Inverso de papis dentro da Umbanda

A gira, alm de representar muito bem a sociedade brasileira, o lugar onde os subalternos, as minorias e todos aqueles que nunca tiveram voz ativa e poder decisrio no mbito social encontram sua fora, seu lugar no mundo, descobrem-se fortes. Durante o ritual, as figuras marginais tornam-se centrais, superiores. E essa inverso simblica acontece em vrios nveis, a comear pela possesso. Em sua maioria, os umbandistas so de classe econmica desfavorecida e, por isso, excludos socialmente de muitos privilgios da elite. Na gira, isso invertido e os mdiuns tornam-se o canal entre os mundos, instrumento da entidade e da caridade, tornando-se pea essencial naquele lugar. A possesso s socialmente aceitvel dentro das giras. , antes de tudo um fenmeno coletivo e que s existe e eficaz, porque as pessoas ao redor do mdium acreditam nessa eficcia. O fenmeno evoca figuras que represento clssicos exemplos brasileiros do cotidiano que sofrem, desde o comeo da nossa histria, diversas formas de preconceito e que apesar disso, possuem todas as caractersticas necessrias pra trazer a cura e alvio para os consulentes. Essa uma das inverses que ocorre dentro da gira: as entidades da umbanda, essencialmente brasileiras, so negros ex-escravos, mulheres de vida fcil, malandros, amerndios, baianos, marinheiros e tantos outros que costumam ficar margem dos acontecimentos sociais. Na umbanda eles so mentores, pessoas que no s merecem ser ouvidas, como so colocadas no centro do ritual; So esperados pelos consulentes que vo at eles com suas aflies e esperam ouvir solues, consolo e palavras que os confortem sobre determinadas situaes. Em ltima anlise, h uma possvel inverso no mbito sexual, j que os mdiuns podem, e geralmente o fazem, incorporar entidades do sexo oposto. Esses episdios de incorporao mostram diferentes lados do ser humano. Contudo, essa inverso social e troca de papis em muitos nveis que ocorrem na umbanda e nas giras, em sua maioria, fica nos rituais. Apenas a inverso das entidades que se mantm fora do ritual e a marginalizao denunciana s no sagrado. Assim que

os mdiuns e consulentes voltam para casa aps uma gira, voltam a ser vistos e tratados como antes.

Referncias:
BARROS, Sulivan Charles. A possesso como expresso da voz subalterna: o caso da umbanda. UNIEURO. MAGGIE, Yvonne. Guerra de Orix: um estudo de ritual e conflito - 3.ed. - Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001