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QUE E METAFISICA? Tradugio: Ernildo Stein NOTA DO TRADUTOR , E rarer primordial da filosofia conduzir o homem para além da pura imediatidade e instaurar a dimensao critica. Superada a postura in- génua diante da realidade é entao possivel assumir responsavelmente a verdade como um todo. Pois somente a Perspectiva que abre o compor- tamento filos6fico é capaz de antecipar os limites e as. Ppossibilidades das diversas 4reas em que se move a interrogacao pela verdade. E por isso que o destino do homem e da histéria depende da lucidez e distancia que sao o apandgio da filosofia. Num momento de crise da sociedade brasileira, em que uma falsa seguranga é buscada com o sacrificio da liberdade; em que se elabora um Pprojeto nacional comprimido dentro de uma visao tecnocrdtica, nada me- Thor que a serena meditago da filosofia. Ela nos ensina a paciéncia diante da histéria e a coragem para apostar nas possibilidades que se escondem no risco da liberdade. Ela nos mostrar4 principalmente o verdadeiro lugar da ciéncia e da técnica na construgo da histéria humana. Todo o deter- minismo que se quer imprimir a sociedade brasileira e 4 consciéncia na- cional, mediante a absolutizagéo da tecnologia, deve ser desmascarado pela consciéncia critica instaurada pela filosofia. Ela é um instrumento de libertagao das amarras deste novo positivismo tecnocrdtico com que 0 sectarismo e o interesse nos querem prender. Que ¢ Metafisica?, de Heidegger, é um texto de grande penetragao e oportunidade. Os amplos horizontes que descerra garantem contribuigao segura para o despertar da verdadeira consciéncia critica. Com-rara feli>- cidade 0 filésofo desenvolve neste texto o horizonte metafisico'em que 0 cientista antecipa a visdo da totalidadee clarifica as condigdes de sua propria existéncia de pesquisador. A luz da transcendéncia exercida no comportamento concreto destacam-se as possibilidades e os limites da pes- quisa cientifica, do célculo e da técnica, e prepara-se um novo pensamento. Dele Heidegger nos fala insistentemente como de uma terra onde o homem reencontra suas rafzes. As notas que seguem procuram situar a obra em seu verdadeiro ee ES 7 SEO h Antecipam elementos importantes para uma interpretagao adequada jugar. : das ciéncias centrais. Orig: i i s de atividad, ® Textos — Depois de varios anos tividade na % 1. da rr diese am-Drelse%, como livre-docente, Heidegger dei- - companhia de seu mestre Husserl e aceitara 0 convite para cétedra de Fllosofia em Marburgo, até entao ocupada por Nicolai Hartmann. Ali 23 a 1928. Neste ano foi convidado para assumir a cdtedra trabalhou de 1923 a osentadoria dmund Husserl, dlosofia em Freiburg, vaga com a apy . . rece ol suas Ge vidsdes de professor ordindrio, Heidegger Pro- nunciou, como era de praxe, sua primeira aula diante de todo 0 co; docente e discente da Universidade. Esta aula inaugural publica, que teve lugar no dia 24 de julho de 1929, trazia o titulo Que ¢ Metafisica? Publicado no mesmo ano, 0 texto integral da prelegao obteve profunda repercussio, Provocou também muitos mal-entendidos. Parecia vir reforgar suspeitas despertadas jé por Ser e Tempo. Heidegger era promotor do niilismo, da filosofia do sentimento da angtistia e da covardia, do irracionalismo que combatia a validez da légica. Em resposta as objegGes que se multiplicavam 0 filésofo acrescentou a quarta edigdo de 1943 um posfacio que respondia as objegdes e elucidava aspectos da preleg4o que suscitavam diividas e mal-entendidos. Em 1949 o autor publicou, com a quinta edicdo do texto, uma introdugao com o titulo "Retorno ao Fundamento da Metafisica”. 2. Posigéo no Contexto da Obra — Se prescindirmos dos dois livros de sua juventude — a tese de doutorado O Juizo no Psicologismo e a de livre-docéncia A Doutrina das Categorias e do Significado em Duns Scot —e levarmos em conta apenas as obras da maturidade, o texto da prelegao Que é Metafisica? € o terceiro trabalho impresso por Heidegger. Depois de Ser e Tempo e Kant eo Problema da Metafisica, Que ¢ Metafisica? foi publicada NO mesmo ano em que surgia Sobre a Esséncia do Fundamento no volume complementar do Anuério de Filosofia e Investigagdes Fenomenolégicas, comemorativo dos setenta anos de Edmund Husserl. Em 1933 se editow seu discurso de tomada de posse da Reitoria da Universidade de Fret n-Breisgau. A Auto-afirmagiio da Universidade Alema. Além dos 0 mentarios sobre a poesia de Hélderlin, os primeiros textos marcantes pur blicados apés Que ¢ Metafisica? sio