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(20240308-PT) Luz Nascer Do Sol
(20240308-PT) Luz Nascer Do Sol
8 MARÇO 2024
REVISTA
DO NASCER
DO SOL
ÓSCARES
ORIGEM,
RECORDES E
CONTROVÉRSIAS:
A CERIMÓNIA
MAIS DOURADA
DA SÉTIMA ARTE
RAQUEL
TILLO
Uma atriz versátil:
BRUNO GONÇALVES
NAS REDES
Georgina Rodríguez
e Cristiano Ronaldo ‘desfilam’
na Semana da Moda de Paris
OBITUÁRIO ENTREVISTA
Iris Apfel, o ícone da moda Raquel Tillo,
carregado de amor próprio uma atriz versátil
despediu-se aos 102 anos
12 14
26 46
C
arolina Beatriz Ângelo seria possivelmente
uma influencer de sucesso nas redes sociais
nos dias de hoje. Podíamos imaginar
até um podcast em nome próprio,
já que apenas as datas do seu nascimento
e da sua morte (1878-1911) são prova de que não
pertenceu ao século XXI.
Mulher à frente do seu tempo, presumimos que o
nome que escolheria para o seu perfil seria apenas
Beatriz Ângelo, como assim era tratada pelos seus mais
próximos. Já no LikedIn apresentar-se-ia como a pri-
meira médica cirurgiã (1902) e a primeira mulher a vo-
tar em Portugal. Passaram-se 113 anos desde a sua vo-
tação histórica, então para a Assembleia Nacional
Constituinte e só resta continuar a supor como hoje
contaria para os seus ouvintes do Spotify a reação dos
homens à inédita presença feminina.
Certamente que a fotografia daquele 28 de maio de
ÓSCARES 1911, ao lado de Ana Castro Osório (filha do juiz que
Histórias e premiados deu razão a Beatriz Ângelo, depois de a médica ter
dado entrada no tribunal na luta pelo direito ao voto, já
da cerimónia mais que se enquadrava nos parâmetros exigidos pela lei, in-
dourada da sétima arte vocando o estatuto de chefe de família depois da mor-
te do seu marido), também renderia uma quantidade
assinalável de likes, numa publicação com a devida
localização identificada: freguesia de Arroios.
Atualmente tem o nome diretamente associado
20 ao Hospital Beatriz Ângelo, mas é de notar o trabalho
cirúrgico na luta pelos direitos das mulheres.
Dia 8 de março, o Google alerta para a comemoração
E TAMBÉM ESTA SEMANA do Dia Internacional da Mulher. E, a juntar a isso, num
fim de semana de eleições legislativas, Beatriz Ângelo
4 Viver para Contar O fim de um mistério com 116 anos torna-se um nome obrigatório a recordar. Se talvez ti-
30 Crónica Viagem por Jeddah e Diriyah, vesse tido Twitter, hoje não precisaria de muitos cara-
na Arábia Saudita teres para lembrar o dever de votar.
36 Destino Improvável Saint John, uma das capitais
mais genuínas das Caraíbas
42 Agenda Luís Represas regressa aos Coliseus
para apresentar o seu novo álbum, ‘Miragem’
H
á 116 anos, no passa- do José de Alpoim – que tinha fugido para Espanha an-
do dia 1 de feverei- tes do atentado –, não se mostrou surpreendido quando
ro, foram mortos a lhe deram a notícia da morte do Rei. Ele estava, portan-
tiro no Terreiro do to, dentro do segredo.
Paço o Rei D. Car- Ora, sabendo-se tudo isto, ninguém durante 116 anos
los e o filho D. Luís conseguiu identificar quem mandou matar o Rei D.
Filipe. Carlos – que seria necessariamente alguém muito pró-
Li praticamente ximo daqueles dois, no caso de não ser um deles.
tudo que de rele- Como explicar este silêncio?
vante se escreveu O processo do regicídio foi aberto imediatamente
sobre o assunto, e após a tragédia, mas começou logo a deparar-se com
surpreende-me sucessivos entraves. Entraves dos republicanos, que
que o enigma so- não queriam que se remexesse muito no assunto. Mas
bre o mandante do crime tenha persistido até hoje. entraves, também, dos monárquicos. E porquê? Por-
De facto, sabia-se quase tudo. Sabia-se que as armas que o Partido Republicano estava em estado de grande
usadas – uma carabina Winchester último modelo, de efervescência, e os monárquicos receavam que a even-
alta precisão, e uma pistola Browning – eram caríssi- tual prisão de pessoas importantes ligadas àquele par-
mas, não estando à altura das fracas bolsas dos regici- tido precipitasse uma revolução republicana.
das. E bastava isto para mostrar que havia outras pes- A própria rainha D. Amélia – imagine-se! – terá feito
soas por trás do atentado. pressões para que não se investigasse muito. E a razão
Mas sabia-se mais. era a mesma: perdera o marido, perdera o filho mais
Sabia-se que a espingarda e a pistola tinham sido velho, e tinha agora pavor de perder o único filho que
compradas num armeiro do Rossio, encomendadas por lhe restava, D. Manuel. E, para isso, o melhor era dei-
um monárquico dissidente – um tal visconde da Ribeira xar os republicanos em paz e não escarafunchar mais
Brava. no caso.
E sabia-se que outro monárquico dissidente, chama- Neste ambiente, o último chefe do Governo da Mo-
Georgina Rodríguez
Desfila em Paris
com CR7 em destaque
na passerelle PAPA FRANCISCO Seara, presidente da Mesa da
E RUI COSTA Assembleia Geral do SLB, Car-
No início da semana passada, Georgina Rodríguez foi a Pa- los Moia, presidente da Funda-
ris com os seus filhos, aparentemente para uma visita à
120.º ANIVERSÁRIO ção Benfica, entre outros mem-
Disneyland com Cristiano Jr., de 13 anos, Eva e Mateo, de DO BENFICA bros. O Patriarca de Lisboa,
seis, Alana, também de seis, e Bella Esmeralda, quase com TAMBÉM PASSOU Dom Rui Valério, e o Cónego
dois anos. No entanto, surpreendentemente, o objetivo PELO VATICANO Paulo Franco também estive-
real da influenciadora e empresária era participar na Se- ram presentes. Rui Costa agra-
mana da Moda de Paris, onde causou um grande impacto. Como parte das celebrações deceu ao Papa Francisco por
Georgina Rodríguez desfilou com um vestido especial, ins- oficiais dos 120 anos do Sport receber a delegação do Benfica
pirado e autografado por Cristiano Ronaldo, como parte Lisboa e Benfica, uma delega- neste ano especial de comemo-
da coleção Georgina x Vetements outono/inverno ção do clube, liderada pelo Pre- ração e ofereceu ainda uma ca-
2024/25, que combina a moda e o desporto. Nas costas sidente Rui Costa, teve uma au- misola das ‘águias’ ao Santo Pa-
havia uma mensagem especial de CR7 para o “amor da sua diência privada com o Papa dre. O Papa Francisco, por sua
vida”. O momento foi calorosamente aplaudido e rapida- Francisco no Vaticano. A dele- vez, demonstrou um grande
mente se espalhou pelas redes sociais, tornando-se viral. gação incluía Sandra Silva, es- afeto por Portugal, pelos portu-
posa de Rui Costa, Fernando gueses e por Fátima.
