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dedicar-se a isso exclusivamente, como exige qualquer arte quando se visa
ao máximo de perfeição. Para moldar o caráter deles, devem ser educados
desde a infância a serem corajosos, impetuosos e amáveis. Mas antes da
ginástica, é importante que se comece pela alma dos futuros guardiões.
Discorrendo também sobre essa questão, chegam à seguinte conclusão:
deve-se mudar a maneira pela qual os poetas concebem os mitos, de modo
que se coloquem os deuses como realmente o são, ou seja, como
totalmente bons e sempre idênticos a si, e não como seres por vezes
injustos, intrigantes e enganadores dos homens.
Em suma, esse é o teor do Livro II de A República, e quanto a ele há
duas observações pertinentes. A primeira é quanto a critica ao sofista feita
por Platão, que reduz ao absurdo a tese de Trasímaco, dialogando com ele
pela voz de Sócrates. Nesse horizonte, o que chama a atenção além da
crítica e da figura do retórico, assim como sua mera opinião - contrastante
com a busca da verdade empreendida por Sócrates - é a hostilidade com
que intimida os demais, o desejo que tem o primeiro de impor sua tese sem
permitir questionamentos por parte deles e, ainda, a exigência de
pagamento pelo que considera um serviço prestado. Do outro lado da
balança se encontra a simplicidade de Sócrates e sua humildade em afirmar
que nada sabe, e a forma como coloca seu raciocínio, construindo-o por
meio do diálogo com os demais na tentativa de aprender com eles, jamais
cobrando por isso.
Por fim, merece destaque a superação da mitologia que se coloca no
viés de controle da concepção dos mitos, submetendo-os a limites que
visam a não permitir a contradição entre eles e as leis da cidade. Ao
observar como se dá sua organização no diálogo, é interessante voltarmos-
nos à observação do fato de que nela não é a Paidéia aristocrática dos mitos
que norteia sua constrição, mas a busca da verdade empreendida numa
atitude filosófica. Pode-se perceber que, mesmo quando da discussão
acerca de como conceber os mitos a serem narrados aos futuros guardiões,
eles devem seguir certas leis, na medida em que não mais se apresentam
como ensinamentos em si mesmos. Vemos a mitologia servindo à educação,
pois os mitos devem submeter-se à filosofia, que aqui reclama centralidade
no regimento da vida prática em detrimento da tradição dogmática da
mitologia politeísta.
Bibliografia
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Platão, A República; tradução de Ana Lia de Almeida Prado; Martins
Fontes, 2006