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Capitulol A Lingua é Realidade A nossa époce é caracterzada pela mania de estatfsticas. Tabe~ lis, curvas e contagens invadem a literatura cienifica e paraciencica como prova de sermos uma geragio de contadores empenhados ci levantar um inventirio do mundo. Estio sendo compilados © ccompatados “dados” para serem computados. Somos wima geragsio decontadores que estd em vias de transformar-se em uma linka de computadores. A meta parece ser um superoérebro cletsbnico que devora “dados” e excreta estatisticas. Falta porém uma estatlstica badsica: quais os clementos que perfazem a soma dos “dados”? Qs doadores imesfiatos dos dados sio Jos. Locke nos censina que “nada esténo intelecto que nao estivesse estado anterior- mente nos sentidos”. O intelecto sendo ainda um clo imprescindsvel centre dado ecéeebro elet’nica, continuam os sentidos sendo forne- cedores dos dados. A estatstica que falta deveri, portanto, esclatecer sobre a proporgo na qual os diferentes sentidos participam no for- necimento dos dados. Qual a poreentagem de dados que devemos, por exemplo, 20 tato 01120 olfato? Como se modifica esta porcenta- ‘gem no curso da histéria? Bs aumentando ou diminuindo? E no ‘curso da vida individual? Aumenta ou diminui a conttibuigio do ‘olfato com o avango da idade? Qual a dstribuigio social do olfato? Concribui cle com mais dados (absolutamente e relativamente) a0 operdsio ou a0 intelectual? E qual 6a sua distribuigio entre os sexos? E entre os povos? O problema se complica pela seguinte considera- «foros sentidos, am de dosdores de dado, si, eles mesmo, dados. Estamos, portanto, diante de uma série que concém clementos que, 0 ppor sua vez, contém a sétie. Fis um problema de ligics formal a set ‘esolvido, iuturamente, pelo eérebro eletnico, ji que supera, apa- rentemente, a capacidade do cérebro humano. Na falta dessa estatstica bésica proponho a scguintc hipdcese: devemos a grande maioria dos dados dos quais dispomos 20 ouvi- do.ed vista, jf quea grande maioria desses dados consisteem palayras ‘ouvidas ou lidas. A grande maioria daquilo que forma e informa o ‘nosto intelecto, a grande maioria das informagdes a0 nosso dispor, consiste em palavras. Aquilo com que contamos, o que compila- ‘mos ¢ comparamos, €0 que computamos, enfim, a matéria-prima do nosso pensamento, consiste, em sua maiora, de palavras. Além de palavras, os sentidos fornecem outros dados. Estes se distinguem das palaveas qualtativamente. Sao dados inarticulados, isto-é, imediatos. Para sezem computados, precisam ser articulados, isto é transformados em palavras. Hi, portanto, aparentemente, uma instincia entre sentido ¢ intelecto, que transforma dado em palavra. O intelecto eri sericto é uma tecelagem que usa palavras ‘como fios. O intelecto “sens lato” tem uma ante-sala na qual fun-

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