Você está na página 1de 10
Capitulo 1 Behaviorismo e outros ismos' Nilea Micheletto Puce A“ poucos pensadores foram atribuidos tantos ismos como a Skinner: positi- vismo, mecanicismo, social-darwinismo, empirismo, luncionalismo s40 apenas alguns deles, Esta pratica classificaléria, no caso da Skinner, tem particularidades marcantes. Acomparagao, am vez de ampliat a compreensao do ismo @ do pansamento de Skinner, estreita ambos. A inclusao de Skinner nos varios ismos consiste geralmente om uma acusagao ria qual Ihe é atribuida uma pratica que ndo se sabe exatamente qual ¢, mas parece ser evidente a necessidade de aborina-la, Busca-se aqui caracterizar {ras desies ismos = posilivismo, macanicismo @ so- cial-darwinismo —@ compara-los com as propostas de Skinner, tentando indicar algumas incorregées ¢ limites dessa pratica classiicatéria Uma dificuldade que se coloca na andlise da relagdo entre um ismo e 0 bahavorismo é suber em que consiste cada um destes ismos, Ao falar em positivismo, por exemplo, preciso ter claro a mu iplicidade de pen+ *Trayatna aprasentado no Vil Enceniro da Associagte Brastioima do Psicoternpin o Madicina Comporiamental Santas, So Paulo, sotainbra do 1998. Sobre comportamenta scognigio 3 ‘Samentos que S40, Ou podem ser, assim rotulados. Kolakowski (1988) analisa, sob esle rotulo, pensamentos como os de Comte, Mach, Pierce, Willgenstein, entre outros. O que perrrilliia unir pensadores tao diversos sob tal classilicagao? Kolakowski, apontan- do uma cerla esquematizagao indispensavel na proposi¢ao de identidades que permi- tem reuni-los, destaca como caracteristica do positivisme um conjunto de regras @ crilé- tiog sobre 0 conhecimento humano a parlir dos quais estabelece o que 6 poss'vol ser estudado pela ciéncia: + E objeto de astudo aquilo que se manilasia efetivamonte a experiéneia, Os tendmenos percebidos nao s40 modos de manifestagao de uma realidade que nao se pode revo- lar diretamente ao connecimento. Existéncias ocullas, das quais as sensiveis $40 ma- nitestagao, ndo devem ser consideradas. Aqui, expressa-se uma preocupagao antimetatisica. Esse @ um criténo facil de se aplicar a casos extremos, Mas !1a casos. em que tica dificil decidir se a pergunta que nos lazemos partence a quasiées legili- mas sobre processos que vao além das manifestagbes sensiveis ou se devem sor descartadas porque s40 questdes metalisicas, + Sd podemos reconhecer a exisiéncia do que nos é dado pela experiéncia, O mundo é UM conjunto de fatos individuais observaveis. O saber abstralo, geral, é uma forma de ordenagao, é um produto da linguagem, no coincide com nenhuma experincia. No mundo, nao hd © geral, Os conceitos abstratos dao uma forma concisa a nossa expe- néncia, Podemos utilizé-los de mode pratico, a que nos permite prever alguns aconte- cimentos em {ungao ue culros. As interprelagdes do mundo devem corresponder a uma expenéncia, Deve-se aprotundar a compreensao das relagoes entre os tenome- nos sem aprofundar o conhecimento de sua ‘natureza’ oculta e sem tampouco tratar de estabelecer se 0 mundo em si, independente do conhecimento, possui outras pro- priedades além das que nos dé a experiéncia. + Nao 6 possivel conhecer julzos de valor. Eles nao so passiveis de experiéncia. Nao ha experiéncia que determine que devemos fazer tal coisa, que estabelega orlam ou proibigao, Valores nao sao earacteristicas do mundo acessiveis 20 conhecimento + As maneiras de saber sao as mesmas para todos os campos da experidncia, Particu laridades qualitativas das diferentes ciéncias s4o manilestagoes de um certo estagio histérico do desenvolvimento do conhecimento, © progresso nivelara as dilerengas reduzindo todas a uma unica area do saber, a uma mesma ci8ncia No porisamento de Auguste Comte (1798-1857), pensador que propds o metodo: positivista, assas caracteristicas se fundamentam na nogao de ordem 6 estabilidade Necessarias para progresso social através da ciéncia, o que acaba por dar a sua Proposta um cardter altamente conservador. Comte propde uma ciéncia que supde objatos: ordenados © estdveis, 