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INSTITUTO DE ECONOMIA
MONOGRAFIA DE BACHARELADO
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE ECONOMIA
MONOGRAFIA DE BACHARELADO
__________________________________
ALEXANDER HERZOG CARDOSO
matrícula nº: 097235599
MARÇO DE 2003
2
As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do(a) autor(a)
3
Dedico este trabalho a DEUS, cuja presença ocupou todos
os meus espaços da existência, e aos meus pais e irmãos
que são parte importante de minha esperança.
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço a DEUS, pois em várias ocasiões de minha vida senti sua intervenção
benéfica, e ao Prof° René Louis de Carvalho, cuja paciência "bíblica" e espírito humano,
permitiram sentir-me livre, isto é, pensar, ser responsável com o processo e buscar o rigor na
elaboração das idéias.
5
RESUMO
O estudo das publicações sobre o assunto mostra que em grande parte as IMF's estão
"fracas", isto é, funcionam com baixa escala de clientes e não conseguem funcionar com
recursos gerados próprios, são dependentes de subsídios.
Para explicar o fato, a literatura coloca cinco causas como as mais prováveis para
explicar esse paradoxo entre um, aparente, quadro promissor e a demanda efetiva considerada
muito baixa.
6
SÍMBOLOS, ABREVIATURAS, SIGLAS E CONVENÇÕES
7
ÍNDICE
INTRODUÇÃO.........................................................................................................................................................................9
8
I - INTRODUÇÃO
Em um país como o Brasil que aparenta ter boas condições para o desenvolvimento do
sistema de microfinanças, particularmente o microcrédito. Existe uma grande demanda
9
potencial, um sistema bancário que tem ignorado a necessidade dos microempreendimentos e
instituições com experiência em microfinanciamento. Porém, embora haja uma conjuntura
promissora para o setor, a taxa de penetração da indústria de microfinanças no Brasil é baixa,
estando em 2% da demanda potencial. É uma questão que carece de respostas.
Este estudo tem como objetivo analisar as possíveis causas da baixa penetração dos
programas de microcrédito, destacando o fato de que o setor de microfinanças, principalmente
o microcrédito, encontrar-se pouco desenvolvido, apesar de haver condições propícias um
maior aprofundamento entre a oferta e a demanda potencial. As causas mais pertinentes que
se comenta na literatura são: o contexto macroeconômico anterior (inflação), a existente
tradição do crédito dirigido no país, a estrutura jurídica para o setor e as condições "frágeis"
com que se encontram as instituições de microcrédito.
10
CAPÍTULO I - O MICROCRÉDITO E O BRASIL
11
Ledgerwood (1999, p. 239, edição em inglês), "microfinanças é a provisão de serviços
financeiros a clientes de baixa renda, incluindo aqueles trabalhadores por conta própria1. Em
adição à intermediação financeira, algumas instituições de microfinanças também provêem a
intermediação de serviços sociais, incluindo a ajuda na formação de grupos e no
desenvolvimento da autoconfiança, da aprendizagem, do linguajar financeiro e outros
serviços". Portanto, microfinanças é a prestação de serviços financeiros (crédito, poupança,
seguros, etc.) através de bancos, financeiras, SCM's, cooperativas, ONG's e OSCIPS, para
indivíduos e empresas excluídas do sistema financeiro tradicional, enquanto que microcrédito
é a concessão de empréstimos de relativamente pequeno valor, para atividade produtiva, no
contexto das microfinanças.
1
Estes trabalhadores estão caracterizados por exclusão do sistema formal de fornecimento de crédito
12
O crédito produtivo
2
Vamos caracterizar como baixa renda a faixa de rendimento de 2 a 3 salários mínimos, de acordo com a medida
apresentada em "Brusky, Bonnie e Fortuna, João Paulo. 2002 . Entendendo a Demanda para as Microfinancas no
Brasil: um Estudo Qualitativo de Duas Cidades, PDI/BNDES", em relação às cidades Recife e São Paulo.
3
O aval solidário se constitui na formação de grupos de três a cinco pessoas, em geral, com pequenos negócios e
necessidade de crédito. Normalmente há uma relação de confiança entre os integrantes do grupo, onde eles
assumem as responsabilidades mutuamente pelo crédito tomado por todos os integrantes. Vide: Yunus,
Muhammad. 2000. O Banqueiro dos Pobres.
13
São medidas que visam estimular o tomador a cumprir seus prazos, podendo gozar do
benefício de renovar o empréstimo e tomar valores maiores de acordo com sua capacidade de
pagamento e com a política de crédito da instituição. Podem também disciplinar o tomador
em relação à condução de seu negócio, quanto à gerência eficaz e a possibilidade de
crescimento. Para a instituição microcreditícia, pode significar aumento da escala de
operações e sustentabilidade.
A orientação ao tomador
4
As funções e procedimentos dos agentes de crédito são, em síntese, entrevistar no local do negócio,
diagnosticar a situação financeira do demandante e as condições de administração do negócio. Dimensiona a
viabilidade do crédito a ser concedido. Vide: Bruett, Tillman. 2002. Técnicas de Gestão Microfinanceira,
PDI/BNDES.
14
Ação econômica com impacto social
5
Tem-se a idéia de que se há a continuidade na tomada de empréstimos, possivelmente há investimento no
negócio para sua manutenção e/ou ampliação, aumentando seus ativos e possibilitando vias de fomento
financeiro ao seu capital de giro.
6
Yunus, Muhammad. O Banqueiro dos Pobres. 2000.
7
Para saber os objetivos sociais previstos em lei, vide BRASIL. Lei Nº 9.790 de 23/03/99.
15
iminência de se tornarem pobres8, aumentando suas oportunidades e possibilidades de
melhoria da renda e da qualidade de vida.
8
Cabe aqui notar que o conceito de linha de pobreza é que faz o corte entre quem está na iminência de estar na
pobreza e que se encontra nesta faixa. No entanto, para efeito de objetivar o combate à pobreza com o
instrumento de microcrédito, deve-se escolher um indicador que seja mais adequado a cada análise, pois há
várias formas para se definir pobreza em relação a um mínimo de renda (1/4 de salário mínimo mês, 1 salário
mínimo/mês, etc) ou a um mínimo de atendimento de necessidades básicas. Para definições sobre linha de
pobreza Vide: Lustosa et al. 1989.
9
Vide: BRASIL. Lei Nº 9.790 de 23/03/99, art. 3 alínea IX.
10
Sugere-se que o crédito apropriado às unidades produtivas de pequenas escala seja um elemento de
importância para sua inserção competitiva na economia quando aplicado em melhoria do seu capital e em bases
tecnológicas de forma suficiente para lhe garantir sustentabilidade e crescimento, com reflexo na geração de
renda e emprego na economia.
11
Esse ponto objetivado através do instrumento de microcrédito visa o desenvolvimento dos pequenos negócios
de forma escalonada, desde a fase incipinte até atingir condições de entrar e competir no mercado formal .
12
BRASIL. BNDES. Programa de Crédito Produtivo Popular. Rio de janeiro, 1996, pág. 3. Cartilha.
13
Com facilidades econômicas refiro-me às oportunidades que os indivíduos tem de utilizar recursos econômicos
com propósito de consumo, produção e troca. Vide: Sem, Amartya. Desenvolvimento como Liberdade. São
Paulo: Companhia das Letras, 2000.
16
crédito. O público a que se destina essa modalidade de financiamento é composto de
indivíduos que exercem alguma atividade produtiva que gere renda familiar e, geralmente, são
trabalhadores dispensados e/ou aqueles sem chances de serem absorvidos pelo mercado
formal de trabalho. São os microempreendedores formais ou informais, individuais ou
coletivos, situados nos meios urbanos e rural sem acesso ao sistema financeiro tradicional.
14
O conceito de microempreendimento considera o empreendimento com até 5 empregados. Essa concepção e
os dados se aproximam com a nota nº 13.
15
Nichter et al. “Entendendo as microfinanças no contexto brasileiro”, 2002. Este ponto será discutido no
Capítulo II.
16
Schonberger. Microfinance Prospective in Brazil. 2001. vide: Capítulo II desta monografia.
17
Nichter et al. 2002. Pág 29.
17
Gráfico 1:
Microempreendimentos no Brasil, formais e informais
(1998-2002)
18
3,9
16 3,6
3,4
3,1 3,2
14
12
Formal
10
Total (milhões) Informal
8
11,1 11,4 11,8 12,2 12,5
6
4
2
0
1998 1999 2000(Est.) 2001(Est.) 2002(Est.)
Muitas das pessoas, inseridas na informalidade, investem recursos de que não dispõe:
assumem dívidas com agiotas, procuram ajuda entre amigos e parentes, ou procuram outras
fontes; a fim de angariar recursos para capitalizar seus negócios. Há a intenção de que
empreendendo uma atividade econômica qualquer, possa melhorar suas condições de vida, e
de sua família, frente à ausência de oportunidades de emprego e renda no mercado formal de
trabalho19. Elas não dispõem de conhecimento técnico e administrativo e recursos financeiros
adequados ao desenvolvimento de seu negócio.
18
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – Economia Informal Urbana – 1997 - Volume 4; Rio de Janeiro,
1999.
19
Segundo o SEBRAE 2002: "O setor informal, que também faz parte da complexidade da economia real, abriga
maioria dos empreendedores brasileiros. Muitos estão nessa condição por motivo de sobrevivência. Outros, por
estratégias fiscais. Mas há os que estão lá porque forma simplesmente excluídos dos mecanismos de acesso à
economia formal".
18
aplicadas, a burocracia que cerca o atendimento de concessão de crédito e as garantias
exigidas." 21
I.1.5 Microconclusão.
Socialmente, quer dizer dar aparato financeiro a uma camada da sociedade que através
de uma relação estrutural se encontra em condições de pouca mobilidade. Outro ponto
importante é que os instrumentos de microfinanças, aliados ao microcrédito, compõem o
aumento das possibilidades de mudança do status quo da sociedade, pois o elemento
poupança e seguros são práticas pouco difundidas entre os indivíduos que se reproduzem
economicamente nas camadas mais empobrecidas22, e pode significar maior consistência no
crescimento do negócio e aumento de suas rendas.
21
IBAM. 2001. Relatório Final.
22
A poupança, principalmente, é um mecanismo importantíssimo. Simplificando, um negócio que gere algum
lucro em determinado período pode dividi-lo em partes segundo as necessidades de empreendedor. Se no caso, a
cada período, e após satisfazer suas necessidades básicas, o indivíduo consegue poupar 20% (uma expectativa
otimista) de seus lucros, e não houver emergências neste período, ele pode criar um pecúlio que, se conseguir
19
O microcrédito, no Brasil, é o elemento fundamental das microfinanças. Ele tem
potencialidades para auxiliar no desenvolvimento dos sistemas locais de produção. A par de
toda discussão filosófica sobre o significado do microcrédito, deve-se atentar para os aspectos
técnicos relacionados à sua utilização, levando em consideração a natureza dos seus
problemas e suas causas, para que se proponham medidas que eficientize a atuação das
instituições microcreditícias, e que seja conduzido de forma sustentável. Isto quer dizer
aumentar sua penetração, já que no Brasil só se consegue que 2% da população
potencialmente demandante efetive a utilização dos serviços de microfinanças, enquanto na
Bolívia, por exemplo, chega a uma taxa de penetração no mercado de 163%23. Aumentar o
acesso da população potencialmente demandante é um primeiro passo para o desenvolvimento
do microcrédito no Brasil e das potencialidades produtivas das camadas mais pobres da
população24.
realizar o mesmo a cada ciclo operacional de sua microempresa, lhe dará segurança cumulativa, diminuindo os
risco relacionados ao seu negócio.
23
Ver: Nichter et al. “Entendendo as microfinanças no contexto brasileiro”, 2002.
24
O artigo de Otaviano Canuto publicado pelo jornal "Valor Econômico" em 02/01/2001, o autor chama a
atenção para o aumento de estoques de ativos dos quais os pobres participem como forma única de erradicar a
pobreza, e coloca o microcrédito como um meio para incrementar os ditos ativos. Conclui dizendo que o
microcrédito não é uma panacéia contra a pobreza. A respeito dos limites do microcrédito como instrumento de
20
depósitos a prazo fixo25. Sua natureza peculiar indica a existência de uma função e certa
permanência no seu campo de atuação. A definição de sua função é muito importante e tem
que estar bem clara. O grau em que as instituições estão estabelecidas e capacitadas para
desempenhar suas funções de forma permanente reflete sua estabilidade e é de grande
importância para eficiência e eficácia de seus programas, pois as populações demandantes de
microcrédito necessitam de continuidade ao acesso de vias ofertantes adequadas.
21
A estabilidade e a sustentabilidade da instituição tem uma dimensão financeira. Ela
deve prover fundos suficientemente para fomentar suas operações e realizar seus objetivos de
intervenção. Devem operar com tecnologia eficiente e em escala significativamente grande de
clientes para que todos os seus custos sejam minimizados e cobertos, obtendo graus
sucessivamente reduzidos da dependência de doações e subsídios. A maioria das IMF's no
mundo não é auto-suficiente28. Porém, a capacidade de se auto-gerar financeiramente é um
atributo importante para a IMF que vise ser contínua e sólida, já que se pressupõe uma
tendência crescente da demanda por serviços de microcrédtio e uma decrescente dos recursos
doados.
Instituições formais
28
ver Ledgerwood, 1999. Pág 108
22
tipos mais usuais são os bancos de desenvolvimento público (de âmbito nacional e regional),
os bancos de desenvolvimento privado, os bancos comerciais e as financeiras.
Instituições semiformais
As instituições semiformais são aquelas definidas por uma delimitação entre o formal
e o informal no que diz respeito à sua atuação e obrigações. Por um lado, estão sujeitas às leis
gerais mais relevantes, incluindo as leis comerciais. Por outro lado, são informais, pois
geralmente estão fora de sujeição às leis, às regulamentações e à supervisão próprias do setor
bancário. São principalmente as ONG's financeiras, as OSCIP's, as cooperativas de crédito e
cooperativas de múltiplos propósitos.
Provedores informais
São as fontes de fornecimento de crédito em que não se aplicam leis comerciais gerais
nem leis bancárias específicas, tampouco estão sujeitos a alguma regulamentação formal. Em
lugares pobres sua difusão como provedor de recursos financeiros é grande. Estão
circunscritos nesse ramo os agiotas, os amigos familiares, fornecedores, associações de
poupança e crédito rotativo, entre outros; que fornecem crédito sob a forma de dinheiro ou de
tempo entre recebimentos e pagamentos.
