No final do ano passado, o bispo de Limoeiro do Norte, no Ceará, Dom
Manuel Edmilson da Cruz, recusou uma homenagem do Congresso em razão de sua indignação a respeito do aumento de 61% aprovado pelos parlamentares. Segundo o bispo, aquele aumento seria um atentado contra os direitos humanos do povo brasileiro. Disse ainda, que os políticos que votaram a favor desse reajuste não representam o povo. Em meio a seu discurso, defendeu a criação de uma lei que atrele o reajuste salarial dos parlamentares ao do salário mínimo e das aposentadorias. Analisando a ideia defendida pelo bispo, é necessário ressaltar que tal atitude deveria ser tomada constantemente, pois trata de uma questão que afeta todo o país. A luta contra a corrupção é fundamental para a melhoria das condições de vida da população e por isso, deve fazer parte do cotidiano de todos. Não é possível aceitar o fato de que um aumento de 61% no salário dos parlamentares seja aprovado em sete minutos com 95% dos votos a favor de tal decisão, enquanto um projeto criado para fazer uma melhoria na saúde ou na educação, por exemplo, demore meses e até anos para ser votado e em muitos dos casos, tais projetos podem ainda ser recusados. Essa situação fere a dignidade do contribuinte, que trabalha quase cinco meses do ano para pagar impostos. Por isso, pessoas como esse bispo, que calou durante oito minutos todo o Congresso nacional, deveriam ser apoiadas com mais fervor, principalmente pelos meios de comunicação. É interessante lembrar que esse episódio não foi muito difundido pela mídia, talvez pelo desinteresse das emissoras em despertar na população uma consciência a respeito dos rumos que a política brasileira está tomando. Pode- se observar que a maioria dos programas de televisão não transmitem um conteúdo ligado ao desenvolvimento intelectual e, sim, visam entreter o povo transmitindo novelas e jogos de futebol, o que leva a uma alienação por parte dos telespectadores , fazendo com o que o interesse por assuntos ligados à política – que são de suma importância para o âmbito popular, pois influencia diretamente na vida das pessoas – caia vertiginosamente. Desse modo, torna-se muito mais simples para os corruptos manipular a população e desvirtuar-se de suas obrigações enquanto representante do povo, resultando nos enormes e inúmeros problemas sociais que atingem a nação, tais como educação de má qualidade e a precariedade na saúde pública. Em determinado momento do discurso do bispo, ele afirma que votar em político corrupto seria votar na votar na morte. Diante da situação vivida pelo país, sobretudo em relação à postura dos governantes em relação às necessidades do povo, não há palavras mais abrangentes, simplórias e objetivas que as proferidas por Dom Manuel nessa singela frase, que sintetiza fielmente o quadro político brasileiro. Outra questão que deve ser discutida com muita atenção diz respeito à criação de uma lei que atrele o aumento salarial dos políticos ao reajuste ao salário mínimo e da aposentadoria, de modo que ambos guardem a mesma proporção. A aprovação de uma lei dessa natureza mudaria bastante o procedimento dos políticos frente aos reajustes salariais, pois tornaria-se necessário analisar cuidadosamente a porcentagem a ser aumentada, levando em conta uma série de fatores, ligados diretamente a aspectos de fundo sociais, econômicos e até morais. O grande desafio, no entanto, é fazer com que um projeto desse tipo passe pela Câmara dos Deputados e pelo Congresso, o que seria bem difícil de acontecer, tendo em vista que tal decisão contrariaria os interesses de muitos parlamentares, especialmente os dos corruptos. É ingenuidade achar que um político capaz de aprovar um aumento como aquele, que representa um desrespeito explícito ao povo, irá votar a favor de uma decisão que provavelmente “prejudicará” suas aspirações. De acordo com Dom Manuel, “temos ali no Congresso pessoas competentes, boas pessoas, grandes homens, mas ninguém ainda do porte de um Nelson Mandela, que, ao tomar posse na Presidência de seu país, fez baixar em 50% o valor de seus honorários”. Ainda que haja políticos honestos e preocupados com o bem-estar comum, não se pode criar a falsa esperança, pelo menos a curto prazo, de que esses políticos – que na votação do reajuste constituíram 5% dos que foram contra a decisão – possam modificar repentinamente a mentalidade e as atitudes de todo o corpo parlamentar brasileiro presente no Congresso e nas demais câmaras, pois mesmo que criem um projeto que favoreça de fato o povo, este não seria aprovado, caso contrarie algum princípio da camada corrupta. Ao dizer categoricamente que aquele aumento era um atentado aos direitos humanos do povo brasileiro, o bispo caracterizou fielmente não só aquela decisão, mas também todas as demais ações exercidas pelo parlamentares que prejudicam a vida do cidadão. Não seria escárnio dizer que essas decisões têm também um fundo de ingratidão. Ora, o corrupto está atacando o cidadão, mas está atacando, sobretudo, o contribuinte, que na verdade sustenta, por meios dos altos impostos, toda essa corja parlamentar ou como disse Dom Manuel, “para-lamentar”. Após analisar cuidadosamente as colocações do bispo e fazer as observações pessoais a respeito da situação política do Brasil, pode-se concluir que é necessário haver uma conscientização popular em relação às questões de fundo político, pois são elas que provocam as mudanças profundas no país. É inimaginável que se possa aceitar passivamente todas as disparidades impostas pelos políticos desonestos, que não possuem nenhuma consideração pelo cidadão, pelo eleitor, responsável por conceder a tais pessoas o direito de ocupar um cargo criado justamente para representar e defender a população brasileira. É possível acreditar numa mudança em nosso país, mesmo a longo prazo, pois haverá um momento em que a omissão popular cesará e nessa hora teremos uma transformação na sociedade brasileira. Essa transformação irá despertar na mentalidade das pessoas um profundo interesse pelas decisões políticas e isso fará com que o cidadão escolha melhor seus candidatos, de modo que a corrupção se torne uma exceção e não a regra. No entanto, para que tais mudanças ocorram, é preciso haver uma revolução no campo educacional brasileiro, pois somente a formação de grandes mentes pode refletir na execução de grandes atos e só grandes atos constroem grandes nações.