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Resumo: Este artigo pretende compreender como a publicidade se utiliza de conteúdos míticos e
arquetípicos enquanto “iscas” de consumo, através da análise da campanha do sabonete Lux
intitulada “Revele a estrela que existe em você”, veiculada nos anos de 2003 e 2004. Abordamos
como a estratégia persuasiva pretende seduzir o consumidor, atuando num nível ideológico-
cognitivo, desencadeando um processo de “identificação espelhada” entre o receptor e o ator da
propaganda.
*
Aluna do segundo semestre do curso de Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda, no
Uni-Facef Centro Universitário, em 2005.
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INTRODUÇÃO
A MORFOLOGIA DO MITO
espécie tal que precisa encontrar expressão numa forma simbólica” (CAMPBELL, 2000, p.33),
um universo macrometafórico que mais tarde será constantemente reatualizado a partir dos ritos.
Sobre o duplo da tomada de consciência formulou-se todo um panteão de
simbolismos. Desde então, as imagens sociais são carregadas dessa presença1 e adquirem,
portanto, um poder vinculador do qual a mídia se apropria para exercer seu domínio sobre o
receptor, cuja natureza gregária busca sempre um ponto de convergência, onde se dê o processo
de identificação e comunhão2.
Eliade disserta sobre a característica atemporal do mito, narrativa que se passa
num “instante sem duração”, e que insere o homem que o ouve ou narra num tempo a-histórico,
intemporal, sagrado, portanto real. O que ele chama o Grande Tempo (ELIADE, 1991, p.54).
O fascínio, a sedução que o mito provoca pode ser traduzido na seguinte frase: “O
mito reatualiza continuamente o Grande Tempo e dessa forma projeta quem o ouve a um plano
sobre-humano e sobre-histórico que, entre outras coisas, proporciona a abordagem de uma
Realidade impossível de ser alcançada no plano da existência individual profana” (ELIADE,
1991, p.56) e ainda:
Que isso seja uma ilusão, pouco importa, se a
compreendermos como sendo um imaginário que atrai, que
fascina, em torno do qual se cristalizam as atitudes, as
representações que constituem a sociedade.
(MAFFESOLI, 1996 apud CONTRERA, 2002, p.52)
A mídia, portanto, devido ao seu poder vinculador, acaba por legitimar uma
espécie de rito contemporâneo, que transporta o leitor sempre e de novo àquele Grande Tempo,
através de imagens e sons que se sucedem numa velocidade nauseante, e cuja intenção
fundamental é sempre vender mais.
1
A Profª Drª Malena Contrera em ambos os livros citados na bibliografia deste artigo explica melhor a relação
existente entre o pensamento mítico e a dualidade primária gerada pela dissociação,ou seja, o momento em que o
homem conscientiza-se de sua mortalidade. A noção do Duplo e a questão fundamental da imagem, abordada por ela
estão presentes nos estudos do filósofo francês Edgard Morin. Contrera afirma que as narrativas míticas partem como
resposta ao eterno conflito entre bem e mal, vida e morte, herói e anti-herói.
2
Contrera também baseia sua obra nos estudos do sociólogo da pós- modernidade Michel Maffesoli, em cuja obra
No Fundo das Aparências (Petrópolis: Vozes, 1996.) postula sobre a tendência geral das sociedades humanas de
buscar suportes materiais (concretos ou virtuais) a partir dos quais possam criar uma comunhão. Hoje, a mídia
fornece tal suporte. Supondo isto, é interessante lembrar aqui a noção de Simbolismo do “Centro” de Mircea Eliade:
“Vimos que não só os templos supostamente se encontravam no “Centro do Mundo”, mas que todo lugar sagrado,
todo lugar que manifestava uma inserção do sagrado no espaço profano, era também considerado como um
“centro” (ELIADE, 1991, p.48).
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seu arsenal para a ausência primordial que mora em todo e qualquer ser humano, de qualquer
raça, de qualquer tempo, de qualquer classe social.
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“(A sociedade precisa de heróis) porque ela tem necessidade de uma constelação de imagens suficientemente
poderosa para reunir, sob uma mesma intenção, todas essas tendências individualistas. (...) A nação necessita de
algum modo, de uma intenção a fim de atuar como um poder uno.” (CAMPBELL, 2000, p.142).
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pela mídia é o espelho no qual sonham ver-se refletidos, já que quando flagram-se nas lentes do
sistema, desaparecem.
REFERÊNCIAS
ALVES, Márcio Moreira. Cultura e idolatria: ilusão, consumo e fantasia. In: ROCHA, Everardo
P. Guimarães (Org.). Cultura e imaginário. Rio de Janeiro: Mauad, 1998.
CAMPBELL, Joseph. O mito e o mundo moderno. In: _______. O poder do mito. São Paulo:
Palas Athena, 2000.
________. A saga do herói. In: _______. O poder do mito. São Paulo: Palas Athena, 2000.
CONTRERA, Malena Segura. O mito na mídia: a presença de conteúdos arcaicos nos meios de
comunicação. São Paulo: Annablume, 1996.
________. Mídia e Pânico: saturação da informação, violência e crise cultural na mídia. São
Paulo: Annablume: Fapesp, 2002.
ELIADE, Mircea. Imagens e símbolos: ensaio sobre o simbolismo mágico-religioso. São Paulo:
Martins Fontes, 1991.
GALEANO, Eduardo. A descoberta da América (que ainda não houve). Porto Alegre:
Universidades UFRGS, 1999.
LOPES, Edward. Retórica da imagem no discurso publicitário. In: _________. Metáfora. São
Paulo: Atual, 1987.