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Espirit an © Devs ile Vivre, Espirito Santo O Deus que vive em nods Caio Fabio Publicado com a devida autorizagao e com todos os direitos reservados pela: EDITORA LUZE VIDA Rua Trajano Reis, 672 CEP 80510-220 Curitiba - PR Redagao com estilizagao do discurso oral: Allinges L. C. Mafra MacKn ight Coordenagao de produgao: Hans Udo Fuchs Capa e lay-out: Marianne Bettina Richter Impressao: Imprensa da Fé 12 Edicdo - 1991- CLC Editora 2? Edigao - 1991- CLC Editora 3? Edicao - 1993 - CLC Editora 4? Edicdo - 1996 - Editora Luz e Vida 5? Edicdo - 1997 - Editora Luz e Vida - 18-21 mil E proibida a reprodugao total ou parcial sem permissao escrita dos editores: Dedicatiria A Allinges Lenz César Mafra MacKnight, com minha gratidao por sua amizade, carinho e servicos prestados, espe- cialmente durante os ultimos trés anos. Allinges, sem sua efe- tiva dedicagéo, muitos dos meus livros — incluindo o presen- te texto — nao estariam ainda nas maos dos meus muitos leitores. Ao meu amadissimo filho Ciro Fernandes d’Aratijo, que com seu trabalho no computador tornou possivel que meus Ultimos livros viessem a publico sem enorme atraso. Obrigado, meu filho-amigo, por seu amor e boa vontade em servir 0 papai. indice I- Quem é 0 Espirito Santo?. 11 1. O Espirito Santo é Deus. 12 2. O Espirito Santo é uma pessoa. 16 1.0 eid Santo em relacao a Jesu: 2. O Espirito Santo em relacao a Palavra. 3. O Espirito Santo em relacao ao mundo. 29 4. O Espirito Santo em relacao ao crente. 31 5. O Espirito Santo em relagao a igrej 39 (UI} Pienitude do Espirito Santo... 1. A plenitude do Espirito como expe iéncia de crise 2. A plenitude do Espirito como um processo na vida. 52 3. Os sete principios sobre como obter a plenitude do Espirit 54 Didlogo e comunhao... . 55 Nutrigao do amor. 56 Ecumenicidad 57 O ciclo de Efésios. 58 Sofrimento e perseguica 65 A vida de oracao. 67 A Palavra... 68 Sinais da plenitude, 70 IV - O batismo com 0 Espirito Santo.. 73 1. Atos nao serve a teologia sistematica. 76 2. Teologia sistematica, somente nas cartas doutrinarias.. 77 3. O batismo com 0 Espirito Santo conforme o Novo Testamento... 78 4. Justificativas quanto a afirma¢&o pentecostal de ser o batismo com o Espirito Santo um segunda bén¢ao.......0 79 5. Por que afirmo que o batismo com o Espirito Santo é a conversao?.... iv} Os dons do Espirito Santo sao para hoje?... 1. Argumentos contestadores & movimentacao acerca do Espirito Santo . 2. O que aconteceu aos dons espi ituais entre os anos 400 e 1700. 3. Os dons existem e sao para hoje... {VI Distinguindo os dons do Espirito Santo ° 1. O dom de contribui 2. Odom de governo... VII - Obstdculos ao funcionamento dos dons no corpo de Cristo. VII - Como descobrir seus dons espirituai: 3.Odom de socorto.. 4.O.dom de administraga 5.O dom de misericérdia.. 6. Odom desabedori: 7. Odom deconheciment 8.Odom dafe 9.0 dom dacura... 10. Odom de operar milagres. 11.0 dom de discernimento de espiritos. 12.Odom de linguas.. 13. Odom de interpretaga 14. O dom de apostolad 15. Odom de evangelista.. 16. Odom de pastor... 17. O dom de solteiro ou de celibato. 18. O dom de pobreza voluntiria. 23. Odom de exortagac 24. O dom de hospitalidade. 25. O dom de missionari 1. Vencendo os obstaculos através de uma visdo equilibrada. 2.A que nos conduz o equilibrio?. 3. Dom de evangelist 4. Dom de pastor-mestr 5. Dom de operagao de milagres e cura. 6, Dom de socorro.... 7. Dom de governo, administragao. IX - Mutualidade dos dons no corpo de Cristo..... 