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Politicas e Desafios Da Educacao Tecnico
Politicas e Desafios Da Educacao Tecnico
técnico-Profissional em moçambique
Impulso, Piracicaba • 28(73) 87-106 set.-dez. 2018 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767
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Introdução Moçambique, pelos padres Salesia-
nos, e oferecia formação nas áreas
Segundo Azevedo e Abreu (2007), de- das artes gráficas e da carpintaria.
pois da guerra civil e das eleições de 1994, a Desta escola-oficina saía boa parte
educação foi encarada como uma prioridade do material impresso que circulava,
nacional, com destaque para o ensino ele- ao tempo, em Moçambique” (AZE-
mentar. O sistema educativo nacional mo- VEDO e ABREU, 2007, p. 26)
çambicano era regulado por uma Lei de Ba-
ses, de 1983. Em Agosto de 1995, foi aprovada
pelo Governo uma nova política nacional de Sabe-se que o sistema de educação
educação, reconfirmada pelo “Plano Nacional técnico-profissional Moçambicano é ofereci-
de Desenvolvimento do Sistema Educativo”, do sobretudo por escolas públicas e centros
discutido com os doadores em Setembro de de formação administrados pelos diferentes
1997, em que se definiram as grandes orienta- ministérios. Há pouco tempo, alguns prove-
ções para os anos vindouros, a saber: melho- dores privados entraram no mercado e ofere-
rar o acesso à educação e a qualidade do ensi- ceram programas especializados de formação
no. Já nesse momento, foi atribuído ao Ensino aos seus clientes do setor privado (principal-
Técnico-Profissional um papel muito significa- mente novos investidores estrangeiros), mas
tivo, afirmando-se como prioridade reabrir e estes programas ainda só beneficiam uma mi-
criar escolas de artes e ofícios e elementares noria de alunos no sistema de educação téc-
de agricultura e pecuária, e incentivar outras nico-profissional (BROUWER e BRITO, 2010,
iniciativas neste domínio, por forma a pro- p.10). Pela sua natureza e enfoque, o ensino
mover o autoemprego. Das Escolas de Artes técnico-profissional (ETP) enquadra-se no
e Ofícios (EAO) esperava-se um papel deter- conceito mais amplo de Educação Profissio-
minante na “reativação do tecido produtivo nal, o qual envolve como provedores o gover-
nas zonas rurais e na fixação das populações” no e outros parceiros (PLANO ESTRATÉGICO
(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1995^, apud DA EDUCAÇÃO, 2012-2016, p. 90).
AZEVEDO e ABREU, 2007, p. 25). Tais escolas Segundo Macamo (2015), ETP de quali-
tinham caraterísticas bem específicase contri- dade envolve elevados custos. Comparando
buiram significativamente para o bem-estar ao Ensino Secundário Geral (ESG) a algumas
da população, conforme destacam Azevedo e especialidades do Ensino Superior, o custo por
Abreu (2007): aluno do ETP é mais alto. Porém, apesar de ser
alocado, a este tipo de ensino, uma parte con-
As EAO eram escolas-oficinas e ti- siderável do orçamento para o setor de Edu-
nham por finalidade principal dar cação, não é suficiente para garantir as condi-
aos seus alunos, quase sempre ções necessárias à progressão das reformas já
população autóctone, uma prepa- iniciadas. A fim de manter a sustentabilidade
ração profissional prática, a que se financeira do ETP, assegurar a sua qualidade
juntava alguma formação académi- e expansão, o Ministério de Educação de Mo-
ca, bastante elementar, equivalen- çambique tem redefinido os critérios de finan-
te ao primeiro grau, ou seja, a ter- ciamento e aumenta a contribuição do setor
ceira classe da instrução primária. privado por meio do envolvimento das comu-
Os oficiais deles saídos, viam em ge- nidades e das próprias famílias. Assim sendo,
ral melhorada a sua situação econó- este novo século (XXI), inicia-se com o ressur-
mica, diferenciando-se mesmo dos gimento do Ensino Técnico-Profissional, o qual
trabalhadores rurais, socialmente passou pela preparação de uma nova estraté-
mais desfavorecidos. A primeira es- gia do Ensino Técnico-Profissional e pelo início
cola foi criada em 1907, na Ilha de da Reforma da Educação Profissional (REP).
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Visando a concretização deste estudo, escola única inicial de cultura geral,
foram utilizados os procedimentos meto- humanista, formativa, que equilibre
dológicos da pesquisa teórica e qualitativa, de modo justo o desenvolvimento
fundamentando-se em leituras, interpreta- da capacidade de trabalhar manu-
ções e análise de diferentes manuais e textos almente (tecnicamente, industrial-
científicos. Também foi usado o método her- mente) e o desenvolvimento das
menêutico, por meio de recursos didáticos, capacidades de trabalho intelectu-
fazendo uma análise aprofundada de dife- al. (GRAMSCI, 2004, p.33).
rentes abordagens que discorrem a respeito
da questão da educação moçambicana, em Entretanto, a educação pode ser enten-
diversos âmbitos. Valeu-se ainda da pesquisa dida como processo de formação da perso-
bibliográfica, mediante consultas a estudos já nalidade do homem para a vida e trabalho na
publicados, com o intuito de também proce- sociedade, na medida que se torna um supor-
der a uma abordagem sobre atual cenário da te na efetivação do homem na intervenção e
educação moçambicana. A pesquisa foi o re- transformação do mundo, isto é:
sultado do trabalho desenvolvido, pelo autor,
durante o curso de mestrado. a escola unitária (...) deveria assu-
mir a tarefa de inserir os jovens na
ConCepção relaCIonal entre atividade social, depois de tê-los
eduCação e trabalho elevados a um certo grau de ma-
turidade e capacidade para criação
Em contexto do mundo capitalista mar- intelectual e prática e a uma certa
cado pela revolução tecnológica acelerada, autonomia na orientação e na inicia-
em que a força do trabalho é uma mercado- tiva (GRAMSCI, 2004, p. 36).