RIHANNA
ATUA NA
LUXUOSA FESTA
DE MULTIMILIONÁRIO
INDIANO
O regresso de Rihanna à música
tem sido aguardado com grande
expectativa, já que o seu último
álbum, Anti, foi lançado em
2016. A artista fez uma pausa si-
gnificativa, mas recentemente
voltou a apresentar-se num even-
to especial: a pré-festa do casa-
mento de Anant Ambani, filho de
Mukesh Ambani, o homem mais
rico da Ásia, com uma fortuna
avaliada em cerca de 103 mil mi-
lhões de euros pela Forbes.
Rihanna apresentou um total de
19 músicas durante o evento na
Índia, incluindo sucessos como
We Found Love, Work, Dia-
monds, Rude Boy e Bitch Better
Have My Money. Embora tenha
recebido uma quantia substan-
cial pelo espetáculo (os meios de
comunicação internacionais fa-
lam em cerca de 6 milhões de eu-
ros), algumas críticas surgiram
nas redes sociais, descrevendo a
sua performance como «fraca».
A
brinquedos, quando crescem passamos a apanhar bonés.
China/ Segunda
figura do Estado
votada ao silêncio
Pequim, 5 de março. Sete
‘hospedeiras’ vestidas a rigor
ensaiam uma pequena
coreografia em frente ao
Grande Salão do Povo, que
delimita a Praça de Tiananmen
a ocidente. A sessão da passada
segunda-feira trouxe uma
novidade: nos próximos anos
não se realizará a habitual
conferência de imprensa do
primeiro-ministro com os
jornalistas no encerramento do
Congresso Nacional do Povo, «a
menos que haja circunstâncias
especiais», anunciaram as
autoridades chinesas. Muitos
WANG ZHAO/AFP
França/
Cartaz olímpico
O cartaz oficial dos Jogos
Olímpicos Paris 2024 foi
apresentado com toda a pompa
e circunstância no Museu
d’Orsay, uma antiga estação
de comboios reconvertida.
O desenho, que tanto lembra
os puzzles de Mordillo como
as pinturas de Seurat, mostra
alguns dos ícones da cidade-
-luz: a cúpula dos Inválidos,
o Grand Palais, o Sena e, claro,
a Torre Eiffel. O autor do cartaz
chama-se Ugo Gattoni,
DIMITAR DILKOFF/AFP
mas é francês.
Gaza/
Cemitério de latas
de conserva
Enquanto o exército israelita
prossegue a sua ofensiva, os
deslocados de Gaza vão
sobrevivendo como podem.
Numa cozinha ao ar livre,
aquece-se o almoço em ‘fogões’
a lenha improvisados:
conservas provenientes
da ajuda humanitária. Quanto
às centenas e centenas latas
vazias, vão-se acumulando por
ali, à espera que melhores dias
permitam retomar a recolha do
lixo. Já diz o ditado, «em tempo
de guerra não se limpam
armas».
MOHAMMED ABED/AFP
D
izia que não era bonita, mas antigos. A empresa foi vendida em 1992, mas a panhas publicitárias, como MAC Cosmetics
pelo menos tinha estilo. O que excentricidade de Apfel nunca desapareceu. e Kate Spade. Além disso, a empresária lançou
considerava muito melhor. Nunca tiveram filhos. Dedicavam o tempo a uma linha de óculos com a Zenni Eyewear e
Iris Apfel, conhecida como trabalhar, a viajar, ou a decorar o apartamento são mais de 100 as peças assinadas por si.
um ícone da moda em Nova que tinham na Park Avenue. Diz-se que era uma Ao completar 98 anos, contou a sua história
Iorque morreu aos 102 anos, mistura entre o exagero e o bom gosto. através do livro Iris Apfel: Accidental Icon. Além
deixando para trás uma vida excêntrica, car- Empresária e designer de interiores, nun- disso, conta com quatro livros publicados.
regada de cor e amor próprio. ca se considerou bonita, mas também não Em 2021 ganhou o prémio Andrée Putman
A sua imagem de marca eram os grandes considerava que isso fosse o mais importan- Lifetime Achievement Award, que celebra e
óculos de aros pretos, os colares de contas te. «Não sou bonita e nunca serei bonita, mas reconhece a visão singular da carreira de Apfel.
grandes e os lábios sempre pintados, bem isso não importa (…) tenho algo muito me- Uma vez foi questionada sobre que conse-
como as cores berrantes que vestia e conquis- lhor, tenho estilo», chegou a dizer. lhos de moda poderia dar e Apfel foi muito cla-
tou o mundo com a sua confiança, estabele- Durante a sua vida foi fazendo vários tra- ra: «Cada um deveria encontrar o seu próprio
cendo o seu próprio estilo que nunca passa- balhos para grandes nomes, como a Casa caminho. Eu sou ótima na individualidade.
va despercebido. Não ligava ao que os outros Branca nos mandatos de nove presidentes, Não gosto de tendências. Se aprendermos a
diziam, o importante foi sempre – e a sua prin- como Richard Nixon, John Kennedy e Ronald ser quem somos, como sonos e com o que po-
cipal prioridade – sentir-se bem. E feliz. Reagan. Entre os clientes famosos, destaque demos lidar, conseguimos saber o que fazer».