1. Mandamentos da mutualidade referentes ao amor 2. Mandamentos da mutualidade referentes ao servico. 3. Comunhio espiritual entre os irmao.... 7 4. Mandamentos da mutualidade relacionados ao uso da lingua. X - Fluxo e refluxo do Espirito Santo no homem interior... Béngios do fluxo e do refluxo no nosso homem interior. 125 125 127 128 130 130 131 134 135 137 140 142 144 146 147 148 149 150 153 153 154 155 156 157 161 163 167 168 170 172 177 179 182 182 185 188 193 198 204 209 214 Prefacio O presente texto é resultado de uma série de pales- tras sobre o tema “Espirito Santo”, que realizei quando era pastor titular da Igreja Presbiteriana Betania, em Niterdi, e sentia, no dia-a-dia da minha experiéncia pastoral, como a tematica do Espirito Santo era mais que uma doutrina ou um fato abencoador na vida de muitos daqueles irmaos e irmas. Na realidade este assunto constituia para eles um elemento doutrinario altamente perturbador. Prova disso é que quase todas as semanas eu era abordado por pessoas que traziam consigo frustragdes, perplexidades e até enfermidades emo- cionais pelo fato de terem tido algum tipo de ma-relacao com grupos chamados carismaticos. Ora, como pastor, o que muito me perturbava era a constatagao de que elas acabavam, além de enfermas, um tanto cinicas com respeito ao genuino poder do Espirito San- to de Deus. Também havia aqueles que nao criam nas acées contemporaneas do Espirito, atribuindo quase sempre tais maus-contatos espirituais ao fato de o Espirito j4 nao estar em acao em nossos dias, razao por que as chamadas experi- éncias com ele nao passavam de meras experiéncias psicold- gicas, sendo vivenciadas com todos os riscos que tais relag¢des trazem em si mesmas. No entanto, como estava e estou convencido de que nao ha méa-relacao com o Espirito, o que sobrava para mim a nivel de conclusao era a dedug&o de que tais pessoas haviam- se relacionado com uma mera caricatura do Espirito. Eu nao negava que houvessem tido aluma experiéncia com o Espiri- to. No entanto estava convencido de que a satide de nossas relacdes —- tanto com os homens como com Deus — depen- de fundamentalmente de modo como entendemos a pessoa coma qual nos relacionamos. Assim, uma criatura maravi- 7 lhosa pode se tornar num elemento de promogao de en- fermidade emocional, se aquele que lhe devota tal amiza- de @ alguém que a encara numa perspectiva errada, distorcida. Foi por isso que resolvi entregar-me a estes estudos, que lhe chegam agora as maos na forma de livro. Minha intengao era tracar alguns perfis que pudessem ori- entar aqueles irmaos no seu discernimento de experiénci- as carismaticas. Alguns autores foram minhas fontes originais de inspiracao ou confirmacao de pensamento. Entre eles des- taco especialmente John Stott (Batismo e plenitude do Espirito Santo) e Michael Green (Creo en el Espiritu San- to). Alem desses, houve ainda dezenas de pequenos textos que no curso de minha vida tém nao so me influenciado como constituido fontes de inspiragao. Digo tudo isso a fim de deixar bem claro que as idéias aqui defendidas nao sao originais. Original é apenas a maneira de dizé-las, ou seja, meu modo particular de dizer coisas. Além disso, fiz tal tentativa, substanciando o livro, tanto quanto possivel, em minhas proprias experiéncias a fim de tornar evidente que nao estou tratando de algo a cujo respeito simples- mente ouvi falar, mas referindo-me a coisas que nao s6 tenho experimentado, como inclusive encontrado vasta fun- damentacao biblica. 