23
oferecem capacitação, apoio técnico e recursos financeiros, em condição de empréstimo, às
instituições que trabalham diretamente com o público alvo. Denominaremos essas outras
instituições de "retaguarda" 30.
29
O BNDES criou o Programa de Crédito Produtivo Popular e o Programa de Desenvolvimento Institucional
que se dedicam ao aprimoramento técnico das IMF's e ao provimento financeiro para os programas que
desenvolvem atividades de microfinanças. Ver o site: http://www.bndes.gov.br
30
Os termos "retaguarda" e "vanguarda" são utilizado para designar uma oposição em termos de atuação em
relação ao tomador potencial e efetivo de microcrédito. Vanguarda refere-se às instituições que atuam na frente
dos programas com relação direta com o público tomador de microcrédito no local, analisando os pedidos,
liberando os empréstimo e acompanhando-o. Retaguarda denomina as instituições que desempenham papel de
apoio ao grupo que atua diretamente com o cliente final. É, apenas, uma relação de oposição entre o papel que
cada instituição definida nesta linha assume frente ao público: se atua diretamente ou se atuam indiretamente.
31
Esta caracterização é a mais importante para efeito deste trabalho, pois visaremos as instituições que trabalham
diretamente com o cliente final na elaboração da proposição explicativa sobre a questão da baixa penetração do
microcrédito no Brasil.
24
sociedade civil, do poder público e da iniciativa privada, conforme sua origem e delimitação
legal.
Essas instituições são constituídas sob a forma de pessoa jurídica de direito privado,
sem fins lucrativos. Dada essas características, os lucros apurados após o resultado
operacional de sua atividade fim é completamente revertido para instituição. Portanto, não há
distribuição de lucro na forma de apropriação, mas um redirecionamento na forma de
capitalização, contribuindo para a sustentabilidade econômico-financeira da instituição.
32
A diferenciação entre as instituições que oferecem apenas a intermediação financeira (crédito), chamadas
minimalistas, e as que oferecem além de crédito outros serviços de acompanhamento e desenvolvimento dos
negócios, além de iniciativas sociais, chamadas integradas, será realizada na seção 2.3 deste texto.
33
A primeira experiência com microcrédito no Brasil foi desenvolvida pelo Programa Uno, em 1973, nos
municípios de Recife e Salvador. Esse programa foi criado pela iniciativa da ONG ACCION International, a
qual ainda fornecia assistência técnica.
25
microfinanceiros, especializadas na concessão de crédito produtivo ou que ofertam outros
serviços além do microcrédito.
O grau em que uma ONG's é especializada ou não está relacionado com o nível de
intermediação financeira. A maior capacidade de intermediação financeira está determinada
pelas possibilidades de oferecer uma variedade de serviços à microempresa e alcançar a
massificação dos serviços de crédito, inversão, poupança e operações à vista35. O parâmetro
de comparação é o sistema financeiro tradicional. A capacidade de intermediação financeira é
um ponto fundamental do debate sobre que estratégias institucionais são viáveis para o
fortalecimento das ONG's de crédito ou se é mais apropriado deixar que os setores financeiros
atuarem, de forma eficaz, na oferta de microcrédito.
Se tratarmos o marco legal das ONG's, e seu desdobramento, há uma tendência de que
estas instituições sejam reguladas pelo setor bancário. Os caminhos sugerem um conjunto de
desenhos institucionais, com a transformação das ONG's de crédito em entidades reguladas
pelos bancos centrais36. A idéia é buscar a sustentabilidade dos sistemas de fornecimento de
serviços financeiros através dessas instituições para que o processo implantação do
microcrédito tenha um desempenho eficiente, garantindo continuidade às intervenções que
visam o desenvolvimento do setor de microfinanças e dos negócios de baixa renda.
34
vide: Abramovay, Ricardo. O Capital Social dos Territórios: repensando o desenvolvimento rural. Economia
Aplicada, volume 4, n° 2, abril/junho, São Paulo, 2000.
26
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP's)
A discussão sobre o modelo de estruturação para o terceiro setor vem sendo mediada
pelo Governo Federal através da Comunidade Solidária. O objetivo principal é o
fortalecimento da sociedade civil como um todo40. Como conseqüência do debate, constituiu-
se a Lei 9.790 de março de 1999 que, conjuntamente com o Decreto 3.100, de junho de 1999,
estabeleceram a função social da OSCIP e sua parceria com o poder público.
A Lei 9.790 serve como um divisor dentro do terceiro setor, ao determinar quais
modalidades institucionais estariam aptas a se qualificarem como OSCIP. Segundo o artigo 2º
da Lei 9.790, especificado das alíneas I à XIII, as associações criadas por órgão ou por
fundação pública, cooperativas, sindicatos, partidos políticos e suas fundações, instituições
religiosas, organizações sociais e organizações creditícias, que tenham quaisquer tipos de
35
IBAM. 2001. Relatório Final.
36
IBAM. 2001. Relatório Final.
37
IBAM. 2001. Relatório Final.
38
Ferrarezi, Elisabete, Rezende, Valéria. 2000. OSCIP – organização da sociedade civil de interesse público: a
lei 9.790/99 como alternativa para o terceiro setor. Brasília: Comunidade Solidária
39
IBAM. 2001. Relatório Final.
40
Ferrarezi et al. 2000.
27
ligações com o Sistema Financeiro Nacional, entre outras, estão impedidas de obter a titulação
de OSCIP.
O chamado Termo de Parceria, criado pela Lei nº 9.790, é a relação contratual que
pode ser estabelecida entre o Estado e as OSCIP's. Se por um lado as OSCIP's estão
submetidas a requisitos legais rigorosos, por outro elas usufruem exclusividade nos concursos
que forem estabelecidos na definição deste termo, o que pode propiciar às OSCIP's acesso à
participação em programas dos quais estarão excluídas as demais organizações do terceiro
setor41.
Com a criação das OSCIP's, dentro de seu marco legal, o setor de microfinanças
recebe um grande impacto positivo devido à acessibilidade aos recursos destinados aos
programas, à isenção da Lei da Usura42 e à possibilidade de efetivar o termo de parceria. Para
instituições como as ONG's, tonar-se uma OSCIP's seria praticamente a única forma pela qual
se poderia operar de forma sustentável.
41
IBAM. 2001. Relatório Final
42
O Decreto 22.626, de 7 de abril de 1933, constitui a lei da usura e estipula juros máximos de 12% ao ano,
consistindo a cobrança de juros usurários em crime contra a economia popular. Esta lei não se aplica a
instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, Sociedades de Crédito ao Microempreendedor e
Organizações da Sociedade Civil de Interesses Público.
28
Banco do Povo de Juiz de Fora, etc. Na esfera Federal, têm-se a atuação do Banco do
Nordeste, responsável pelo programa CrediAmigo, o maior do país44.
43
O Banco do Povo de São Paulo é uma parceria entre os governos estadual e de alguns municípios do Estado de
São Paulo, formado em 1998. Essa entidade oferece empréstimos a microempreendedores locais a uma taxa
altamente subsidiada, de 1% por mês. O programa está crescendo rapidamente, embora o modelo escolhido não
permita sua continuidade num contexto de mercado. Em menos de quatro anos de operação ele já atende a 9.521
clientes ativos. O valor médio de empréstimo do Banco do Povo de São Paulo é de R$ 1.696. vide: Nichter et al.
2002.
44
Segundo Nichter et al (2002): "O Banco do Nordeste é uma instituição federal de desenvolvimento regional,
sediada no Ceará, que fornece mais de 70% do financiamento bancário na região Nordeste. Por intermédio de
seu programa Crediamigo, de rápido crescimento, lançado em 1998, o banco atende a 54% dos atuais clientes de
microfinanças no Brasil. O programa Crediamigo é voltado para clientes de baixa renda (com um valor médio de
empréstimo de R$ 584) em áreas urbanas, utilizando uma metodologia de grupos solidários. O banco tem uma
estratégia de crescimento agressiva e toma decisões com base comercial, dentro da estrutura de uma instituição
de desenvolvimento regional".
29
I.2.2.2.5 As Instituições da Iniciativa Privada
Legalmente, ao se criar uma SCM, algumas condições são de destaque. Elas estão
equiparadas às instituições financeiras, tendo sua "constituição, organização e funcionamento
46
disciplinados pelo Conselho Monetário Nacional" . Seu objetivo social é conceder
financiamentos às pessoas físicas e jurídicas com fins produtivos47. Está sujeita à fiscalização
do Banco Central do Brasil. Estão proibidas de realizar captação recursos junto ao público,
sob de qualquer forma, inclusive emitir título mobiliários.
45
A natureza financeira e lucrativa, no entanto, justifica as SCM's serem isentas da lei da usura, consistindo
assim em instituições com boa sustentabilidade, já que estão habilitadas a cobrar juros de mercado. Vide: IBAM.
2001. Relatório Final.
46
vide: Lei 10.194, 14 de fevereiro de 2001, art. 1, alínea II.
47
Isto é, viabilização de empreendimentos de natureza profissional, comercial ou industrial. vide: Lei 10.194, 14
de fevereiro de 2001, art. 1, alínea I.
30
Um avanço que trás a resolução é em relação à criação de Postos de Atendimento de
Microcrédito. Objetivam exclusivamente a operações destinadas ao microcrédito. Esses
postos podem ser instalados em qualquer instituição financeira, sem exigência adicional de
capital. Não se exige o aporte mínimo de capital para instalação dos postos. Há flexibilidade
quanto à permanência (tempo), ao horário de funcionamento e à estrutura física dos postos. O
aspecto positivo dessa medida é que se abriu a possibilidade para alongar o atendimento até
populações isoladas.
Quadro 1: Tipos de IMF's segundo formalidade, contato com o tomador e segundo os setores da economia
48
A discussão sobre instituições minimalistas e integradas está baseada em Ledgerwood 1999.
31
o objetivo de melhorar a capacidade de seus clientes em gerir seus negócios e utilizarem os
serviços financeiros disponíveis.
Os serviços sociais são serviços não financeiros que visam melhorar as condições de
vida do microempreendedor. Esses tipos de serviços concentram-se em ampliar os
acompanhamentos dos clientes nas áreas de saúde, educação, alimentação e alfabetização.
Esses quatro tipos de serviços dão a dimensão de atuação da IMF. Ela pode se
especializar em conceder unicamente serviços de intermediação financeira, ou englobar todos
os serviços em sua carteira de atividades oferecidas às populações em que esteja intervindo. O
grau em que cada instituição oferece cada um desses serviços define se sua abordagem é
minimalista ou integrada.
32
minimalista. As instituições minimalistas baseiam seu enfoque na premissa de que o crédito é
a ferramenta capaz de alavancar os empreendimentos de baixa renda, fazendo-os crescer e
seguir as vias do desenvolvimento. Estas instituições reconhecem sua vantagem comparativa
ao se especializar somente na intermediação financeira. Assume-se que os outros serviços
serão oferecidos por outras instituições de acordo com seu público alvo. Ao focalizar um
único objetivo, as IMF's diminuem os custos e a dependência de subsídios, além de dar
clareza quanto ao seu objetivo como instituição.
A abordagem integrada adota uma visão que contempla, ou busca contemplar, todas
as dimensões do seu cliente, e são próprias da IMF's que oferecem uma cesta diversificada de
serviços que inclui intermediação financeira, intermediação social, serviços de
desenvolvimentos dos negócios e serviços sociais. Nem todas as instituições oferecem todos
os serviços expostos nos quatros grupos acima mencionados, mas podem aproveitar a
proximidade com os seus clientes, baseados em seus objetivos, para oferecer aqueles serviços
que são mais necessários e cujos custos são comparativamente mais vantajosos.
I.2.2.4 Microconclusão
33
Essa diferenciação coloca as IMF's atuantes no Brasil situadas, principalmente, entre
as instituições formais e semiformais. Dessas instituições, parte opera diretamente com o
cliente final concedendo microcrédito e outros serviços complementares. Outra porção
trabalha concedendo recursos financeiros, sob a forma de doações ou empréstimos, e serviços
de apoio técnico às instituições microfinanceiras em contato direto com o público demandante
dos seus serviços. Denominamos instituições de "vanguarda" aquelas que lidam diretamente
com o cliente final de microfinanças, e retaguarda aquelas que operam em pró da constituição
dos fundos das instituições de "vanguarda" e do desenvolvimento de suas dimensões técnicas
e institucionais.
Por último, as IMF's podem ser minimalistas ou integradas, de acordo com sua
especialização em intermediação financeira ou com o espectro de serviços ofertados aos
clientes que vão desde intermediação financeira até serviços sociais, expressos no item 2.3.
O marco institucional das IMF's no Brasil, de acordo com este texto, estabelece
definições quanto a sua formalidade, a atuação direta ou indireta com o cliente final, de
acordo com os setores da vida econômica nacional e segundo o espectro de serviços ofertados
aos clientes. Os propósitos das instituições inseridas são diversificados e visam desde o
34
desenvolvimento dos negócios de baixa renda até o de sistemas produtivos locais e do capital
social. As instituições de microcrédito têm objetivos lucrativos, no caso das SCM's, e não
lucrativos, quando OSCIP ou ONG.
49
Com setor da vida econômica nacional quero me referir aos setores público, privado e da sociedade civil (3º
setor).
50
O dados apresentados neste item são estimados pelo PDI-BNDES, expostos em Nichter et al. “Entendendo as
microfinanças no contexto brasileiro”, 2002.
35
Figura 1: Mercado de IMF's no Brasil.