A paixão pela moda vinha de família. O avô ainda para Estée Lauder e Greta Garbo. Tinha 102 anos, mas nunca quis reformar-
de Apfel foi alfaiate na Rússia, o seu pai, Sa- A sua fama eclodiu em 2005, quando o Cos- -se. Ou pelo menos, deixar de criar. «Acho
muel Barrel, fornecia espelhos para decora- tume Institute do Metropolitan Museum of que reformar-se, seja em que idade for, é um
dores sofisticados e a sua mãe, Sadye, tinha Art, em Nova Iorque, apresentou um progra- destino pior que a morte. Só porque apare-
uma loja de moda. Moravam na zona rural de ma sobre si chamado Rara Avis, palavra em ce um número não significa que as pessoas
Astoria, no bairro de Queens, em Nova Ior- latim para ‘pássaro raro’. O museu descreveu tenham que parar», disse ao Today.
que, onde Iris nasceu. o seu estilo como «espirituoso e exuberan- Chegou tarde às redes sociais, mas era um
Licenciada em História da Arte pela Uni- temente idiossincrático». Foi das primeiras sucesso. Tinha mais de três milhões de segui-
versidade de Nova York e também pela Uni- mulheres a usar calças nos anos 40. Mesmo dores no Instagram e, no TikTok, onde jun-
versidade de Wisconsin, Apfel chegou a que- antes de existirem modelos femininos. tou 215 mil seguidores, falava de moda e pro-
rer trabalhar em jornalismo com o objetivo Mas mesmo depois de se afastar um pouco movia colaborações.
de se tornar uma grande editora. E assim fez: do mundo da moda, a moda veio ter consigo. Recentemente tinha celebrado o seu aniver-
começou por se tornar uma office girl no jor- Em 2018, a Mattel criou uma Barbie Iris Apfel sário com os seguidores. Nascida a 29 de agos-
nal WWD, que, na altura, era considerado um e fez questão de vesti-la com o seu tradicional to de 1921, Iris Apfel tinha completado 102 anos
dos maiores veículos fashion. terno verde da Gucci. e meio a 29 de fevereiro. «Em meios aniversá-
Casou-se em 1948 com Carl Apfel – que mor- Tinha 97 quando assinou um contrato de rios, tenho apenas 26 anos. Hoje tenho 102
reu em 2015 aos 100 anos –, apenas cinco me- modelo com a agência IMG Models e foi a mu- anos e meio. Feliz dia bissexto», escreveu.
ses após o primeiro encontro. Fundaram a Old lher mais velha do mundo a fazer uma capa Não chegará a celebrar os 103 mas o legado
World Weavers, uma empresa que era especia- de revista de moda. que deixa no mundo na moda continuará a
lizada no fabrico de roupa a partir de retalhos Esteve também presente em várias cam- ser celebrado.
RAQUEL
TILLO Porque ser ator é uma constante procura… Acho que trazemos sempre
um bocadinho de nós para as personagens, mas isso é que faz um bom
ator. Não acredito muito naquela ideia de ires a um casting e não ficares
com o papel porque foste “mau”. Acredito que cada papel é para uma
pessoa porque essa pessoa traz alguma coisa de dentro dela para o papel.
“É uma mais Parece ser uma pessoa bastante descontraída, de sorriso fácil, com
humor. É mesmo assim? De que forma se vê? Eu acho que sou mui-
valia estar em
to descontraída. Não sou muito tensa, nem muito agressiva. Levo a
vida calmamente, mas também tenho um lado mais sério que gosto
de guardar. Sendo que, às vezes, o mostro. Não tenho medo de par-
muitas frentes
tilhar, mas gosto de guardar algumas coisas mais para mim. Um lado
mais intenso. Para fora gosto de ser isto… E fazer com que as pessoas
se sintam confortáveis!
diferentes da arte” Ao contrário de muita gente que quis ser mil coisas em criança, a Ra-
quel sempre quis ser artista. De onde veio essa paixão? Eu não faço
ideia, mas a primeira memória que tenho de querer ser atriz foi com 7
anos. Fui ver uma peça de teatro em Londres (foi a primeira vez que os
TEXTO Sara Porto | FOTOGRAFIA Bruno Gonçalves meus pais me levaram lá). Era um musical e eu fiquei fascinada. No fi-
É
nal do espetáculo perguntei se podia ir para o palco! (risos) Claro que
me responderam que não. Lembro-me de os ter chateado o caminho
atriz, cantora, comediante. Recentemente aprendeu todo para o hotel. É a minha primeira memória relacionada com o mun-
a dançar… Existe alguma área que mais a apaixone? Na do do espetáculo, mas a minha mãe diz que desde muito pequena que
realidade sempre foi a área da representação que me in- sempre fiz os meus teatrinhos. Eu dizia que queria ser enfermeira, por
teressou. Conhecer personagens novas, ser essas per- exemplo, mas sempre a fingir. Por isso a minha mãe dizia-me: «Então
sonagens, saber o que é que essas personagens sentem se calhar queres ser atriz, já que tudo o que queres ser é a fingir».
em vários momentos diferentes…
Tinha um baú cheio de roupas e obrigava tanto os seus irmãos a par-
Mas sente que fazer tanta coisa diferente a dispersa? Ou, por outro ticiparem nos seus teatros, como a família a ver… Quer dizer que
lado, torna-a uma artista mais completa? Eu espero que me torne isto sempre foi bem recebido pela sua família… Sim! A minha famí-
uma artista mais completa! Aquele pensamento de: «Tu só podes fa- lia é académica, são pessoas que fizeram um trajeto muito “normal”:
zer uma coisa», não é verdade! Acho que principalmente nós, ato- liceu, licenciatura, etc. Eu sou a mais nova e não quis nada disso. Tal-
res, que gostamos de ser pessoas diferentes – é isso que fazemos, co- vez houvesse medo, já que todos antes de mim viveram com essas
nhecemos seres humanos que fingimos ser e que ao mesmo tempo “regras”. Um padrão… Mas o medo nunca foi das artes, nada disso! Era
habitam dentro de nós –, não devemos ter pudor de experimentar apenas fora do padrão e a preocupação vinha da possibilidade de eu
várias coisas diferentes. Quantas mais coisas nós experimentarmos ficar sem trabalho. Por isso, queriam que tivesse uma licenciatura
mais experiências temos para colocar nas nossas personagens, no caso as coisas não corressem bem. Acho que é normal para as pes-
nosso trabalho, na representação. É uma mais valia estar em muitas soas que não estão habituadas. De repente entrar num mundo de in-
frentes diferentes. certezas. Mas sempre me apoiaram neste percurso!
E quem é que era essa criança? Não era hiperativa, mas era muito ativa.
Os meus irmãos dizem que eu berrava imenso, queria sempre fazer coisas, bem aceite, tanto
pelos meus amigos,
mordia-os. Era louca e histérica. Acho que essa menina ainda vive em mim!