0 que permite construir esquemas duradouros de classificagao, divisdes perteitas @ definitivas, Tais supostos lavam Comte a, por exemplo, nagar a teoria da evolugag, Eles trazem também implicagdes para a sua visao de sociedade, sagunde a qual sdo impres- Gindiveis condigées estaveis na vida humana. A suposigao de que as condigdes de vita dos homens devam ser transformadas atrasa o progresso, em vez de lavorecé-lo, 4 ilies Micheteto Aciéncia proposta por Comte deveria elaborar projets de acorde com propneda- des naturais © necessarias da vida social, sem que 0 progresso allere os caracteres estrulurais da vida coletiva; deveria estabelecer leis de forma objetiva, sem ir além dos mites observaveis. Neste proceso, 0 homem deveria propor leis que $80 0 retlexo da ordem objetiva e, a partir de tais leis, prever os acontecimentos 0 exercer sobre cles uma agao pratica Algumas destas caracteristicas sdo associadas ao pensamento de Skinner por alguns criticos?. Vejarnos como elas aparecem: “watson e os behavioristas estenderam a Psicologia humana. de modo siste- malico, a teoria dos retlexos condicionados (provocados artiticialmene nos ani mais): (odo comportamento humano é uin conjunto de ainvidades retlexas. Foi ba- seado nesie lipo de andlise que o psiedlogo amencano Burrus Frederic Skinner se deu por objetwve fundamenial, a fim de estudar cieniticamente 0 camporiamento humano, a objetividade e a descri¢éo. Por isso, privilegia a experimentagaa am laboratdrio que permite 0 controle & quantiticagao por um tipo de procedimento que ele chama de ‘andlise {uncionat’. Em sintese, essa andlise consiste em buscar as iigacées entre diferentes elementos observavais que seriam as causas das imudangas do compontamente, Ao exciuir de sua andlise todos os processos hipo- téticos, que levariam a Psicologia a um impasse, Skinner opta decididamente pelo ineiodo das ciéncias da Natureza, noladamente da Fisica e da Biologia. E a esse metodo que ele submete, alé o reducionismo, suas investigagoes sobre o compor- famento e sua modilicagao por condicionamento”. (Japiassu, 1991, p. 276) “Como as alividades humanas devem ser consideradas como uma luta contra a Natureza, 0 que imporia restaurar sdo os métodos de controle dos comportamen- fos humanos. No entanto, Skinner ndo dd mdicagdes precisas de seus métodos de controle. Para ele, o progresso da tecnologia comportamental implica um aumen- 10.00 poder de controle de certas pessoas sobre as outras. E a extensao do contro- Je deve ser boa, independentemente daquelé qué o exerce. do mado coma 0 exerce € dos objetvos perseguicos. Sende assim, a conclude a que se pode chegaré a de que a escravidao ou 0 governo de um Hiller seam algo deseydvel para a hurna- nidade’. (Japiassu, 1991, p. 286) Aadogao do método das ciéncias naturais e a nogdo de que 0 comportamento é delerminado sao caracterislicas apresenladas como umn reducionismo do homem a um ser que responde apenas de forma rellexa @ condicionada ao ambiente. Tal reducionisme se completa ao propor que sda “elementos observaveis" do ambiente os lalores determinantes. E a proposta de controle torna-se, na {rase do critico, defesa da domina- ao e da opressao, encobertas pela proposta de uma ciéncia que alirma produzir connec mento com objetividade, apenas descrevendo relagées naturais. Uma outra relagao frequentemente estabelecida é entre Skinner @ 0 social- darwinismo, que 6 chamado de reducionismo bioldgico. Para caractorizar esse ismo, alguns aspectos presentes no pensamento de Herbert Spencer (1820-1903), um dos Outros exompios do critien f obra do Skinner podorn sar encontratias win Rogers, 1964, Black, 1973, Poralman, 1973, Zadosh, 1973, Pulgandia, 1974 Sobre no econnnto — & SCUS Mais importantes representantes, padem ser destacados: A evolugao é um proceso continuo, necessanio ¢ otimista, A evoluigao deve-se a uma forga espontanea que impulsiona o progresso, lavando a um aprimoramento ¢ a uma haimonta crescenles. Esta forga tom um cardter transcendente, 6 parte de um processo Unico do Universo, do qual 0 proceso natural