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Carlinda Leite
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também de nos afastar de uma concepção curricular construída “à prova das escolas e dos
professores” para nos aproximarmos de uma outra que incorpore a diversidade de situações
e a flexibilização de percursos e meios de formação. E é, evidentemente, nesta última
concepção que se enquadram as ideias de “projecto educativo de escola”, “projecto
curricular de escola” e “projecto curricular de turma”.
O conceito de projecto
INTENÇÃO
PRESENTE FUTURO
ACÇÃO
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Projecto “projectado”
Sendo um projecto uma ideia para uma transformação do real e a sua concretização, ele
deve conduzir a essa transformação (Leite, C., 1997: 182-183). Por isso, um projecto, para
não se esgotar em “estéticas relações de boas intenções” (Escudero Muñoz, 1988: 87),
deve definir claramente os “perfis de mudança” desejados. E para essa definição, vale a pena
ter presente o que dizem M. Broch e F. Cros (1991: 16-17) quando referem que o projecto
está na charneira de dois pólos: um da ordem da utopia, do sonho e das intenções num
espírito de algo onde ainda não cabem os meios da sua execução e outro que aponta para a
programação dos meios de o pôr em acção. São, no fundo, a intenção - ou sentido a dar à
acção - e a programação - ou organização coerente dessa acção. É esta relação entre a
utopia e a tecnocracia que o esquema de Broch & Cros (1991: 17) pretende apresentar.
Sentido
Projecto
Utopia
Organização
Tecnocracia
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E Broch & Cros (1991: 17) dizem que a ligação entre a “inspiração” (o sentido, a
intenção) e a “acção” (a organização) não é fácil mas “é preciso ser-se capaz de
inspiração e de acção” pois a recusa das acções (de organização) conduz, muitas vezes,
apenas à utopia e a centração exclusiva na organização ameaça a própria acção pela perda do
sentido, tal como acontece nos programas puramente tecnocráticos. Esta é também a ideia
que nos deve orientar quando pensamos qualquer projecto educativo e quando o
acompanhamos.
Como já foi dito, o P.E.E. surge quando se reconhece que a qualidade da formação
escolar passa pelo envolvimento das escolas e dos agentes educativos na configuração de
acções adequadas às populações que as vão viver. “Formar é muito mais do que puramente
treinar o educando no desempenho de destrezas”, diz-nos P. Freire (1997: 15), ou, dito de
outro modo, a escola é uma instituição geradora de educação e não de mera instrução. E a
realização deste mandato passa pelo reconhecimento da autonomia das escolas e pelo
reconhecimento dos professores não como meros consumidores de currículo, tal como já
dissemos. Por isso, o P.E.E. representa uma ruptura com a normalização e constituiu-se
como uma referência para a organização do presente e do futuro, proporcionando um
enquadramento e um sentido para as acções individuais. Por outro lado, o P.E.E., ao definir
as políticas educativas da instituição e ao apontar para “perfis de mudança”, implica
processos de negociação entre os diversos protagonistas promovendo a participação na
expressão dessas opções. Daí S. Antúnez e al. (1991) afirmarem que o P.E.E. é “um
contrato que compromete e vincula todos os membros da comunidade educativa numa
finalidade comum (:20-21) sendo o “resultado de um consenso a que se chega depois de
uma análise de dados, de necessidades e de expectativas (ibidem: 21).
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E para esta mesma ideia apontaram os participantes neste Encontro ao dizerem que o
P.E.E. “é a filosofia subjacente a uma dinâmica de escola”, “define princípios e linhas
orientadoras gerais, assentes nas características da comunidade educativa, de acordo com
as orientações nacionais”, “estabelece metas prevendo parcerias e tendo em conta os
recursos disponíveis (materiais, humanos ... )”, enuncia uma “resposta educativa global” da
instituição, “define as políticas educativas para aquela comunidade educativa”, é a
expressão dos “princípios, orientações e metas a atingir” pela escola, clarifica “os aspectos
de gestão e administração” que permitam cumprir a ideologia político-educativa da escola,
“define e reflecte a visão, a ideologia e as acções da escola”, “cria a matriz de suporte que
vai ser concretizada no P.C.E. e no P.C.T.”, é “ o tronco comum de onde partem os vários
projectos” existentes na escola, tais como: formação do pessoal docente e não docente,
orientações administrativas, organização curricular, ofertas da escola”.
A utilização destas duas expressões (P.C.E. e P.C.T.) é ainda mais recente do que a de
P.E.E. e está associada à ideia de que o currículo (o currículo nacional, mas também o
currículo regional e o local) tem de ser percepcionado numa concepção de projecto,
portanto enquanto algo que é aberto e dinâmico, por forma a permitir apropriações e
adequações às realidades para que é proposto e onde vai ser vivido. De facto, embora as
metodologias activas (quando preconizavam a importância da diferenciação pedagógica) e
as teses que defendem a integração curricular tenham recorrido à ideia de projecto, foi
com o desejo da escola responder à diversidade (cultural e outras) da população que a
frequenta e, mais recentemente, com a proposta da organização curricular na lógica do
modelo da “gestão flexível do currículo” que estes conceitos (P.C.E. e P.C.T.) ganharam
mais sentido.
