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CB Siri rae Scag as Matomninenntse Coe SRR anaes mprormamsete, cat ms meen conigusneen ‘cose AEN foun coon SES STATE cme ee et oonoiae Four bbs -0te tome aout Sa ABORT ont MER osc SE BeGT t B on-eae emer ~wopremtareiegaie re Camara] {SBN 97885-02-152574 cnsusn xaLocacho “NDIA NACIONAL DOS COTORES DELVES, ona Maio amen MS Catal — 4.8 So No 2 1. Cat, i Se, 1954 2 Ce bas Sot" ton Sonate ee ibs raecaoenade Dieta eta coord eto rao aia Marking eto ‘tee prodcio ce Pred plea i Aves vn Asa in es ch ir ae de Quo ‘nae Cans sh asl Naga Sond eta eat te ‘tor erat eo Coma ‘lin iin Ces ‘iin a er chosen cbt soso (CB saraivaun nay rence apa ‘alpha dhelemeacectecabsteds wees Shonayeo sap co pra YERSAR es ra ete tismine-wewsrate Para Emilia, Vida e Mée, muitas vezes admirdvel. Para Antonio, Vida e Pai, muitas vezes memordvel. evolugo nem sempre é para melhor ‘sexo, o simples e 0 complexo felicidade como vitalidade desejo, necessidade, vontade razbes da existéncia 85 ou 97 103 107 O QUE SE APRENDE COM O OBVIO Ebsinar vem do latim ensignar, vem de signo, de sinal, de deixar uma marca. Ensignar é 0 que voeé grava em algo ou alguém. Se uma pessoa me pergunta o que aprendi na vida até agora, minha resposta revelaré tudo que me ensignou, as ‘mareas que foram gravadas em mim. Revelaré minhas carac- teristicas, meus caracteres, meu carter. Perceba que as pala- ‘ras ensignar e aprender esto conectadas, uma vez que nin- guém ensina sem ter aprendido e vice-versa. Parece 6bvio, ‘mas pouca coisa é mais perigosa na existéncia do que o dbvio, essa Ancora que paralisa o pensamento e induz a falsidade, & distorgio, ao erro. Quantas vezes voc8 jé disse ou ouviu alguém dizer isso: “Puxa, procurei as chaves pela casa toda e s6 encontrei no ‘timo lugar que olhei”. E quem escuta isso geralmente diz: “Que curioso, isso também sempre acontece comigo!”. Mas 6 bbvio. & claro que a pessoa encontra no dltimo lugar que procurou, pois ninguém encontra algo e, em si consciéncia, continua procurando 0 que jé encontrou. Sempre se encontra algo no iiltimo lugar, e jamais antes nem depois. ‘Todo conhecimento e todo avango vio contra 0 bvio, contra tudo aquilo que ancora, que evita o progresso e 0 de- senvolvimento humano. Sim, mudar 6 complicado, pois a mudanga 6 contréria & imobilidade ~ e a imobilidade diversas veres se esconde por tris da mascara traigoeira da coerén- cia. Os melhores artistas no sio coerentes. Séo a antitese do 6b Guernica é uma aldeia que foi bombardeada em abril de 1937, durante a guerra civil espanhola, Picasso pintou um painel sobre o tema. Nele, no ha nada de dbvio; ndo hé bombas, explosdes, soldados, nada disso. Mas basta olhar as pessoas que esto ali, o cavalo, para ver que o quadro retrata o deses- pero eo horror. Hé muitas maneiras de fugir do bvio, e os melhores artistas so especialistas nisso. grito também pode ser contrério ao dbvio. O diretor Francis Ford Coppola, no Poderoso Cheftio 3, mostrou o gri- to mais silencioso da historia do cinema, na cena em que a filha do personagem de Al Pacino leva um tiro e morre. Ao perceber o que ocorrera, ele abre a boca em desespero € grita sem som por uns 30 segundos, num siléncio ensurdecedor. Nelson Rodrigues disse que o que déi na bofetada é 0 som. Shakespeare disse que a vida é feita de som e fiiria. Se voce tirar o som, a fitria desaparece — no filme Ran, o diretor Akira 9. Picasso e sua Guernica, eis um bom exemplo disso. 