Norte Nordeste
N° de IMF's: 3 N° de IMF's: 28
Clientes ativos: 653 Clientes Ativos: 15.582
Carteira ativa: R$ 0.9 milhões Carteira ativa: R$ 69.1 milhões
Sudestet
Centro-Oeste N° de IMF's: 50
N° de IMF's: 8 Clientes ativos: 18.197
Clientes ativos: 10.095 Carteira ativa: R$ 29.2 milhões
Carteira ativa: R$ 11.1
Sul
N° de IMF's: 32
Brasil Clientes ativos: 14.127
N° de IMF's : 121
Carteira ativa: R$ 28.4 milhões
Clientes ativos: 158.654
Carteira ativa: R$ 138.8 milhões
Gráfico 2:
SE
42%
36
73% do total de clientes estimados no Brasil. O Sudeste agrega 18.197 clientes, mais de 11%
do público efetivamente tomador de microcrédito no Brasil. As demais regiões Sul, Centro-
Oeste e Norte possuem respectivamente 14.127, 10.095 e 653 clientes participantes de seus
programas, e somadas representam cerca de 15% do total no Brasil. Deve-se ressaltar que do
total de clientes ativos no Nordeste 73,80% são clientes do programa Crediamigo do Banco
do Nordeste, e que esse programa dispõe do uso da rede de agências do Banco distribuídas
pela região Nordeste, certamente uma vantagem institucional para captação de clientes em
relação às demais regiões. O Gráfico 3 apresenta os percentuais que cada região dispõe do
total de clientes ativos no país.
Gráfico 3:
S CO N
9% 6% 0,5%
SE
11,5%
NE
73%
O Nordeste é a região onde está contida a maior carteira ativa, com R$ 69,1 milhões.
As regiões Sudeste e Sul possuem respectivamente R$ 29,2 milhões e R$ 28,4 milhões, e as
regiões Centro-Oeste e Norte possuem carteiras ativas respectivas de R$ 11,1 milhões e R$
900 mil. Em termos percentuais, o Gráfico 4 ilustra qual a parcela de microcrédito
movimentada em cada região do país.
37
Gráfico 4:
CO N
8% 1%
S
20%
NE
50%
SE
21%
38
Gráfico 5:
Empréstimo Médio
2.500,00
2.000,00
Valor (R$) 1.500,00
1.000,00
500,00
0,00
N NE SE S CO Brasil
Regiões
39
Tabela 1
Proporção de Empréstimo Médio por Região do PIB Regional per capita (%)
Indicadores N NE SE S CO Brasil
Empréstimo médio E (médio) 1.378,25 597,84 1.604,66 2.010,33 1.099,55 874,23
PIB regional per capta 3.907,00 3.014,00 8.774,00 7.692,00 6.559,00 6.473,00
E (médio)/PIB per capta 35,28% 19,84% 18,29% 26,14% 16,76% 13,51%
Fonte: Elaboração própria a partir das Contas Regionais do IBGE e dos dados de Nichter et al, 2002.
Há uma idéia por de trás destas relações entre empréstimo médio por região e PIB
regional per capita. A distribuição de valores médios de empréstimo espelha as diferenças
regionais51, e embora a renda média per capita não explique completamente a variação de
valor dos empréstimos de microcrédito no território brasileiro, ela pode influenciar o
montante de empréstimo demandado dadas as características intrínsecas da dinâmica dos
mercados de maior renda. O Sul possui renda per capita de R$ 7692 e o Nordeste de R$ 3014,
segundo as Contas Regionais do IBGE para o ano de 2000. O valor médio do empréstimo
pode significar, em parte, o tipo de negócio, em termos de ativos movimentados, que estão
sendo desenvolvidos em cada região. Ou melhor, a demanda por microcrédito, em valor, pode
ter uma relação com o perfil econômico dos microempreendimentos e/ou microempresas que
estão sendo supridos por este instrumento, no setor comercial, industrial ou de serviços, e o
quanto de investimento demandam para sua manutenção e desenvolvimento dentro de seu
mercado local52.
51
Nichter et al. 2002.
52
Esta análise está centrada no campo das possibilidades. Embora não seja o objetivo primeiro deste texto, talvez
seja necessário uma análise da demanda por crédito produtivo popular no que diz respeito ao valor,
relacionando-o ao mercado em que está inserido o negócio e qual a qualidade dos ativos que movimenta para sua
manutenção e desenvolvimento. Os diferentes perfis de negócios podem demandar mais recursos ou menos, e
tipos específicos de produtos microfinanceiros, de acordo com a região onde estão inseridos e à dinâmica do
mercado onde competem.
53
vide: Goldmark et al. "As situações das microfinanças no Brasil", 2000.
54
Nichter et al. 2002
40
mercado de microfinanças no Brasil em 2001 indica 121 IMF's operantes no país, com
158.654 clientes ativos e carteira de empréstimos de R$ 138,80 milhões.
A comparação entre esses dados revela que os clientes ativos aumentaram em mais de
duas vezes, contabilizando um incremento de mais de 81 mil. Grande parte deste aumento se
deve à penetração do Banco do Nordeste através do programa Crediamigo que de dezembro
de 1999 a dezembro de 2001 aumentou o número de seus clientes de microcrédito de 35.332
para 85.309. A carteira ativa mais que triplicou, com um incremento de cerca de R$ 95,00
milhões, e que o número de IMF's operantes no Brasil passaram de 47 para o patamar de 121.
O empréstimo médio passou de R$ 565 para R$ 875, em valores aproximados, que significa
um aumento qualitativo para o setor. A este aumento dos empréstimos médios tem de ser
computado a inflação para o calculo do aumento real do empréstimo médio, já que o Índice
Geral de Preços da Fundação Getúlio Vargas (IGP-FGV) dos anos de 2000 e 2001 foi de
9,81% e 10,40%, respectivamente.
41
suas carteiras, comprometendo as intervenções a longo prazo. Portanto, mesmo reconhecendo
esse aumento em termos quantitativos, a certeza a cerca da qualidade dos modelos de gestão
das instituições ofertantes é uma análise à parte, onde podemos ter algumas informações a
respeito, desagregando os dados globais por instituições atuantes:
"O programa Crediamigo do Banco do Nordeste, por exemplo, o maior programa de microfinanças do
Brasil em termos de clientes ativos, deve ser visto dentro de seu contexto regional. Enquanto o CrediAmigo
demonstrou um rápido crescimento nos seus primeiros anos de operação, isto tem se dado principalmente nas
cidades secundárias onde opera. Esta expansão tem sido muito mais lenta nas áreas urbanas do litoral nordestino.
Se dividida pelo número de agências (aproximadamente 70) a carteira do Banco do Nordeste, com uma média de
1.218 clientes ativos por agência, revela um perfil não tão diferente das IMF's especializadas". (Nichter et al,
2002)
Quadro 2: Instituições de microfinanças no Brasil com mais de 2.000 clientes ativos (2001).
Sociedade Civil/
CEAPE (MA) 546
OSCIP 5.467 2.985.111
Sociedade Civil/
CEAPE (RN) 745
ONG 5.411 4.030.880
Sociedade Civil/
2.996.848 662
CEAPE (PE) OSCIP 4.527
Sociedade Civil/
CEAPE (SE) 1.826.593 718
OSCIP 2.543
Sociedade Civil/
Portosol (RS)
OSCIP 2.069 3.860.355 1.866
42
apresenta a distribuição de seu produto por meio de 164 das 174 agências do Banco do
Nordeste. Seu público é composto de microempresários já estabelecidos, fornecendo meios de
financiamento de seu capital de giro e para ativos fixos necessários. Não se exigem garantias,
utilizando-se de aval solidário para concessão dos empréstimos a grupos formados de 3 a 5
pessoas que garantem o empréstimo mutuamente. Seu prazo tem em média 3 meses de
duração. Na primeira ocasião, os empréstimos restringem-se à faixa de R$ 300 à R$ 700,
podendo chegar à R$ 4.000 por sucessivas renovações. A taxa de juros atualmente é de cerca
de 3,5%. Há mecanismos de estímulo à adimplência, com abatimento de 15% sobre os juros,
caso todas as parcelas sejam pagas em dia. O programa ainda cobre demandas individuais e
de investimento.
Essa análise revela o perfil estrutural que confere ao programa Crediamigo grande
parte do seu sucesso em termo de penetração regional. Porém, se visto pelo número médio de
clientes por agência, percebe-se que sua escala não difere muito das demais instituições. Se os
dados são de Nichter et al; a escala por agência do programa é de 1218 clientes por agência,
se os números são do artigo publicado pelo Banco Mundial, então sua escala fica em cerca de
600 clientes por agência. O importante é que o número de clientes por agência reflete na
viabilidade econômica e financeira dos programas quando se tem em mente que os custos
globais do programa serão cobertos, em objetivos restritos, se houver uma escala mínima de
clientes que movimente o necessário em recursos financeiros, e sejam cobrados juros e taxas
administrativas, para garantir a sustentabilidade da rede distribuidora55. Essa aparente
vantagem do Crediamigo em usar as instalações do Banco do Nordeste para obter estes
resultados, pode mascarar a real viabilidade do programa se pensássemos em obter esses
resultados através de outras formas estruturais disponibilizadas.
Em fim, segundo a pesquisa de Nichter et al, das 112 IMF's operantes atualmente no
Brasil oito atendem a pelo menos 1.000 clientes, enquanto 88 atendem a menos de 500
55
vale lembrar que os empréstimos médios são baixos, o que quer dizer uma maior clientela para movimentar
uma massa necessária de recursos que viabilize o programa no curto, médio e longo prazos.
43
indivíduos. Mais detalhadamente, o Gráfico 6 mostra que 38% das instituições operam com
menos de 100 clientes, 32% tem entre 100 e 500 clientes em seus programas, 16% agregam
tem 500 ou mais clientes e menos de 1.000 e as IMF's que possuem clientes ativos de 1.000 à
1.999 representa cerca de 7% do total do Brasil. O que prevalece no quadro institucional são
as menores IMF's.
Gráfico 6:
Distribuição de IMF's por n° de clientes
140 121
120
N° de IMF's
100
80
60 46 39
40 19
20 8 9
0
0-99 100- 500- 1000- 2000 ou Total
499 999 1999 +
Faixa por n° de clientes
I.3.2 Microconclusão
44
de R$ 43,4 milhões para R$ 138,8 milhões. Esse aumento tem um reflexo qualitativo no
empréstimo médio, aumentando seu valor estimado em 55%.
45
CAPÍTULO II - AS CARACTERÍSTICAS DA DEMANDA
46
que possui receita bruta anual dentro dos limites R$ 120.000,00 (inferior) e de R$ 720.000,00
(superior), respectivamente (Lei 9.317 de dezembro de 1996).
1
Remuneração média quer dizer, neste texto, o total de salários e outras remunerações das MPE's divididos pela
população ocupada em atividades destas empresas.
2
Isso é explicado pelo fato dos setores de indústria e serviços empregarem trabalho mais qualificado em suas
atividades.
47
Segundo Schonberger, as microempresas são parte substancial de todas as empresas
que operam na economia nacional reunidas em 9,5 milhões de firmas e representando a
proporção de mais de 90% de todas as empresas3. O estudo do SEBRAE "Políticas de
Pequeña e Mediana Empresa en Brasil", diz que essas empresas de ordem micro são
responsáveis por 60% da força de trabalho, 48% da produção nacional, 21 % do PIB, tendo
relação de dependência direta com elas 45 milhões de pessoas4. Se considerarmos as firmas
com no máximo 4 empregados, as microempresas figuram dentro dos setores de indústria,
comércio e serviços com 46%, 78% e 82%, respectivamente, do total de firmas operantes5.
II.1.1 Microconclusão
A análise apresentada acima revela a diversidade dos focos adotados nas discussões
acerca do público a que se destina o microcrédito. Há definições quanto aos empreendimentos
objetivados pelo crédito produtivo popular quanto à lei, que define de acordo com a receita
bruta, há uma conceituação de acordo com o número de trabalhadores utilizados pelas
3
SEBRAE, 1997. in: Schonberger, Steven. "Microfinance Prospects in Brazil". Banco Mundial.
4
SEBRAE. Políticas de Pequeña e Mediana Empresa en Brasil. Documento apresentado à Mesa Redonda:
POLÍTICAS Y PROGRAMAS PARA LA PEQUEÑA E MEDIANA EMPRESA. Washington, D.C, Banco
Interamericano de Desenvolvimento, 1998.
5
Goldmark et al. 2000.
1
GALVÃO, Luís E. Crédito Popular: de grão em grão se faz o pão. Rumos, dezembro de 1998.
48
unidades produtivas, como a do IBGE, e outras também representativas. O conceito quanto ao
microempreendimento sofre variações que revelam sensíveis diferenças em relação ao objeto
de estudo quando focado na demanda potencial das microfinanças. São os
microempreendedores, é certo, e eles compõem uma parcela significativa da economia
brasileira, tanto na ótica da produção quanto na ótica do emprego. Porém, para clareza do que
estamos procurando explicar, há a necessidade de estabelecer um conceito de demanda
potencial que homogeneize o objeto em estudo neste capítulo, e de onde possa se determinar o
que é essa demanda e quanto representa no Brasil, em número, e como está distribuída pelas
grandes regiões.
Diante dos dados apresentados e das estimativas existentes, dada a diversidade das
discussões e pontos a que se referem, para efeito da análise a ser realizada neste texto vamos
adotar as estimativas sobre o número de mcroempreendimentos no Brasil realizadas pelo PDI-
BNDES e através do estudo "Entendendo as Microfinanças no Brasil" de Nichter et al (2002).
49
II.2.1 A metodologia utilizada
Formalidade:
Empresas formais:
4 empregados ou Corte urbano/rural:
Número de menos (1)
. Microempreendimentos
no Brasil Empresas informais
urbanas (2)
Empresas informais
Fazendas rurais de
menos de 10 hectares
(3)
7
Christen, Peck R. “Commercialization and Mission Drift: The Transformation of Microfinance in Latin
America”, 2001.
