemos o histórico da formação superior em música no Brasil, suas transformações e
caminhos até a contemporaneidade. III) Traços de colonialidade nos repertórios do curso de
licenciatura em música, onde destacaremos os materiais que serviram de suporte às análises, o
perfil e objetivos do curso, os conhecimentos e saberes contemplados, a estrutura curricular e
o repertório, além da estruturação da análise da estrutura e dos componentes curriculares,
objetivos, conhecimentos e saberes contemplados nas disciplinas, suas metodologias e
atividades de ensino. Por último, teceremos algumas conclusões e indagações correlacionando
os resultados com trabalhos e teorias de outros autores que dialogam sobre o tema.
13
Esse modelo pedagógico tende a centralizar o ensino da música, sendo ela classificada
como erudita ou popular, em saberes ditos eurocentrados - centralizados em conceitos
estéticos e pedagógicos vindouros da Europa Ocidental. Tanto na apreciação, quanto na
aprendizagem e na posterior execução de música, o fazer musical tende a ser mensurado por
moldes e olhares hegemônicos, muitas vezes resultando consequentemente na qualificação da
música em “boa ou ruim” e utilizando para isso conceitos unidirecionais, ignorando muitos
dos conhecimentos e olhares musicais que não se enquadram no “modelo ideal” e nas suas
derivações.
Tais características podem ser relacionadas às fortes influências coloniais que
permeiam a trajetória política do nosso país desde sua invasão. Pouco da cultura dos povos
originários ou quaisquer que tenham povoado o território que hoje pertence ao Brasil
sobreviveu ao processo de apagamento histórico, cultural e populacional proporcionado pelos
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Artes Plásticas, Artes Cênicas, Desenho e Música, com foco na formação polivalente de
licenciados para a atuação nas escolas (DELMÁS, 2017). Alguns desses cursos foram, por um
bom tempo, as únicas opções de formação e certificação de determinadas faculdades para o
professor de música que quisesse atuar na escola básica.
A fase que se estendeu entre as décadas de 1960 e 1990 foi marcada pela a criação de
cursos de bacharelado e de licenciatura na área de música em diversas universidades do país.
A partir dos anos de 1980, também foram implementados no Brasil os primeiros cursos de
pós-graduação na área, dando início, de maneira embrionária, ao processo de formação de
mestres e doutores em música (QUEIROZ, 2017, p. 135).
A partir da década de 2000, houve uma significativa expansão dos cursos de
graduação da área, sobretudo no que diz respeito às licenciaturas (Queiroz; Figueiredo, 2016).
Esse período também marcou o desmembramento de alguns cursos de Licenciatura em
Educação Artística, dando origem a diversas Licenciaturas em Música, Dança, Artes Cênicas
e Visuais, etc, como foi o caso da UFPB, em 2004 (LIMA, 2005, p. 37).
A década de 2000 também foi marcada por um crescimento importante dos cursos de
pós-graduação na área, como resultado do novo cenário estabelecido para a educação
superior, através do fortalecimento da graduação, via ampliação e melhoria das universidades
e a contratação de profissionais diversos (Queiroz; Figueiredo, 2016). Assim, o cenário da
pós-graduação em música se ampliou consideravelmente no país, passando de cinco cursos de
mestrado e três cursos de doutorado em música ofertados até 1999 para 16 cursos de mestrado
acadêmico, dez cursos de doutorado acadêmico e três cursos de mestrado profissional,
considerando dados referentes a dezembro de 2017 (Brasil, 2017 apud QUEIROZ, 2017, p.
135).
contemporânea foram garantindo que, pouco a pouco, expressões artísticas com esse
perfil fossem ganhando contextos variados de ensino da música, começando em
espaços privados e não formais, mas, principalmente nas últimas décadas, chegando
também a escolas, conservatórios e universidades do país. (DANTAS; QUEIROZ,
2021, p. 6).
portas para a institucionalização oficial de saberes musicais populares “em uma época em que
a hegemonia de cursos centrado na música erudita europeia era absoluta” (DANTAS;
QUEIROZ, 2021, p. 6).
No entanto, é importante destacar que a proposta do curso não previa uma
contraposição ao ensino da música erudita, e sim a abertura de um “diálogo mais íntimo entre
o erudito e o popular” (TORRES et al., 2017). Tal proposta delineou não só a implementação
do curso da UNICAMP, mas também a implementação dos demais cursos de música popular
criados na década de 1990 e a partir do século XXI nas universidades brasileiras (DANTAS;
QUEIROZ, 2021, p. 7).
Essa perspectiva “dialógica” é apontada por Dantas e Queiroz (2021) e Queiroz
(2020, 2019, 2017) como um fator de criação para interações e diálogos importantes entre
cursos com perfil erudito e popular, mas também age como base fortalecedora para a estrutura
colonial do ensino da música que, por já ser dominante, exerce grande influência nos
currículos de música como um todo. Também é necessário destacar que o modelo de ensino
dos cursos, ainda é baseado na lógica positivista europeia moderna de separação dos
conhecimentos em disciplinas, cuja a fragmentação entre teoria, prática e ensino se mantém
como uma pilar paradigmático importante no fazer musical atual, como dizem os autores:
Assim, a “música nova” que chega com esses cursos é implementada na estrutura
curricular disciplinar, baseada nos modelos prescritivos e normativos de currículos
que, construídos nos meandros dos conservatórios europeus do passado, insere a
música popular nas velhas formas de pensar, organizar e desenvolver o ensino.
(QUEIROZ, 2020, 2019, 2017).
