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A espinhosa questo da depressdo — resenha de O tempo e o cdo ~ a atualidade das depressées, de Maria Rita Kehl - 2009" Paula Regina Peron’ Segundo a OMS, a depressio atinge aproximadamente 121 milhies de pesso- ase até 2020 serd a segunda principal causa de morbidade, perdendo apenas para as doengas cardiovasculares. Sabemos que a Medicina tem se ocupado da medicali- zagio da depressiio, Nos consultérios, recebemos muitos pacientes medieados, por seus ginecologistas, endocrinologistas, elinicos-gerais. Hé uma atual patologizacio sgeral da vida subjetiva, sustentada pelos grandes laborat6rios farmacéuticos, o que coopera para que os menores sinais depressivos sejam detectados. Em aulas de Psicandlise, no Ambito universitirio, recorrentemente escuto questdes sobre a depressio e niio posso dizer que neste sentido tenhamos um sax ber mais acabado, jé que hi grandes diferengas de compreensio entre os autores, que denotam principalmente a complexidade do que estamos tratando e nfio uma precariedade de nosso conhecimento, Nao é incomum que se use este termo ~ de- pressio ~ sem precisio e sem diferenciar as iniimeras situagées psiquicas onde ela pode estar presente, Existe também confusio sobre as inevitaveis diferengas no entendimento de diagnéstico e de génese entre nés eo campo da Psiquiatria, discurso da Psiquiatria aleanga amplos limites na sociedade e contamina o senso comum com verses biolégicas e inatas da génese do adoecimento psfquico,isolando o ser humano de suas relagdes e, principalmente, de sua caracteristia sui generis: alinguagem. Por isto, sio bem vindas as desconstrugdes deste discurso hegeméni- co que, entretanto, precisam de estofa tedrico consistente e bases elfnicas sélidas. ‘Neste sentido, o livro de Kehl é precioso, embora complexo para o leitor iniciante. Maria Rita Kehl convoea os analistas: 6 preciso resgatar a clinica das depres- ses do campo exclusivo da psiquiatria. E embarca em um exame detalhado sobre a depressio, na companhia de Lacan e autores da filosofia, ainda assim mantendo a clareza tfpica de sua escrita, o que ndo é muito comum encontrar em autores de base lacaniana, + Kebl, MR. (2009), O tempo eo cio ~ a atualidade das depressées, So Paulo: Boitempo. ** Doutora em Psicologia Clinica pela PUC/SP, professora do Curso de Psicologia da mesma instituicéo, pelo Departamento de Psicodinimica, ede eursos de extensio na COGEAE/SP. prperon@uolcombr Pric, Rev. Sio Paulo, volume 18, 2, 279-285, 2009 10 Resenha Para ela, o aumento das depresses na atualidade configura um sintoma so- «ial, visto que ha sintomas ou estruturas clinieas que, dada sua posigdo de desacordo frente a normatividede social, denunciam as contradigdes de uma época. A autora argumenta que, em diferentes 6pocas historieas,temos diferentes sinalizadores do ‘mal-estar derivado da vida em cultura, Desde a Tdade Média até o infcio da Mo- demidade, a melancolia teria ocupado este lugar sinalizador, de excegio no lago social. Hoje, seriam os depressivos os portadores da mé noticia da qual ninguém ‘quer saber. A premissa em jogo € que “se as estruturas

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