(risos) Se eu pudesse também mordia as pessoas hoje em dia! (risos)
Foi a Raquel que pediu aos pais para ir para Inglaterra para um co-
légio interno estudar Teatro Musical. Tinha apenas 15 anos. De onde como pelas pessoas
de fora! (...) Eu amo
veio essa coragem? Na escola nós tínhamos teatro e eu tinha uma
professora que conhecia esse colégio. Havia as aulas “normais” (que
era o que a minha mãe tinha em consideração) e aulas de teatro de
tarde. Comecei a ver vídeos na internet e tinha um amigo muito pró-
ximo que queria ser músico e também queria ir para esta escola. Ele o Porto, mas sempre
senti que queria ir
falou com a mãe dele que lhe disse que podia fazer a audição. Pensei:
«Se a mãe dele diz que sim, tenho de ir falar com ela, para ela falar
com a minha»; aqueles arranjos que fazes quando és criança. (risos)
E foi isso… Também queria fazer a audição e consegui.
O que é que mais recorda dessa altura? Como era a rotina no colégio?
a outros sítios”
Complexa! (risos) Muitas pessoas acham que quando as pessoas vão para
A Raquel também faz parte disso… Eu não me sinto parte de nada, Vai integrar o elenco do musical ‘Motherhood’. O que é que nos pode
mas gosto muito de ver! (risos) dizer sobre o espetáculo? Acho que temos uma equipa incrível! Eu
adoro o Ricardo Neves-Neves e trabalhei com ele há pouco tempo.
É uma voz ativa na luta pelos direitos LGBTQIA+. É imperativo quebrar Sempre que acontece, sinto que me estou a divertir imenso. Tem um
tabus e falarmos cada vez mais abertamente sobre orientação sexual, imaginário como ninguém. Ele nasceu especial. E vou trabalhar com
sexualidade, género? Sente que Portugal ainda é conservador nesse atrizes que eu amo. Sinto-me uma bebé ao lado delas. Acho que po-
sentido? Vejo um grande crescimento. Além disso, vejo as pessoas mui- dem esperar um musical muito divertido, leve e com muita parvoíce
to abertas a falarem sobre isso, em todo o lado. Há uma aceitação mui- pelo meio. Mães e não mães podem identificar-se. São quatro mulhe-
to maior. Temos sempre mais para aprender e descobrir. Acho mesmo res, uma delas não é mãe. Vão ver o que acontece quando amigas fe-
que qualquer tipo de questão de direitos, vem com uma questão de em- cham a porta e bebem uns copos de vinho. É quase olhar pela fecha-
patia. Pensarmos no outro, naquilo que ele sente. Quando nós nos colo- dura. Uma loucura.
camos nesse lugar, é impossível não sentir empatia. Somos todos pes-
soas, temos todos lutas! Acho que as pessoas o fazem cada vez mais, co- Tem algum projeto de sonho? O que é que se segue? Não penso mui-
locar-se nos sapatos dos outros. Acho que, muitas vezes, nós falamos to no que desejo a seguir. Penso naquilo que desejo em geral. Eu sou
destes temas com uma carga tão negativa, quando poderíamos falar de- feliz a trabalhar, gosto de estar ocupada, fazer coisas. É um privilégio
les com uma carga mais leve. Isso aproxima mais as pessoas que se calhar gostarmos do que fazemos. Gostava de continuar o que tenho feito.
não se sentem tão próximas ou à vontade com o tema. Estas questões Fazer teatro, televisão, cinema e não ter pudor de fazer o comercial
LGBT não são negativas, são as pessoas a serem elas mesmas e a serem e o não comercial. Acho que, às vezes, há esse pudor. Não o quero ter.
felizes. Isso é uma coisa boa. Vamos falar das coisas com leveza! Tudo me traz coisas diferentes, me enriquece de alguma maneira.
Óscares
OS PRÉMIOS
MAIS
CONHECIDOS
DA SÉTIMA
ARTE
20 LUZ | 8 MARÇO 2024
São considerados os prémios mais importantes da sétima arte.
Existem desde 1929 e muita coisa tem mudado desde então.
Mas qual a sua origem? De que forma foi escolhido o seu
nome? Quais os artistas e filmes mais galardoados até hoje?
Há quem os tenha recusado? Conheça também os destaques
da cerimónia deste ano que se realiza no dia 10 de março.
Sara Porto
O
TEXTO
cinema pode ter um significado de 1927, surgiu de uma ideia de um dos che-
e importância diferente para fes da Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) – em-
toda a gente. No entanto, há presa norte-americana de produção, distri-
uma premissa inegável: este faz- buição de filmes e programas televisivos –,
-nos viajar, sair de nós, viver a Louis B. Mayer.
vida dos outros, conhecer novos lugares, no- Segundo os meios de comunicação inter-
vas histórias, experienciar novas sensações, nacionais, no princípio, a associação servia
repensar ideologias. Se algumas vezes nos faz para «cuidar da imagem dos estúdios de ci-
sentir medo, outras faz-nos sonhar, chorar de nema de Hollywood» e «resolver problemas
alegria, sentir tristeza, raiva, desconforto ou dos trabalhadores». Teve como primeiro pre-
rir às gargalhadas. sidente Douglas Fairbanks, considerado um
Todos os anos os aficionados de cinema es- dos principais atores norte-americanos do
peram por este momento. O ano é passado a começo do século XX. No entanto, as coisas
ver tudo aquilo que de melhor se fez no uni- acabaram por mudar e os seus fundadores
verso cinematográfico para, neste dia, se co- chegaram à conclusão que era necessário
nhecerem os vencedores. Falamos da ceri- criar uma cerimónia onde fossem premiados
mónia dos Óscares que, este ano, se realiza os melhores filmes produzidos a cada ano.
no dia 10 de março em Los Angeles, nos EUA. Na primeira cerimónia organizada pela as-
Esta é já a 96º edição da entrega destes pré- sociação, realizada a 16 de maio de 1929, fo-
mios. Mas como surgiram? Quem os inven- ram premiados os melhores filmes de 1927 e
tou? Quais os melhores momentos e curiosi- 1928. O evento contou apenas com a presen-
dades? Quem escolhe os vencedores? O que ça de 270 pessoas (nessa altura já se sabiam
é preciso para uma longa metragem poder quem eram os vencedores e as pessoas tive-
ser considerada para nomeação? Quais os ram de pagar 5 dólares para assistir). E diz-se A PRIMEIRA CERIMÓNIA
maiores galardoados até hoje? E quais os no- que esta só durou 10 minutos. Além disso,
meados para este ano? destinou-se a premiar apenas 12 categorias CONTOU COM 270 PESSOAS
(algumas já extintas): Filme, Ator, Atriz, Rea-
A ORIGEM lizador de Drama, Realizador de Comédia, E CADA UMA TEVE DE PAGAR
Este é o prémio que todo o artista sonha rece- Argumento Original, Argumento Adaptado,
ber e também o mais antigo de Hollywood. Quadros, Qualidade de Produção, Direção CINCO DÓLARES PARA ESTAR
Criado em 1927, teve a sua primeira cerimó- Artística, Fotografia e Efeitos de Engenharia.