50
Os dados utilizados para realização da estimativa através deste modelo são retirados de
estudos publicados pelo IBGE, relacionados aos quadros numerados. O quadro (1) refere-se
às empresas formais, com 4 ou menos empregados. Foi utilizado o Cadastro Central de
Empresas do IBGE para reunir informações sobre empresas com este perfil e registradas em
cada região brasileira. Elas representam 24% dos microempreendimentos em 2002. O quadro
(2) diz respeito às empresas urbanas informais. Para sua quantificação foi utilizado o Estudo
de Empreendimentos Informais Urbanos, publicado em 1997 pelo IBGE. A metodologia deste
estudo consiste numa pesquisa estatística em grandes áreas metropolitanas em todo o Brasil,
objetivando estimar o nível de informalidade das atividades econômicas urbanas. Extraiu-se
deste estudo a porcentagem da população economicamente ativa de cada região que
desenvolve atividades na informalidade. Com os dados da população economicamente ativa
de cada região (dados encontrados na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do
IBGE, de 1996 a 1999) determinou-se o número de pessoas trabalhando no setor informal
urbano nos anos de 1996 a 1999. Dividiram-se esses últimos dados pelo tamanho médio das
empresas informais para determinar o número de microempreendimentos urbanos informais,
por região brasileira nos anos de 1996 a 1999. O resultado obtido foi de 58% de
empreendimentos informais na área urbana, do total de microempreendimentos. O quadro (3)
representa as fazendas rurais com menos de 10 hectares. Os dados foram obtidos do Censo
Agrícola de 1995 do IBGE. Calculou-se a relação entre o número de fazendas de menos de 10
hectares e a população economicamente ativa em cada região. O valor percentual gerado foi
aplicado à população economicamente ativa de cada região a fim de determinar o número de
fazendas menores que 10 hectares por região ao longo dos anos de 1996 a 1999. Somando-se
todos os dados gerados, calculou-se o número de microempreendimentos por região de 1996 a
1999. Calculando-se as taxas de crescimento compostas anuais de três anos, tomando como
referência os dados de 1996 a 1999, estimamos os valores para os anos de 2000 a 2002. O
resultado foi de 18% dos microempreendimentos em 2002.
51
agrega 12,5 milhões de microempreendimentos, o que representa 77% do total estimado. De
acordo com a estimativa deslocada no tempo, entre os anos de 1998 a 2002, o crescimento do
setor se dá a uma taxa de 3,7% ao ano8. O setor formal foi o que obteve maior taxa de
crescimento, com uma taxa média de 6,7%, e o setor informal aumentou à taxa de 3% ao ano9.
Porém em números absolutos, houve um acréscimo de 800 mil microempreendimentos
formais, enquanto ao setor informal foi estimado um incremento de 1,4 milhão de
microempreendimentos.
Gráfico 7:
Microempreendimentos formais e informais por região
(2002)
7
1,9
6
0,7
5
N° ME's
4 Formal
(milhões)
3 1,0 Informal
4,5 4,6
2
0,2 0,1
1 1,7
0,8 0,9
0
SE NE S CO N
8
Baseado em Nichter et al, 2002. Ver Gráfico 1, desta monografia.
9
Silva e Barbosa citam no texto "O sentido do trabalho Informal na construção de alternativas
socioeconômicas e o seu perfil no Rio de Janeiro.", o estudo da PREALC que de 1986 a 1990 os trabalhadores
na informalidade passaram de 24% para 29% da PEA.
52
As regiões ainda revelam o aprofundamento da sua população economicamente ativa
(PEA)10 com as atividades microempreendedoras. Embora a região Sudeste possua a maior
parcela de microempreendimentos, a região Nordeste é a que possui a maior cota de
microempreendimentos em relação a sua PEA. No Sudeste encontram-se 6,4 milhões de
microempreendimentos, dos quais 4,5 milhões são informais, e uma PEA de mais de 34
milhões de pessoas. O Nordeste reúne 5,3 milhões de microempreendimentos, dos quais 4,6
milhões são informais, para uma PEA de mais de 22 milhões de pessoas. Essa proporção da
população economicamente ativa por região que desenvolve atividades microempreendedoras
indica em que tipo de trabalho parte significativa da população emprega seu tempo, dadas as
opções de emprego de seu trabalho.
10
A população economicamente ativa segue a definição adotada pelo IBGE: população com idade igual ou
superior a quinze anos. Os dados relacionados à PEA foram tirados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios do IBGE, 1999. A PEA do Brasil é de 79.315.287. Na região Sudeste é de 34.422.715, no Nordeste
22.344.532, no Sul de 13.150.894 e no Centro-Oeste de 5.749.675. Na região norte foi calculada a PEA da zona
urbana (3.533.532). Esses dados foram retirados de DIEESE/2000-2001-ANUÁRIO DOS TRABALHADORES,
com base na PNAD.
53
de possíveis obrigações com outras instituições. Explicitar algumas de suas características é
necessário para entender a natureza microeconômica de uma parcela significativa da demanda
potencial dos serviços financeiros especializados em microempreendimentos e as
possibilidades de relação desses negócios com instrumento de financiamento de suas
atividades.
11
Ver os itens I.2.1 e I.2.2 .
12
Essa discussão se baseia nos textos: "O sentido do trabalho Informal na construção de alternativas
socioeconômicas e o seu perfil no Rio de Janeiro.", de Silva e Barbosa, 200X; "Mapa do Trabalho
Informal", de Jakobsen; Martins; Dombrowski; Paul e Pochmann, 1996 e "O Trabalho Informal no Brasil",
publicado pelo DESEP/CAP - Departamento de Estudos Sócio-Econômicos e Políticos/Centro de Apoio na web
da CUT.
54
mercado ou ao consumo dos trabalhadores formais. Por exemplo, um microempreendedor
pode fornecer brincos, pulseiras e cordões para uma empresa de bijuterias, ou um desenhista
que faz painel para festas de aniversário pode vender seus serviços a um buffet. Portanto, uma
característica do setor informal é a sua dependência dos setores mais dinâmicos da economia
(setores do sistema capitalista), tanto de seus níveis de investimento quanto dos salários
despendidos.
Dada a discussão anterior, a questão mais importante para analisar a relação dos
demandantes de microcrédito, entre os serviços de microfinanças, com as instituições
ofertantes é a natureza do microempreendimento quanto a sua estrutura, organização e diretriz
capitalista. Os empreendimentos informais não são estritamente capitalistas, pois não há uma
divisão clara entre trabalho e capital, são poucos estruturados, possuem baixa produtividade e
dinamismo econômico.
12
Os primeiros são produtores que oferecem seus produtos às empresas demandantes como peças de confecção,
bijuterias e outros; e os segundos são camelôs, ambulantes, pedreiros, etc.
13
Essa discussão se baseia na elaboração dos dados sobre trabalho informal realizados pelo DESEP/CAP-
Departamento de Estudos Sócio-Econômicos e Políticos/Centro de Apoio, com base na Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios, IBGE, 1997.
55
termos absolutos o número de empregados tenha aumentado (carteira assinada aumentou em
mais de 1 milhão, enquanto os sem carteira assinada em mais de 600 mil), a maior parcela do
aumento líquido do total de trabalhadores se deu entre os trabalhadores doméstico, informal e
empregadores. Com destaque para os trabalhadores informais14 (ver Tabela 2). Esses
trabalhadores estão predominantemente situados nas grandes regiões metropolitanas,
concentrando-se em áreas urbanas. Ao compararmos os dados divulgados no estudo do
DESEP/CUT, verificaremos que aproximadamente 80% dos trabalhadores desenvolvem
atividades não-agrícolas. Dado que nem todas as atividades que se desenvolvem na área rural
são agrícolas, nem todos situados nesta margem de 80% são trabalhadores inseridos em áreas
urbanas.
Tabela 2
14
O aumento em número absoluto dos trabalhadores totais, segundo o DESEP/CPA/CUT, foi de mais de 4
milhões. Mais de 73% desse aumento foram distribuídos, principalmente, entre os trabalhadores domésticos,
informais e empregadores. Dentre esses três tipos de trabalhadores, os informais tiveram a maior participação
com mais de mais de 60%, e sobre o aumento total foi mais de 44%.
15
São basicamente ajudantes familiares de pequenas unidades produtivas.
56
Os trabalhadores autônomos do setor informal estão distribuídos nas mais diversas
atividades. Elas se concentram principalmente nas atividades agrícolas, na prestação de
serviços diversos16, no comércio de mercadorias e na indústria de construção com as
participações de 28,18%, 22,06%, 19,42% e 11,65%, respectivamente (ver Tabela 3).
Tabela 3
Um outro ângulo a ser explorado é o quanto está aprofundado o trabalho informal nas
grandes regiões brasileiras, mais especificamente nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul, onde se
concentra a maior parte do microempreendimentos conforme a estimativa do PDI-BNDES.
16
Com serviços diversos quer se dizer que são basicamente os serviços pessoais, que, assim como o comércio e a
construção civil, são caracterizados pela oferta de postos de trabalho de baixa qualidade e produtividade, nos
aspectos referentes à remuneração, qualificação exigida, estabilidade do vínculo, entre outros.
57
4, com dados de 1997, o Sudeste possui cerca de 45% de seus trabalhadores com carteira
assinada, o Sul 39% e o Nordeste com aproximadamente 23%. O contraste com o
aprofundamento do trabalho informal nas regiões indica que onde há maior dinamismo
econômico e tendência em gerar maiores quantidades de emprego formais, o emprego
informal da mão-de-obra tem menor participação. No Nordeste o trabalho informal representa
33,6% dos trabalhadores desta região. O Sudeste tem 23,4% e o Sul tem 25,1%. Quanto ao
emprego considerado formal, porém, sem carteira assinada, característica de precariedade, o
Nordeste ainda possui a maior parcela em relação a sua população de trabalhadores, com
17,9%. O Sul e o Sudeste possuem respectivamente 13,5% e 11,1%.
Tabela 4:
Distribuição dos Trabalhadores (agrícolas e não-agrícolas) Segundo sua posição na Ocupação nas regiões
Sul, Sudeste e Nordeste - 1997.
Quando visto pelo ângulo do rendimento, o trabalho informal em cada região revela
diferenças. De acordo com O DESEP/CUT, 80% dos trabalhadores informais desenvolvem
atividades econômicas por conta própria. Com base na Tabela 5, o rendimento médio dos
trabalhadores por conta própria na região Sudeste excede os rendimentos dos empregados em
12,5%. No Sul essa diferença fica na casa dos 4%, porém no Nordeste a renda média dos
autônomos é aproximadamente 29% menor que a renda média dos empregados (de carteira
assinada ou não).
58
estrutura empresarial, logística e financeira bem desenvolvida, em especial o Sudeste, que
suplanta as demais regiões do Brasil. Utilizando o pressuposto de que "quanto maior a
geração de emprego e renda no setor formal, comandado pela lógica capitalista, maior é o
rendimento médio do trabalho informal" 17, dado que os indivíduos e agentes do setor formal
compõem parte significativa da demanda do setor informal, tem-se um componente que
reforça as diferenças entre os rendimentos médios do trabalhador autônomo do setor informal
nas regiões.
Tabela 5:
Rendimento Médio dos Trabalhadores (agrícolas e não-agrícolas) por Categoria Ocupacional nas Regiões
Sul, Sudeste e Nordeste - Setembro de 1997.
17
DESEP/CAP-Departamento de Estudos Sócio-Econômicos e Políticos/Centro de Apoio, publicado na web da
Central Única dos Trabalhadores (CUT).
18
Este item se baseia em LUSTOSA, T.Q. & FIGUEIREDO, J.B.B. Pobreza no Brasil: métodos de análise e
resultados. Rio de Janeiro: UFRJ. Texto para discussão n° 205, 1989, e ROMÃO, M. C. Pobreza: conceito e
mensuração. Brasília: IPEA, 1993. (Cadernos de economia, 13)
59
microempreendimentos, informalidade e pobreza. No Brasil, em grande parte as discussões
que envolvem a problemática do microcrédito estão diretamente relacionadas com o que este
instrumento de financiamento alternativo tem com o problema da desigualdade social e com a
pobreza, como forma de combatê-la.
"No Brasil, em 2001, cerca de 14,6% da população pertencem às famílias com renda inferior à linha de
extrema pobreza e 34% às famílias com renda inferior à linha de pobreza. Para uma população, pertencente a
famílias em domicílios permanentes, de 165 milhões de pessoas, em 2001, o número de pessoas consideradas
pobres é de cerca de 56 milhões enquanto que o de indigentes é de 23 milhões"19.
19
Conhecimento e Desigualdade, IETS, 2002.
60
A pobreza é a condição de carência em que vivem determinados indivíduos ou
população de uma sociedade de satisfazer suas necessidades básicas de alimentação, moradia,
saúde, educação e vestuário, por viverem com uma renda insuficiente para aquisição, ou
propiciar o acesso, desses bens ou por não haver uma oferta adequada de bens de consumo
suficiente à saciedade das necessidades básicas. É a privação do indivíduo de participar do
circuito de trocas em escala suficiente para que satisfaça não seus desejos de consumo mais
amplo, mas de bens que conferem a ele a capacidade de sobreviver biologicamente, e de
forma saudável, com acesso a oportunidades de obter conhecimento e preparo profissional e
de um lugar em condições de habitação. Essa privação é conseqüência direta a escassez de
meios de pagamento por parte dos classificados como pobres para realizar o circuito de trocas.
A pobreza vista pela privação relativa diferencia grupos sociais que não tem acesso
aos meios de subsistência de que desfruta a maioria da população, e por isso são considerados
como pobres. Uma situação em que os recursos destinados à manutenção da sobrevivência
estão disponíveis para a maioria da população, mas há um grupo que não desfruta destes
recursos então ocorre uma situação de desvantagem e o problema está na distribuição. A
pobreza relativa aponta os grupos desfavorecidos por não acessarem os meios - determinado
grau de consumo de bens pessoais, a qualidade dos serviços de educação e saúde ofertados, as
oportunidades de emprego e condições de trabalho e as possibilidades de lazer, e a fração da
20
SEN, A. Three notes on the concept of poverty, world employment porgramme research Working. Genebra:
I.L.O, 1978, citado por Lustosa et al, 1989.
21
Com isso quero dizer moradias em condições de saneamento básico adequadas e segundo os parâmetros
aceitos de habitação no sentido físico-estrutural.
61
população que tem acesso a esses produtos, o que ainda depende da natureza da sociedade em
avaliação - utilizados na determinação do padrão de vida médio da população22.
“Para SEN (1978), a abordagem relativa complementa, em vez de competir com a noção absoluta.
SZAL (1977) argumenta que desigualdade não necessariamente implica em pobreza: em uma distribuição de
renda muito desigual, pode não haver privação absoluta, enquanto em uma região uniformemente pobre pode
não haver desigualdade”. (LUSTOSA, 1989, p. 8)
Em seu texto, Lustosa (1989) propõe que o padrão absoluto deve prevalecer em
situações, locais, onde a maioria da população é carente. Nesse caso os valores médios dos
atributos selecionados para a medida do bem-estar/pobreza podem não ser satisfatórios, pelo
baixo nível de bem-estar em relação às outras regiões mais ricas. No caso em que o padrão de
vida é mais alto, as medidas de pobreza relativa, ou privação relativa, se tornam mais
apropriadas, dado o nível de bem-estar em que se encontra a maioria da população.
