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OPINIãO

Repensar a política energética


10 Janeiro 2011 | 11:43
Cláudia DiasSoares -

Há que repensar as políticas públicas à luz do novo paradigma civilizacional que está
subjacente ao conceito de desenvolvimento sustentável.
Em Portugal, a política energética oferece-nos um bom exemplo de como a intervenção do Estado pode
simultaneamente prejudicar o ambiente e as finanças públicas.

As causas de degradação ambiental encontram-se frequentemente nas falhas do mercado, quando os


preços não reflectem correctamente o verdadeiro custo ou beneficio dos consumos ou a escassez dos bens,
mas também nas falhas do Estado, quando este financia bens ou comportamentos que degradam o
ambiente. Em ambos os casos, vão-se impor custos a quem deles não beneficia. Tal solução é injusta e
economicamente ineficiente por gerar níveis de procura em que a sociedade tem mais custos do que
benefícios. Num tempo de crise financeira existe uma janela de oportunidade para se corrigir estes erros.
Colocar um preço no ambiente, através de impostos verdes, e eliminar subsídios que distorcem a procura
em sentido ambientalmente perverso gera receitas públicas e reduz a poluição.

Porquê continuar a obrigar o comercializador de electricidade a comprar a preço-prémio energia eólica,


passando esse custo para o consumidor, através de uma subida significativa das tarifas de electricidade,
quando se pode tornar a energia limpa mais competitiva pela mera correcção dos preços? Os produtores de
electricidade que utilizam combustíveis fósseis são poluidores, mas ainda assim recebem pelo menos 90%
dos seus direitos de emissão gratuitamente. E lucram com isso. Recebem gratuitamente um activo com
valor no mercado (as licenças) e que capitalizam no mercado, passando-o como custo para o consumidor.
Porque não tributar esse ganho (windfall profit) como recentemente o Governo irlandês, no seu esforço de
consolidação orçamental, decidiu fazer?

Continuar a compensar as renováveis pelos custos das externalidades geradas pelas fósseis e espalhar esse
encargo por todos os consumidores de energia prejudica a atractividade de estratégias de composição do
pacote energético com cada vez mais renováveis e gera uma opinião pública desfavorável a estas, embora
sejam estas as que podem garantir um maior benefício social. As renováveis também devem ser
pressionadas a tornarem-se cada vez mais competitivas. O que se consegue obrigando-as a ir ao mercado
vender a sua produção, mesmo que haja garantia de aquisição e algum prémio, como acontece em
Espanha, em vez de se estabelecer administrativamente um elevado preço-prémio, como se faz cá.

A futura estratégia energética da União Europeia tem que passar pela segurança do fornecimento, por uma
economia de baixo carbono e pela competitividade em termos energéticos (i.e., eficiência). Manter os
subsídios às fósseis prejudica todos estes objectivos, além de dar um sinal errado ao mercado,
perpetuando a atractividade dos investimentos nas fósseis. O que atrasa o desenvolvimento de tecnologias
e processos de apoio às renováveis e, consequentemente, atrasa a sua competitividade.

A folga financeira assim criada poderia não só melhorar as contas públicas mas também permitir um maior
investimento na rede de transporte, de modo a torná-la apta a receber cada vez maior quantidade da
energia intermitente das renováveis, e na manutenção de capacidade de reserva para acudir a problemas
de falhas nas renováveis.

Professora Auxiliar da Universidade Católica Portuguesa


Consultora da Comissão Europeia no "Grupo de Alto Nível para A Competitividade, a Energia e o Ambiente"

http://www.jornaldenegocios.pt/imprimirNews_v2.php?id=462117 10-01-2011

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