nia em 1929, em Los Angeles (como ainda De acordo com a Infopédia, só em 1936 foi PRESENTE. ATUALMENTE OS
acontece atualmente). Tal como acima refe- criada a categoria que se destina a premiar o
rido, o seu objetivo é premiar as melhores Melhor Ator e Atriz Secundários. Com o pas-
ÓSCARES SÃO EXIBIDOS NOS
produções cinematográficas de cada ano. Na sar do tempo, o evento tornou-se multimilio- MAIS DIVERSOS PAÍSES E
altura em que surgiu, o cinema americano nário e é exibido nas mais diversas partes do
atravessava um processo de expansão. À épo- mundo, dando a oportunidade de todos as- TORNARAM-SE UM EVENTO
ca, grandes nomes do ramo resolveram jun- sistirem.
tar-se e criar uma organização que fosse res- MULTIMILIONÁRIO AGUARDADO
ponsável pela imagem de Hollywood, onde OS JURADOS E O PRÉMIO
os filmes eram produzidos. Foi assim que nas- Mas quem é que decide os vencedores? De POR MILHÕES DE PESSOAS
ceu a Academy of Motion Picture Arts and acordo com o Digital Spy, plataforma de en-
Science (AMPAS). Fundada no dia 11 de maio tretenimento especializada em cinema, tan-
1 2
N
em Nova Iorque, um americano atuava no Conservatório
de Moscovo. O público estava de má catadura e apupou-o.
Campeões
do mundo
marcam
o ritmo
O
TEXTO João Sena
Campeonato do Mundo de
motociclismo começa hoje no
Qatar e termina em novem-
bro, em Espanha. Durante
nove meses os pilotos de Mo-
toGP (1000 cc), Moto2 (765
cc) e Moto3 (250 cc) vão disputar 21 Grandes
Prémios – igual número de corridas Sprint (ao
sábado) –, e passam por 17 países. É uma tem-
porada especial, onde se celebram os 75 anos
de Grandes Prémios: é a competição mais an-
tiga do desporto motorizado, a Fórmula 1 co-
meçou um ano mais tarde. A primeira corrida
realizou-se na Ilha de Man, localizada no mar
da Irlanda, em 1949. Leslie Graham (AJS) ven-
ceu a categoria de 500 cc e foi também o pri-
5
10 MAR 24 MAR 14 ABR 28 ABR4 12 MAI 26 MAI 7 02 JUN 16 JUN 30 JUN 07 JUL
2 3 6 8 9 10
1
QATAR PORTUGAL AMÉRICAS ESPANHA FRANÇA CATALUNHA ITÁLIA CAZAQUISTÃO PAÍSES BAIXOS ALEMANHA
CIRCUITO INTERN. INTERN. DO ALGARVE CIRC. DAS AMÉRICAS, CIRCUITO JEREZ CIRC. LE MANS CIRCUITO BARCELONA- AUTÓDROMO MUGELLO AUTÓDROMO INTERN. CIRCUITO TT ASSEN CIRCUITO
DE LOSAIL (DOHA) (PORTIMÃO) AUSTIN DE LA FRONTERA -CATALUNHA SOKOL SACHSENRING
5
3 4 7
1 2 6 8 9 10
E OS OUTROS o título
#1
Aprilia RS-GP24 Aprilia RS-GP24/23 DESMOSEDICI GP24 DESMOSEDICI GP23 DESMOSEDICI GP23
#12 #41 #88 #25 #21 #89 #93 #73 #49 #72
EQUIPAS Ducati LENOVO
DESMOSEDICI GP24
Aprilia RACING Trackhouse RACING PRIMA PRAMAC Racing GRESINI Racing Petarmina VR46
#1
Aprilia RS-GP24 Aprilia RS-GP24/23 DESMOSEDICI GP24 DESMOSEDICI GP23 DESMOSEDICI GP23
#12 #41 #88 #25 #21 #89 #93 #73 #49 #72
ESP MAVERICK ESP ALEIX ESP MIGUEL ESP RAÚL ITA FRANCO ESP JORGE ESP MARC ESP ÁLEX ITA FABIO DI ITA MARCO ITA FRANCESCO
VINÃLES ESPARGARÓ OLIVEIRA FERNÁNDEZ MORBIDELLI MARTÍN MÁRQUEZ MÁRQUEZ GIANNIANT. BEZZECCHI BAGNAIA
Moto3 Moto 2 125CC 125CC Moto 2
Moto2 Moto2 2X MotoGP
6X MotoGP
ESP MAVERICK ESP ALEIX ESP MIGUEL ESP RAÚL ITA FRANCO ESP JORGE ESP MARC ESP ÁLEX ITA FABIO DI ITA MARCO ITA FRANCESCO
VINÃLES ESPARGARÓ OLIVEIRA FERNÁNDEZ MORBIDELLI MARTÍN MÁRQUEZ MÁRQUEZ GIANNIANT. BEZZECCHI BAGNAIA
Moto3 Moto 2 125CC 125CC Moto 2
Moto2 Moto2 2X MotoGP
6X MotoGP
LCR HONDA REPSOL HONDA RED BULL GAS GAS RED BULL KTM FACTORY MONSTER ENERGY
Honda RC213V Honda RC213V KTM RC16 KTM RC16 YAMAHA YZR-M1
#23 #5 #30 #10 #36 #31 #37 #33 #43 #20 #42
LCR HONDA REPSOL HONDA RED BULL GAS GAS RED BULL KTM FACTORY MONSTER ENERGY
Honda RC213V Honda RC213V KTM RC16 KTM RC16 YAMAHA YZR-M1
#23 #5 #30 #10 #36 #31 #37 #33 #43 #20 #42
ITA ENEA ITA JOHANN JAP TAKAAKI ITA LUCA ESP JOAN ESP PEDRO ESP AUGUSTO ITA BRAD AUS JACK ESP FABIO ESP ÁLEX
BASTIANINI ZARCO NAKAGAMI MARINI MIR ACOSTA FERNÁNDEZ BINDER MILLER QUARTARARO RINS
2x Moto 2 MotoGP Moto 2 Moto 2 125 CC Moto GP
125cc Moto 3
ITA ENEA ITA JOHANN JAP TAKAAKI ITA LUCA ESP JOAN ESP PEDRO ESP AUGUSTO ITA BRAD AUS JACK ESP FABIO ESP ÁLEX
BASTIANINI ZARCO NAKAGAMI MARINI MIR ACOSTA FERNÁNDEZ BINDER MILLER QUARTARARO RINS
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125cc Moto 3
MAFOMA
SE CALHAR
O CARA-FEIA
NÃO ERA ASSIM
TÃO FEIO
QUANTO ISSO
Desventuras da viagem de um jornalista de Riade
até ser barrado nos portões de Meca e desviado
para Jeddah cuja origem se perde na poeira do
Tempo, tendo por fundo a vida extraordinária
daquele que se chamou Abū al-Qāsim Muhammad
ibn Abd Allāh ibn Abd al-Muttalib ibn Hāshim...