7 Por ser este um livro cheio de ilustragdes relacio- nadas também a minha propria vida, acredito que me traraé alguns problemas. Primeiro, porque alguns amados irmaos de teologia bastante reformada poderao afirmar que fui longe demais na questao dos “dons espirituais”. Certamente muitos ficarao chocados com minhas opinides pessoais nes- ta area. Por outro lado, alguns amados irmaos de teologia pentecostal talvez digam que andei para tras no que se re- fere 4 minha persuasao do que seja “batismo com o Espiri- to Santo”. Isso porque minhas idéias sobre a contem- poraneidade dos dons espirituais podem ser entendidas como excessivamente carismaticas, para 0 sofisticado sabor dos mais tradicionais. Por outro lado, minhas convicgdes sobre o que seja batismo com o Espirito Santo serao certamente entendi- das como excessivamente moderadas e decepcionantes, para © gosto mais picante da fé pentecostal. 8 Preferi no entanto correr o risco de ser julgado dessa forma, porque estou convencido de que apesar dos riscos e das inevitéveis conseqtiéncias que tais “julgamen- tos” humanos trazem, havera um grupo imenso de irmaos e irmas que se identificarao com a posigao aqui advogada. Es- ses sao aqueles que conhecem suficientemente a Biblia e o Espirito Santo, a ponto de nao se atreverem a afirmar que ele limitou e circunscreveu seu exuberante poder aos dias apostélicos. Esses mesmos também sao suficientemente aferrados 4 compreensao a respeito da imensuravel graca de Deus a ponto de se recusarem a aceitar que ele se haja restringido a certas expresses temperamentais ou religio- so-evangélico-pentecostal-culturais. Em outras palavras: eles créem que o Espirito age ainda hoje e age como quer e de diferentes modos em diferentes grupos. Como membro de uma igreja de teologia chamada tradicional, sinto-me perfeitamente a vontade para dizer que muitas vezes, em nossas teologias, reservamos um lu- garzinho para o Espirito Santo, sendo amitide nossa inten- cao muito mais nao ofender o Espirito, através de nosso siléncio a seu respeito, do que realmente conhecé-lo e con- viver com ele de forma consciente e profunda. Finalmente, quando vocé ja se prepara para dar inicio a Jeitura deste livro, faco-lhe dois pedidos. O primei- ro é que 0 leia com coragao de ouvinte. Afinal de contas, o texto foi transcrito de sua forma falada, sendo, portanto, natural que nele aparecam muitas das maneiras usuais des- se tipo de comunica¢ao. O segundo pedido é que vocé ten- te nao ser “reformado” ou “pentecostal” em sua leitura, mas exclusivamente cristao — em harmonia com a beleza e a simplicidade neotestamentaria do que significava ser um cristéo nos primérdios da fé. Dessa forma vocé ira perce- ber que, nao obstante simples e teologicamente leve, pelo menos do ponto de vista dos mais exigentes na matéria, ele ira fazer um grande sentido com a Biblia e com o bom- senso com os quais a acao de Deus deve ser interpretada na historia. Rev. Caio Fabio D’Aratijo Filho Bc RS pass 6 i) Quem € o Espirito Santo? Seguramente o Espirito Santo é a pessoa da Trindade que menos atencao tem recebido no curso da historia da igreja, bem como por parte dos tedlogos nestes dois mil anos de reflexdo teolégica. Muito se fala sobre Deus o Pai e como ele age. Também a cristologia (doutrina relacionadas a obra de Cristo) tem recebido atencao especial, a tal ponto que muitas vezes nem sabemos o que fazer com tantas teologias a respeito da natureza e da obra de Jesus. Quanto ao Espirito Santo, aparece em doutrinas mofadas nos pesados livros de teologia sistematica, os quais muito raramente o povo de Deus abre e folheia; s6 mesmo os tedlogos mais meticulosos 0 fazem. Ha também um elemento