ria, cujo preço depende cada vez mais de ha-
bilidades adquiridas nos bancos escolares, os Assim sendo, há uma necessidade de
trabalhadores encaram a educação como a distinguir educação técnica e tecnicista. Isto é,
senha necessária para ingresso e permanên- educação técnica refere-se aos processos de
cia no emprego. A escola continua a ser vista manipulação do mundo material; e a educação
como a porta de entrada para o mundo do tecnicista por sua vez enfatiza a predominân-
trabalho e condição para a sobrevivência. cia da mecanicidade dos mesmos. Entretanto,
A educação e trabalho fazem parte da educação como a prática técnica é trabalho por
mesma dimensão e podemos inferir como seus procedimentos burocráticos e também
uma dimensão humana, ou seja, essas duas por sua dinâmica. Errôneo pensar educação
categorias dizem respeito somente ao ser do distinto do trabalho, pois, a educação aumen-
homem. Segundo Karl Marx (1964), trabalho ta a produtividade e produz o conhecimento
manual (prática) e trabalho intelectual (teo- técnico exigido pelo acelerado crescimento
ria) deveriam associar-se, ou seja, combinação econômico no mundo de trabalho.
entre o trabalho produtivo e a educação (po- Portanto, na concepção da educação
litécnica), considerando que a primeira finali- prática, a escola procura valorizar as ações
dade da vida é a manutenção e a reprodução didáticas e a mesma tem maior probabilidade
de si mesma. Desse modo, Gramsci (2004) in- de proporcionar ao educando apropriados
troduz o conceito da escola unitária, que pro- métodos para o aprendizado e, aos professo-
cura salvaguardar a relação entre o trabalho res, a possibilidade do desenvolvimento das
manual e trabalho intelectual, ou seja: competências necessárias para implementar
as ações requeridas. Na mesma ordem de
A crise terá uma solução que, racio- ideia, Gramsci (2004) salienta que devemos
nalmente, deveria seguir esta linha: conceber o trabalho como um princípio edu-
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cativo, ou seja, o estudo é também trabalho quando da realização do Seminário Nacional
e muito cansativo (GRAMSCI, 2004). E tendo do Ensino Técnico, e, segundo Pinto (2012),
em conta que o trabalho humaniza o homem. era um cenário de uma rede escolar reduzida.
No contexto moçambicano, a relação Havia insuficiente aparelhamento das institui-
da educação e mundo de trabalho é marca- ções em material oficinal e instrumentaliza-
da por um certo desnivelamento, ou seja, ção de laboratórios, além de falta de pessoal
“nota-se um desfasamento entre as mudan- docente e de técnicos habilitados, decorren-
ças que ocorrem no mundo do trabalho e a tes da saída dos portugueses.
o perfil do trabalhador ingresso nas Institui- Esses cenários do Ensino Técnico tam-
ções da educação moçambicana” (GONÇAL- bém verificaram-se depois da independência,
VES, 2015, p. 8). E, segundo o mesmo autor, como procura ilustrar Pinto:
um dos problemas desse desnivelamento
entre educação e mundo de trabalho, no sis- Mesmo depois da independência,
tema educacional moçambicano, é a falta de verifica-se dispersão da responsa-
escolas técnicas vocacionais e profissionais bilidade, da direção e administração
de educação terciária, o que se traduz no das áreas de formação e educação,
pouco número de trabalhadores com uma assim como desarticulação e fraca
qualificação profissional que esteja em con- interligação entre várias estruturas
sonância com as mudanças no mundo do tra- educacionais. Os princípios e os
balho exigidas pelos empregadores. objectivos gerais eram diversos,
não existia um perfil profissional, as
polítICas naCIonaIs do ensIno ações realizadas não obedeciam a
téCnICo-profIssIonal em moçambIque um plano único de formação de força
de trabalho qualificada, não existia
A missão das EP é qualificar profis- normas e princípios de equivalência,
sionalmente adolescentes e jovens continuidade de estudos, diplomas e
moçambicanos como núcleo de regulamentação diversa (SNE, 1985
uma estratégia de desenvolvimen- apud PINTO, 2012, p. 5).
to sócio-económico nacional que
requer e repousa, em boa parte, Um dos objetivos e prioridades do Go-
na existência de uma mão-de-obra verno Moçambicano (o programa quinquenal
competente e apta a evoluir nos para o período 1995-1999) é a redução dos ní-
mais variados contextos profis- veis de pobreza absoluta e melhoria de vida
sionais e laborais. (Artigo noo1 do de sua população Educação, concretamente
Regulamento das Escolas Profissio- educação técnica, era a saída para se alcançar
nais de Moçambique de 2003). este objetivo. Com a aprovação da Política
Nacional de Educação (PNE), em 1995, surge a
O ETP em Moçambique foi criado ainda necessidade de traduzir as intenções políticas
no tempo colonial, ou seja, a lei colonial no para um quadro de ações e transformações
2025, de 19 de julho de 1947, já vinha a reger o por meio de um Plano Estratégico. E é a partir
ensino técnico-profissional. E em 1948, criou-se disso que surgiu o primeiro Plano Estratégico
a Direção Geral do Ensino Técnico Profissional de Educação 1999-2003 (PEE I), o qual tinha
(decreto lei no 37.028, de 25/08//48), que tinha como lema “Combater a Exclusão, Renovar a
como função conduzir o ensino agrícola, indus- Escola”. Caracterizou-se como sendo um pla-
trial e comercial (PINTO, 2012). no centrado em prioridades, com opções limi-
Entretanto, nessa ordem de ideia, no tadas, que se apoiou nos três pilares definidos
ano de 1975, surge, em Moçambique, o pri- pela Política Nacional de Educação, quais se-
meiro debate sobre o Ensino técnico, isto jam: aumento do acesso e equidade; melhoria
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da qualidade e relevância do ensino; reforço nais, relevantes, que preparem os indivíduos
da capacidade institucional do Ministério da para o mundo de mercado e para a vida, que
Educação. O Plano Estratégico de Educação contribua para o Desenvolvimento dos Recur-
(PEE) propõe três principais objetivos para sos Humanos de Moçambique e com um sis-
o sistema educativo: aumentar o acesso às tema de Avaliação e Certificação. E segundo
oportunidades educativas para todos os mo- Pinto (2010), os objetivos estratégicos vão ao
çambicanos e em todos os níveis do sistema; encontro aos do Plano Estratégico da Educa-
manter e melhorar a qualidade da educação, ção 2012-2016 (PEE III).