Romão diz em seu texto "Pobreza: conceito e mensuração", que as discussões teóricas
tradicionais de economia, mais especificamente a teoria neoclássica, a Economia Política
clássica e a análise marxista, não incorporam explicitamente a questão da pobreza como
categoria analítica específica23.
22
Lustosa et al, 1989.
23
ROMÃO, M. C. Pobreza: conceito e mensuração. Brasília: IPEA, 1993. (Cadernos de Economia, 13)
24
Romão, 1993.
62
havendo uma distinção clara da pobreza como um fenômeno originado dentro destas relações
econômicas25.
25
Romão, 1993.
26
Romão, 1993.
27
“Onde impera a subjetividade em graus variados não se pode esperar que a base conceitual do fenômeno seja
tratada de forma incontroversa”. Romão, 1993.
28
Romão, 1993.
29
Canuto, Ottaviano in "Doses de Microcrédito Contra a Pobreza", publicado jornal VALOR ECONÔMICO em
02/01/2002.
63
microfinanças, é uma das formas de combate à pobreza servindo como ponte entre as
necessidades de crédito para constituição material dos microempreendimentos, "uma gama de
atividades de pequena escala, baixos requisitos de capital, tecnologia e qualificação de mão-
de-obra, que nem por isso deixam de ser agregadoras de valor e de constituir-se em
30
oportunidades para pequenos investimentos" , e um sistema que confira crédito de forma
adequada às características de econômicas e sociais dos microempreendedores, como pobreza,
por exemplo, e aos negócios em si31. Devemos ainda ressaltar que "a ausência de garantias
patrimoniais, as dificuldades de seleção e monitoramento das operações, as escalas mínimas
de transação da instituição financeira típica etc., impedem o engajamento desta naquele
32
mercado potencial." E os trabalhadores operam em condições precárias, e vivem com
insegurança financeira e baixa renda.
A discussão sobre pobreza delineada neste item da monografia é uma base conceitual
que define a situação em que se encontra grande parte dos microempreendimentos que
demandam microcrédito, sendo os empreendedores pessoas em que estão situadas no estrato
social que sofre de escassez de recursos, com ênfase na renda, e de reflexos como entraves
nas oportunidades de participação no sistema social e econômico de forma efetiva, são pobres,
e que constituem o perfil social amplamente configurado entre os demandantes potenciais de
microcrédito.
30
Canuto, Ottaviano in "Doses de Microcrédito Contra a Pobreza", publicado jornal VALOR ECONÔMICO em
02/01/2002.
31
Ofertar fontes de recursos para máquinas de costura, instrumentos para artesanato, equipamentos de cozinha,
pequenos barcos de pesca, carroças, etc.
32
Canuto, Ottaviano in "Doses de Microcrédito Contra a Pobreza", publicado jornal "VALOR ECONÔMICO"
em 02/01/2002
33
Esta seção se baseia em Brusky & Fortuna, 2002 , e Nichter et al, 2002, e Wright, Graham A.N. 2001. Market
Research and Client-Responsive Product Development, Microsave-Africa.
34
Devemos novamente ressaltar que os estudo de Brusky & Fortuna, 2002, adotam baixa renda como a faixa de
2 à 3 salários mínimos, com base nas classificações utilizadas pelas prefeituras de Recife e São Paulo em seus
programas junto às população carentes.
64
Os microempreendedores, em geral, demandam acesso rápido aos recursos; poucas
exigências de garantias, que a documentação exigida seja apropriada (simples) e que as
instituições ofertantes estejam localizadas convenientemente, isto é, próximo ao local onde
35
funcionam seus negócios e/ou moradia. São preferências consistentes com a situação de
precariedade em que vivem. Nichter et al, 2002, coloca que algumas preferências são
peculiares à realidade brasileira. São elas: "comprar tempo e não dinheiro" e empréstimos
com parcelas menores e prazos maiores.
35
Vide: item I.1.2 do capítulo I desta monografia. Estas demandas são generalizadas em todas as situações
referentes no mundo.
36
Normalmente de acordo com a realização de receitas, no presente ou futuro, e com o pagamento de outras
dívidas não negociáveis.
37
Gallager et al, 2002, diz que em algumas populações pobres pesquisadas os microempreendedores, grupos
entrevistados, "distinguiam entre comprar a crédito, que é considerado uma negociação sobre o tempo; e aceitar
um empréstimo, que é considerado uma transação financeira".
65
Há características que são particulares ao tipo de microempreendimento quanto as suas
atividades desenvolvidas. Por exemplo, para os fazendeiros a rapidez em relação ao
desembolso do crédito não é tão importante, já que a dinâmica de suas atividades exigia maior
tempo para planejar a combinação dos elementos essenciais para plantar e colher sua
produção. Ainda, os microempreendimentos rurais prefeririam casar os pagamentos a serem
quitados com o seu fluxo de caixa. Em relação ao urbano, o meio rural apresenta maior
tendência em trabalhar na configuração de grupos, seja associativismo, cooperativismo ou
outras conformações. Mas no geral, a demanda rural por serviços financeiros no Brasil teria
necessidades não atendidas. E segundo Nichter: "é interessante ressaltar que a maioria dos
produtores rurais tinha experiência com tecnologias bancárias avançadas: os desembolsos
mensais dos benefícios de assistência governamental de desemprego, distribuição de cestas
básicas, auxílio escola e pensões são obtidos através de máquinas automáticas em agências
locais de bancos, utilizando um cartão de débito." 38
38
Nichter et al, 2002.
39
Com base em Grant, William. 1999. Marketing in Microfinance Institutions: The State of the Practice.
Development Alternatives International, citado por Nichter et al, 2002.
66
disponibilidade dos serviços financeiros, dos trâmites para obter o financiamento e
das responsabilidades envolvidas por parte dos demandantes. Há uma difusão do que
são os serviços financeiros em áreas ainda inacessíveis aos produtos.
(iii) Nos mercados desenvolvidos as IMF's cobrem quase toda a demanda potencial, com a
maioria das filiais desenvolvidas. Os clientes tomam conhecimento das possibilidades
e diversidade de instituições e produtos microfinanceiros por elas ofertados,
aumentando as relações competitivas do mercado (exigem mais qualidade do serviço,
preços e vantagens mais atraentes).
A esses fatores alie-se a baixa cobertura alcançada pelas IMF's (2% da demanda
potencial), e temos uma mescla entre um mercado que reflete características de um mercado
incipiente com um mercado mais desenvolvido em que os clientes sofisticados que podem
exigir condições que confiram qualidade e adequação dos produtos frentes as suas
preferências e necessidades. Essa característica é distintiva do mercado de microfinanças
brasileiro, onde a IMF's tem a necessidade de estabelecer padrões operacionais e desenvolver
formas para oferecer serviços com vista ao público que os demanda.
II.3 Microconclusão
40
Nichter et al, 2002.
41
Nichter et al, 2002.
42
Nichter et al, 2002.
67
se encontra o campo de estudos sobre microfinanças no Brasil e a necessidade de mais
pesquisas sobre as características das populações de microempreendedores, demandantes
potenciais de microcrédito.
68
A análise sobre a demanda revela que os demandantes potenciais exigem condições
mais apropriadas a sua precariedade para que acessem a serviços financeiros produtivos. Eles
encontram impossibilidades de utilização do setor formal bancário, e buscam outras formas de
financiamento como o crédito ao fornecedor, ao que parecem buscar flexibilidade prazos com
adequação dos pagamentos às suas receitas auferidas, em datas e montante. Prazos adequados,
parcelas menores e relação com o credor são importantes parâmetros para a decisão entro
tomar um empréstimo ou não.
69
CAPÍTULO III - A BAIXA PENETRAÇÃO: CAUSAS E NATUREZA
Ao que vimos, durante a discussão do texto, o Brasil tem condições para que se
configure um quadro bem desenvolvido do setor de microfinanças, porém a penetração das
IMF's no Brasil se encontra bem reduzida com 2% de cobertura de toda demanda potencial
estimada, e revelada, segundo a metodologia utilizada pelo PDI-BNDES. O quadro é bastante
significativo e, comparando com a consolidação dos programas ofertantes de microfinanças
na América Latina, deixa algumas questões em aberto sobre "o que leva o Brasil, frente as
suas condições propícias ao microfinanciamento, atingir tão baixa escala de demanda
efetivada pelos produtos microfinanceiros, especialmente o microcrédito". Com condições
propícias, em síntese, quer se dizer que há experiências ao longo de décadas de programas de
microcrédito1 de IMF's, uma ampla base de clientes em potencial e um quadro estabelecido
pelo setor bancário tradicional que reflete o esquecimento dos empreendimentos de baixas
escala e renda.
1
No Brasil a introdução do crédito produtivo popular iniciou-se em 1973 com o Projeto Uno, tendo várias outras
experiências desde então.
70
opções de serviços financeiros de que se utilizam as pessoas no geral, e que serviços são mais
utilizados pelo público alvo do microcrédito. Na próxima etapa iremos apresentar as causas
tidas como mais razoáveis na literatura e analisá-las criticamente, tentando estabelecer uma
ordem de importância e relação existente entre elas como possível explicação do quadro atual
do setor de microfinanças no Brasil. Vamos também propor algumas sugestões de quais
aspectos são importantes do ponto de vista da abordagem das instituições diante da
problemática em questão. Devemos ressaltar que o tema é ainda recente no debate econômico
e que o que se tenta é esclarecer, senão cooperar para um avanço, sobre a natureza das
discussões e do quadro microfinanceiro brasileiro.
71
e o Norte com aproximadamente 0,2%. A Tabela 6 mostra os valores da demanda potencial e
dos clientes ativos relacionados a cada região brasileira.
Tabela 6
Distribuição da demanda potencial e efetiva por região com taxa de penetração respectiva.
2
Esses dados são retirados de Nichter et al, 2002, com base em Christen, Peck R. “Commercialization and
Mission Drift: The Transformation of Microfinance in Latin America”, 2001.
72
Brasil possui 2% de penetração, e se encontra em posição consideravelmente inferior, em
termos de penetração, no setor de microfinanças, em relação aos países da América latina
apresentados. Ao observarmos o caso da Bolívia, por exemplo, sua demanda efetiva foi de
mais de 63% maior que a demanda potencial estimada. (ver Quadro 3)
Demanda Potencial
País Clientes Ativos Taxa de Penetração
Estimada
3
Microempreendimentos elegíveis são aqueles que estão na proporção arbitrada por Christen, e expresso na
seção II.2.2 do capitulo 2 desta monografia, que significam 50%. Essa proporção pode ser mudada dependendo
do foco da análise.
73
pelo sistema de crédito tradicional. Isso quer dizer que a demanda, tendo claramente
necessidades de microfinanciamento de suas atividades produtivas, comporta-se de forma
inelástica em relação à oferta existente, sabendo-se que a quantidade de recursos financeiros
ofertados não tem se configurado como o principal problema da baixa cobertura do setor
microfinanceiro4. Um ponto importante a ser analisado é o grau de substituição que os
demandantes conferem aos produtos alternativos ao microcrédito disponíveis nos mercados
formais, semiformal e informal de produtos financeiros. Portanto, para analisar o peso que
outras vias de financiamento possui na satisfação das necessidades financeiras dos
microempreendedores temos de analisar que alternativas de financiamento esses pequenos
agentes encontram.
Grande parte das camadas de baixa renda da população não tem acesso ao setor
bancário formal5. Mas diante das barreiras encontradas neste setor, os microempreendedores
encontram compensações nos mercados semiformal e informal para atender às suas
necessidades financeiras. Os serviços financeiros ofertados pelos setores formal, semiformal
ou informal, podem ser, por exemplo, sob a forma de crédito em dinheiro ou o crédito
parcelado. Não é o interesse, deste texto, especificar os produtos em si, mas sim indicar as
opções mais comuns de serviços alternativos ao setor bancário formal e ressaltar a tendência
do uso desses serviços pelos microempreendedores.
4
Atualmente as IMF's não encontram obstáculos em obter recursos para operar no mercado de microcrédito,
sejam obtidos por doações ou financiados por instituições financeiras.
5
Segundo a publicação McKinsey and Company. 1999. Produtividade no Brasil: A Chave do Desenvolvimento
Acelerado,” Editora Campus (Adaptado por Míriam Leitão), 70% da população brasileira se encontra em total
exclusão do sistema financeiro formal.
74
crédito e das Cooperativas de múltiplo propósito. Algumas ONG's realizam troca de cheques.
Quando parcelado tem-se as modalidades de crediário da lojinha e crédito dos fornecedores.
6
Quer dizer não ter nome apontado nos serviços de proteção ao crédito (SPC, Telecheque, SERASA, etc.)
7
Não há consultas às instituições de proteção ao crédito como o SPC, SERASA, Telecheque, etc.
75
obrigações passadas não são verificadas, e a documentação também obedece às exigências de
acordo com as possibilidades do cliente8. Há uma maior comodidade em adquirir os
empréstimos por essas vias, dado que as relações entre os demandantes e ofertantes são mais
simples e a liberação mais rápida. Assim mesmo analisar esta situação é muito complicado,
pois não há como sabermos o quanto significa a elasticidade de substituição entres os
diferentes tipos de serviços oferecidos, e se há uma relação consistente com as condições
estabelecidas entres as exigências cobradas na oferta, escolha e o setor procurado para
aquisição dos serviços microfinanceiros. No entanto, nos parece possível que a relação
contratual não seria o fator de maior peso na decisão em adquirir o crédito pelas vias formal,
semiformal ou informal. Mas sim a exigência de documentação e adimplência com obrigações
financeiras anteriores, pois essa opção inviabilizaria grande parte dos tomadores potenciais de
crédito produtivo popular. Por outro lado, a relação entre tomador e ofertante seria
importante, pois os indivíduos em situação de precariedade poderiam preferir se relacionar
com um ofertante que se colocasse de forma menos constrangedora, querendo saber menos
sobre sua vida material, e efetivando a liberação em grande parte com base na confiança em
sua palavra para realização do pagamento.