é apenas uma manitestacao. Formas homogéneas e instaveis evoluiram para formas helerogéneas e estaveis. Este pracesso dle diferenciagao ocorre desde fendmenos mais elementaros tla maté- 11a Inorganica até os fendmenos humanos. Este proceso produziu todas as formas cle evolugto, 0 que @ exemplificado “pela formagao dos corpos celesies, pela modelicao da crosta terrestre, peias moditicagdes organicas, pelo astabelecimanto das distr oes mentais, pela génese das divisdes sociais," (Spencer, 1862/1922, pp, 440-441) “A sociedade num estdgio micial e inferior 6 uma reumia homogénea do mnchvi= duos tenao poderes semeihantes @ funedes semethantes. ... Muilo ceao, entre- fanto, no curso da evolugao social, nds encontramos uma inciprente dilerenciagao entre governantas @ governados. ... A auloridade do mais forte @ do mais hall se fez senur entre os selvagens, como numa manada de aiumais ou num banda de estudantes." (Spencer, 1862/1922. pp. 276-277) “Entrementas fo1 acontecenda uma diferenciagaa de tipo mais familar, aquela, nomeadamente, pela qual a massa da comunidade foi segregada ern classes aistintas 6 espécies de trabathadores." (Spencer, 1862/1922. p. 278) Dai, conclui-se que a eliminagao dos individuos mais débeis sao leis reais ¢ ue- vem ser aceitas come uma norma. Supanda tacios os processos como pertencentes a uum percurso natural, todas as dimansdes da vida, inclusive as praticas morais, a cle se suhordinam, A lei biolégica da supremacia dos mais adaptados € 0 Unico fundamento possivel da vida moral Algumas dessas carateristicas do pensamento de Spencer sag alribuicias as pro- postas de Skinner, quando seu pensamento 6 relacionada a Biologia, especialmente teoria da evolugao. E a suposta semelhanca entre as propostas destos dois pensadoros que parece orientar a critica apresentada a seguir 6 "O argumonto bioldgico permite a Skinner reduzir 0 social ao animal ¢ fazer abstragoes da histéna e das relagdes sociass." (Japiassu, 1991, p. 278) "Set raducionismo psicoldgico encontra-se ancorado em auas ciéncias res- peltaveis: a Fisica ¢ a Biologia. A Fisica serve de caugdo ciemitica para a aplica- ¢20 de um raciocinio mecanicista esinio de causa ¢ ofeito sobre 0 objeto estucla- do: 0 comportamento. Quanto @ Biologia, serve de caugdo cientifica para se Subs- ituir as relagdes socia's por relacdes intra @ inter-espécies. E a0 descartar 0 con fronto social entre individuos iwres @ iguats, para realcar 0 confronio dos controladores do comportamento e dos controlades, os especialistas da 'ciéncia’ do compontamento rejeitam a ideologia tiberal e se apdiam numa ideologia ao status quo ¢ da ordem estabelecida. E (sto, como se a ordem social fosse funda- da na ordem natural ‘biokigica’, Donde se pode dizer que as aplicagdes praticas Nila Michell deste modelo teorico’, por mais eficazes que possam parecer, constituem um ide ologia justlicadora a servico dos poderes estabelecios,” (Japiassu, 1991, 287) A explicagao de Skinner para 0 comportamento é apresentatia jrelo critico come urna forma de reduzit a dimensao social a processes que descrevem a vida anmnral, 0 que resulia em supor a ordem social como uma ordem natural. A parir da alnbuigae a Skinner de uma naturalizagao bioldgica das praticas humanas, novamente a teona skinnonana @ aprasentada como explicagao voltada para relerendar @ manter praticas de donmmagao Neste ultimo trecho, fica evidente um outro ismo que é atibuido # Skinner, 0 Mocanicismo, aSsociado A sua visao determiysta. Novamente, uma brove caracterizagao dos supostos mecanicistas pode ser esclarecedora: * Avisao mecanicista diz resperto ao mundo material. + Opera com as dimensdes quantlativas das coisas, elimmando as diversas qualidades sensivars. * As coisas, 0s eventos, realizam movimentos no espago ¢ no tempo ¢@ sao resultado da ileragao entre maténia e lorga. * Os movimentos sao gerados por uma pressao, uma forga, produzida polos propnos. compos materiais, que empurra, que impulsiona, que tunciona coma uM Motor = Sua causa. + A causa de toUos 0s efeitos ¢ concebda mecanicamente. A