J
TEXTO
Monocromática A cidade, construída à base de barro, toma a cor dos seus arredores
Cuidada Património da Humanidade, Diriyah é uma cidade cuidada com todo o carinho
Recuperados Alguns dos edifícios do local foram recuperados, permitindo uma noção melhor de como eram no seu tempo áureo
D
carne de porco. Em Julho de 627, junto com um batalhão ALGUNS
IRIYAH – Estranhamente chuvisca. Said, composto por trinta homens e comandados por
que vai ao volante e fala um inglês horren- Muhammad ibn Maslamah al-Ansāri (O Rei dos Soldados RECONSTRUÍDOS,
do, mais incompreensível do que o de qual- de Allah), tomaram todos os centros habitacionais e de-
quer scouser, ou mais concretamente aqui- puseram o seu chefe Thumamah Bin Uthal al-Hanafi. CONFUNDEM-SE
lo que, do fundo da sua suprema vaidade Durante os anos que se seguiram, o local não teve paz.
nunca escondida, os britânicos gostam de apelidar de Golpes e contragolpes assolaram a região e foi já no sé- COM AS DUNAS
pidgin English, uma versão corriqueira da língua infeta- culo XVIII que um homem chamado Muhammad bin
da – «if I may express myself in these words» – por pala- Su ūd Āl Muqrin, mais prosaicamente conhecido por Ibn
DE AREIA DE PÓ
vras locais ou de pronúncia arrevesada, diz que já não Saud, assumiu o cargo de emir de Diriyah e, em Feverei-
caía água do céu há mais de três meses e, na verdade, não ro de 1727, criou a Casa de Saud e com ela o primeiro Es-
FINO E AVERMELHADO
se pode chamar a estes salpicos verdadeira chuva. Saí- tado Saudita. Os nomes árabes são de provocar cãibras QUE A BRISA ENTRANHA
mos de Riade e das suas avenidas largas de quatro ou cin- na língua, bem sei, mas com vossa licença, trago aqui ou-
co faixas para cada lado que nos impedem de gozar o pra- tro à colação, Muhammad ibn Abd al-Wahhāb ibn Su- NA NOSSA ROUPA
zer de uns passeios a pé, e caminhamos para norte, to- laymān al-Tamīmī, um teólogo, estudioso e professor do
mando primeiro a estrada 522, que nos transporta para islamismo sunita – assim só ao correr da pena, os sunitas
os arrabaldes da capital saudita e, finalmente, uma zona creem que Maomé foi o últimos dos profetas e os xiitas
mais desértica logo após Tuwaiq Palace, onde se concen- acreditam que esse foi Ali, genro de Maomé, marido de
tram as embaixadas, e várias toneladas de areia fina como Fátima, que acabou assassinado, uma minoria que englo-
pó de tom alaranjado até chegarmos a At-Turaif, outra ba apenas 10% dos muçulmanos – que não pode deixar
das pérolas da Arábia Saudita, também ela Património de ser mencionado porque é aí que nascem as raízes da
da Humanidade, a primeira capital da dinastia saudita, confusão entre o Estado político e o religioso, engloba-
fundada no século XV, e que fica paredes meias com o dos num só. São diversas as construções arquitetónicas
destino que aqui me trouxe, Diriyah. que Dariyah tem para oferecer a quem a visita, desde o
As casas misturam-se com as dunas e os tons vão-se al- palácio Salwa, primeira habitação dos Saud, ao palácio
terando conforme o movimento do sol resolve brincar Sa’d bin Sa ūd, muitos anos utilizado como estábulo dos
com as sombras. Foi aqui o berço da família real que ain- famosos cavalos árabes, da casa dos banhos de At-Turaif
da hoje governa o país. Começou por ser um emirado com à mesquita de Imām Muhammad bin Sa ūd.
o mesmo nome, englobando algumas povoações próxi- Por entre a poeira que a brisa levanta neste plaino aban-
mas como foram os casos de Uyayna, Jubayla, e Al-Amma- donado espalham-se as lendas da coragem e do sangue.
riyyah. Estamos num vale. O vale de Wadi Hanifa que se Os planos de recuperação e de reconstrução de vários
estende daqui até Riade. Todas as construções são de edifícios concentram-se nos escritórios modernos da
areia ou terracota o que dá a sensação de estarmos pre- aglomeração de salas que não dispensam o ar-condicio-
sos no centro de uma cor. Claro que, para além das ruí- nado. Historiadores, arqueólogos e arquitetos dedicam-
nas, muitas delas recuperadas, existe um centro habita- -se febrilmente ao seu trabalho. Talvez estejamos a pisar
cional pequeno mas modernos pronto a satisfazer as ne- o mais histórico de todos os pedaços de solo da Arábia
cessidades dos habitantes e dos visitantes. Fica no alto Saudita, se entendermos Meca mais como um significa-
de uma colina, rodeada de palmeiras sem cor e de algu- do do que uma peça íntima do Passado. Mas não exijam
mas fazendas devidamente separadas umas das outras. aos sauditas que diminuam o seu lugar sagrado.
SAINT JOHN’S
ANTÍGUA E
BARBUDA
Barbuda
ANTÍGUA
E BARBUDA
MAR DAS
CARAÍBAS
2 Antígua
1 – Antígua
2 – Saint John’s
Como Ir:
VIAGEM PARA ANTÍGUA, COM A
BRITISH AIRWAYS, VIA LONDRES
A CIDADE CARIBENHA
DE SÃO JOÃO
Situada numa enseada oposta àquela em que o Almirante Nelson
fundou as suas estratégicas Nelson Dockyards, Saint John
tornou-se a maior povoação de Antígua e um porto de cruzeiros
concorrido. Os visitantes que a exploram além do artificial
Heritage Quay, descobrem uma das capitais mais genuínas das
Caraíbas.