8
Os setores semiformal exigem CPF e contra cheque, há casos que nem isso se exige, e o informal não há
qualquer exigência de documentos. O nome não precisa estar nos serviços de proteção ao crédito. Esses setores
ainda não exigem contrato formal para liberação do crédito. Os agiotas podem exigir assinaturas de notas
promissórias,, porém a difusão desse ofertante de crédito é intensa entre as camadas populares, as quais mostram
não se importa com os juros extorsivos que cobram.
9
Para uma discussão mais detalhada ver: Soares, Ricardo P., “Evolução do Crédito de 1994 a 1999: Uma
Explicação”, Texto para Discussão No. 808, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Brasília, julho
2001.
76
crédito às empresas10. Lembrando que os bancos comerciais geralmente relutam em oferecer
crédito aos micro e pequenos empreendedores.
10
Vide: Nichter et al, 2002.
77
O crédito ao fornecedor é um substituto em alto grau dos serviços microfinanceiro
ofertados pelas instituições no Brasil, utilizados por negócios de vários portes. Essas
condições de pagamento são utilizadas como estratégia para consolidar uma relação comercial
com clientes atuais em um prazo mais longo, além de atrair novos clientes pelas boas
condições que possa oferecer como renegociação sobre custo e prazo da obrigação pendente.
Nas populações de Baixa renda estudada por Brusky e Fotuna, 2002, o crédito
parcelado, categoria que engloba o cheque pré-datado, o fiado, o crediário da lojinha, por
exemplo, e que possui diferentes taxas de juros, é a forma mais utilizada pelas populações de
baixa renda. Mesmo existindo o reconhecimento e o entendimento de que a compra parcelada
tenha no final das contas maior custo do que tomar um empréstimo, havendo a possibilidade
de escolha entre as duas formas, a crédito parcelado é a opção geralmente escolhida.
"Comprar a crédito significa ganhar um prazo suficiente para poder reunir as condições
necessárias para efetuar os pagamentos. O que está sendo negociado é o tempo e, na cabeça
da maioria dos microempreendedores, há pouca ou nenhuma correlação entre compras a
crédito e operações financeiras. Pedir empréstimo, sim, é uma operação financeira, para os
microempreendedores: o que está sendo comprado é o dinheiro, a ser pago em valor maior do
que o que lhe foi dado (Para “comprar” R$ 1.000 , por exemplo, paga-se R$ 1.800 ou
mais)"11.
O crédito é visto como uma forma normal de adquirir uma dívida em troca de
consumo presente, onde a cobertura das exigências é suficiente para ocorrer liberação. Os
empréstimos, quando não automáticos, têm de ser justificados frente ao pedido, sendo mais
complicado o processo de negociação. Essas razões reforçam a raridade com que essas
11
Brusky e Fortuna, 2002. (citando Gallagher et al, 2002)
78
populações recorrem ao empréstimo para o financiamento de seus desejos de consumo12. O
que pode em parte ser explicado por uma perspectiva cultural, que reflete o valor atribuído
pelos indivíduos às duas diferentes vias de financiamento.
"Enquanto alguns desses produtos estejam fora do alcance da maioria dos microempreendedores, outros
estão especialmente focados na população de baixa renda. Manter este contexto em mente é fundamental, na
medida em que o setor financeiro tem uma forte influência sobre mercado de microfinanças brasileiro. ... sobre a
demanda, outros produtos não só se colocam como substitutos, mas moldam a percepção e expectativas dos
clientes atuais e potenciais de microfinanças". (Brusky e Fortuna, 2002).
12
No sentido estrito, crédito significa formas facilitadas de pagamento de compras ou de serviços, que não
envolvem transferências físicas de dinheiro da parte de quem concede para a parte de quem toma, mas sim,
ocorre uma negociação de bens ou serviços, com um custo embutido no preço da mercadoria. No sentido amplo,
crédito ultrapassa os limites financeiros, a assume o sentido de hábito de cumprir os compromissos assumidos,
qualquer que seja a natureza desses compromissos, financeiros ou não. Ou seja, confiança. Os empréstimos são
estritamente a concessão de dinheiro do emprestador para o tomador. É uma compra de dinheiro por um valor
79
último nas populações potencialmente demandantes, ainda mais pela percepção do que
significa empréstimo para os demandantes potenciais, já que o microcrédito é uma forma de
empréstimo. Esta relação será mais explicitada nos próximos itens deste capítulo.
mais alto do que o seu valor de face, onde o emprestador recebe no futuro o pagamento por abrir mão do uso do
80
utilizar essa alternativa financeira. A facilidade e rapidez para conseguir um empréstimo são
elementos de grande importância, pois reflete na opção que um indivíduo demandante de
crédito faz por um serviço específico ou outro. Essa relação determina o grau de substituição
que a demanda confere aos demais serviços financeiros em relação ao microcrédito. A
elasticidade de substituição entre os produtos financeiros, considerando as preferências e
níveis de satisfação que os demandantes conferem a cada produto, é um fator importante a ser
analisado, e não disponível nos textos sobre microfinanças, que revela quanto os demandantes
estariam dispostos a adquirir um serviço em relação ao outro.
O mais importante é que existe uma demanda que acessa outros serviços financeiros
em detrimento de empréstimos, o que também engloba o microcrédito, e que a magnitude da
demanda potencial brasileira de microcrédito, 8,2 milhões de microempreendimentos, requer
um sistema institucional ofertante capaz de oferecer serviços microfinanceiros adequados e
suficientemente fortes para realizar a cobertura de tão grande demanda. O que poderia
requerer investimento e políticas específicas para o setor
dinheiro no presente.
13
Vide: item I.2.2.2.1 desta monografia.
81
No Capítulo II examinamos a demanda, efetiva e potencial, de microcrédito no Brasil.
Apresentamos as diferentes abordagens existentes na literatura sobre as micro e pequenas
empresas, além dos microempreendimentos. Optamos por adotar a quantificação da demanda
estimada pela metodologia utilizada pelo PDI-BNDES, explicitando os parâmetros adotados
para se chegar ao resultado: 8,2 milhões de microempreendimentos potencial demandantes. A
razão para adotar esta estimativa é que ela propõe um tratamento conceitual homogêneo de
microempreendimentos, utilizando os dados do IBGE, principalmente, para quantificá-las
diante das várias perspectivas de estimativas. Discutimos o setor informal, parte
representativa da demanda potencial de microcrédito, dando ênfase ao trabalho, em termos de
informalidade, de forma quantitativa e qualitativa. Abordamos, ainda, a inserção dos
microempreendedores no estrato social em que se situam, de acordo com a renda e condições
de precariedade em que sobrevivem, ressaltando a existência daqueles que são mais
dinâmicos economicamente e apresentam recursos (conhecimento, certa quantia de dinheiro e
boas condições para crescerem e se desenvolverem) para o seu desenvolvimento, aqueles que
possuem condições estruturais para gerar renda (conhecimento, tácito ou não, capitais fixos e
mão-de-obra), porém necessitam de dinheiro para comprar equipamentos necessários à
viabilização da produção (como bombas d'água para irrigar sua pequena plantação), e aqueles
que dispõe de pouquíssimos recursos e por isso estão abaixo ou nas proximidades da linha de
pobreza. Por último, discutimos a necessidade que a demanda, analisada nas seções
anteriores, tem pelos serviços financeiros e que características esperam que a oferta tenha para
satisfação de suas necessidades.
82
14
tradicionalmente ignorado as micro e pequenas empresas" . No Brasil há cerca de 30 anos
instituições atuam no fornecimento de microcrédito, inicialmente através do Projeto UNO15,
com experiências desenvolvidas ao longo das décadas, a demanda potencial é estimada em 8,2
milhões de microempreendimentos, utilizando serviços custosos e clandestinos e com uma
ampla necessidade por financiamento, e dificuldades de acesso ao sistema bancário
tradicional.
14
Goldmark et al, 2000.
15
Vide: nota 33, do Capítulo I desta monografia.
83
formular uma explicação definitiva para situação. O assunto ganhou força recentemente no
Brasil e carece de maior tempo para amadurecer. Ainda, devemos ressaltar que analisar as
causas é um ponto importante para que estudos posteriores formulem sugestões de abordagem
local baseada em microcrédito, caso seja o objetivo, para melhorias das condições de
reprodução de microempreendimentos, microempresas e as de pequena escala, na geração de
renda e emprego e promoção do desenvolvimento.
Vamos apresentar aqui, com base nas discussões publicadas sobre a situação do
microcrédito no Brasil, os argumentos que considerados como mais aceitos como explicações
da baixa penetração do microcrédito no Brasil frente às condições que se representariam como
"boas" para que o microcrédito tivesse maior profundidade, atualmente, na relação com a
grande demanda potencial existente.
O Ambiente Regulatório16
16
Esta apresentação é baseada principalmente em Nichter et al, 2002, Goldmark et al, 2000, e Haus et al, 2002.
17
Citado de Goldmark et al, 2000.
18
Vide: item I.2.2.2.3 desta monografia.
19
Vide: item I.2.2.2.4 desta monografia.
84
As IMF's brasileiras sofrem de restrição, com base na lei, quanto aos serviços
microfinanceiros que podem oferecer às populações demandantes, comparando às instituições
do mesmo ramo que funcionam em outras partes do mundo. Esses produtos são
principalmente poupança e seguros20. Essa restrição não significa necessariamente um entrave
ao setor, porém, se focar-mos na visão estratégica de longo prazo de um programa, e
administrativamente, o planejamento das IMF's fica restritamente focada no microcrédito,
podendo-se comprometer o aprofundamento de sua relação com os clientes e a sua
credibilidade no local21. Outro ponto importante, é que uma oferta mais diversificada de
produtos microfinanceiros contribui para solidez, e sustentabilidade, das IMF's viabilizando
economicamente sua atuação no local, além de suprir uma demanda com serviços financeiros
mais adequados aos demandantes (empreendedores de baixa escala). Por exemplo, os
depósitos são uma fonte de recursos de baixo custo financeiro para as IMF's, os quais
poderiam ser revertidos em recursos para realização de mais empréstimos aos
microempreendedores. O Quadro 5 aponta algumas restrições das IMF's, e dos bancos.
20
Em termos do desenvolvimento de novos produtos, é certo que prestar diretamente serviços de seguros, penhor
ou empréstimos para habitação estaria fora de questão, do ponto de vista jurídico, para as instituições de
microfinanças no Brasil, enquanto outras instituições no mundo, como os bancos Grameen, Bangladesh, e
Rakyat, Indonésia, recebem depósitos e oferecem serviços de seguros. Vide: Goldmark et al, 2000.
21
No curto prazo, as IMF's não estão preparadas para oferecer serviços de poupança e seguros. Para ver mais de
talhes sobre este parágrafo vide: Haus et al, 2002.
21
No Brasil, os serviços de penhora são monopólio concedida à Caixa Econômica Federal por lei.
22
Quer dizer que a instituição deve ter conhecimento e consolidação local, além de um aparato técnico
administrativo de fundos de poupança para operam com segurança e fazer frente às responsabilidades de saques
o recebimentos de depósitos.
85
proporção dos depósitos à vista e dos depósitos em poupança sejam usados em programas de
crédito rural e habitacional" 23.
"Os investidores estrangeiros podem ser desestimulados de investir na indústria brasileira das
microfinanças, uma vez que deparam restrições monetárias e prolongados processos de registro". (Nichter et al,
2002).
Essa questão depende da relação que o Banco Central estabelece com as instituição
financeiras que queiram investir no setor, principalmente entre financeiras que queiram
investir em SCM's. Se assim o permite, e diante das exigências que se cobra para que estas
instituições obtenham permissão, então o setor formal pode ver desestímulo para entrar no
setor de microcrédito.
No caso dos recursos humanos utilizados pelas IMF's, as leis trabalhistas são
complexas e desestimulantes para as instituições que queiram contratar mais empregados e/ou
mais qualificados, dado que existe os custos de contratação, por um lado, e os limites
financeiros24, por outro lado. E mais:
"... as leis trabalhistas complexas podem criar riscos para as instituições que pretendem usar incentivos
financeiros para motivar os empregados. Atividades criativas às vezes permitem que as IMF's contornem os
regulamentos: o Banco do Nordeste terceirizou muitas funções do programa CrediAmigo, em parte para facilitar
o uso de incentivos financeiros para os funcionários da carteira de crédito". (Nichter et al, 2002)
23
Nichter et al, 2002.
24
As IMF's não geram seus próprios recursos, estando dependentes, praticamente, de subsídios e doações.
86
são obscuros25. Isso pode significar um desestímulo, ao ser bem custoso construir meios para
conseguir as autorizações para realizar outras atividades. Há dificuldades de as IMF's se
autoprotegerem da responsabilidade jurídica, o que pode torná-las avessas ao risco, um
desestímulo à entrada, e mais complicado identificar as mudanças necessárias no ambiente
regulatório para conferir maior liberdade de atuação econômica das IMF's.
O Ambiente Macroeconômico
As altas taxas de inflação, até 1993 a inflação anual foi de mais de 2.600% e em 1994
de cerca de 1.700%, tornou as operações de financiamento inviáveis, com a perda rápida do
valor dos empréstimos e gerando problemas de pagamento por parte dos devedores, frente ao
crescimento em progressão geométrica dos juros cobrados. As pequenas empresas e os
microempresários, os quais possuíam menos alternativas para proteger o valor de compra de
seu dinheiro, solicitavam menos crédito para realização de atividades produtivas26. Por outro
lado, outras atividades que não o empréstimo, como mercado de ações e aplicações em dólar,
tornavam-se mais atrativas do ponto de vista financeiro, por causa da inflação, provocando
redução em sua oferta. Esse período afetou, no sentido de limitar, tanto a oferta quanto à
demanda de microcrédito.
"As atividades relacionadas com a inflação em geral alcançavam um pico de 41,9% da receita dos
bancos em 199227. Ao deslocar a atenção do setor financeiro das atividades creditícias — e ao reduzir a demanda
de empréstimos dos microempresários — a hiperinflação tolheu o desenvolvimento da indústria de
microfinanças". (Nichter et al, 2002)
25
Haus et al, 2002.
26
Vide: Nichter et al, 2002.
27
Esses dados sobre a taxa de inflação são do Banco Central e baseados no IGP-M.