partir desta nogao de determinagag, propriedades mecdnicas podem ser descobertas en todos us eventos fisicos, + As forgas que provocam estes movimentos se propagam através de coisas materials, hum sistema de choques, sequencial ou encadeado; 840 necessarias, portanto, enti- dades nedradoras entre a causa ¢ 0 feito, metos que estabelecem igagoes que per- imtam © estabelecimento de cadeias causais. A Natureza é resultado de um cade! causal do mteragdes mecanicas. * Tal visao supe que 0 {uluro seria como o passadlo, Sendo possivel suzor que, a pall” de concligoes iniciais, pode-se obter as condigdes finais. Ui exemple de critea que atabur a Skiner uma visao mecaniasta é a Sequir apresentata, quando Capra (1982), analisande a Psicologia mecanicista, assim se rele rea Skinner: “Embora o titulo da hive de Skinner faga reteréncia axpliciia ao comportamen- fo humano (Ciéneia @ comportariento humane), os conceitos nele discutidos lia- Senim-se Yuase que exclusrvainente em exponmentes de condicionamerto com vatos 6 pornos, Esses anunins foram reduzidos, come wsse Pau) Viens, a Dit onetes vicionadiis por fios aminentars' Os behavioristas ignoram largennente a mleragao mutua @ a imerdependéneia entre um organismo vivo @ Seu Me ANE ente natural, 0 qual tambem é, ele propao, um organsme. Com base aim sua exiqua perspectiva sobre © comportamento animal, eles executam entao um gr gantesco salto conceitual que os faz aternizar no comportamento humane, air. mando que os seres huinaiios, lal como os ammats, sdo maquinas cuja abvidede esta hintada as respostas condicionadas a estimulos ainbientais,” Salve tomprimeniae cman 7 “Tudo isto 6, portanto, Psicologia newtaniana por exceléneia, una Psicologia sem consciénoia, que reduz todo 0 comportamento a sequéncias mecancas do resposias condicronauas, v que afema que a unica compreensad crentilica ‘le Net furega humane: 6 aquela que permanece dentro da estrutura da Fisica 0 ta Broloiier ckassicas, uma Psicologia, além disso, quo refer a preocupacac de nossa cunuted cotta tecnologia manipulativa, criada para exercer domina e controle "(p 16A) Para relacionar Skinner ao Mecanicismo, os criticas destacam a quaniilicagae ¢ apresentam 0 condicionamente como uma cadera de respostas mecanicas, em que nao ocore inferagad entre 9 organismo eo meio. Skinner 6 acusade (le reduzir o homem A maquina, portanto passivel de ser controlado por uma tecnologia clentitica yerada a partir de suas explicagoes. Vojamos, agora, alguns aspectos da proposta de Skinner que nos permilem ana sar a possituidade de relacionar a proposta de Skinner com estes smos A nogao de determinagao do comportamento pelo ambiente @ usada pata lunda- menar a atnibuigao a Skinner de uma posi¢ao mecanicisia Anagaa de determinagae que oxplica os cemportamentos humanos é, para Skinner, expressu na nogao de selegao por consequéncias. No comporamento opcranie, um Hos nive's em que esta determnagao opera, o ambiente delermina o compartamento attavos das conscquéncias que $e sequeM a agad. A Neterminagaio do ambionto nao coorre através de uma tora, de um estimulo, que desencadee a resposta, & preciso que 0 arganismie se comporte para que a consequéneia ocorra. Como alumna Skinne: as contingéncias ontogeneticas continiam inelicazes até que a resposta ocar 1a... Ha limiagao semeinante nas coningéncias tagenéticas _ Disto so saque que todo 9 repertério de um individua ou de uma espécie precisa cxistu previa: mene a solegdo ontogenslica ou Mogentitca.,." (1966/1969, pr 175-6) A delerminagao do ambiente é seletiva, O ambiente age fortalecendo uma classe Uo resposta, Ou Soja, tornado mais provavel a ocorréncia de respostas fuluras porter: centes a mesma classe. Condigées passadas e presentes determina o comportamen: to, Historias especificas de reforgamento explicam comportamenios de ada maividuo. Senco assim, determinagao ambiental nao yera a homogeneiade © a pacronz7agao, pla produz a variagao - de espécies, cle comportamentos, tle culturas. Tal nogag de determinagaa, caracteristica do comporiamento operante, nega su: postos mecanicistas, Nao ha uma forga que impulsiona, que desencadere o comporta: mento, A agao do ambiente se da apés a ocorréncia da resposta. Nao ha, portant meios propagadores das forgas ambientais que garantam a iransmissao da forga meca- neal “Atima-se trequememente que uma descri¢do behaviorista negigencia de certa forma algo daquilo que uma pessoa pode ser ou fazer, porque a trata como ume maquina... Mas atirmar que 0 comportamento esta submetiao a leis néio e dizer que as leis que 0 governam sao tdo simples e tao mecanicas como aquelas que se aplicam a operagae de um retngerador.” (Skinner, 1974/1976. p. 262) Bo Nie ntnnatots QO homem é um produtor das conting&ncias que o determinam. Mas tal determina- Gao nao implica que o homem responda passivamente a provocagées do ambiente. Seu comportamento ¢ produlo dos efeitos de sua propria agao, Essa determinagao ocorro por uma canjungao de multiplas dimensées em que comportamento e ambiente se transtore mam a partir de um processo de interagSes reciprocas das contingéncias de sobrevivén- cia, das contingéncias de retorcamento e das contingéncias mantidas pelo ambiente so- cial (Skinner, 1981/1987), Tais contingéncias do meio social, tundamentais para compre- ender 0 comportamento humana, so produzidas pelos préprios homens, E o homem que constrdi as contingéncias que o determinam. "O comportamento human esta, portanto, amplamente sob 0 controle humano.” (1947/1972, p. 299) *...0 homem, como o conhece- unos, methor au pior, & 0 que o homem fez do homem." (1971, p. 197) Nesta nova nogao de causalidade ~ a selegdo por conseqiiéneias -, segundo Skinnor especitica para os organismos vivos, o ambiente age selecionando em dimen- s0es temporais distintas, tendo cada um das niveis de selegao (tilogenético, ontogenético e cultural) una forma especifica de ocorrer, Skinner retira esta nogao de causalidade dat taoria da evolugao por selegao natural de Darwin e parece ser este viniculo com a Biolo- gia darwiniana que leva os criticos a relacionarem seu pensamento com o social- darwinismo. Aidentificagao da selegao por consequéncias como uma determinagao ambiental, que opera tarito na salogao das espécios como na selagao do compartamento individual e das praticas cullurais, resulia em uma andlise de cada um dasses niveis, ¢ da agdo conjunta dos trés, radicalmente oposta a proposta social-darwinista de Spencer. A apli- cagao do principio causal, identificado pela primoira voz na selegao natural, nao reduz 0 comportamento € as pralicas hummanas a um processo bialégico. Segundo Skinner, a selagao produziu uma “natureza humana”, que nunca chega a existir de fato, uma vez que a “dotagéo genélica nada é até ter sido exposia aa meio ambiente @ a exposigao a modifica imediatamente.” (1974/1976, p. 165) Da grando variabilidade de suscatibilidados gonéticas produzidas em nivel gené- lico, sao selecionadas em nivel ontogenético aquelas que s4o adequadas ao meio trans- lormado, O comportamento operante permite, portanio, que a espécie adquira rapida- manto novos comportamentos. Ele modilica 0 organismo @ apera junto com a selogao natural, podendo agir na mesma direcdo ou em sentidos opostos a ela, Como Skinner intimeras vezes afirma, a vida do individuo nao ¢ uma reprodugac do que ocorreu na espécie, nem as delerminagdes da espécie sao determinantes inevildveis do comporla- mento, “Genes sem diivida explicam o comportamento resultante da selegao natural, @ eles sao também responsaveis pelo condicionamento operante come um pro- casso, mas uma vez que aste proceso evolu, uma especie diferente de selagao explica 0 comportamento do individuo @ a evolugaa das praticas cultwrais”. (1983/ 1987, p. 165) “As similandades entre os trés niveis de determinagao !