imensamente contradit6rio relacionado a doutrina do Espirito Santo. Isso porque nao obstante ele seja a pessoa gregaria por exceléncia na Trindade — ele é o supremo edificador, agindo na perspectiva da promogao da unidade desde a dimensao da matéria fisica (da qual é o sustentador) até a vida espiritual da igreja (da qual é o unificador) — , sua doutrina tem sido pomo de discérdias, o 11 elemento mais significantemente divisor da Igreja de Cristo no curso da historia. No entanto, mesmo essa histéria — tao dividida em nome daquele que veio para unir — nado nos permite negar a realidade de que o Espirito Santo tem agido. O Espirito também tem sido objeto de compreensdes crist&s as mais variadas, na maioria das vezes ma compreensao. Pois é essa ma compreensao acerca do Espirito Santo que ora faz dele um mero agente especial em reunides de oracao carismatica, ora o transforma em “energia” de Deus, uma espécie de forga santa que age em nosso favor. Por outro lado, € comum acontecer de nao o conseguirmos relacionar de modo claro, especifico, a uma pessoa que sente. A maioria de nds nao pensa nele como pessoa e como Deus. Entao quem é, de fato, o Espirito Santo? Antes de mais nada faco esta afirmac&o categérica — que alids talvez a grande maioria pareca redundante: o Espirito Santo é Deus. Ele nao é uma emanacao secundaria da divindade, como pensava 0 presbitero Ario, de Alexandria, ai por volta do ano 300. Ario propagara a doutrina de que Deus, o Pai, criara Jesus Cristo, o Filho, e o Filho criara o Espirito Santo e o enviara a terra. Essa doutrina ganhou algum espacgo na Igreja Crista, até que, no ano 325, o credo niceno estabeleceu que Deus-Pai, Filho e Espirito Santo so igualmente Deus; ou seja, um so Deus em trés pessoas. O ESPiRITO SANTO E DEUS 1. O Espirito Santo é€ Deus porque sua natureza é divina; e a natureza basica essencial da divindade é espirito. Em Joao 4.24 Jesus fala sobre a natureza essencial de Deus, e afirma que Deus é espirito. Ora, se Deus é espirito, e o Espirito Santo € 0 espirito de Deus, e conseqiientemente tem a mesma natureza divina, resta-nos afirmar que ele é da mesma substancia essencial da divindade. 2. Ele é Deus porque estava presente na criacéo quando tirou as coisas do nada, do vazio, e do vazio fez o cosmos. E 0 que diz Génesis 1.1-2. No principio “criou Deus”. 12 “Criou” vem do verbo hebraico bara, que significa “tirar do nada”. O texto de Génesis poderia entao ser lido assim: “No principio tirou Deus do nada os céus ea terra. A terra, porém, era sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo, e 0 Espirito de Deus pairava sobre as aguas.” 3. Ele é o mantenedor da vida, por isso é Deus. Em J6 34.14 e 15 encontramos uma das mais belas e significativas afirmagées biblicas a esse respeito: “Se Deus pensasse apenas em si mesmo e para si recolhesse o seu Espirito e o seu sopro, toda carne juntamente expiraria e o homem voltaria ao pd.” O que o texto esta dizendo é que quem energiza, quem sustenta toda vida, os coragées latejando, o sangue correndo; quem preserva a fotossintese dos vegetais; enfim, quem mantém vivo tudo que tem vida é o Espirito de Deus. No Salmo 104 encontramos também a mesma afirmacao de que o Espirito Santo é o mantenedor da vida. Confirme isto lendo o trecho entre os v. 5 e 30: “Langaste os fundamentos da Terra, para que nao vacile em tempo nenhum. Tomaste o abismo por vestuario e © cobriste; as Aguas ficaram acima das montanhas; a tua repreensao fugiram, a voz do teu trovao bateram em retirada. Elevaram-se os montes, desceram os vales, até o lugar