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Coach Townes Fovcago Marae ‘um tema central na estruturago de toda proposta’ que visa a assegurar uma maior sistematizacao e validade da pes quisa, Fazemos nossas consideracoes a partir da leitura do texto de Artigue (1996), 0 qual nos serviut de motivagao para destacar uma diferenca conceitual entre metodologia e técnica de pesquisa, Em sintese, com a questo metodolégica esperamos fechar um ciclo temporario de nossas indagagées reflexivas, chegando a algumas conclusdes para que a pesquisa em didatica da matematica possa langar um trago mais dura- douro no complexo espago da educacao escolar. Capitulo I Trajetérias do saber e a transposicao didatica O orjetivo deste capitulo ¢ descrever um estido das transformagées por que passam os conteticlos da educagao ma- tematica, através da nogio de transposicio diditien, tal como foi definida por Chevallard (1991). Fazemosisto com a consciéricia de que se trata da tentativa de divulgar uma nogao essencial- mente académica para o territ6rio mais amplo da formagio de professores e da iniciagdo a pesquisa. Ao realizar esta des- cricdo, estamos pressupondo que o fendmeno educacional da matemética se revela por uma multiplicidade de dimensdes, a qual deve ser considerada na anélise de qualquer situagio relativa ao ensino desta disciplina. Quando se trata da pratica pedagdgica, a andlise dessa multiplicidade requer priorizar alguns aspectos, tal como a selecio de contetidos ¢ materiais, didaticos, sem perder de vista suas conexdes coth 0 horizonte mais amplo da educacdo. E com essa visdo que abordamos a nogao de transposigdo didatica, sendo uma de suas dimensoes, ‘© caminho evolutivo dos conceitos. ‘Transposigiio dos saberes A transposicio didética pode ser entendida como um caso especial da transposicao dos saberes, sendo esta enten- dida no sentido da evolugao das ideias, no plano hist6rico da producao intelectual da humanidade. No caso das ciéncias eda matemética, essa evolucio ocorre sob um controle mais intenso dos respectivos paradigmas. De acordo com Khum 7 CCoveci Towers me fovcacho Maen (1975), 08 paradigmas sao principios e regras que os'membros de uma comunidade cientifica compartilham entre si, visando a validacio dos saberes produzidos nesse contexto. Para que ‘uma producao seja reconhecida como cientifica é preciso que ‘8 membros da respectiva comunidade respeitem 0 conjunto dessas regras. Dessa forma, os conceitos de transposigao e o pré- prio saber cientifico estao interligados, © que fica mais evidente quando sua anélise é remetida ao plano pedagégico, onde toda transposicao esta relacionada a um saber especiico, assim como toda aprendizagem se faz sob a influéncia de uma transposicio. Anogio de transposicao pode ser analisada no dominio, mais especifico da aprendizagem para caracterizar 0 fluxo cognitivo relativo a evolugdo do conhecimento, restrita a0 plano das elaboracdes subjetivas, pois é nesse nivel que ‘ocorre o nticleo do fenémeno. A conveniéncia em destacar essa dimensdo da transposigdo ests associada & necesséria aplicagao de conhecimentos anteriores para a aprendizagem de um novo conceito. Na sintese de uma nova ideia, cada um desses momentos nao subsiste sem uma base anterior. Este € 0 sentido estrito da cognigao normal, ou seja, nenhum conceito surge sem a existéncia de um precedente. Assim, quando se trata da produgio de um conhecimento, existe tum processo que caracteriza a iceia de transposigao. Por esta raza0, a0 estud-la, é bom destacar uma diferenga entre 0 sa- ber eo conhecimento, Mesmo que no cotidiano nao seja usual fazer essa distingao, para tentar reforgar as bases de estudo da didética da matemética, somos Ievados a buscar maior clareza para 0 uso desses termos, no proximo capitulo. Transposigto didética © estudo das prioridades que orientam a pratica pe- dagégica é também uma das atribuigdes da didética, que deve fornecer referéncias a fim de estabelecer propostas de contetido para a educagao escolar. Nao se trata de uma escolha direta e imediata, e, sim, da existéncia de um lon- 0 processo seletivo por que passam os saberes. Uma das Is Didi ds Matemitca - Ua anise da inane francesa fontes de selegdo do saber escolar é a propria historia das ciéncias, que