ém froqientemente gerado enganos, Em que sentido, por examplo, nés pademas falar de "vida s0- cial” dos insotos? individuos em uma coldnia de formigas respondem diferento- ‘mente uns aos outros do que as pessoas responder umas as cutras na sociedade humana. Numa coldnia, 0 comportamento 6 “liberade" nos modos deierminados yyportanentae caguias 9 pela sele¢do natural, Na sociedade humana, o comportamento 6 largamente produ- to de condicionamento operante sob contingéncias sociais mantidas pela cultura”. (1988/1989, p. 54) “(Culturas que modelam e mantém o comportamento operante sao exctusiva- mente humanas. Sociedades animais tém muitos fatores semelhantes, mas sd como produto de contingéncias de sobrevivéncia.) A evolugae cultural ndo 6 uri processa biolégica"... (1990, p. 1207) A determinagao através da selegao por consequiéncias no produz evolugao, mas sim a seleg&o do comportamento, sem que qualquer forga nalural ou transcendental a oriente, “O progresso nao é inevitdvel, cerlamenie porque ha culturas extinias como espécies extinias.” (Skimner, 1953/1965, p.432) Nosse proceso de selegao, é indispensdvel a existéncia 0 a produgao de variagao. Tanto na selegao natural como no condicionamento operante o aparecimento de ‘muta- das’ é essencial” (1974, p. 247). Devem ser planejadas contingéncias que produzam variabilidade de comportamento e de praticas culturais. “Uma cultura que se contente com 0 Status quo - que alegue conhecer quats s4o os melhores procedimentos cantrofadores € portanto néo experimenta = pode alcangar uma estabildade temporaria apenas pelo prego ae uma extingdo eventual,” (1953/1965, p. 443) A.ciéncia do comportamenta teria a possibilidade de, a partir dos conhecimentos produzidos, propor novos mados de vida que, como as mutagdes na selecao das especies, seriam variagées. Para isso, a ciéncia do comportamento deve desvendar as formas de determina- ¢€0 que estao envolvidas no processo comportamental, que nao sao evidentes como a determinagao mecanicista, 6, a0 !azé-lo, a ciéncia do comportamento refuta explicagdes nao apenas mecanicistas, mas também mentalistas. Como afirma Skinner: “.. a selegdo por consequéncias é um modo causal néo facilmente observaao. Porque as circunstancias controladoras que existem na historia de reforgamento do organismo so obscuras, 0 substitute mental tem sua chance.” (1975/1978, p. 102) “Talvez porque vemos 0 comportamento humano e observamos tuilo pouco do processo através do qual elo se origina sentimos necessidade do um eu criati- vo." (1989, p. 43) Paroce quo uma ciéncia que supde um processo do determinagao “obscuro", de dificil observagao, nao possa atender ao critério positivista que delimita como objeto de estude somente aquilo que se manifesta efetivamente & observagao. As propostas de Skinner rejeilam também a necessidade de formas estaveis e ordenadas do positivismo comtiano. Para Skinner, a compreensdo das determinagdas ¢ condi¢ao indispensavel para que se evidenciom prdticas de dominagdo ¢ para a translormagao das praticas socials que ameagam a sobrevivéncia futura da espécie. “Diz-se que, embora o comporlamento seja completamente determinado, 6 melhor que 0 homem ‘se sinia livre’ ou que ‘acredite que 6 livre’. Se isso significa que 6 methor ser controlado por maneiras que tenham conseqvéncias nao 10 Nava Michelet aversivas, nds podemos concordar; mas se significa que é methor ser controlado por maneiras contra as quais ndo sé revolte, isto falha em levar em conta a pass'- bildade de canseqiiéncias aversivas retardadas. Ha uma outra afirmativa que pare- ce mais apropriada. é melhor ser eseravo conscienle do que um oscravo feliz.” (1971, p. 37) A partir da. uma tal compreensaa, ¢ preciso prover e controlar, certamente nado no sentirio proposto pelo pasitivismo de Comte. Para Skinnar, a previsdo € 0 controle nao signiticam aniquilagao das praticas culturais vigentes, para que a ciéncia possa dominar de forma totalitaria, mas uma prética planejada que sena uma mutagae a ser selecionada por suas conseqiéncias “Um nova conjunta de praticas nao pode simplesmente ser imposio por gover- nos, religidas ou sistema ecandmico; se isto fosse feito, nao seria um conjunto do prdticas correto. Ele deve desempenhar seu papel sd como uma variagdo a ser testada por seu valor para a sobrevivéncia. As conlingéncias de selegao esido alem clo nasso controle’. (1986/1987, pp. 