e por último desenvolver um quadro institu- Neste caso, realiza-se o segundo semi-
cional e financeiro que possa, no futuro, sus- nário Nacional do Ensino Técnico-Profissional,
tentar as escolas e os alunos (PLANO ESTRA- isto entre os dias 24 a 28 de maio de 2004, o
TÉGICO DE EDUCAÇÃO 1999-2003, 1998). mesmo tinha como objetivo de avançar na
Ainda no mesmo ano de 2005, surge implementação da Estratégia do ETP (2002-
outra mudança. Houve extinção dos Ministé- 2011). E que se pretendia lançar um debate
rios da Educação e da Cultura e foi criado o estratégico sobre a reforma do Ensino Técni-
Ministério da Educação e Cultura, mantendo co-Profissional e conhecer possíveis opções
na sua gênese a estrutura Direção Nacional de para essa mesma reforma. Daqui resultou a
Educação Técnico-Profissional e Vocacional discussão de uma nova visão mais abrangente
(DINET). Por sua vez, a DINET teve a res- do ETP e Formação Profissional, de uma busca
ponsabilidade de elaborar o segundo Plano de consenso sobre a reforma do sistema de
Estratégico da Educação 2005/2009 (PEE II), ETP entre as entidades envolvidas (PINTO,
que tinha como objetivo redução da pobreza 2010). Posteriormente, iremos discutir sobre
absoluta; assegurar a justiça e a equidade do esta reforma do ETP.
gênero e a luta contra a propagação do HIV/ De acordo com a Política Nacional de
SIDA e a mitigação do seu impacto. Educação e Estratégias de Implementação,
Como parte integrante do PEE I e do promulgada pelo Conselho de Ministros da
Plano de Ação para a Redução da Pobreza República de Moçambique (Resolução nº
Absoluta (2001-2005), a estratégia do Ensino 8/95, de 22 de agosto de 1995), o Ensino Técni-
Técnico-Profissional em Moçambique (2002- co tem a responsabilidade de formar os ope-
2011), “Mais técnicos, novas profissões, me- rários e técnicos necessários devidamente
lhor qualidade”, identifica as opções e ações qualificados, para responder às necessidades
prioritárias a serem implementadas visando de mão de obra qualificada para os diferentes
ajustar o ETP aos desafios do desenvolvimento setores econômicos e sociais do país.
econômico de Moçambique. Nessa ordem de ideia e perante a Resolu-
Assim, esse documento destaca que o ção nº 8/95, de 22 de agosto de 1995, esse ensi-
ETP tem como missão garantir aos cidadãos no encontra-se subdividido em três níveis: En-
o acesso a uma formação científico-técnica al- sino Técnico Elementar (ETE), Ensino Técnico
tamente qualificada, para responder às neces- Básico (ETB) e o Ensino Técnico Médio (ETM).
sidades do desenvolvimento econômico e so- O ETE faz-se após a conclusão do 1º Grau do En-
cial. Diz também que esse ensino técnico tem sino Primário Geral ou para adultos, inclui disci-
como visão a transformação num subsistema plinas de formação geral e técnica, conferindo
mais flexível, articulado, inovador, dinâmico, um nível escolar correspondente ao Ensino Pri-
autônomo e sustentável, reconhecido, valori- mário Geral ou para adultos.
zado, comparticipado por todos os parceiros Ao contrário do antigos Planos (PEE I e
sociais, com capacidade de adaptação e com PEE II), o Plano Estratégico da Educação 2012-
respostas às mudanças, acessível a todos, 2016 subdivide-se em dois níveis: o nível básico
com oferta de programas de formação flexí- e nível médio, cada um com duração de três
veis, que promovam competências profissio- anos. Assim está expresso no PEE (2012-2016):
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O Ensino Técnico-Profissional estru- Ensino Técnico-Profissional. Este ní-
tura-se neste momento em dois ní- vel de educação não é gratuito, ha-
veis: o nível básico e o nível médio, vendo cobrança de propinas. O En-
ambos com a duração de três anos, sino Técnico-Profissional está numa
e é organizado por ramos: comer- fase de reforma, com enfoque na
cial, industrial e agrícola. O critério introdução de um sistema educa-
mínimo de ingresso é a conclusão tivo modular, seja ao nível básico,
da 7ª classe para o nível básico, e, seja ao nível médio, que vai resultar
para o nível médio, a conclusão da em diferentes tipos de certificados
10a classe do Ensino Secundário Ge- (PLANO ESTRATÉGICO DA EDUCA-
ral ou do 3o ano do nível básico do ÇÃO, 2012-2016, p. 14).
1 Nesta coluna os dados surgem acumulados, uma vez que houve escolas que seguiram o novo modelo curricular e
pedagógico sem que se tivesse ainda verificados a sua institucionalização.