Sobre a Esséncia da Verdade em 1943 € ‘a carta Sobre o Humanismo em 1947. Os textos do posfacio e da i actescentados posteriormente jé sio manifestacées nitidas do : ppg 0 estagio em que o filésofo analisa a metafisica como austria do ser. Os dois volumes intitulados Nietzsche, que contém as _Tes6es entre 1936 e 1946, retratam 0 contexto temético em que nascera@® Elementos Caracterfsticos — Heidegger toma como PO! : uma situagao concreta: a reunido de pesd HEIDEGGER professores e estudantes. Realiza uma analitica da existéncia a partir dela procura responder 0 que é metafisica. Nao define a c Um problema que emerge do préprio comportamento do homem cia € examinado. A questo do nada como questéo metafisica envolve — toda metafisica e a existéncia global daqueles que interrogam. Assim é en responder a pergunta pela metafisica aprofundando uma questao metafisica. ie Dentro do mais auténtico estilo heideggeriano, a prelegao marcha para seu objetivo. Importa, porém, acompanhar a tessitura da interrogagao que perseguir a meta que, desligada do movimento problematizador, apa- rece despida de qualquer interesse. Este encadeamento dialético visa a arrancar 0 ouvinte ou leitor da postura ingénua e imediatista para elevé-lo ao nivel em que se deve cles Shia ena metafisica. Atingido | tal nivel, a resposta é encontrada pelo esforgo pessoal. : Que é Metafisica? é um testemunho desta ie que socraticamente faz participar do processo interrogador aqu se dirige. Mas ela nao se reduz a isto. H4 uma partici d uma pedagogia prépria da filosofia. Heidegger arranca 0 ou da imediatidade da postura natural em face das coisas e o leva a. transcendental. Torna reflexo no interlocutor 0 exercicio coti nsado da transcendéncia. Mostra, pelo préprio movimen aoe © fato de que o homem nio esté ao lado da pedra, da estrela, mas que as envolve pela compreens4o numa es abre um espaco antecipador a partir do qual tomam caracteristica primeira da existéncia humana e que lhe « mundo natural e a faz ser transcendentalmente na mir, no exercicio da interrogag¢ao, esta condi¢ao t do comportamento filoséfico. 3 tanto lembram Ser e Tempo, nao visam a outra coisa. / . fenom Precisamente a arte de desvelar aquilo que, no comport a Ros ocultamos a nds mesmos: o exercicio da tr $¢ , degger nao permanece aqui 1 ela é realizada j4 vem marcada pela do ser, que em sua radicalidade é precisan transcendental do homem. Mas no texto que : a da ontologia. lo “ dicalizagéo da pene ; ma ontologia ae ace - a Leva-o as su: itima: . : i acho _ para omen moderno e since, sistas do pensamen' ‘a, através do pri oP prio ponto de parti sreE0 . a ontologia a se oon di metafisi , de TE il pr ola ones ce gia ou cone C P 0 ser como evidente, ; a = = m do . Mas, uma , ea possi Seeds a : ser, a ontol vez posta em maxes ia : 3 : r = a duivida a ve nena ne ? = si . : 3 que foi inici engage

menos um instrumento ttil para leitores indulgentes e para ‘de anélise de textos na universidade. TradugGes como estas trabalho combinado de filésofos e fildlogos. Nao para carregar ‘com notas, mas para elaborar um texto em que se transpor- tassem com fidelidade os contetidos expressos em alemAo para uma lingua romnica. Tempos melhores talvez permitirao que se tratem com a serie- Jade exigida os textos cldssicos que devemos usar no Brasil. Temos pre- exigéncias e nao esquecemos as inconveniéncias de uma traducao. O texto poderd ser aprimorado pelo auxilio que prestarem os estudiosos, apontando erros e sugerindo modos mais claros e menos equivocos de Utilizamos para a tradugio a redacao da sétima edi¢ao alema e nao fazemos alusées a redagGes anteriores. A discussao de certas modificagées Seria interessante, mas nao se faz necesséria para compreendermos o texto que traduzimos. Alguns talvez estranharao a distribuicgao da matéria do volume que apresentamos. Colocamos a introducao no fim do volume, em primeiro i, porque quisemos respeitar a ordem cronoldégica do aparecimento dos textos; em segundo lugar, porque, ainda que interligados entre si, 0 texto da introducao tem sentido independente; em terceiro lugar, porque © texto que ser mais usado para o estudo é o da prelecdo. Poderiamos acrescentar um quarto argumento: num volume editado pela Editora Vit- tori enema, em 1967, e que contém grande parte dos trabalhos enores legger, os trés textos em questo sao apresentados na ordem cronolégica de sua publicaco.! 7 . E.S. egmarken, Vittorio Klostermann, Frankfurt am Main, 1967. (N. do T)

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