que lhes havias preparado. Puseste as Aguas divisa que nao ultrapassarao, para que nao tornem a cobrir a Terra. Tu fazes rebentar fontes no vale, Cujas Aguas correm entre os montes; dao de beber a todos os animais do campo; os jumentos selvagens matam a sua sede. Junto delas tém as aves do céuo seu pouso e, por entre a ramagem, desferem o seu canto. Do alto da tua morada regas os montes; a terra farta-se do fruto de tuas obras. Fazes crescer a relva para os animais, e as plantas para o servico do homem, de sorte que da terra tire o seu pao; o vinho, que alegra o coracao do homem, o azeite que lhe da brilho ao rosto, e o pao que lhe sustém as forcas. Avigoram-se as arvores do Senhor, e os cedros do Libano que ele plantou, em que as aves fazem seus ninhos; quanto a cegonha, a sua casa é nos ciprestes. Os altos montes sAo das 13 cabras montesinhas, e as rochas 0 refligio dos arganazes. Fez a lua para marcar o tempo: o sol conhece a hora do seu ocaso. Dispée as trevas, e vem a noite, na qual vagueiam os animais da selva. Os ledezinhos rugem pela presa, e buscam de Deus o sustento; em vindo o sol, eles se recolhem e se acomodam nos seus covis. Sai o homem para o seu trabalho, e para o seu encargo até a tarde.” E assim o salmista vai passo a passo descrevendo a criacéo magnificente e grandiosa de Deus, até declarar: “Que variedade, Senhor, nas tuas obras! Todas com sabedoria as fizeste; cheia est a Terra das tuas riquezas. Eis o mar, vasto, imenso, no qual se movem seres sem conta, animais pequenos e grandes. Por ele transitam os navios, e o monstro marinho _ que formaste para nele folgar. Todos eles esperam em ti, que lhes dés de comer a seu tempo. Se lhes das, eles o recolhem; se abres a mao, eles se fartam de bens. Se ocultas o teu rosto, eles se perturbam; se lhes cortas a respiracéo, morrem, e voltam ao seu po. Envias o teu Espirito; eles sao criados e assim renovas a face da terra.” Este texto afirma que o Espirito Santo continua atuando hoje na perspectiva da renovacao da natureza e do cosmos. Deus nao apenas criou, mas continua mantendo, renovando e criando dentro da criag&o. O texto se refere, pois, a preservacao da vida, dizendo que Deus prosseque mantendo-a através do envio do seu Espirito (v.30). Dessa forma poderiamos dizer que vivemos numa Natureza Carismatica. Ou seja, poderiamos ver na chegada da primavera uma manifestac&o de uma espécie de Pentecoste natural, uma explosao de graca, uma tremenda renovacao da vida, um testemunho da permanente possibilidade de avivamento. Vendo a vida por essa perspectiva, 0 cosmos se torna um grande sacramento. O Espirito Santo nao é uma entidade confinada a guetos carismaticos e aposentos escuros. Ele trabalha em todo o cosmos! 4. Ele é Deus porque é chamado Deus na Biblia. Em Atos 5.3 e 4, passagem que narra o caso da mentira de 14 Ananias e Safira, bem como 0 juizo que Deus trouxe sobre eles, observe a palavra de Pedro: “Ananias, por que encheu Satands teu coracdo para que mentisses ao Espirito Santo?” E conclui: “Nao mentiste aos homens, mas a Deus.” © que Pedro diz é que mentir ao Espirito Santo é o mesmo que mentir a Deus. Ele é Deus, pois é chamado de Senhor. 2Corintios 3.17 diz: “Ora, o Senhor é 0 Espirito”; e no v. 18 diz: Todos nds, “contemplando como por espelho a gloria do Senhor, somos transformados de gloria em gloria, na sua propria imagem, como pelo Senhor, 0 Espirito.” Observe que a palavra Senhor segue-se uma virgula, depois do que esta dito: “o Espirito.” Ou seja; Paulo chama o Espirito de o Senhor. 