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Salienta-se que o ensino técnico é ca- A Educação Profissional inclui o
racterizado e diferenciado dos outros subsis- ETP, sob tutela do MINED e lidera-
temas do ensino pela sua função social de: do pela DINET, e abrange os níveis
básico (após a 7a classe) e médio
a) Assegurar a formação integral dos (após a 10a classe). Os provedores
jovens e trabalhadores preparando- deste tipo de ensino são públicos
-os para o exercício de uma profissão e privados. A Educação Profissional
numa especialidade, mas sempre inclui também a Formação Profis-
dentro das exigências qualitativas sional de curta duração, em primei-
e quantitativas da planificação e do ro lugar sob tutela do Ministério de
desenvolvimento da economia e da Trabalho e liderada pelo INEFP. Os
sociedade; b) Pela ênfase na forma- seus provedores são públicos e pri-
ção profissional que consiste em dar vados. (PLANO ESTRATEGICO DA
aos jovens e trabalhadores uma es- EDUCAÇÃO, 2012-2016, p. 90).
pecialidade e desenvolvendo neles
capacidades e hábitos profissionais; Por sua vez, oEnsino Técnico Médio faz-
c) Associar o conhecimento técnico -se após a conclusão do 2º nível dos subsiste-
às experiências práticas e à busca de mas de Educação Geral, de Educação de Adul-
soluções técnicas e tecnológicas; d) tos ou de Educação Técnico-Profissional, com
Vincular as escolas técnicas e institu- duração de dois a quatro anos, concedendo
tos com os sectores produtivos; e) um nível escolar equivalente ao 3º nível do
Pelo carácter terminal da formação subsistema de educação Geral e oportunizan-
(a formação geral e básica confina- do o ingresso no Subsistema de Educação Su-
-se às exigências da educação técni- perior ou no nível Superior do Subsistema de
co-profissional, sem perderem a sua Formação de Professores (AFRIMAP; 2012).
estrutura e solidez científicas; os gra- Com a guerra de década 80, entre o Go-
duados de cada nível incorporam-se verno de Moçambique e a Renamo,1 que de-
prioritariamente nos serviços e na sestabilizou o país fez que a economia ficasse
produção; o prosseguimento dos es- estagnada e houve também muita saída dos
tudos sem abandonar o exercício da técnicos qualificados para outros países, dei-
profissão) (AFRIMAP, 2012, p. 117). xando o Ensino Técnico com grandes proble-
mas. Na mesma discussão, Macamo (2015) diz
O ingresso no Ensino Técnico Básico o seguinte:
(ETB) tem como requisito a conclusão do A introdução de novas qualifi-
Ensino Primário Geral ou para adultos ou do cações, do ensino baseado em
Ensino Elementar Técnico-Profissional, com a competências no ensino técnico-
duração de dois a quatro anos, conferindo um -profissional, a forte ligação deste
nível escolar correspondente ao 2º nível do subsistema com o sector produtivo,
Subsistema de Educação Geral e permitindo o desenho e implementação de um
o ingresso ao 3º nível de qualquer dos sub- sistema de garantia de qualidade
sistemas do Sistema Nacional de Educação e para as novas qualificações, são
Médio (ETM) com as especializações do co- ações importantes resgatadas para
mércio, indústria e agricultura, saúde e pesca. tornar o ensino mais credível. O
Esse subsistema tem como população alvo: sucesso na implementação de um
os jovens em idade escolar e pré-laboral. Na novo sistema de educação baseado
mesma ordem de ideia, o Plano Estratégico da em competências pode confirmar
Educação 2012/2016 vem salientar o seguinte: a assunção de que, no mercado de
1
Resistência Nacional de Moçambique
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trabalho, são igualmente importan- Na tentativa de dar resposta aos desa-
tes os conhecimentos, as habilida- fios da competitividade de Moçambique, to-
des e a atitude dos profissionais, ou mando também em consideração o processo
seja, os vários saberes (saber, saber de integração regional na Comunidade para
fazer, e saber ser e estar). o Desenvolvimento da África Austral (SADC),
o governo, por meio do Ministério da Educa-
Por outro lado, o desenho curricular ção, iniciou, em 2006, a Reforma da Educação
baseado em competências permite, Profissional (REP). O objetivo dessa reforma
também, que os estudantes obte- é de instruir cidadãos profissionalmente com-
nham retorno imediato sobre o que petentes, de modo a desenvolver uma econo-
estão efetivamente a aprender e mia competitiva.
percebam, com mais clareza, a im- Como havia já referido, que em 2006 o
portância destas competências para Ministério da Educação iniciou a REP, com o
a sua vida pessoal e profissional. O lema: “Educação para o trabalho, Competên-
ensino baseado em competências, cia para a Produção, Desenvolvimento para o
por ser normalmente mais dispen- País”, em que sua implementação está em um
dioso do que o ensino baseado em período compreendido de quinze anos (2006
objetivos de aprendizagem, trouxe – 2020). Portanto, a REP é um plano que se
um desafio adicional para as escolas, comporta em três fases, nomeadamente:
que é o desafio da sustentabilidade. a) A fase piloto, isto compreendido no
Esta sustentabilidade pode ser período entre 2006 a 2011;
alavancada pela oferta de serviços b) A fase de expansão, que foi até o final
ao mercado, o que tem um triplo do ano de 2016;
papel: por um lado, forçar a escola c) A fase de consolidação, que vai até
a transformar-se num centro 2020.
produtivo, condição necessária para Não obstante, que o PIREP,2 sendo uma
um provedor de ensino baseado estratégia de Reforma da Educação da ETP,
em competência; por outro, gerar assenta em quatro grandes componentes:
receitas para a escola e, ainda,
permitir testar a relevância das I. Reforma do Sistema e Desenvol-
competências através da oferta de vimento Institucional (incluindo o
serviços ao mercado, que assentam estabelecimento de um Conselho
nessas mesmas competências (MA- Nacional para a Formação (CNF) e
CAMO, 2015, p. 28). sistemas sustentáveis para o finan-
ciamento e gestão da ETP; o CNF
Contudo, há que ter em conta que a edu- criará um quadro para assegurar o
cação profissional ancorada em competências envolvimento de ONGs, instituições
e de qualidade implica uma série de mudanças do sector público e privado, bem
e de investimentos radicais em relação à situa- como dos empregadores e sindica-
ção atual deste subsistema de educação. Essa tos, na reforma);
reforma requer grandes investimentos, tendo II. Desenvolvimento de um siste-
em conta que a situação orçamental do país é ma da ETP baseado em padrões de
de dependência externa, pelo menos em 50% competência, incluindo a avaliação
do seu orçamento total. Esse fator alia-se ao e certificação;
fato de o Governo não disponibilizar de meios
para investir num tipo de educação adequada
2
O Programa Integrado de Reforma da Educação
Profissional (PIREP) constitui a fase piloto e tem como
para o seu povo. Ficando a critério dos investi- lema: “Educação para o trabalho, competências para
dores externos o poder de imposição. a produção, desenvolvimento para o país”.