87
estabilização da economia proporcionou o fortalecimento, dentro relativo, das microfinanças
no Brasil, embora comparado com outros serviços financeiros, como o empréstimo pessoal e
o crédito parcelado, voltados predominantemente para o consumo, tenham alcançado escalas
bem mais significativas28. Goldmark coloca que: "O crédito privado (ao consumidor) como
percentual do PIB brasileiro subiu ligeiramente desde 1995, passando de 27% a 30% em
1997, embora voltasse a cair para 28% em 1999, após a desvalorização e o subsequente
aumento das taxas de juros. A tendência de aumento do crédito deve continuar. Embora a
proporção do crédito privado para o PIB seja baixa em comparação com países como os
Estados Unidos (63% em 1995 e 71% em 1999) ou Alemanha (123% em 1999), a proporção
no Brasil é igual ou superior à da maioria dos países latino-americanos"29. Se comparada à
taxa de crescimento anual do crédito ao consumidor com o crédito para capital de giro, no
período de janeiro de 1999 a abril de 2002, o primeiro teve 50%, enquanto o segundo 17%30.
28
Segundo os dados do mercado geral de crédito pessoal do Boletim do Banco Central do Brasil, junho de 2002,
o crédito pessoal, não imobiliário, atingiu a escala de R$ 60 bilhões, enquanto, até o mesmo período a carteira
ativa das microfinanças atingiu R$ 138,8 milhões. Dimensão significativamente maior do crédito pessoal,
considerando que este financiamento abrange clientes de todas as faixas de renda da população brasileira.
29
Citação de Goldmark et al, 2000, baseando-se em Steven Schonberger, "Microfinance Prospects in Brazil",
2001, Gustavo Braga, num estudo apresentado no Fórum sobre Microcrédito no Rio de Janeiro, 24 de janeiro
de 2000, e João Salima Neto, "O País dos Enforcados", publicada na revista VEJA, 9 de fevereiro de 2000.
30
Nichter et al, 2002, com base nos dados do Banco Central do Brasil.
31
Vide: item I.3 desta monografia.
88
microempresários são em geral altamente flexíveis32". "Por exemplo, quando as condições
econômicas decadentes do Zimbábue levaram o país a uma taxa média de inflação de 44,5%
entre 1997 e 2000, os clientes que necessitavam fazer frente aos pagamentos ajustaram suas
empresas, muitas vezes diversificando seus produtos ou iniciando uma nova empresa"33.
Portanto, as estratégias que adotam as IMF's, considerando o perfil de sua oferta e o público
demandante, para operar em ambientes instáveis economicamente e de pouco crescimento é
importante para o aprofundamento que estas IMF's consolidam em seus locais de atuação.
Ainda assim, as características culturais são importantes, pois as experiências internacionais
podem estar centradas em locais onde a relação do público com alternativas de crédito via
IMF's podem não sofrer resistência e se desenvolver. Essa questão (cultural) é complexa e não
compete a esta monografia analisá-la.
32
Nichter et al, 2002.
33
Nichter et al, 2002, citando McGuire, Paul B., Conroy, Jonh D. 1998. “ Effects on Microfinance of the 1997-
1998 Asian Financial Crises”, FDC Publications.
89
instituições. É uma causa da baixa penetração das microfinanças no Brasil, tendo que se
relacionado a outros fatores para avançar na explicação desta situação.
34
Vide; Goldmark et al, 2000, e Schonberger, 2001.
35
Nichter et al, 2002, citando Brusky, Bonie. 2002. “ Prospecting the FUNDAF Market: An Overview of
Demands, Competition, and Client Satisfaction”.
36
vide: Romano, Jorge O.; Buarque, Cristina M. 2001. Crédito e Gênero no Nordeste Brasileiro. Rio de Janeiro:
AS-PTA.
90
fornecimento de microcrédito das IMF's nestas áreas. No confronto entre as ofertas do
microcrédito e das linhas de crédito dirigido, este segundo ganha espaço pela estrutura de que
dispõe, institucional e financeira, e pelos atrativos de pagamento dos empréstimos e a forma
amena com que cobram as dívidas.
37
Para uma discussão mais detalhada vide: Romano e Buarque, 2001.
38
Nichter et al, 2002.
91
cidades. Ainda assim, essas linhas elaboram processos burocráticos, longos e problemáticos,
com várias análise de seus negócios e a obrigatoriedade na participação de cursos de
treinamento, até a liberação dos empréstimos às microempresas, contraditoriamente à
característica do microcrédito. Como foi dito no Capítulo II desta monografia, os
empreendedores rurais podem esperar um prazo maior para liberação do empréstimo, dada a
natureza do processo produtivo de suas atividades, porém, os empreendedores urbanos
elegíveis dessas linhas de crédito não podem esperar tanto tempo, sob pena de perder
oportunidades comerciais importantes para sobrevivência dos seus negócios. Devemos
ressaltar, que os microempreendedores informais, com 4 ou menos empregados, tem acesso
quase nulo a esses recursos39.
Em fim, a influência das linhas de crédito do setor público parece ter mais importância
nas áreas rurais, dado que 18% das microempresas são rurais, principalmente afetando o
comportamento da população demandante e na imagem que o microcrédito pode ter aos
microempreendedores, causando-lhes confusão em relação aos objetivos das IMF's. No meio
urbano, sua influência se torna mais limitada, embora as linhas de crédito públicas existentes
nesse meio devam ser avaliadas, a fim de se evitar problemas futuros com a imagem do
microcrédito criada pelo público demandante.
39
Nichter et al, 2002.
92
No Brasil não há um efeito demonstração onde se possa avaliar com base técnica a
realidade que cerca o sistema operacional das IMF's. Torna-se difícil aprender com as
experiências se não há como analisar os resultados, separando as potencialidades e limites
para que se formule um modelo mais eficaz de intervenção das IMF's através do microcrédito.
Mesmo o Banco do Nordeste que possui parte significativa dos recursos efetivados com
microcrédito (opera através do CrediAmigo 54% de todos os clientes ativos do país e 33% da
carteira ativa total) não é considerado um efeito demonstração, pois, "a transparência limitada
de seus resultados financeiros e do seu modelo operacional impede outras IMF's, instituições
interessadas, de saberem se devem confiar no que o banco diz sobre seu próprio
desempenho"40. Observando o contexto internacional das microfinanças, várias instituições
possuem grande sucesso em sua atuação. Na América latina temos o BancoSol, na Indonésia
temos o Banco Rakyat Indonésia, em Bangladesh o Banco Grameem, além de outros. São
instituições de reconhecido desempenho financeiro, com potencial incentivador para o setor
de microfinanças local. No entanto, as experiências internacionais não podem servir de
exemplo para o Brasil, dado a nossa peculiaridade cultural, os indivíduos não mostram o
tamanho interesse que os microempreendedores dessas localidades demonstram pelo
microcrédito. Por outro lado, as características culturais heterogêneas que nosso país
apresenta põem em vista estratégias diferenciadas para cada região e localidade.
40
Nichter et al, 2002.
93
mais baixos em relação ás IMF's). Podem ainda, ter acesso a maior volume de recursos para
implantar sucursais, de forma menos custosa, e desenvolver programas mais eficientes,
obtendo maiores resultados. Como mostramos, uma demanda potencial existe e em massa.
Porém, o setor formal encontra-se afastado das microfinanças, e a falta de uma experiência de
sucesso pode ser o indicador de que as IMF's precisam estabelecer estratégias para efetivar
uma demanda pelo acesso a um sistema de fornecimento de crédito produtivo popular
adaptado e adequado às características do público demandante, dando maior cobertura aos
microempreendimentos no Brasil.
Como foi discutido acima, no Brasil não há um "efeito demonstração" entre as IMF's,
com indicadores confiáveis que demonstrem a viabilidade das instituições. O Banco do
Nordeste, através do programa CrediAmigo, tem significativa penetração na região Nordeste,
porém seus dados são pouco claros, sobre o desempenho financeiro do programa. Acredita-se
que o que o programa CrediAmigo mostrou é que há demanda no Nordeste, mas que não se
tem certeza de um mercado que funcione com operações sustentáveis. Além do mais, esse
banco se aproveitou de sua rede agências e logística, conferindo-lhe baixos custos e vantagens
comparativas. As outras instituições, como o CEAPE-Pernambuco, são lucrativas, porém seus
94
dados não esclarecem detalhes sobre sua condição como instituição auto-sustentável41. Isso
quer dizer que esses programas não são conhecidos como detentores das melhores práticas.
Como mostrado no item I 3.1 desta monografia, a grande maioria das instituições (121
instituições) operam com menos de 2.000 clientes, e que o número de instituições que operam
com menos de 1.000 clientes é de 104 (ver Gráfico 6). Financeiramente, isto quer dizer, que a
maioria não opera em escala suficiente para serem rentáveis e construir solidez institucional
na situação, havendo uma prevalência de IMF's no quadro institucional do setor brasileiro.
Esse quadro revela alguns aspectos que tornam as IMF's vulneráveis as análises mais
rigorosas do comportamento técnico de seus processos. Porém, devemos ressaltar que pode
ser necessário algum tempo de ajuste com a realidade de mercado, no sentido das
demonstrações financeiros e profissionalização dos recursos humanos utilizados das IMF's,
para que elas se tornem mais profissionais, sustentáveis e que ganhem maior solidez
institucional.
Conforme o apresentado no item III. 2.1., há cinco causas tidas como mais relevantes e
que tentam explicar a baixa penetração do panorama institucional de microcrédito no Brasil
frente às condições que seriam propícias para o desenvolvimento mais acentuado do setor,
isto é, uma penetração maior que a de 2%. Não se determina o quanto seja essa penetração
para confirmar o aprofundamento. Nem de que forma ela se dará, em valor médio do
41
Duvida-se que os programas de sucesso no Brasil funcionem a base do subsídio, e que não geram, com os
próprios recursos capacidade se sustentar como instituição.
42
Goldmark et al, 2002.
95
empréstimo, número de clientes, sustentabilidade das instituições, etc. Somente temos a idéia
de que uma relação sólida entre a alternativa de microcrédito como financiamento de camadas
populares produtivas, que geram emprego e renda, passam por todos esses requisitos, pois a
relação da demanda com o uso eficiente do microcrédito em suas atividades produtivas é tão
importante quanto a eficiência administrativa que as IMF's promovem em suas operações e
gestão de recursos de sua competência.
O que se fará é, diante dos dados e fatos expressos durante toda a monografia até antes
deste item e retirados dos textos que tratam do assunto ou tem ligação com o assunto, tirar
algumas conclusões que avancem no entendimento do que representa cada causa para a
aceleração do crescimento do setor microfinanceiro, propondo um ordem de importância e
eliminado algumas aceitas como causas. Portanto é uma proposição explicativa das causas e o
que podem representar para a questão do crescimento das microfinanças no Brasil.
96
várias razões que levam os indivíduos potencialmente demandantes torna-se "improcessável",
portanto, incompreensível diante da metodologia existente.
Pelo lado da instituição, formular estratégias para atrair os clientes pode requerer
medidas que compensem esse risco (descrito no parágrafo acima), normalmente tornando o
empréstimo mais barato. Porém, ao optar por esta estratégia incorre-se em elevados custos
operacionais e de captação de recursos para constituir os fundos, os quais podem
comprometer o andamento dos programas. Além do mais, as IMF's nessa situação adversa de
97
instabilidade tem de ter conhecimento de como operar com altas taxas de inflação, caso em
que a sustentabilidade financeira pode se fragilizar com muito mais facilidade.
O setor bancário volta-se totalmente para outras operações, como nos mercados
financeiro e cambial, por exemplo, e não há incentivo que o faça se interessar pelo setor de
microfinanças, além deste setor (microfinanças) ser descaracterizado como elegível tomador
de empréstimo pelo setor bancário, por não cobrir exigências requeridas e possuir grandes
riscos incorporados ao fornecimento de empréstimos a essa camada de produtores.
98
Quando na época da estabilização, consolidação a partir de 1995, as IMF's não
possuíam aprofundamento de seus programas de microcrédito, estavam "fracas". Da
implantação do Plano Real até o momento decorreram pouco mais de 8 anos, e a pergunta
agora é: foi tempo suficiente para que as IMF's encontrassem formas e condições para
expandir suas carteiras e clientes ativos? Tem-se a idéia que não, pois trabalhar com
microcrédito é complicado, conforme analisamos durante a monografia, e leva algum tempo
para que as IMF's amadureçam institucionalmente para que atinjam níveis de operação
consideráveis, caso contrário ocorreria se houvesse um aquecimento do setor e os
demandantes procurassem essa alternativa de financiamento produtivo, hipoteticamente
colocando. Mas, assim mesmo, esbarraríamos no conhecimento do público sobre as IMF's,
que conforme apresentado no Capítulo II desta monografia, elas não são conhecidas.
Em relação às taxas de juros, conforme analisada no item anterior deste capítulo, elas
continuaram altas após e estabilização o que dificultava as operações das instituições e seu
fortalecimento financeiro e institucional, além de inibir as oportunidades das micro e
pequenas empresas, desde o desaquecimento da economia até o aumento dos custos
financeiros envolvidos na tomada de empréstimos.
99
macroeconômico adverso foi, possivelmente, a principal causa desse estado incipiente em que
se encontram as microfinanças no Brasil atualmente, pela ausência de parâmetro financeiros e
econômicos constantes para realização de planejamento dos agentes envolvidos para desenhar
um sistema de financiamento alternativo que atendesse um crescente número de pequenas e
microempresas que apareciam no cenário econômico nacional. Ledgerwood, 1998, apresenta
em sua publicação "Microfinance Handbook: An Institutional and Financial Perspective" uma
série de produtos financeiro, além do microcrédito, que podem ser ofertados aos micro e
pequenos negociantes, de baixa renda. Mostra ainda "desenhos" de produtos quanto a forma,
objetivo e características que procuram a adequação às necessidades, condições e
características pessoais da maioria dos empreendedores de baixa renda. Se a regulamentação
do setor de microfinanças impõe uma série de restrições quanto à atuação das IMF's,
principalmente em relação à diversidade de serviços financeiros que podem ser ofertados, essa
adequação, a qual defendemos em toda monografia, fica em detrimento do fato de que a lei
permite praticamente que as instituições ofertem apenas microcrédito. Essa determinação
restringe as estratégias das IMF's, seu aprendizado sobre o processo de fornecimento de
microfinanças, "empobrece" e enfraquece sua relação com a demanda e sua constituição
institucional.
43
Os itens I.2 e I.3 discutem esses avanços no setor de microfinanças no Brasil, pelo lado da oferta.