5. O Espirito Santo é Deus porque possui atributos divinos. Em Hebreus 9.14 0 apéstolo diz que o Espirito possui eternidade, ao chamé-lo de “Espirito eterno”. O Salmo 139.7 e 10 declara que o Espirito Santo possui onipresenga, pois é capaz de estar a um s6 tempo em todo lugar. O salmista indaga: “...Para onde fugirei da tua face? Para onde me ausentarei do teu Espirito? Se subo aos céus, la estds; se faco a minha cama no mais profundo abismo, Ia estas também; se tomo as asas da alvorada e me detenho nos confins dos mares, ainda l4 me havera de guiar a tua m&o e a tua destra me sustera. Se eu digo: As trevas, com efeito, me encobrirao, e a luz ao redor de mim se fara noite, até as proprias trevas nao te serao escuras: as trevas e a luz séo a mesma coisa.” O Espirito do Senhor tem onipresenca! — é 0 que declara este salmo. Diz ainda a Biblia que ele tem onipoténcia. Lucas 1.35 fala sobre a concep¢ao milagrosa de Jesus no ventre de Maria, quando foi engendrado pelo poder do Espirito Santo, ea sombra do Altissimo cobriu Maria. O interessante é que na seqiiéncia imediata do texto conclui-se dizendo que “nao havera impossfveis para nenhuma das promessas do Senhor”, outra vez se criando uma conexao indissoltivel entre a obra do Espirito Santo (na concep¢ao de Jesus) e a onipoténcia de Deus (aquele para quem nao ha impossiveis). 15 Também nos é dito, em 1Corintios 1.10 e 11, que o Espirito Santo tem onisciéncia. “... O Espirito a todas as coisas perscruta; até mesmo as profundezas de Deus” — diz Paulo. Ele sabe tudo. Nao existe mistério algum para ele; nada lhe é oculto; as maiores profundidades da inteligéncia e da divindade sao inteiramente discernidas por ele. 6. O Espirito Santo é Deus porque possui nomes divinos. Em 1Corintios 3.16 ele é chamado de Espirito de Deus. Em Isaias 11.2, de “Espirito do Senhor”. Em Isaias 61.1, de “Espirito do Senhor Deus”. E em 2Corintios 3.3, de “Espirito do Deus vivente”. Lembre que a primeira afirmac&o que fiz sobre quem é o Espirito Santo foi que ele é Deus. Para a maioria das pessoas isto pode soar 6bvio. O fato, entretanto, 6 que nado poderiamos tratar dos assuntos aqui relacionados sem primeiro dizer quem é 0 Espirito Santo. O ESPiRITO SANTO E UMA PESSOA O Espirito Santo é Deus e é também uma pessoa. Ele nao é uma energia impessoal, uma mente fria, sem personalidade, sem coracao. A Biblia nao coloca o Espirito Santo na categoria de Isto, da coisa, mas do Tu, da pessoa. HA no entanto muita confusao a esse respeito, inclusive nos meios evangélicos. Nao que afirmemos teolégica e doutrinariamente que ele seja apenas uma Coisa Santa. Mas a verdade é que nds nos relacionamos muitas vezes com ele, o oramos a ele como se ele nao passasse de uma energia, uma forca. Vocé ja observou que as nossas oracées, quando relacionadas ao Espirito, muitas vezes lhe atribuem apenas poder energético? Oramos: “O Deus, manda a forca do Espirito, o poder do Espirito, a influéncia do Espirito...” De onde vira essa idéia a respeito da impessoalidade do Espirito Santo? A mim me parece que essa idéia resulta da ma compreensao das metaforas que a Biblia usa para caracterizar, manifestar e expressar a pessoa do Espirito. Se nao vejamos: 16 oo Em Joao 20.20, Jesus associa 0 Espirito ao félego. Jesus aparece aos seus discipulos e os satida: “Paz seja nesta casa.” Em seguida sopra e diz: “Recebi o Espirito Santo.” O Espirito aparece pois associado ao fdlego, ao sopro. Em Joao 3:6-8 ele o associa ao vento; “O vento [ou pneuma] sopra onde quer.” E acrescenta: “...Nao sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido do Espirito.” Dessa maneira volta