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III. Melhoria da qualidade, por via gião Austral, os graduados da edu-
da formação de professores, do for- cação profissional moçambicanos
necimento de materiais de ensino de Mavago têm de competir, em
adequados, equipamento e infra- pé de igualdade, pelos postos de
estruturas físicas, o estabelecimen- trabalho não só com os graduados
to de serviços de orientação dos da Cidade de Maputo mas também
alunos e reforço da capacidade de com os graduados do Botswana,
gestão das instituições da ETP (as- África do Sul, China ou de qualquer
sim como a capacidade de planear outro país do mundo. Só assim po-
e gerir o impacto do HIV/SIDA nos deremos desenvolver o país de for-
professores e alunos); ma sustentável e quebrar, de uma
IV. Criação de um fundo para o vez por todas, o ciclo da pobreza
desenvolvimento de capacidades através da criação de emprego, in-
(FUNDEC) para estimular a emer- cremento da atividade produtiva
gência de programas de formação e inovação, bem como da criação
inovadores e de alta qualidade. da riqueza para o bem-estar dos
(PLANO ESTRATÉGICO DE EDUCA- moçambicanos (BROUWER e BRI-
ÇÃO E CULTURA, 2006/11, p. 41). TO, 2010, p.12).
Assim sendo, “tendo a REP sido um pro- Por sua vez, Pinto (2010) vem salientar
cesso de consulta e parceria com os represen- que a filosofia do PIREP aponta para a trans-
tantes do sector produtivo, das organizações formação da provisão do (ETP) num sistema
sindicais, da sociedade civil e parceiros inter- orientado pela procura, construído num qua-
nacionais várias questões se podem colocar e dro de formação modular com cursos ancora-
têm sido colocados” (PINTO, 2012, p. 10). dos em padrões de competência e firme num
Para a execução da REP foram criadas Sistema Nacional de Padrões, o qual deverá
as seguintes estruturas: CIREP – Comissão ser reconhecido pelos empregadores e pela
Interministerial da Reforma da Educação Pro- sociedade civil. Para isso, destaca-se entre
fissional, com funções de orientação política seus objetivos o estabelecimento de um sis-
e presidida pelo primeiro-ministro; COREP – tema de educação profissional integrado,
Comissão Executiva da Reforma da Educação coerente, flexível e orientado para a procura
Profissional, multissetorial, de competências do mercado de trabalho, e que contará com
executivas e deliberativa; UI – Unidade de o envolvimento de todos os parceiros sociais.
Implementação, principal órgão de execução A fim de garantir qualidade na reforma,
das políticas, e – Grupo de Aconselhamento, o setor produtivo deve assumir a liderança na
que tem competências consultivas de apoio definição e aprovação de unidades de com-
técnico e interação ao nível da UI e que inte- petências, das qualificações e programas,
gra os parceiros da cooperação e as agências oferecer experiências no local de trabalho e
doadoras (PINTO, 2012, p.137). estágios para os estudantes, apoiar na ava-
Nesta mesma senda, a REP é uma tenta- liação externa dos estudantes e desenvolver
tiva de dar resposta aos desafios da compe- parcerias com os provedores de formação, ou
titividade de Moçambique, tomando também por outra:
em consideração o processo de integração re-
gional na SADC. Ainda na mesma perspectiva, Nas parcerias com o setor produti-
Brouwer e Brito (2010) salientam o seguinte: vo a reforma propõe que as novas
qualificações estejam de acordo
Num mundo cada vez mais global e com os requisitos da indústria, se-
com o país melhor integrado na Re- jam baseadas em padrões de ocupa-
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ção da indústria que definem com- Mas de acordo com o Plano Estratégico
petências e em unidades contendo a Educação, 2012-2016, os objetivos do Ensino
elementos de competência, desen- Técnico-Profissional trazem consigo novas
volvidas em módulos de aprendiza- ideias, que são:
gem (módulos vocacionais, eletivos
e de competências genéricas) que a) Uma resposta diversificada à
compõem uma qualificação que demanda dos sectores económi-
permita flexibilidade na lecionação, cos prioritários e emergentes; b) A
dê crédito à aprendizagem anterior expansão do subsistema ETP, en-
do estudante, permita a acumula- tendida como resposta crucial do
ção de crédito de módulos conclu- Governo á redução da pobreza e ao
ídos que sejam avaliados de acordo aumento de oportunidade de traba-
com as unidades nacionais de com- lho, no sector formal e informal da
petência, que possua medidas de economia (PLANO ESTRATÉGICO A
garantia de qualidade para validar EDUCAÇÃO, 2012-2016, p. 12)
as unidades de competência e o seu
grau de alcance, se ajuste ao novo avanços do ensIno téCnICo-
Quadro Nacional de Qualificações profIssIonal em moçambIque
Profissionais e que desenvolva uma
forte parceria entre o setor produti- Apesar de alguns recuos em determi-
vo e a educação (PIREP, 2008, apud nados aspectos, podemos considerar que o
PINTO, 2012, p. 139). ETP tem evoluído bastante nestes últimos
anos. Desde 2012, houve progresso, conside-
objetIvos do ensIno téCnICo- rando o aspecto da taxa de aproveitamento
profIssIonal emmoçambIque dos institutos médios. Também houve evolu-
ção no que diz respeito à implementação das
De acordo com a Política Nacional de ações prioritárias que vêm emanando nos
Educação e Estratégias de Implementação, planos estratégicos, expansão da formação
promulgada pelo Conselho de Ministros da Re- ancorada em competências, a formação e
pública de Moçambique (Resolução nº 8/95 de capacitação dos professores, equipamento
22 de agosto de 1995), os seguintes objetivos das novas instituições, e por último a recen-
são previsto para o Ensino Técnico-Profissional: te aprovação do pacote legislativo da Edu-
cação Profissional pelo Conselho de Minis-
Assegurar a formação integral e tros, como ilustram os quadros 2 e 3. Há de
técnica dos jovens em idade esco- salientar-se, também, a falta do pessoal téc-
lar, de modo a prepará-los para o nico em todos os níveis do subsistema para
exercício de uma profissão; b) De- melhor responder aos desafios da Reforma
senvolver nos jovens as qualidades da Educação Profissional (DESEMPENHO DO
básicas de personalidade, em par- SECTOR DA EDUCAÇÃO, 2013).
