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Epport12 Solucoes Trab Grupo 262
Epport12 Solucoes Trab Grupo 262
Pós-Leitura Manual, p.
262
A – Procissão da Quaresma
Sentimentos e comportamentos despertados pelos acontecimentos:
“O Entrudo correu pela cidade, em excesso e desvario.
É tempo de penitenciar os pecados da carne: primeiro, pelo jejum e depois pelo açoite.
A procissão da Quaresma, meticulosamente organizada, percorre as ruas da cidade,
despertando no povo os mais primitivos instintos:
– os comportamentos sadomasoquistas dos penitentes que integram a procissão,
autoflagelando-se para gáudio das mulheres e amantes que, das janelas engalanadas,
assistem à procissão;
– os comportamentos das mulheres que reclamam mais violência e vigor na atuação do
seu “servidor”, ao mesmo tempo que experimentam prazer perante o sofrimento do
penitente;
– a alteração dos habituais comportamentos femininos – a mulher é livre de percorrer
sozinha as igrejas e as ruas da cidade, comportamento facilitador do adultério;
– a alteração da mentalidade masculina, que “fecha os olhos” ao desregramento
feminino. Com o fim da Quaresma, restabelece-se a velha ordem, ou seja, as mulheres
regressam aos trabalhos domésticos, à submissão, enquanto os homens reassumem a
sua autoridade.”1
Funcionalidade do episódio:
Aspetos destacados na apresentação da procissão:
– caracterização da cidade de Lisboa;
B – Auto de fé
Sentimentos e comportamentos despertados pelos acontecimentos:
O auto de fé é apresentado com um divertimento de interesse, quer para a Igreja, que dele
“aproveita em reforço piedoso e outras utilidades” (p. 101), quer para El-rei, que reforça o
seu poder económico com os bens dos condenados, quer para o povo, que assiste ao
cerimonial como a uma “festa” (p. 102), evidenciando, uma vez mais, a sua propensão
para o excesso.
Recursos expressivos (exemplos):
– Gradação: “[…] ao lado de outros chamuscados, assados, dispersos e varridos […]”, p.
101;
– Antítese: “[…] tanto vale […] o doce como o amargo, o pecado como a virtude […]”, p.
102;
– Polissíndeto: “Que se há de dizer, por exemplo, desta freira professa, que era afinal
judia, e foi condenada a cárcere e hábito perpétuo, e também esta preta de Angola, caso
novo, que veio do Rio de Janeiro com culpas de judaísmo, e este mercador do Algarve
[…]”, pp. 101-102;
– Enumeração: “[…] a preta de Angola, o mulato da Caparica, a freira judia, os religiosos
que diziam missa, confessavam e pregavam sem terem ordens para tal, o juiz de fora de
Arraiolos […]”, p. 102;
– Metáfora: “[…] o Santo Ofício, podendo, lança as redes ao mundo e trá-las cheias […]”,
p. 102;
– Ironia: “[…] o Santo Ofício, podendo, lança as redes ao mundo e trá-las cheias, assim
peculiarmente praticando a boa lição de Cristo quando a Pedro disse que o queria
pescador de homens.”, p. 102.
Funcionalidade do episódio:
Enumeração dos condenados – uma mulher relaxada e “outros chamuscados, assados,
dispersos
e varridos” (p. 101) – e composição do espaço social do romance.
A procissão:
• desfile das bandeiras dos ofícios, rica e excessivamente decoradas – damasco brocado,
bordaduras de ouro e seda, bolas de metal;
• as fanfarras de trombetas e tambores;
• a representação de S. Jorge;
• o desfile das diferentes irmandades, distintas pelas cores das capas;
• o desfile das comunidades religiosas;
• a multidão do clero das paróquias;
• a participação de el-rei, que segura uma vara do pálio;
• os pensamentos do patriarca e os pensamentos do rei revelados pelo narrador.”1
Funcionalidade do episódio:
“As procissões e os autos de fé caracterizam Lisboa como um espaço caótico, dominado
por rituais religiosos cujo efeito exorcizante esconjura um mal momentâneo que motiva a
exaltação absurda que envolve os habitantes.
A desmistificação dos dogmas e a crítica irónica do narrador ao clero subjazem ao ideário
marxista que condena a religião enquanto ‘ópio do povo’, isto é, condena-se a visão
redutora do mundo apresentada pela Igreja, que condiciona os comportamentos, manipula
os sentimentos e conduz os fiéis a atitudes estereotipadas.”2
1. RAMOS, Auxília, e BRAGA, Zaida, 2009. Memorial do Convento, José Saramago. Porto: Ideias de Ler (pp. 23-24, 24-25 e 25-26).
2. JACINTO, Conceição, e LANÇA, Gabriela, 2008. Análise da obra Memorial do Convento, José Saramago. Porto: Porto Editora
(pp. 43-44, 46 e 49).
3. SILVA, Teresa Cristina Cerdeira da, 1989. José Saramago. Entre a História e a Ficção: Uma Saga de Portugueses. Lisboa: Dom
Quixote (p. 52).