através de sucessivas transformacées, fornece a parte essencial do contetido curricular. Estes tém conexdes com a ciéncia, mas se mantém pelas suas cargcteristicas proprias. A nogao de transposicao estuda a selecio que ocorre através de uma extensa rede de influéncias, envolvendo diversos segmentos do sistema educacional. Essas igeias aparecem na definicao dada por Chevallard: ‘Um conteuido do conhecimento, tendo sido designado ‘como saber aensinar,sofreentio um conjunto de trans- formagiies adaptativas que vao torné-lo apto a tomar lugar entre os objetos ce ensino. O trabalho que, de ‘um objeto de saber a ensinar faz um objeto de ensino, & chamaclo de transposigio didatiea.(CHvALLARD, 1991) O estudo da trajetéria dos saberes permite visualizar suas fontes de influéncias, passando pelos saberes cientificos © por outras éreas do conhecimento humano. Sao influéncias que contribuem na redefinigao de aspectos conceituais & também na reformulagao de sua forma de apresentagdo. O conjunto das fontes de influéncias na selegao dos contetidos recebe onome de noosfera, segundo descricao de Chevallard, da qual fazem parte: cientistas, professores, especialistas, politicos, autores de livros e outros agentes que interferem no processo educativo. O resultado da influéncia da noosfera condiciona © funcionamento de todo o sistema didatico. G trabalho se- letivo resulta nao s6 na escolha de contetidos, como também na definicdo de valores, objetivos e métodos, que conduzem o sistema de ensino. Criagdes didaticas Aescolha dos contetidos escolares se faz principalmente através das indicagdes contidas nos parimetros, programas, livros didaticos, softwares educativos, entre outras fontes. Mas, embora tais fontes sejam preexistentes ao processo de escolha, 6 possivel perceber que alguns contetidos sao verdadeiras criagdes diddticas incorporadas aos programas, motivadas par 9 Coxscho Tnatas os Eoucaco Maen supostas necessidades do ensino, servindo como reéurso para facilitar a aprendizagem. A prineipio, tais criagdes tém uta finalidade eminentemente didética, entretanto, o problema surge quiando sua utilizagao acontece de forma desvinculada desua finalidade principal. Este 60 caso dos produtos notaveis que, quando ensinados sem um contexto significativo, passam a figurar apenas como 0 objeto de ensino em si mesmo. Para estar atento a essas distorgdes, se faz necessério cultivar um petunanente espirito de vigilancia que deve prevalecer ao longo de toda a andlise da transposicio didatica, pois é 0 conjunto dlas criacdes didaticas que evidencia a diferenca entre o saber cientifico e o saber ensinado. Exemplos de transposigito didditica Um exemplo de transposicao didatica, descrito por Che- vallard (1991), 6 0 conceito de distancia. Desde a época em que podemos falar da influéncia de Euclides na geometria, a nogéo de distancia entre dois pontos foi estudada de uma forma quase espontinea. Entretanto, em 1906, essa nocdo foi generalizada pelo matematico Fréchet! com o objetivo de trabalhar com os chamados espacos de fungdes. Como consequencia, a partir da écada de70, apés passar por diversas transformagdes,a nogdo foi inserida no curriculo escolar francés. Antes dessa data, ela jf era estudada como uma ferramenta para os matematicos. Apés sua inclusao nos programas, ela passou a ser estudada, quase sempre, como um objeto de estudo em si mesmo, sem necessariamente ter vinculos com aplicacées compreensiveis, para o aluno. Quando a evolugio das ideias é analisada em relacio a um determinado conceito, como no caso da nogio de distan- cia, trata-se de uma transposicio didatica stricto sensu. Por outro lado, se a analise é desenvolvida no contexto mais amplo, ndo seatendo a uma nogao particular, trata-se de uma tranisposigao didtica lato sensu. © Movimento da Matematica Modema é im exemplo de transposigio didética lato sensu. O contexto inicial desse movimento era muito diferente do que prevaleceu na 20 Didsua da Matematica ~ Una ans da intra ances proposta curricular. © resultado da reforma foi muito dife- rente da proposta do plano intencional. Acreditava-se que era possivel uma abordagem estruturalista para o ensino da ‘matemética, sendo esta tentativa inctementada com o uso de novas téenicas de ensino, esperando