ticular, educando-os a assumir uma De acordo com o Plano de Educação, o
atitude correta perante o trabalho; número de alunos do Ensino Técnico-Profis-
c) Desenvolver capacidades de sional cresceu numa média de 25%, isto entre
análise e síntese, de investigação e os anos de 2012 e 2014. Esse progresso foi no-
inovação, de organização e direção tório devido à política de transformação das
científica do trabalho; d) Desenvol- escolas básicas em escolas de nível médio e
ver conhecimentos sobre a saúde e profissionais, além da implantação de seis no-
nutrição e a proteção do ambiente vas escolas, conforme registros constantes
(MOÇAMBIQUE, 1995, p. 182). nos quadros 4 e 5, que estão adiante no texto.
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Nessa mesma senda, é de referir que no Escolas Profissionais. Foram ainda
campo contratação, formação e capacitação capacitados professores em exercí-
de professores houve melhorias, ou seja: cio na Alemanha (24), e realizou-se
a capacitação pedagógica dos pro-
Em 2013 houve progressos na im- fessores dos ramos agrários, indus-
plementação da estratégia de trial e comercial, bem como a capa-
recrutamento, formação e capa- citação na área tecnológica. Ainda,
citação dos professores para o receberam capacitação em CBT em
ETP. Foram recrutados 152 novos 2013 o que cumulativamente eleva
docentes (...). Iniciou a formação o número de professores que rece-
de professores do Certificado B em beram formação no uso das novas
parceria com a Itália e, no âmbito metodologias de ensino para mais
da parceria com Portugal, foram de 1.000 (DESEMPENHO DO SEC-
formados 19 professores para as TOR DA EDUCAÇÃO, 2013, p. 42).
0%
Noturno 1.731 5.626 31% 1.181 4.152 28% -26% 959 3.320 -20%
Básico Público
27%
Diurno 102 213 48% 148 389 38% 83% 155 344 -12%
Noturno 6 49 12% 5 50 10% 2% 33% -100%
Privado
Outros Diurno 22 90 24% 48 177 27% 97% 39 144 35% -19%
Públicos 30%
Total 7.554 22.364 34% 6.633 19.735 34% -12% 5.879 17.927 55% -9%
Diurno 1.803 6.258 29% 2.015 6.406 31% 2% 2.801 8.047 26%
Noturno 1.384 4.092 34% 1.390 4.274 33% 4% 1.450 4.759 47% 11%
Médio Público
Diurno 1.449 2.830 51% 1.093 2.120 52% -25% 1.793 3.247 38% 53%
Noturno 362 733 49% 343 698 49% -5% 398 850 22%
Privado
Total 4.998 13.913 36% 4.841 13.49836% 36% -3% 6442 16.903 25%
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Quadro 3: Progresso do Ensino Técnico-Profissional
Objetivos Estratégicos Indicador de Resultado Base 2011 Valor observado Meta 2013 Avaliação
2013
2012
Aumentar o Número de jovem e Escola 7.662 7871 9.496 2.675 Atingida
acesso e a retenção adultos no sistema profissionais
no ETP, prestando Escolas 22.364 19735 17.927 23.410 Atingida
particular atenção Básicas
às disparidades
Instituto 13.913 13498 16.903 13384 Atingida
geográficas e de
Médios
gênero
Cursos não 1.000 1954 3250 2.600 Atingida
Formais de (previsão
Curta duração 2011)
Garantir que os Taxa de aproveita- Escola 75,7% 75% 68,8% 79% Não
graduados do mento por profissionais atingida
ETP tenham uma cada nível e sistema Escolas 63,3% 53% 53,0% 67,0% Não
Formação de de ensino Básicas atingida
qualidade e
Instituições 73,2% 72% 76,3% 77% Não
relevante para
de nível Atingida
o mercado formal
médio com
e informal
progresso
Melhorar a gestão Número de escolas que
Coordenação do Implementam instrumentos de
Sistema, gestão de qualidade
Envolvendo o 5 14 19 19 Atingida
Sector produtivo
de forma
particular
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os desafIos do ensIno téCnICo (saber e geral, e a ligação entre os empre-
fazer) em moçambIque gadores e as IEP. Unificar o sistema
de educação para emprego com o
sistema de ensino técnico assim
O Ensino Técnico-Profissional pre- como a educação não-formal (que
para os alunos para a transição da abrange a maioria dos profissionais
escola para o mundo de trabalho, moçambicanos), através da imple-
através do desenvolvimento de mentação do QNQP e seus sistemas
conhecimentos e de competências associados. E por ultimo descen-
para um desempenho adequado tralização da gestão do sistema de
nas várias profissões. O desenvolvi- educação para que ele seja mais efi-
mento vertente é crucial para uma ciente e responda às necessidades
economia em crescimento, que so- locais, reforçando as funções e atri-
licita competências cada vez mais buições de IEP no que diz respeito
complexas e especializadas. Isto im- à gestão de todo o processo de en-
plica a criação de um de qualidade, sino/aprendizagem, contactos com
que responda com graduados com- os empregadores para estágios,
petentes e suficientes às diversas mobilização de fundos (BROUWER,
necessidades do sector produtivo” BRITO, 2010, p. 285).
