Você está na página 1de 3

Endereço da página:

https://novaescola.org.br/conteudo/18281/o-que-o-autoconhecimento-tem-a-ver-
com-a-solidao

Publicado em NOVA ESCOLA 16 de Setembro | 2019

Desafio Nova Escola

O que o autoconhecimento tem a


ver com a solidão?
Conhecer melhor nosso íntimo pode favorecer relacionamentos mais
saudáveis, contribuindo para o bem-estar
Laís Barros Martins

Crédito: Getty Images

São cada vez mais comuns os relatos de professores que têm se sentido sozinhos, sem espaços para
troca e diálogo no ambiente profissional, o que pode afetar sua saúde emocional, minar a capacidade
criativa para desenvolver aulas e projetos, e ampliar as possibilidades de Burnout e depressão.

Saber identificar padrões de pensamento e de comportamento envolve a capacidade de se posicionar


diante de questões do dia a dia e tomar decisões mais acertadas, mas também pode ajudar a reduzir a
sensação de isolamento, combatendo a solidão e nutrindo a saúde mental. O autoconhecimento tem
sido encarado como uma etapa da evolução individual e humana ao simplificar esses processos e
trazer clareza sobre os nosso hábitos mais enraizados.

LEIA MAIS Solidão do professor: está na hora de compartilhar

Para entender quais são os principais influenciadores do pensamento e da ação, é necessário observar
atentamente o fluxo interno das emoções e das reações mais comuns que elas provocam. O que isso
significa? Significa estar sempre consciente do que um acontecimento causa em você. Tristeza, raiva,
felicidade? A partir desse sentimento, quais são as reações em seu comportamento e em seu
psicológico? Sessões de terapia, meditação e até exercícios físicos são importantes aliados para obter
essas respostas.
À medida em que nos tornamos capazes de identificar nossos sentimentos e nossas ações, passamos a
olhar de maneira mais generosa para nós mesmos, aumentando progressivamente as chances de
gostarmos de quem nós somos. Ao promover essa investigação profunda sobre nós mesmos, vamos
aprendendo a ouvir a própria voz e a respeitar o que vem à tona, valorizando as conquistas mas
também aceitando os aspectos menos louváveis do nosso ser.

Com o tempo, vamos nos acostumando com a nossa própria companhia, e encontrar-se sozinho deixa
de assustar tanto. Pessoas com dificuldade de se admirar, reconhecer as próprias qualidades, perceber
seu valor e, sobretudo, se respeitar tendem a ter menos recursos para lidar com a solidão, e a simples
ameaça de ficar sozinho já traz sofrimento.

Você não está sozinho

Embora centrado no indivíduo, o processo do autoconhecimento tem também um lado social. Isso
porque, ao entendermos melhor nosso funcionamento particular, podemos direcionar algumas das
nossas características para construir relações mais equilibradas, inclusive no trabalho.

O livro Pílulas de bem-estar, Daniel Martins de Barros, reúne dicas simples, baseadas em evidências
científicas, para melhorar nossa qualidade de vida. Entre outros assuntos, o psiquiatra destaca como
estimular atitudes mentais e comportamentos para ter relacionamentos mais significativos, já que a
interação com o outro seria um dos pilares para viver melhor, e também propõe o exercício de anotar
pequenas percepções de coisas boas que acontecem ao longo do dia, para avaliar a evolução do nosso
bem-estar. “O melhor é ajudar as pessoas a mudar o foco, fazendo-as ver um pouco mais o lado bom
das coisas”, escreve Daniel sobre a técnica do “diário da gratidão”.

LEIA MAIS Trocar ideias ajuda a evitar a solidão

Manter o foco em forças e virtudes para buscar o melhor de si é o que propõe a Psicologia Positiva. O
pesquisador Martin Seligman destaca que a capacidade de adaptação, ou seja, reparar alguns aspectos
negativos e torná-los características positivas, pode trazer transformações pessoais e sociais
importantes.

Na mesma linha, a teoria de Aaron Beck sobre distorções cognitivas evidencia a habilidade de
ressignificar a memória que estrutura as emoções que vivemos, pois trechos ou capítulos inteiros
dessa história estão sujeitos a reedições ao longo do tempo, podendo não corresponder mais ao
roteiro original.

Veja, abaixo, quais são os tipos de pensamentos mais recorrentes aos quais todos estamos sujeitos, de
acordo com a teoria de distorções cognitivas (eles podem estar ocupando a sua mente de maneira
excessiva e desnecessária neste momento, inclusive):

Catastrofização
Pensar que o pior de uma situação irá acontecer, sem levar em consideração a possibilidade de outros
desfechos.
Se eu não conseguir controlar essa turma significa que sou a pior professora do mundo e certamente
serei demitida no final do ano.

Raciocínio emocional (emocionalização)


Presumir que sentimentos são fatos. Presumir que algo é verdadeiro porque tem uma emoção (na
verdade, um pensamento) forte a respeito.
Sinto que meus alunos não gostam de mim, então isso é um fato.

Polarização (tudo ou nada)


Ver a situação em apenas duas categorias ou termos absolutos.
Deu tudo errado na minha aula hoje.

Abstração seletiva (visão de túnel)


Um aspecto de uma situação complexa é o foco de atenção, enquanto outros aspectos relevantes da
situação são ignorados.
Os alunos não estão tirando mais que 4,5 nas minhas provas.

Leitura mental
Presumir, sem evidências, que sabe o que os outros estão pensando, desconsiderando outras
hipóteses possíveis.
Os outros professores e os pais dos alunos acham que eu não sei dar aula.

Rotulação
Colocar um rótulo global e rígido em si mesmo, em uma pessoa ou em uma situação ao invés de
rotular a situação ou comportamento específico.
A minha coordenadora é ausente.

Minimização ou maximização
Características e experiências positivas em si mesmo, no outro ou nas situações são minimizadas,
enquanto o negativo é magnificado.
Eu consegui esse emprego, mas era fácil.

Imperativos ("deveria" e "tenho que")


Interpretar eventos em termos de como as coisas deveriam ser, ao invés de focar em como as coisas
são. Demandas feitas a si mesmo, aos outros e ao mundo.
Sou formada há 3 anos e já deveria saber fazer isso.

Aonde queremos chegar com essa conversa?

Ao propor uma reconexão consigo mesmo e com a comunidade à sua volta, você terá instrumentos
para elaborar os problemas que te afligem - usando o “diário da gratidão”, por exemplo - e, junto dos
colegas do corpo docente e demais profissionais da escola, enfrentar os desafios do dia a dia,
encontrando soluções mais eficientes, além de sentir que há espaço para compartilhar angústias e
dificuldades.

Depois de identificar seus pensamentos mais comuns e entender que é possível alterar esses padrões,
você pode anotá-los para seu controle individual e compartilhar essa experiência em sua escola, se
encontrar espaço. Isso pode contribuir com a saúde mental de cada um, aumentar o senso de
comunidade e reduzir o isolamento. Você verá que não é o único que tem esses pensamentos.

IR PARA O DESAFIO

Você também pode gostar