que fosse possivel obter ‘uma aprendizagem mais fécil do que a tradicional. Diversas criagdes didéticas surgiram para tentar viabilizar essa pro- posia. Este € 0 caso, dos diagramas de Ven, que de recurso para representacio gréfica, passaram a ser ensinados como contetido em si mesmo. Nesse caso, as diversas reformulagoes ocorridas resultaram em inversées tao fortes que contribuiram para o fracasso do movimento, conforme anélise descrita por Kline (1976). Saber cientifico e saber escolar O saber cientifico esté associado a vida académica, embora nem toda produgao académica represente tim saber cientifico. ‘Trata-se de um saber criado nas universidades e nos institutos de pesquisas, mas que nao est’ necessariamente vineulado a0 ensino bisico, Sua natureza é diferente do saber escolar. Pode- ‘mos destacar a existéncia de uma diferenga entre a linguagem empregada no texto cientifico e escolar. Para andlise dos saberes escolares 6 necessario que se coloque o problema da lingua- gem. Se, por um lado, o saber cientifico ¢ registrado por,tuma linguagem codificada, o saber escolar nao deve ser ensinado nessa forma, tal como se encontram tedigidos nos textos & relatérios técnicos. A desconsideracio desse aspecto favorece a transformagio da linguagem em uma dificuldade adicional. Assim, a linguagem é considerada como um elemento que interfere diretamente no sistema didatico, pois guarda uma relagdo direta com o fendmeno cognitivo. A formalizacdo pre- Cipitada do saber escolar, por vezes, através de uma linguagem. carregada de simbolos e c6dligos, se constitui em uma possivel fonte de dificuldade para a aprendizagem O saber escolar representa 0 conjunto dos contetidos pre- vistos na estrutura curricular das varias disciplinas escolares ar valorizadas no contexto da histéria da educacéo. Por exemplo, no ensino da matemiética, uma parte dos contetidos tem stias raizes na matematica grega, de onde provém boa parte de sua caracterizagio. Existe uma forma na qual as atividades sio normalmente apresentadas aos alunos e varios aspectos esto vinculados aos conceitos mateméticos tal como foram criados. Em seguida, ocorrem varias muclangas, nio s6 no contetido, como.em varios outros elementos do sistema didatico. Na pas- sagem do saber cientifico ao saber previstona educagio escolar, ocorre a criagio de varios recursos didéticos, cujo resultado pritico ultrapassa os limites conceituais do saber matematico. A partir do surgimento desses recursos, surgem também as criagdesdditicas que fornecem 0 essencial da intencio de ensino da disciplina, Nessa etapa, predomina uma forma direcionada para o trabalho do professor. Nessa perspectiva, enquanto 0 saber académico estd vinculado & descoberta da ciéncia,o tra- balho docente envolve simulagdes dessa descoberta. Enquanto 0 saber cientifico & apresentado através de artigos, teses, livros e relatérios; o saber escolar é apresentado através de livros didaticos, programas e de outros materia. O processo de ensino leva finalmente ao saber ensinado, que € aquele registrado no plano de aula do professor e que nao coincide necessariamente com a intengao prevista nos obje- tivos programados. A andlise do saber ensinado coloca em evidéncia os desafios da metodologia de ensino, a qual nao pode ser dissociada da andlise dos valores e dos objetivos da aprendizagem. Por outro lado, nao ha garantia de que, no plano individual, o conteiido aprendido pelo aluno corresponda exa- tamente ao contetido ensinado pelo professor. Assim, pode-se chegar a conclus6es distantes da proposta inicial eque, em casos extremos, permanecem apenas vestigios da intencio original. Por esta razdo, 0 contetido escolar ndo pode ser concebido apenas como uma simplificagio do saber cientifico. Finalmente, enquanto o saber cientifico é validado pelos paradigmas da ‘rea, 0 saber escolar esti sob 0 controle de um conjunto de regras que condiciona as relagdes entre professor, aluno e saber. 