10 Kurosawa inseriu uma eena de batalha, retirou 0 som e, a0 passa-la em cAmara lenta sem som, foi contra o dbvio ¢ trans- formou um confronto sangrento em um balé. O que podemos aprender com 0 dbvio? Podemos apren- der que ninguém nasce pronto e vai se desgastando. Nos mascemos crus € vamos nos fazendo. , isso € 6bvio, mas como eu aprendi? © que mais aprendi? Com quem, por que eu aprendi? Eo que deixei de aprender, todas as coisas que ainda nao aprendi? Quando aprenderei, se aprenderei? Sou sempre a minha mais recente edi Gosto muito de um verso em particular do grande poeta gaticho Mario Quintana, que teve o infortdnio de morrer na mesma semana de Ayrton Senna, em maio de 1994, e, por conta da merecida celebridade do piloto, a partida do genial poeta ficou obscurecida, Fazendo um parénteses, Eu viajo muito de ar io, revista e ampliada. jo eno gos- to quando ha pessoas muito famosas a bordo. Fico imaginan- do que, se houver um acidente fatal, quando divulgarem lista de passageiros, as pessoas s6 vio prestar atengo nos nomes ilustres e eu serei “tebaixado", entrarei apenas na relagdo do “e outros”, no pé da pagina do jomnal. E nem eu nem ninguém quer ser reconhecido, seja na vida ou na morte, como apenas “mais um”, Quer ser identificado como alguém especial. Voltando, Mario Quintana por trés vezes concorreu a uma cadeira da Academia Brasileira de Letras e, em todas, foi re- cusado, apesar de lé jé terem estado e ainda estarem alguns u ” extremamente banais. Como forma de recusa & &tica, o gaticho, nascido em Alegrete, fez uma das mais brilhantes reagGes, produzindo um Poemi- nho do Contra (e é poeminho mesmo): “imortai essa afronta estética e Todos esses que af estdio Atravancando 0 meu caminho. Eles passarao. Eu passarinho. Quintana também disse que, se um autor tem de explicar a seu leitor o que ele quis dizer com uma determinada frase ou conceito, um dos dois é burro. Pois, no meu caso, sempre con- sidero que o burro sou eu. Quando eserevemos, nunca sab ‘mos com6 seremos interpretados. As vezes escrevo algo com a certeza de que aquilo vai chamar a atengio, mas as pessoas 86 dio importancia a algo que nao dei muita bola. £ como se eu estivesse interessado no recheio e o leitor, na casea da empada, ou ao contrétio. Isso mostra que raramente a gente tem controle, mesmo em algo que antes parecia ser bastante previsivel e, portanto, controlével. Mas é af, na negacio do bvio, na eterna mutagdo do que esti ao redor, que esté a beleza da coisa, 2 ESCREVER, PARA APAZIGUAR... ‘Viver pressupée aprendizado e muita coisa que se aprende precisa de método ~ a determinagdo de razdes e sendes nao deixa de ser um método para estabelecer sentidos a vida. Dos varios modos que existem para aprender a viver melhor, um dos que mais aprecio é a escrita, Para escrever, é preciso pen- sar. Para escrever bem, é preciso pensar bem. Eserever aju- daa elaborar o raciocinio, a sublimar emogies, a organizar 0 mundo, A escrita tem fungGes que muita gente néo imagina; ‘itil nas situagdes mais diversas e inusuais. A humanidade faz isso ha séculos: para espantar seus fantasmas, ela escreve, Quando trés dos-meus filhos eram pequenos, houve uma época em que eu e minha mulher trabalhdvamos muito e che- ‘givamos tarde em casa, as vezes s6 depois das dez ou onze ho- ras da noite, Tinhamos uma ajudante para cuidar das nossas criangas. Mas, por mais que ela zelasse pela “tropa”, era quase impossivel no haver confito entre eles. Note que 0 conflito é 13

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