TEXTO Marco C. Pereira | FOTOGRAFIA M.C.Pereira e Sara Wong
Q
da baía em que se aninhou a cidade, as suas es-
uinze minutos. Quinze breves rarmos o carro recém-alugado para fazermos truturas construídas de novo ou demasiado
minutos a bordo de um Boeing compras num mini-mercado mal-amanha- recuperadas, polidas e garridas. Contrastam
777, representaram um recorde do, percebemos que o dono do rent-a-car nos com o centro da capital circundante, feito de
do nosso voo mais curto no tinha deixado o carro ligado, mas levado a edifícios antigos com dois ou três andares,
maior avião. Dificilmente será chave com ele. quase sempre erguidos acima de arcadas que
batido. A rota principal era Saint Kitts – Darmos com a vivenda resulta noutro fil- permitem uma melhor ventilação dos lares
Gatwick, Londres. Fazia escala em Saint me. Cumpridas voltas e mais voltas, por fim, e a circulação dos pedestres a salvo da chuva.
John’s, Antígua, para recolher mais passagei- instalamo-nos, conseguimos alguma paz e o Numa ilha exposta a frequentes bátegas,
ros destinados a Inglaterra. Breve como era, descanso necessário à exploração de Antígua. ventos húmidos e salinos, a tempestades tro-
o voo força o Boeing 777 a manter-se a uma O dia seguinte traz a necessidade de um car- picais e furacões, as suas pinturas desgastam-
altitude baixa que permitisse a aterragem no tão SIM local, uma razão incontornável para -se rápido. Esse desgaste sublinha a antigui-
aeroporto internacional V.C.Bird. Ainda nos irmos até Saint John’s. A empresa de teleco- dade e densidade colonial do lugar.
estávamos a ajustar aos assentos quando municações fica a pouca distância da beira- Como sempre acontece com os cruzeiros,
anunciam o desembarque. Somos os únicos -mar. Curiosos quanto ao que reservava a o Heritage Quay Complex marcava uma área
passageiros a sair em Antígua, já de noite. A marginal, decidimos começar por aí. Ao per- protegida do desconhecido afro-caribenho
casa em que nos vamos alojar fica no leste da corrermos a Promenade do porto, ficamos que um amedrontamento étnico comunal
ilha, o lado oposto ao da capital. Chegarmos na iminência de uns poucos catamarãs e bar- levava os passageiros a recear. Os que dei-
lá depressa se prova uma epopeia com o cú- cos de pequena dimensão. Mais distantes, um xavam os cruzeiros, faziam-no integrados
mulo do caricato no momento em que, ao pa- de cada lado de um dos longos molhes de ci- em excursões organizadas às monumentais
A
bandeira tem-se preservado con-
sensual, o nome do território,
Docas de Nelson, mandadas erguer pelo fa- ANTÍGUA E A “IRMÔ nem por isso. Aquando da passa-
moso almirante. Ou ao viveiro da “Stingray gem de Cristóvão Colombo, pela
Antigua”, mantido para cobrar um convívio BARBUDA PRESERVAM ilha, na sua viagem de 1493, o descobridor
intimista com dezenas de raias do Atlânti- tê-la-á batizado em honra de uma das igre-
co ao largo. UM LEGADO BRITÂNICO jas de Sevilha que mais venerava, a de San-
E, no entanto, Saint John’s revela-se uma ta Maria de Antígua. Por essa altura, há mui-
das urbes mais atarefadas e genuínas das An- PROLÍFICO. EM SAINT to que os indígenas Caribes tratavam a ilha
tilhas, incomparavelmente mais segura que por Wadadli. Também em função de uma
muitas das cidades dos Estados Unidos, de JOHN’S, AQUI E ALI, certa postura anti-colonial, é esse o nome
onde provém quase todos os cruzeiros. usado por boa parte dos habitantes des-
Fartos da zona portuária, inauguramos um DAMOS COM AS TÍPICAS cendentes dos escravos lá desterrados de
périplo espontâneo pela longa Thames Street. África, ao serviço da produção local de
A essa hora, estudantes num sortido de uni- CABINES TELEFÓNICAS cana-de-açúcar. Como é usual nestas Pe-
formes cruzavam-se, apressados, indiferen- quenas Antilhas e Caraíbas, o termo no-
tes às montras de rua por que passavam dia
VERMELHAS
após dia. Era o caso da Johan Mansoor – Top 2 3
C
harcos negros, legados por pés-
-d’água recentes refletem-nos. Ge-
ram obras de arte visuais que nos de-
leitam. Num beco próximo, um par
de adolescentes tornados barbeiros ao ar li-
vre, tinham instalado pouco mais que dois
bancos e dois espelhos. Lucravam da reno-
vação capilar acelerada dos antiguanos. Con- 1. Uma moradora a cantar 2. Barbearia sem teto
tinuamos a deambular. De volta ao cerne da 3. Casario do Heritage Quay Complex 4. Uma
grelha urbana, surpreende-nos uma parada cabine britânica na bala de Dickinson 5. A cate-
infantil, prolongada por sucessivos agrupa- dral anglicana de Saint John
meia ainda a mais popular das marcas de ralhas comedidas e uma bateria de canhões se cruzam, interagem e negoceiam sob o ca-
cerveja nacionais. apontada ao Mar das Caraíbas iminente. O lor tropical, amiúde, abrasador.
Mas, regressemos à bandeira que encontrá- acesso ao restante espaço está vedado por Uma senhora canta um qualquer tema tra-
vamos vezes sem conta. As gentes do arqui- uma série de casas de banho contentores, dicional que trata o passado esclavagista da-
pélago adaptaram-na, em 1967, quando con- destinadas a um evento a ter lugar nessa noi- quelas paragens. Do lado oposto da estrada,
quistaram o seu autogoverno, catorze anos te. Ao constatarmos que por ali somos os úni- uma estátua com visual de museu de cera ho-
antes da independência do Reino Unido. Se cos, esgueiramo-nos entre dois deles e esprei- menageia V.C. Bird: Vere Cornwall Bird Snr.,
bem que Antígua e a “irmã” Barbuda ainda se tamos o que se destacava em redor: uma vis- figura idolatrada pelo seu papel na emanci-
mantêm no âmbito da Commonwealth. Têm ta invertida para The Cove e, mais distante, pação financeira e política dos jovens países
em Carlos III, o seu longínquo monarca. o cimo do casario secular da capital. Perce- caribenhos, o primeiro-ministro inaugural,
Como seria de esperar, ambas preservam bemo-lo culminado pela catedral de Saint considerado pai da nação de Antígua e Bar-
um legado britânico prolífico. Em Saint John, o templo anglicano que abençoa a urbe buda.