A ideia de projecto curricular parte da crença de que uma escola de sucesso para todos e
o desenvolvimento de aprendizagens significativas passam pela reconstrução do currículo
nacional, de modo a ter em conta as situações e características dos contextos onde ele se
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vai realizar. Incorpora, portanto, a dimensão social da acção educativa e até a de “cidade
educativa” de que nos falava o relatório da UNESCO nos anos 70 (Edgar Faure) e só é
viável no quadro da autonomia escolar, que concebe as escolas como lugares de decisão.
Por isso, se reconhece que o P.C.E. e os P.C.T., enquanto instrumentos de gestão
pedagógica da escola, fomentam uma cultura de reflexão e de análise dos processos de
ensinar e de fazer aprender, bem como o trabalho cooperativo entre os professores (e
mesmo entre outros actores educativos) gerador de intervenções de melhor qualidade.
E para estas ideias convergem, entre outros, L. del Carmen e A. Zabala (1991: 16)
quando definem P.C.E. como um “conjunto de decisões articuladas, partilhadas pela equipa
docente de uma escola, tendentes a dotar de maior coerência a sua actuação, concretizando
as orientações curriculares de âmbito nacional em propostas globais de intervenção
pedagógico-didáctica adequadas a um contexto específico” e M. do Céu Roldão (1999: 44)
quando diz que “por projecto curricular entende-se a forma particular como, em cada
contexto, se reconstrói e se apropria um currículo face a uma situação real, definindo
opções e intencionalidades próprias, e construindo modos específicos de organização e
gestão curricular, adequados à consecução das aprendizagens que integram o currículo para
os alunos concretos daquele contexto”.
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para corresponder às especificidades da turma e deverá permitir um nível de articulação
(horizontal e vertical 1) que só as situações reais tornam possível concretizar.
De facto, é ao nível do P.C.T. que é possível respeitar os alunos reais e articular a acção
dos diversos professores dessa turma, por forma a romper com a mera acumulação de
conhecimentos e propiciar uma visão interdisciplinar e integrada do saber.
No quadro destas ideias, os participantes neste Curso expressaram que o P.C.E. “define
um esquema organizativo de concretização do currículo” que, depois, no P.C.T. é adequado
ao grupo concreto dos alunos da turma, com a “consubstanciação da diferenciação
pedagógica”, realizada pelo Conselho de Turma que, para isso, fará a “caracterização da
turma” e a avaliação das situações de aprendizagens adquiridas.
Outras ideias foram expressas, neste Curso, e que dão igualmente conta da distinção
deste dois tipos de projectos curriculares, quer pelo grau de abrangência, quer pelos
motivos que os podem justificar. É dito que, enquanto o P.C.E. é o “núcleo duro que
contextualiza o currículo nacional àquela escola”, o P.C.T. operacionaliza-o em função
daquela turma e daqueles alunos; enquanto o P.C.E. é projectado pelo Conselho
Pedagógico/Comissão Pedagógica/Conselho de Professores (no 1º ciclo), o P:C.T. é
projectado pelo C.T. (ou, no 1º ciclo, pelo grupo de professores que trabalham com aquele
grupo de alunos) em conjunto com os seus alunos (como propõem alguns colegas;
enquanto o P.C.E. “é elaborado de acordo com as componentes regionais e locais, embora
respeitando o currículo nacional”, o P.C.T. “é elaborado de acordo com o perfil da turma”;
enquanto o P.C.E. “define as opções curriculares da escola”, o P.C.T. “adequa essas opções
ao grupo a que se destina e tem uma dimensão temporal comparativamente mais curta”. E
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Aceitando o princípio de que no ensino-aprendizagem se deve respeitar a sequencialidade em espiral dos
conteúdos, é importante que os professores, nos diversos níveis de escolaridade, conheçam quer as
intenções dos objectivos da formação nos níveis que os antecederam e os que se lhe vão seguir, quer os
conteúdos programáticos das áreas disciplinares a que se encontram ligados. Este trabalho, feito nos
grupos disciplinares e nos departamentos curriculares, será um contributo para a organização do
P.C.E.. Depois, ao nível da turma e do P.C.T., caberá ao C.T. construir uma articulação, já não apenas
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talvez pela forma como a acção desses projectos se vai repercutir nos processos de ensino
e de aprendizagem, alguns colegas tenham dito que o P.C.E. é da ordem do “deliberativo”,
enquanto o P.C.T. é da ordem do “executivo” (sendo, nesta óptica, o P.E.E. da ordem do
“normativo”).
Em síntese, tanto o P.E.E., como o P.C.E. e o P.C.T. têm “como referência as políticas
educativas nacionais” e justificam-se enquanto dispositivos para melhorar a actuação
educativa, gerindo essa actuação. No entanto, cada um deles refere contextos diferentes,
implica concretizações diferentes e é projectado por órgãos diferentes. E, para expressar
estas relações, alguns colegas conceberam os seguintes esquemas:
P.E.E.
P.C.E. P.C.T.
P.C.T.
P.C.E.
P.E.E.
no pressuposto de que determinado assunto foi ensinado e aprendido mas, sim, que tenha em conta as
situações reais dos alunos que a constituem.
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P.E.E.
Opções Opções
organizacionais pedagógicas
R.I.
P.C.E.
Opções
curriculares
Referências:
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Editorial Graú.
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Sociale.
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- ESCUDERO MUÑOZ (1988). “La inovación y la organización escolar”, in PASCUAL, R. - org. -
La gestión educativa ante la innovación y el cambio, Madrid: Congrsso Mundial Vasco, Ed.
Nárcea.
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português. Porto: F.P.C.E. da U.P., tese de doutoramento, doc. policopiado.
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