Saxofone (perfil popular), Teclado, Trombone, Trompa, Trompete, Tuba, Viola, Viola Caipira,
Viola Nordestina, Violão, Violão (perfil popular), Violino, Violoncelo - entre outros
instrumentos que venham a ser incorporados - , Canto e Canto Popular (UFX, 2009, p. 3). A
clientela descrita pelo curso abrange “egressos do ensino médio que tenham como finalidade
habilitar-se para o ensino de música em escolas de educação básica, escolas especializadas
e/ou profissionalizantes de música e demais contextos de práticas educativo-musicais.” (UFX,
2009, p. 3).
O objetivo geral do curso, descrito no PPC, consiste em “Formar professores para o
ensino de música, habilitando-os para a atuação em escolas de educação básica, escolas
especializadas da área e demais contextos de ensino e aprendizagem da música.” (UFX, 2009,
p. 12). Como objetivos específicos, o PPC elenca:
1) Atender às demandas e às necessidades profissionais relacionadas ao ensino da
música na região; 2) Proporcionar um conhecimento amplo da área, possibilitando
aos alunos uma formação abrangente que contemple universos distintos do ensino da
música; 3) Desenvolver a capacidade reflexiva na área de Educação Musical com
base em projetos que inter-relacione ensino, pesquisa e extensão; 4) Possibilitar
vivências em situações de ensino e aprendizagem nos diferentes contextos da área de
Educação Musical; 5) Ampliar as perspectivas de atuação docente, de forma que o
aluno possa pensar e atuar na Educação Musical a partir de um conhecimento
interdisciplinar; 6) Proporcionar que o estudante seja capaz de lidar com a
multiculturalidade oriunda das diferenças culturais de cada sociedade e dos distintos
contextos de ensino e aprendizagem da música; 7) Capacitar docentes para atuar na
sociedade, com base em valores da humanidade, da natureza, da ciência e da ética.
(UFX, 2009, p. 12).
Dos planos de curso dessas disciplinas, selecionamos para destaque os três tópicos
mais importantes para a análise panorâmica dos conteúdos trabalhados nos componentes
curriculares selecionados: objetivos, conteúdos e metodologia do ensino e avaliação de
cada turma. A seguir, apresentamos uma tabela com essas informações listadas
separadamente, com o intuito de facilitar nossas análises e observações.
sido alvo de críticas por muitos teóricos que as concebem como um modo antiquado de
ensino, apontado como uma forma de transmissão do conteúdo pelo professor onde os alunos
se tornam apenas sujeitos passivos do seu próprio processo de aprendizagem (GIL, 2009 apud
ALVES, 2017, p. 2; LOPES, 2011). Muitas vezes, esse formato de aula é associado ao modelo
de “educação bancária e vertical”, centralizada no professor e no “depósito de informações”
sobre os alunos. Apesar das amplas críticas dos teóricos da educação, que afirmam que a
exposição estimula a passividade do aluno, observamos uma grande tendência para a adoção
dessa prática metodológica em todas as disciplinas selecionadas.
Essa tendência também foi observada de maneira global na análise metodológica
dos cursos de graduação em música realizada por Dantas & Queiroz (2021, pág 12), que
concluíram que “os cursos analisados se mantêm alinhados, homogeneamente, aos padrões
canônicos dos currículos disciplinares”.
Observamos também que o currículo disciplinar é dividido em disciplinas e
apresenta em sua estruturação uma grande fragmentação dos conteúdos. Essa fragmentação,
adotada de uma forma geral pela maioria das estruturas curriculares dos cursos superiores do
Brasil, e a limitação do tempo das aulas, que se concentra em um tempo pré-determinado de
50 min, são apontadas por Massetto (2010) como motivos da predileção dos professores pelas
aulas expositivas, umas vez que esses fatores dificultam a explanação dos tópicos,
concentrando muitos conteúdos a serem ministrados por aula e limitando as discussões e a
compreensão dos mesmo por parte dos discentes, além da distribuição dos mesmos por parte
dos docentes. Sobre isso, Silva (2008, p. 37) acrescenta:
“Tempo fragmentado, determinado, que, ao definir a organização em termos
quantitativos, interfere na organização do processo didático em que se desenvolvem
ações, meios e condições para a realização da formação, do desenvolvimento e
domínio dos conhecimentos pelos alunos”. (SILVA, 2008, p. 37).
Nesse sentido, Dantas & Queiroz (2021) afirmam que, no caso das graduações em
música, a adoção desse modelo fragmenta a formação musical em disciplinas diversas, o que
reflete a manutenção da “lógica positivista da separação do conhecimento em disciplinas, e
perpetuando a tendência da modernidade europeia de fragmentação entre teoria e prática,
fazer e saber, tocar e pensar, entre diversos outros aspectos dessa natureza.” (DANTAS;
QUEIROZ, 2021, pág 13).
Essa constatação nos leva a refletir que, mesmo havendo a entrada de saberes
populares e não eurocentrados nas graduações em música, os cursos estão sob forte influência
da colonialidade na sua estruturação. Como descreve Queiroz (2017, p. 154): “mesmo quando
mudamos as músicas, [no caso desse cursos incluindo a música popular historicamente
31
Sendo assim, provavelmente, a música seguia sendo produzida por mulheres e pessoas
não-brancas também durante esses períodos históricos. Possivelmente ela só não alcançava os
espaços, a legitimação e a visibilidade obrigatoriamente dominados pelos homens brancos.
Não à toa essas pessoas não são citadas no recorte de disciplinas observadas neste trabalho e
pouco se ouve falar de composições feitas por mulheres e pessoas não brancas que tenham
tido destaque no mundo da música até o início do século passado.
37
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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41
ANEXOS
Fonte: Universidade X
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Fonte: Universidade X
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Fonte: Universidade X
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Fonte: Universidade X
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Fonte: Universidade X
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Fonte: Universidade X
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Fonte: Universidade X
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Fonte: Universidade X