(PLANO ESTRATÉGICO DA EDUCA-
ÇÃO, 2012-2016, p. 90). Outro fator que torna a ETP menos efi-
ciente é o fato de os seus graduados terem
reduzido a possibilidade de empregabilidade,
O problema central do ETP está no fato por isso muitos deles recorrem ao autoempre-
de não possuir um subsistema que reúna as go, o que é agravado pelas fraca qualificação
condições necessárias para satisfazer, quali- dos instrutores, pois os melhores instrutores
tativa e quantitativamente, as necessidades acabam por abandonar o ensino em troca de
atuais e futuras do mercado de trabalho for- emprego melhor remunerado.
mal e informal (PINTO, 2010). No que se refere aos custos por aluno,
Segundo Brouwer e Brito (2010), o Ensino a ETP possui um custo relativamente alto, 2,5
Técnico tem enormes desafios, por exemplo: vezes superior ao custo por aluno numa ins-
tituição do ensino secundário geral. Porém,
criação um órgão regulador forte um dos fatores fundamentais para o sucesso
para o sistema da educação profis- deste subsistema de ensino é a qualificação e
sional o mais rápido possível por competência técnica do professor, o que ele-
forma a implementar o Quadro va os custos por aluno.
Nacional de Qualificações Profis- Podemos dizer que um dos grandes de-
sionais (QNQP) e os mecanismos safios de momento é encontrar uma forma
de garantia de qualidade que vão que garanta, por um lado, a integridade do sis-
trazer a credibilidade desejada pelo tema; por outro, criando a flexibilidade neces-
sistema conjugado com envolvi- sária mediante o estabelecimento de um siste-
mento formal dos empregadores ma de financiamento e seriedade adequado.
na estrutura de governação dos ins- Tomando em conta que o ensino primário, em
tituto do ensino profissional (IEP), nível das autarquias, deve ser assumido como
como já acontece nos instituto su- responsabilidade dos Conselhos Municipais,
perior profissional (ISP). Melhorar esta oportunidade pode ajudar a alavancar a
a articulação com o ensino superior reconfiguração que se pretende no sistema
(MACAMO, 2015).
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Outro desafio é que Ensino Técnico deve suas famílias, da escola e da comunidade em
promover a coesão entre a instituição educa- geral (PINTO, 2012).
tiva (escolar ou comunidade escolar) e o meio Em razão disso, pode-se concluir que o
envolvente (comunidade geral) onde esta se setor de educação, sobretudo a este nível,
encontra inserida. Para que isso ocorra, é im- possui grandes desafios, desde a construção
prescindível a articulação de esforços para de- e reabilitação de infraestruturas até a forma-
finir o sentido da ação educativa e satisfazer ção do corpo docente.
os anseios e as necessidades dos alunos, das
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Entretanto, existe um desajustamento Ainda nessa mesma discussão, Pinto
entre a procura e a oferta de profissionais (2010) diz que vários cenários ou projetos es-
em termos de níveis, como em termos de tão a ser estudados, por exemplo aproveitar
competências e conhecimento. Registra-se as instituições de ETP do nível médio, pelo
falta de professores com a formação ade- menos uma em cada região principal do país,
quada para atuação nos domínios das disci- para a formação inicial de professores ou acei-
plinas técnicas e profissionais, insuficiência tar proposta da Comunidade Salesiana em
que compromete também a possibilidade de Moçambique que se propõe a construir um
realizar outras ofertas de qualificação profis- campus de formação de professores. Isto é:
sional, como cursos de curta duração. E isto
tem levado muitos professores a assegurar Como no Ensino Técnico é impor-
simultaneamente disciplinas da formação tante que o corpo docente seja
técnica e geral. Ou seja, sendo, o sistema de constituído, na sua maioria, por téc-
educação técnico-profissional, que é respon- nicos com formação e experiência
sável pela moldagem do perfil de habilidades profissional, procura-se desenvol-
exigidas no mercado de emprego, foi lento ver mecanismos que favoreçam o
na resposta às demandas de mudança de recrutamento de docentes a partir
mercado no setor formal. As pesquisas sobre das empresas, como medida de
o emprego e estudos de mercado de traba- emergência para combater a falta
lho nas empresas do setor formal mostram de formação de professores para o
que há uma ligação inadequada entre a ca- ETP. Prevê-se organizar cursos de
pacidade humana disponível e as crescentes formação inicial com o objectivo de
necessidades do mercado de emprego, que conferir conhecimentos nos domí-
requer trabalhadores mais qualificados (DI- nios psicopedagógicos e metodolo-
NET/COREP, 2008). gias de ensino (PINTO, 2010, p. 11).