2 Didi da Mada - Un ni dai fares Vigilncia didética A aplicagio de uma teoria deslocada de seu territério original torna-se estéril, perde seu significado, obscurece sua validade e confunde a solugao do problema estudado naquele momento. Assim, € preciso sempre estar atento a eficiéncia de uma interpretacdo pedagdgica, o que dgpencle fortemente da consciéncia de quem analisa 0 fenémeno. Em suma, é ne- cessitio 0 exercicio de uma vigilivncia diditica. Esta é uma das atribuigdes do trabalho docente, que deve estar ancorado tanto nos saberes cientificos como em uma concepgao educacional. (Odeslocamento de uma teoria fere o espitito da vigiliin- cia, além de ser um obsticulo do tipo de uma generalizagaio precipitada, fazendo com que sua validade educacional de- penda de seus vinculos com contexto original. Nesse sentido, ro devemos incorrer no erro de confundir a andlise filos6fica de uma questao matematica coma intengao de procedera uma analise matematica de uma posicaéo filoséfica, Mais particular- ‘mente, quando perguntamos “O que ¢ontimero?”, trata-se de ‘uma questao pertinentea teoria do conhecimento, portanto, de natureza filoséfica. A tentativa de responder com argumentos puramente matematicos leva a um desvio de explicagao, pois a questo inicial nao pertence exclusivamente & matemiética, mostrando a importancia de uma componente epistemolgica 1a formagao do professor. © iinteresse que temos em analisar o problema do cruza- mento indevico de explicagées é relativo a dignificara natureza do trabalho diditico, buscando diferencié-1o daquele do pro- prio cientista. Para quem trabalha com a criagao das ciéncias, as questdes educacionais esto, normalmente, restritas 20s fatos cientificos. Dafa tendéncia a priorizar um olhar deslocado para o fendmeno educativo. Para 0 educador, pelo contratio, 68 fatos cientificos nao podem predominar no tratamento do, objeto pedagégico e, quando isto acontece, a amplitude do fe- nomeno cognitivo ésensivelmente reduzida. Fisto que estamos dlenominando de deslocamento de explicagoes. ‘ 2 Um outro exemplo, referente ao cruzamento indevido de cexplicagdes, é a confusio feita entre o método de construgad logica da matematica e os desafios de sua metodologia de en- sino. Em outros termos, a aprendizagem da matematica nao se realiza da mesma forma sequencial, tal qual aparece na redagio textual da matemética. Até mesmo o matematico somente consegue uma clara linearidade ao apresentar uma demons- tracio, como resultado de uma longa e complexa trajetéria de raciocinio e nao como o ponto inicial de uma aprendizagem. ‘Queremos com isso destacar a inconveniéncia de tentar aplicar uma determinada teoria, fora do horizonte em que foi desenvolvida. Por esse motivo, os conceitos didaticos aqui estudados destacam a especificidade da educacio ma- tematica. Em outros termos, hé um equivoco frequente em tentar explicar fendmenos de uma érea de conhecimento por intermédio de teorias pertinentes a outras areas. Assim, ‘uma teoria criada para modelizar um problema didtico nio teré necessariamente sua validade assegurada em um outro contexto. Isso é 0 que caracteriza um deslocamento tebrico: a tentativa de realizar uma generalizacio indevida, podendo, até mesmo, se tornar um obstéculo ao desenvolvimento do saber, pois o grau de generalidade depende dos limites impostos pelo meétodo utilizado na sintese dessa teoria. Dimensbes do fenémeno didético Na anélise do discurso cientifico e educacional, desta- cam-se duas varidveis associadas a temporalidade: 0 tempo didatico e tempo de aprendizagem. Nao podemos pensar em um planejamento didatico sem considerar atentamente essas duas condicionantes. tempo didatico & aquele marcado nos [programas escolares e nos livros didaticos em cumprimento a uma exigéncia legal. Ele prevé um carster cumulativo ¢ irre- versivel para a formatizacao do saber escolar. Isso implica no pressuposto de que seja sempre possivel enquadraraaprendi- zagem do saber escolar em um determinado espaco de tempo. Ha uma crenga de que a aprendizagem é sempre sequencial, 24 ‘atin Matemstca Um anit da inne ances logica, puramente racional e organizada através de uma lista de contetidos. Como se fosse possivel comparé-lalinearidade da apresentagio do saber matemitico. Seu compromisso est mais voltado para o texto sintético do saber e para o cumpri- ‘mento de um programa curricular do que para 0s desafios do fendmeno cognitivo. tempo deaprendizagem 6aquele que est mais vinculado com as rupturas e conflitos do conhecimento, exigindo uma permanente reorganizagao de informagées ¢ que