John’s, aqui e ali, damos com as típicas cabi- homónima, ainda que as suas anteriores ver- Com o dia a chegar ao término, lembramo-
nes telefónicas vermelhas. Vemo-las no His- sões tenham sido seriamente danificadas por -nos do velho plano de explorarmos uma ilha
toric Redcliffe Quay. E também, entre coquei- sismos poderosos de 1683 e 1745, ao que não que, por motivos vulcânicos inusitados, con-
ros, na beira-mar idílica do Siboney Beach será alheio o facto de assentar sobre um reci- siderávamos ainda mais prioritária que a pró-
Club. A baía de Dickinson adiante, fica umas fe de coral fossilizado, no ponto mais eleva- pria Antígua.
três ou quatro enseadas a norte daquela que do da cidade. Percorremos a Long Street. Estacionamos
R
acolhe os cruzeiros, algumas menos da pe- o mais próximo possível do pontão de Bryson.
nínsula e da praia de Fort James, que os bri- egressamos do Fort James. Mete- Compramos os bilhetes do ferry que lá nos
tânicos ali ergueram, de maneira a protege- mo-nos na zona comercial autênti- levaria. Dois dias depois, bem cedo, zarparía-
rem a sua invejada capital das potências co- ca e azafamada da cidade, o merca- mos para Montserrate. Toda uma outra “es-
loniais, dos corsários e piratas inimigos. do ao ar livre de frutas e vegetais, tória” que por colapso mecânico desse mes-
Quando, por fim, a achamos, a fortificação todo um mundo de bancas e lojas de muito mo ferry, terminou com o regresso de avio-
pouco mais nos revela que parte das suas mu- mais que esses víveres. Onde as gentes da ilha neta a Saint John’s e a Antígua.
CHEF
JOSÉ LIMA
RESTAURANTE
TÁBUA DA RIA
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SANTA MARIA DA FEIRA
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mais de 30 obras de pintura em
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acompanhada de textos
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contar a história do bairro de RITA VIAN
Campo de Ourique, a exposição Sensorial dá nome à primeira
também pretende ser uma viagem em álbum na qual Rita
celebração da pintura. Vian explora dimensões como
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NÉLSON ALICE
MATEUS VIEIRA
H E
oje celebramos o Dia Internacional da Mulher. fetivamente, podíamos falar de imensas Mulheres do
Uma data que assinala, entre outras causas, a meu país, titulo da obra da minha prima Maria Lamas
igualdade de direitos civis entre homens e mulhe- publicada em fascículos e que traçou o retrato minu-
res. Há quem continue a questionar a pertinência cioso da condição da mulher em Portugal nos anos
desta efeméride. Um tema que foi referido poucas 1940.
vezes na campanha eleitoral que hoje (finalmente) termina. A Também podíamos falar de Maria Teresa Horta, Maria Isabel
verdade é que, até outubro de 2019, (há cinco anos, portanto) o Barreno e Maria Velho da Costa – as três (Marias) autoras das
Código Civil português dizia que, depois de um divórcio, os ho- Novas Cartas Portuguesas, o livro que provocou grande rebuliço
mens precisavam de esperar 180 dias para voltar a casar, en- na vida cultural e política de Portugal.
quanto as mulheres necessitavam de 300 dias, imagina. E este é Também podíamos falar de Florbela Espanca e Amália Rodri-
apenas um exemplo de machismo estrutural no nosso país. Mui- gues. Ou, se quiséssemos retroceder uns séculos na história, po-
tos ainda pensam que o lugar da mulher é em casa a tomar conta díamos falar de D. Maria I ou da neta D. Maria II. Desde a monar-
dos filhos e a cuidar do lar. Muitos homens não aceitam ser lide- quia nunca mais tivemos um país governado por mulheres. No
rados por mulheres. Não percebo a desigualdade salarial exis- entanto ainda existe esperança!
tente entre outras situações. Quanto à nossa amiga Simone de Oliveira deixou o “pombal”
Hoje podíamos recordar aqui grandes mulheres que foram fun- onde vivia na freguesia da Misericórdia e agora reside na Casa do
damentais para o “empoderamento feminino”. A tua prima Ma- Artista.
ria Lamas, Odete Santos, Natália Correia, Beatriz Ângelo, Maria Como sabes, não hesitou em aceitar o convite de Ary dos Santos
de Lurdes Pintasilgo, ou até Brites de Almeida, a Padeira de Alju- para cantar A Desfolhada. Foi uma escandaleira uma mulher a
barrota ou a Maria da Fonte. cantar «Quem faz um filho, fá-lo por gosto», num Portugal a
Mas hoje, em particular, gostaria de referir a nossa amiga Simone preto e branco.
de Oliveira, como uma Mulher Inesquecível! Tem sido uma mulher com um percurso de vida incrível, uma
Foi feminista quando a maior parte das mulheres vivia depen- espécie de montanha russa, com altos e baixo, que deixou mar-
dente da vontade do pai ou do marido. Fumava, usava calças e cas e cicatrizes e muitas histórias por contar.
frequentava a noite, enquanto as outras mulheres estavam de Foi-nos diagnosticado um cancro da mama, praticamente ao
avental na cozinha ou de joelhos nas igrejas. Abandonou o mari- mesmo tempo. Mas também nisso fomos um exemplo de resis-
do que a maltratava e denunciou-o enquanto outras apanhavam tência, e de esperança para tantas outras mulheres.
e ficavam caladas. «Nasci embalada no canto crescido/ Da gente miúda/ Cresci
Já te disse que uma das minhas canções preferidas da Simone é aquecida pelo sol de inverno/ Que o vento não muda/ Cantei
Auto-Retrato, com letra e música do nosso amigo António Sala? desfolhadas, cantei sete letras/ Tangos ribeirinhos/ Cantei os
Um “Retrato Cantado” de uma Mulher Incomum, que ousou poetas, gritei os poemas/ Que são meus caminhos»
percorrer o caminho mais difícil. Amada por muitos homens e «Mudei o cantar e a forma de amar/ Aqui onde estou/ Virei os
mulheres e mal-amada por outros tantos, mas a quem ninguém destinos, mudei os meus hinos/ Mas sei onde vou!»
fica indiferente! Só o António Sala podia ter escrito algo tão bonito para Uma Mu-
Vamos visitá-la em breve? lher Incomum de seu nome Simone de Oliveira.
Bjs Bjs