100
IMF's cooperaram para o desenvolvimento dos negócios dos clientes, dando mecanismos de
segurança financeira e física ao capital dos depositantes e segurados, além de poderem
repassar os depósitos em valores de empréstimos àqueles negócios que demandam
microcrédito. O limite quanto aos serviços oferecidos aos demandantes impedem que as
instituições se fortaleçam como instituições de financiamento e conheçam seu mercado,
fazendo com que as IMF's deixem de ampliar suas carteira e aproveitar oportunidades de
crescimento.
No entanto essa questão é sensível à crítica, pois operar com maior número de serviços
financeiros não quer dizer que haja uma efetivação da demanda por estes serviços. Os
negociantes podem procurar empresas especializadas em seguros, por exemplo, e proteger seu
capital contra acidentes, roubos e outras perdas. Podem procurar o sistema de poupança no
mercado formal para depositar seus ganhos e assim formarem suas reservas. Porém, ao olhar
pelo prisma das restrições que a lei impõe, as experiências que as instituições podem agregar
ao seu conhecimento podem estar comprometidas. Podem fazer com que se foque em um
serviço e não aprendam, na prática, o que as populações estão dispostas a absorver como
serviços financeiros alternativos ao setor formal e como é possível oferecer os serviços de
forma mais adequada às necessidades dos demandantes.
44
Vide: item III.1.2 desta monografia.
101
finalidade de lucro, e que outras instituições que visem o lucro passem a operar no mercado
de microfinanças45. Foi, sem dúvida, um avanço capaz de produzir interesse das instituições
em atuarem, cada qual com seu fim lucrativo, no setor de microfinanças46. Porém, o tempo
talvez não seja o bastante para avaliarmos com maior precisão se os efeitos de tais mudanças
são suficientes para imprimir um maior crescimento do setor.
45
Para rever a discussão sobre os objetivos das IMF's existentes vide o item I.2.2.2 desta monografia.
102
sociedade. O quadro legal que compete ao setor microfinanceiro especificava a questão dos
serviços alternativos de financiamento às camadas produtivas populares. Não havia estímulo
para que se formulassem leis específicas que colocassem o setor dentro de linhas de
tratamento jurídico que estimulasse, ou que não desestimulasse, as iniciativas a investir nas
microfinanças brasileiras. Até a promulgação da Lei 9.790, de março de 1999, o país viveu
períodos conturbados, entre instabilidade econômica e política, para que se concretizasse
algum estímulo jurídico que desse a importância devida às IMF's que operam no setor, ainda
mais que a importância do setor para a economia e sociedade brasileira não era reconhecida
pelos agentes como meio possível e viável de alavancagem das microempresas.
Cabe ressaltar que embora a lei estimule a entrada de IMF's no setor microfinanceiro,
nos formatos de OSCIP e SCM, pela isenção da Lei da Usura e/ou pela possibilidade de se
obter lucros com operações microfinanceiras, não é necessário para que se tenha um
aprofundamento da relação entre o setor ofertante microfinanceiro e a demanda potencial
existente. É necessário dar maior flexibilidade às IMF's para atuarem com formas alternativas
de fornecimento de microcrédito e outros serviços microfinanceiros, e não esperar que o
demandante vá até a instituição e assine um contrato com as responsabilidades da aquisição
de uma dívida em dinheiro, e com outros serviços além do microcrédito, para que se amplie as
visões estratégicas de longo prazo dos administradores de microfinanças no desenvolvimento
de um conjunto flexível de produtos.
A tradição do crédito dirigido é uma causa que atua com mais força no meio rural,
conforme discutido acima. Segundo a estimativa que adotamos, do PDI-BNDES, de que 18%
da demanda potencial de microfinanças são de microempreendimentos rurais, a maior parte
do setor microfinanceiro brasileiro não sofreria conseqüências dessa causa que acarretasse
baixa penetração. Cabe-nos ressaltar que o grande problema torna-se disciplinar, ou que,
principalmente, as facilidades com que as instituições que administram essas linhas de crédito
dão ao tomadores de empréstimo, seja nas condições de pagamento seja nas cobranças das
obrigações previstas em contratos assinados pelos devedores. Outro problema está na
"contaminação" que os programas de linhas de crédito produtivo públicas podem acarretar na
imagem das IMF's, levando os demandantes a acreditarem que os programas públicos de
oferta de crédito em pequena escala sejam o mesmo, em condições, que o realizado pelas
IMF's. Porém, essa possibilidade não é viável, já que a proporção de crédito no meio urbano é
46
Muitas ONG's se tornaram OSCIP para se isentar da Lei da Usura e ter maior flexibilidade na cobrança de
juros a fim de cobris seus custos de operação.
103
muito pequena e não teria resultado significativo no setor de microfinanças como um todo.
Em fim, dada a grande concentração em áreas rurais das linhas de crédito público ao setor
produtivo, e a pequena proporção da demanda potencial total estimada no Brasil estar nas
áreas rurais, as linhas de crédito dirigido do setor público não afetaria tanto as condições de
penetração do setor microfinanceiro. Seria uma causa que teria força na penetração do
microcrédito em áreas rurais.
Se as IMF's são fracas por fatores internos a sua estrutura e por conseqüências
externas, de âmbito econômico e jurídico, os quais impedem que estas instituições tenham
ganhos de aprendizagem com a experiência e ampliação da carteira e clientes ativos, então
essa "fraqueza" com que se qualifica uma instituição é um estado conseqüente de vários
fatores. A partir desse ponto, pode-se dizer que o microcrédito, atualmente, não consegue
maior penetração em parte por que as instituições são "fracas"47, mas ocorre que o estado de
"fraqueza" como estão as instituições é conseqüência, fundamentalmente, do cenário
econômico brasileiro de grande instabilidade e do quadro regulamentar que restringiu a
atuação das iniciativas interessadas em atuar.
104
brasileiras são pouco organizadas e não se dispõe de uma fonte de dados segura para que se
possa analisar seus desempenhos, até mesmo o Banco do Nordeste48. Portanto, essa carência
emerge de toda situação que envolve a ausência de políticas voltadas para o setor e o quadro
macroeconômicos dos últimos 20 anos, principalmente, onde as IMF's não conseguiram achar
um meio para penetrar na grande demanda potencial de microcrédito existente.
Da discussão até agora desenvolvida neste item da monografia, podemos ver que a
causa fundamental do atual quadro incipiente do microcrédito no Brasil, e do setor
microfinanceiro, foi a conturbada vida econômica do Brasil até 1994, com o descaso das
autoridades competentes em reconhecer a importância de um sistema de financiamento
adequado e alternativo as micro e pequenas empresas brasileiras, e de um sistema
regulamentar financeiro que não permitiu que se enxergasse o setor como opção de iniciativas
institucionais para concessão de crédito produtivo popular, desestimulando a entrada de
possíveis instituições operadoras de microcrédito. As linhas de crédito subsidiado, por se
concentrarem no meio rural, não teria influência no quadro de baixa penetração das
microfinanças no Brasil. E argumentos que apontam a "fraqueza" das IMF's e a ausência de
um "efeito demonstração" indicam, na verdade, conseqüências de uma correlação entre
ambiente macroeconômico desfavorável e regulamentação desestimulante para o
desenvolvimento das microfinanças no Brasil com taxas maiores de penetração.
Cabe-nos ainda fazer duas observações. A primeira é que a "fraqueza" das IMF's é um
desafio a ser enfrentado para que o setor encontre condições de se expandir. O mesmo pode
ser dizer sobre o "efeito demonstração", que pode partir de uma instituição que consiga
significativo avanço nos próximos anos e dê credibilidade às suas estratégias, expressando de
forma clara os meios e procedimentos de que se utilizou para atingir determinado nível
considerável. A regulamentação é muito importante, pois pode dar às instituições flexibilidade
para atuarem de forma mais coerente com o meio e consistente com seus objetivos. No
entanto, torna-se difícil apontar quais mudanças a rigor seriam suficientes para promover o
primeiro passo de forma segura. Lembrar-se que a demanda cresce a 3,7% ao ano e que a
conjuntura econômica aponta o desemprego acentuado que atinge tanto pessoas com baixa
educação formal, quanto com maior nível de educação formal. Isso significa potencialidades
para o surgimento de microempreendimentos geridos por pessoas mais capazes de lhe dar
47
Para saber o que significa "fraqueza" das instituições, veja as seções do item III.2.1 deste capítulo que trata do
assunto.
48
Vide: Nichter et al, 2002.
105
com o mercado e por pessoas menos preparadas, e que tais desafios devem ser encarados no
sentido de aumentar a dinâmica do setor ofertante de microcrédito.
106
tem de enfrentar a fim de que se reestruture um quadro ofertante capaz de atrair e cobrir, com
um aparato sustentável de recursos e técnicas, uma demanda potencial existente.
107
CONCLUSÃO:
108
das instituições na demanda. Mesmo que algumas experiências internacionais tenham sido
bem sucedidas em ambientes economicamente instáveis, não serve como parâmetro para
compararmos com as conseqüências da hiperinflação sobre as microfinanças brasileiras, dado
que esses países possuíam uma economia muito menor e menos complexa que a brasileira, e
que os exemplos apontam períodos inflacionários bem mais amenos que o ocorrido até 1995
(no exemplo dado no texto refere-se à Zimbábue, cuja economia não se compara a do Brasil e
que as taxas inflacionárias anuais chagavam à aproximadamente 45%). Mesmo que se pense
que em determinadas economias uma taxa relativamente alta de inflação cause conseqüências
sérias ao sistema econômico, ainda assim permanece a idéia de que é relativamente
incomparável às conseqüências de uma taxa anual de cerca de 2.800%, como a do Brasil em
1993, dada a magnitude "desnorteante", do ponto de vista econômico e financeiro de uma
inflação tão alta quanto as atingidas pelo Brasil na década de 1980 e início da década de 1990.
109
as IMF's no cenário das microfinanças brasileiras atualmente. Mesmo que tenha se passado
cerca de 30 anos desde a primeira experiência, ao chegar na "era da estabilização" as IMF's,
que não encontraram formas de se desenvolver dentro de um ambiente macroeconômico
instável, apresentando-se como frágeis: não alcançaram escalas significativas, não geram os
próprios recursos financeiros para dar andamento aos seus programas (são dependentes de
subsídios e doações), na grande maioria. Isto quer dizer que não operam em escala
significativa para cobrir seus custos e que é questionável seu perfil profissional e sua
sustentabilidade. Até programas como o CrediAmigo do Banco do Nordeste que alcançou
escala significativa, com aparente lucratividade e baixa dependência de subsídios, são
questionados quanto as suas práticas e resultados pelos especialistas. Portanto, a adversidade
econômica e o ambiente regulatório desestimulante contribuíram com mais força para
manutenção da incipiência do setor de microfinanças ao longo dos anos.
110
No entanto como discutimos, a oferta se depara como uma demanda resistente ao
empréstimo e que encontra em outras formas de financiamento suas fontes de sobrevivência,
dando continuidade aos seus negócios.
De qualquer forma, construir um sistema institucional ofertante forte para o setor nos
perece fundamental para que se consiga maior penetração na demanda potencial. O setor
financeiro privado parece não mostrar grande interesse, diante das condições atuais das
microfinanças. As medidas mais fortes têm partido do Setor Público com iniciativas como a
criação da Comunidade Solidária, O Programa de Credito produtivo Popular e o Programa de
Desenvolvimento Institucional, ambos do BNDES, dos "Bancos do Povo", entre outros, se
constituem em alternativas importantes para se desenrolar as microfinanças no Brasil. Porém,
ainda são tímidas. O Terceiro Setor é outro importante ator, embora se ache duvidável que por
ele mesmo se consiga atingir escalas consideráveis com as microfinanças no Brasil.
1
IBAM, 2001.
111
As discussões sobre a problemática do crédito no Brasil apontam uma situação crônica
e afeta todos os setores da economia. Para operar com microfinanças o problema torna-se um
pouco mais complexo, pelas razões expressas nos Capítulos precedentes. Estabelecer
condições para "casar" oferta e demanda, como dito acima, é complicado. Na ausência de
atores que tenham condições de aprofundar a relação da demanda potencial com microcrédito
no Brasil, e de setores com maior poder para tal realização, mas que não demonstra um
interesse concreto nesse ramo, no curto prazo, para intervir com maior força, chamamos a
atenção para o papel do Setor Público na iniciativa de se tomar medidas mais firmes e
apropriadas para se conseguir melhores resultados.
2
"A criação de um ambiente propício ao desenvolvimento dos pequenos negócios pode ser a mola mestra de
uma modelo econômico menos excludente daquele que conhecemos no passado, é obra para muitos diferentes
níveis de governo, sociedade civil organizada e setor privado". Citação de Urani, André. Um Rio que derruba
mitos e tabus. IETS, 2002.
112
causa do atual quadro institucional e baixa penetração. Mesmo havendo a estabilização
econômica a partir do segundo meado da década de 1990, a situação das IMF's era de
"fraqueza", dada as baixas escalas de operação conseguidas conforme suas políticas e
estratégias de intervenção. A legislação e regulamentação para o setor serviram de reforço
para manutenção da situação de baixo desenvolvimento na medida em que restringiram
atuação das IMF's e desestimularam novas iniciativas de atores interessados em entrar no
setor. A "fraqueza" com que as instituições chegam atualmente é resultado dos entraves
descritos acima, porém torna-se o obstáculo principal que o setor enfrenta hoje em dia para
que se atinja maiores níveis de penetração. Esses três fatos seriam a cerne da questão da baixa
penetração do microcrédito no Brasil.
Diante da impossibilidade de atuação mais forte por parte do terceiro setor no ramo de
microfinanças, e do fato de que o setor financeiro formal sempre tenha ignorado as micro e
pequenas empresas, apontamos o papel do Governo como fundamental. Principalmente
trabalhando em conjunto com os atores do Terceiro Setor. Nesse caso, a idéia é que o
Governo intercale posições de apoio com estes atores na formulação de diagnósticos locais,
estudos focalizados e formulação de estratégias de intervenção que considerem a
idiossincrasia dos diferentes locais através de políticas públicas, focadas no microcrédito
como instrumento de promoção de desenvolvimento, mais adequados aos meios heterogêneos
onde se encontram insertos a maioria dos microempreendimentos.
113
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120
ANEXO
121