30-31) Skinner apresenta uma posigdo antagénica a de seus criticos que. ao rotularem a ciéncia do comporlamento com os mais diversos ismos ~ posilivismo, social-darwinismo, mecanicismo, entre outros =, atribuem a ela praticas que submetam @ manipulam o to- mam € que mantém e justiticam formas de dominagao sociais ¢ politicas, @ atribuem a esta ciéncia uma visko reducionista das possibilidades humanas. Para Skinner, as div Mens6es mais importantes do ser humano se {undamentam na compreensao de compor- tamento humano como determinado e capaz de controlar o ambiente que 0 determina “O comportamento é lambeém uma torma de controle. Que um oruanismo deve agir para controlar 0 mundo ao seu redor & to caracteristico da vida como a respiragdo e a reprodugao. Uma pessoa ago sobre o ambiente 00 que ela realiza é essencial para a sua vida @ para a vida da especie. Ciéncia e tecnologia sao simplasmente manifestacées deste trago essencial do comportamento humane." (1974/1976, p. 208) Skinner revere a nogao de controle @ coloca sabre ola novas possibilidades para o hamem: “Uma visao cientifica do hamem oferece possibilidades empolgantes. Ainda nao vimos 0 que o homem pode tazer do homem." (1971, p. 206). Bibliografia BLACK, M. (1973), Some aversive responses lo a would-be reinforcer. Em WHEELER, H (ed.) Beyond the punitive society - operant conditioning: social and political aspects. San Francisco: Freeman, pp.125-134, CAPRA, F. (1982). O ponto de mutagao, Sao Paulo: Cultrix. isso 14 Sobre vomportamento © co JAPIASSU, H. (1991). A ideologia skinneriana do relorgo. Em As paixdes da ciéncia: estudos de historia das ciéncias. Sao Paulo: Letra & Letras, pp. 275-297. KOLAKOWSKI, L. (1988). La fosofia positivista, Madrid; Catedra, PERELMAN, C. (1973). Behaviorism's enlightened despotism, Em WHEELER, H. (ed.) Beyond the punitive society - operant conditianing: social and political aspects. San Francisco: Freeman, pp.121-124, PULIGANDLA, R, (1974). Fact and Fiction in 8, F. Skinnor's scince & utopia: na essay on philosophy of psychology. St Louis: Warren H. Greem. HOGERS, C. R. (1964). Toward a science of the person. Em WANN, 1, W. (ad.) Bahaviorisin and phenomenology: contrasting bases ior modem psychology, Chicago: University 01 Chicago Press/Toronto: University of Toronto Press. SKINNER, 8. F. (1947), Current trends in experimental psychology. Em Cumulative recora: 4 selection of papers. New York: Appielon-Century-Crofts, 1972, pp. 295-313. (1953), Science and human behavior. New York: Macmillan, 1965 (1966). The phylogeny and ontogeny of behavior. Em Contingencies of reinforcement: a theoretical analysis, New York: Appleton-Century-Crofts, 1969, pp. 172-217) (1971), Beyond freedom and dignity. New York: Bantan/Vintage. (1974), About Behaviorism, New York: Vintage, 1976. (1977), Why | am not a cognitive psychologist. Em B. F. Reflections on behaviorism and society. Englewood Clifts, Naw Jersey: Prentice-Hall, 1978, pp. 97-112. (1981). Selections by consequences. Em Upon further reflection. New Jersey, 1987, pp.51-63. (1983), Can the experimental analysis of behavior rescue psycliology? Em Upon Jurther reflection. Englewood Clilts, New Jersey: Prentice-Hall, 1987, pp. 159- 172. (1986). What's wrong with daily life in the westem world, Em Upon further reflection. Englewood Cliffs, New Jersey: Prentice-Hall, 1987, pp. 15-32. (D) (1988). Genes and behavior. Em, Hecent! issues i the analysis of behavior, Columbus, Ohio: Merrill Publishing Company, 1989, pp. 49-56 (1989), The listener, Em Recant issues in the analysis of behavior Columbus, Ohio: Merrill Publishing Company, 1989, pp. 35-47. —_-.. (1990). Can psychology be a science of mind? American Psychologist. 45 (11). pp. 1206-1210, (D) SPENCER, H, (1862). Firs! principies,. London: Williams & Norgate 1922. ZADEH, L. A, (1973). A system-tneoratic view of behavior modification. Em WHEELER, H. (ed.) Beyond the punitive society = operant conditioning: social and political aspects. San Francisco: Freeman, pp.160- 163. 12 Nis Michetetto

Você também pode gostar