earacteriza toda a complexidade do ato de aprender. £ 0 tempo necessério para 0 aluno superar os bloqueios e atingir uma nova posigo de equilibrio. ‘Trata-se de um tempo que nao é sequencial ¢ nem pode ser linear na medida em que é sempre necessério relomar concepgdes precedentes para poder transformé-las e cada sujeito tem o seu proprio ritmo para conseguir fazer isto. Na comparacio entre esses dois tempos, a subjetividade nao pode ser reduzida as exigencias do planejamento didatico. S30 ideias que nao podem ser identificadas e marcam um ponto crucial da cealiagodiditica* Na pratica, identifica-se uma certa confusio entre esses dois tempos, cuja superacio passa pela retomada de nocées jé estudadas, buscando novos niveis de formalizagao dos conceitos. Trata-se de compreender o funcio- namento dos niveis de conceitualizagao, estabelecendo um constante movimento de aproximacao do saber. Para melhor compreender esses dois tempos € preeiso voltar a uma outra especificidade do ensino da matemética,a resolugio de problemas, que éo motor propulsor do saber escolar da matemética. Mesmo que no ensino escolar 0 seu estatuto seja diferente daquele da pesquisa, o problema sempreenvolve ‘uma relagio entre 0 que jé se encontra assimilado eo novo co- rhecimento. No plano pessoal, essa relagao leva a uma dialética entre 0 novo e o antigo. Dai, para ocorrer a aprendizagem, & preciso a superacao das contradigdes inerentes a essa dialética, A dificuldade € que essa superagao nao é mensuravel em ter- _mos quantitativos e definitivos. Dessa forma, um determinado, contetido pode permanecer como um bloqueio para 0 aluno, mesmo depois cle muito tempo em que Ihe foi apresentado, 2s Conug Tinotcs eu oucAGAO MATE Este 6 0 caso quando o aluno arrasta, por muitos anos, dificul- dades referentes & aprendizagem de contetidos estudados nas primeiras séries da escolaridade, gerando 0s conhecidos “trau- mas” pela resolucdo de problemas, em funcao da experiéncia particular por ele vivenciada, Contextualizagao do saber Anogao de pnitica social de referéncia éestucada por Joshua € Dupin (1993), no contexto da andlise de uma transposicio didatica, com a finalidade de contribuir na estruturagao de ‘uma educacio matematica mais significativa. Para isso, todas as vezes que ensinamos um certo conteiico de matematica, & necessério indagar qual foi o contexto de sua origem e quais, 0 08 valores que justificam sua presenca atual no curriculo escolar. Nés estamos ensinando ideias mateméticas esclerosa- das? E pertinente a valorizacio de algumas demonstracdes de geometria em nivel das séries finais do ensino fundamental? Acreditamos que o estuclo da histéria da matemética, assim como a anilise de seu aspecto cientifico e o seu quadro de referéncia possibilitam uma abordagem mais adaptada para a consideracio dessas questdes relativas ao contexto de valo- rizagio do contetido. ssa postura revela uma posigio critica do educadlor frente aos contetidos ensinados. O interesse em destacar essas indagagdes 6 sinalizar que nossa prépria refle- xo pode contribuir diretamente com essa postura critica, na anélise evolutiva dos saberes. Os autores acima mencionados destacam a necessidade de estudar as relacies estabelecidas entre a praticas pedagégicas e as fontes de referéncias do sa- ber. A anélise dessas referéncias serve como uma ancora para o saber ensinado e permitea compreensio dos seus valores. 0 desafio didiatico consiste em fazer essa contextualizacio, sem reduzir o significado da ideias matemsticas que deram origem ao saber ensinado. Existe uma diversidade de fontes de referéncias para © ensino da matemética, tais como: problemas cientificos, as técnicas, problemas, jogos e recreagées vinculados a0 Didi da Matemitca~ Una ants d lta francesa cotidiano do aluno, além de problemas motivados por ques- toes internas a prépria matemética. A principio, todas essas fontes sao legitimas para contextualizar a educagio escolar © 0 indesejavel é a reducio do ensino a uma tinica fonte de referéncia, o que reduzo significado do contetido estudado. A nogao de contextualizagao permite ao educador uma postura ilies, privrizandy os valores educativos, sem reduzir 0 seu aspecto cientifico. Um exemplo retirado de um livro didatico contempora neo