Outro desafio é o recrutamento de
professores sem a formação pedagógica, ou Entretanto, deve haver maior investi-
seja, “a prática tem sido de recrutamento mento por parte das direções provinciais na
de professores jovens, recém-saídos do en- oferta de estruturas e possibilidade no com-
sino técnico, sem a formação e experiência ponente de formação pedagógica.
pedagógica, tendo as direções províncias ar- De acordo com o quadro 6, ainda te-
gumentado que procuram selecionar os que mos grande déficit de pessoal docente com
se revelaram como os melhores estudantes a formação Psicopedagógica. Destaca-se que
no ensino técnico” (CASTRO e MACHADO, é importante incluir essa formação na matriz
2011, p. 38). E segundo Pinto (2010), dentro curricular dos cursos técnicos, isto tendo em
do quadro do pessoal docente, em 2000 conta que os alunos que neles se formam têm
somente 13,8% dos docentes tinham forma- sido recrutados para dar aulas não somente
ção superior e 65,55% possuíam formação nas EP, como também nas escolas de forma-
psicopedagógica. Isso tendo em conta que, ção geral do país.
atualmente para o ETP, não existe qualquer Nessa mesma senda, podemos inferir
sistema de capacitação para os professores que a formação de professores, a par da in-
e gestores, pois desapareceram os Institutos vestigação e desenvolvimento curricular,
Pedagógicos para a sua formação especiali- deve ser um dos pontos centrais do governo,
zada, nos princípios da década de 90. Desde pois sem eles não é possível transformar a
então, a formação de professores para o ETP escola e muito menos ter a educação como
permanece estagnada. a alavanca da transformação que se precisa
para construção de sociedades sustentáveis,
como a moçambicana. (MACAMO, 2015).
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Quadro 6: Perfil docente face à formação psicopedagógica no ano de 2011
EP. Massinga 14 20 34
EP. Montepuez 13 18 31
EP. Mangunde 5 8 13
EP. Mariri 3 8 11
EP. Chimoio 20 26 46
EP. Ocua 14 2 16
EP. Caia 7 4 11
Fonte:(CASTRO e MACHADO, 2011: p. 38) Sd = Sem dados.
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e não jovens cidadãos construtores do seu tivo e nos desafios. É fundamental para a so-
futuro, uma realidade em aberto ao longo brevivência de toda a comunidade.
da vida. Apesar das mesmas escolas do Ensi- Ainda na mesma senda, é preciso não
no Técnico possuírem um percurso próprio colocar de lado reafirmação da participação
e uma relativa autonomia que lhes permite do setor produtivo como condição essencial
construírem uma cultura própria. para a implementação da Reforma da
Assim sendo, persistência de Ensino Téc- Educação Profissional, de modo a qualificar
nico-Profissional parece uma medida política mão de obra alinhada com as necessidades do
(empregabilidade) do que responder ao insu- mercado de trabalho, e por outro, identificar
cesso escolar ou à crise da nossa educação. os níveis, canais e procedimentos de concreti-
Pois, atualmente, o governo moçambicano zação das parcerias entre a Educação Profis-
está preocupado com a escassez de mão de sional e o Setor Empresarial.
obra especializada para satisfazer a demanda É preciso fortificar áreas de oferta de
dos grandes projetos envolvidos na explora- formação, pois vai facilitar e facultar uma
ção de recursos minerais, sobretudo gás natu- especialização terminal e obtenção de um
ral e carvão mineral na região Norte do país, primeiro emprego, mas isso não implica,
portanto, a persistência na formação Técnico- como havíamos referido, afunilar demasiado
-Profissional é uma das saídas para colmatar os domínios de formação que se oferece aos
esse déficit. adolescentes. E para melhor viabilizar esse
Nesse novo contexto do Ensino Técni- projeto ou ideia de especificações terminais,
co Profissional, é preciso com muita urgên- deve-se criar uma organização curricular.
cia revitalizar esse mesmo ensino, mas isso Como diz Brouwer e Brito (2010), é necessário
passa necessariamente pela capacitação dos que o Ensino Técnico-Profissional recupere o
diretores, introdução de cursos com organi- prestígio e a credibilidade, de forma que a so-
zação modular, criação de novo modelo de ciedade veja, nesta formação, uma alternativa
administração, de organização e Gestão do viável ao Ensino Geral. A introdução de novas
Ensino Técnico-Profissional. Também pelo qualificações, do ensino ancorado em compe-
melhoramento do sistema de orçamento e tências no Ensino Técnico-Profissional, a forte
revisão curricular dos cursos do Ensino Médio ligação desse subsistema com o setor produ-
dos vários ramos, novos Institutos Médios e tivo e o desenho e implementação de um sis-
cursos de nível médio introduzidos em esco- tema de garantia de qualidade para as novas
las de nível Básico, reativação e ampliação da qualificações, são ações importantes para se
rede de Escolas Elementares, reabilitações de resgatar essa credibilidade.
infraestruturas e reequipamentos de algumas Por último, temos de advogar a impor-
Escolas Técnicas e várias parcerias entre Esco- tância de estágios profissionais, e os mesmos
las, Institutos Técnicos e empresas. devem ser devidamente acompanhados pela
Podemos inferir que as escolas técni- escola, ou seja, as escolas devem criar con-
cas, sendo parte integrante da comunidade e dições de parcerias com outras instituições,
no meio onde estão inseridas, a comunidade a fim de garantir aos alunos a realização de
deve intervir na vida escolar, isto apoiando na estágios, possibilitar que os alunos realizem
organização e na procura de soluções para as encomendas de trabalho e para a criação de
mais diversas dificuldades, no trabalho educa- pequenas unidades de produção autônomas
e geridas pelos alunos.
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referênCIas
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Moçambique. Maputo: IESE, p. 296, 2010.
MINISTÉRIO DE EDUCAÇÃO. Unidade na Ação: Por uma implementação eficaz do Plano Estra-
tégico da Educação e Cultura-Reforma do Ensino Superior. Ilha de Moçambique, 2008.
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MINISTÉRIO DE EDUCAÇÃO. Estatística da Educação, Levantamento Escolar: Educação Geral:
Formação de professores-Ensino Técnico. Maputo, 2009.
PINTO, Ana Paula. A Escola Técnica e a Dinamização do Meio. Livro de Actas do Congresso África
e o Mundo (COOPEDU II). Lisboa: CEA e IP, Leiria, 2012.
Doutorado em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande Sul (UFRGS). E-mail: augus-
tochicava@yahoo.com.br
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