mostra problemas de matematica, envolvendo pregos de apartamentos de luxo, localizados em uma famosa avenida da cidade do Rio de Janeiro. As referéncias sociais desse livrosio extensiveis a0 conjunto de todas classes sociais da educagio piiblica brasileira? Qual pode ser o significado educacional, para um aluno que mora na favela, de conhecer pregos de residéncias luxuosas, sem o exercicio de uma posigao critica? Besse tipo de problema educacional, associado ao significado do saber escolar, que nos leva a destacar a importincia de uma nogio em curso de formalizagao: A contextualizagio do saber é uma das mais im- portantes nocées pedagégicas que deve ocupar uum lugar demaior destaque na andlise da didatica contemporanea. Trata-se de um conceito didatico fundamental para a expansio do significado da educagao escolar. O valor educacional de uma disciplina expande na medida em que aluno compreende os vinculos do contetido estudado com um contexto compreensivel por cle. A articulagdo entre as diversas disciplinas exige uma dupla explicitacao dos vinculos do contetido estudado pelo aluno, tanto em relacdo a outras disciplinas, comoem relacio as situagdes da vida cotidiano. Dessa maneira, nao se trata de imaginar uma aprendizagem delimitada ao contexto cientifi- co. Por outro lado, o desafio pedagégico envolve também a Contci Trans Eoucacho Mars aprendizagem de conceitos cujo significado pode'estar mais préximo da abstracio do que da dimensio experiniental’ O inconveniente esti na centralizagao em um desses extremos. Nesse sentido, 0 saber escolar revela uma especificidade pré- pria e compete a didatica conduzir os trabalhos escolares para uma conciliagao entre os polos da teoria e da exper cia. A educagio escolar deve se iniciar pela vivéncia do aluno, mas isso nao significa que ela deva ser reduzida ao saber cotidiano. No caso da matemética, consiste em partir do conhecimento dos niimeros, das medidas e da geometria, contextualizados em situagdes proximas do aluno. O desafio didstico consiste em estruturar condigées para que ocorra uma evolucao desta situacao inicial rumo aos conceitos previstos. Uma forma de dar sentido ao plano existencial do aluno & através do compromisso com 0 contexto por ele vivenciado, fazendo com que aquilo que ele estuda tenha um significado auténtico e por isso deve estar proximo a sua realidade. Mas 6 necessério voltar a enfatizar: partir da realidad do aluno nao significa substituir 0 saber escolar pelo saber cotidiano. O objeto da aprendizagem escolar nao é 0 mesmo do saber cotidiano. O saber escolar serve, em particular, para modificar © estatuto dos saberes que o aluno jé aprendeu nas situacdes, do mundo-da-vida. Capitulo TIT Referéncias da Didatica da Matematica O estudo dos conceitos diditicos da matematica fica mais evidente quando se considera a questao de sua espec cidade educacional e cientifica. Torna-se necessério explic algumas referéncias para estruturar uma didética mais signi ficativa. A natureza e o estatuto cientifico de cada disciplina, moldada pela sua trajetéria histérica, determinam uma forma particular de valorizar a dimensio educacional de cada saber. Por esse motivo nao adianta insistirem propostas excessivamen- teabstratas, como se fosse possivel falar de situagGes generalis- tas, aplicaveis a qualquer contetico. © fendmeno educacional passa necessariamente por regras de um corpo de valores que deve ser conhecido pelo professor. Na didatica da matemtica, Brousseau (1986) prope uma anilise do saber matematico, bem como do trabalho do matemético, do trabalho do professor de ‘matemitica e da atividade intelectual do aluno. . Saber matemitico Nosso objetivo neste pardigrafo 6 destacar alguns aspectos da natureza do saber matematico que, originanco no espaco académico, influenciam a pratica correspondente no ensino es- colar. Queremos destacar alguns lagos entre as caracteristicas desta ciéncia e suas manifestagdes no plano escolar. Nesse sentido, iniciamos com a observagio de que nao existe uma tinica forma de conceber as ideias cientificas ou matematicas. Em virtude das diferentes concepcdes filos6ficas, 6 possfvel fa- lar de diferentes praticas educativas. Seguindo esse raciocinio, 2»

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