a nossa mente essa idéia de vento. Em Atos 2.1-3 0 Espirito se manifesta como fogo: “... E apareceram distribuidas sobre eles linguas como de fogo.” Portanto, quando o Espirito se manifestou no dia de Pentecoste, o elemento que ele escolheu para expressar a si mesmo foi o fogo. O préprio Joao Batista ja havia dito que o batismo do Espirito Santo seria também batismo com fogo: “Aquele que vem apds mim vos batizara com Espirito Santo e com fogo.” Ora, tudo isso me traz 4 memoria uma singela historia vivida por mim e Ciro, meu filho mais velho. Na ocasiao ele tinha uns trés anos, e mostrava muita curiosidade por assuntos de teologia. Um dia ele me perguntou: — Papai, Deus sabe tudo? — Sabe! — respondi. — Se ele sabia de tudo, por que entao criou Adao, se sabia que Adao ia pecar, papai? — Meu filho - esclareci -, eu pensei nisso pela primeira vez aos 13 anos. Vocé pensou 10 anos antes de mim... E tentei explicar como pude. Uns dois ou trés dias depois, eu estava em casa, a tarde. Ventava demais. Ele vinha chegando do quintal, cansado, suadinho, com o rosto cheio de terra. — Papai, eu queria ser cheio do Espirito Santo. Como é que faco? O que € 0 Espirito Santo? Eu nao sabia como explicar e como poderia me fazer entender. Fui para o quintal com ele. Nosso quintal era muilo 17 arborizado; ventava muito. O cabelo de Ciro, um pouco grande, comecou a se agitar. — Vocé esta sentindo esse vento em nossa direcdo? - perguntei. — Estou. — Pense como seria se este vento tivesse a capacidade de amar, de sentir, de saber tudo, de estar em todo lugar, de morar no seu coracao. Ele estava olhando para mim, atento e curioso. Entao acrescentei: — O Espirito Santo é como esse vento. Com a diferenca de que é um vento que ama; é uma “pessoa”. Ele pensou, respirou fundo, e disse: — Ah, papai, eu quero ficar cheio do Espirito Santo. Ora, estou desejando aproveitar memoria daquela minha conversa com o Ciro para dizer a vocé a mesma coisa: O Espirito Santo é energia, é forga, € poder, mas é sobretudo pessoa. Vejamos as razGes por que afirmamos que o Espirito Santo @ uma pessoa. 1. O Espirito Santo é pessoa porque pode entristecer- se. Em Efésios 4.30, Paulo diz: “E nao entristecais o Espirito de Deus, no qual fostes selados para o dia da redencao.” O Espirito Santo @ uma pessoa capaz da tristeza, da dor e do sofrimento. Ele sofre quando eu peco, quando vocé peca. Ele vive em nds, e se entristece com as manifestacdes do nosso pecado. 2. O Espirito Santo é pessoa porque é capaz de sentir citimes, é Tiago quem nos diz isto quando afirma: “Infiéis, nao compreendeis que a amizade do mundo é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo, constitui-se inimigo de Deus. Ou supondes que em vao afirma a Escritura: E com citime que por nés anseia o Espirito, que ele fez habitar em nds?" (Tg 4.4,5). Quando traimos a Deus através dos nossos pecados, ambigitidades, contradicées, negagdes da fé, amasiamentos 18 com o mundo, o Espirito de Deus sente citimes, como o marido quando a mulher adultera, e vice-versa. Ele sente citimes do adultério moral (impureza), espiritual (idolatria), econdmico (amor ao dinheiro), politico (paixao e esperancas politicas mais acentuadas em relacao ao programa humano que ao Reino de Deus). O Espirito nao @ simplesmente alguém que entra em nos de vez em quando e depois sai. Ele vem e¢ fica. Além disso ele nao esta presente apenas para energizar-nos a vida. Nao: ele é uma pessoa com a qual mantemos relagdes pessoais. E 0 marido da nossa alma e da nossa consciéncia. 3. O Espirito Santo é uma pessoa porque pode gemer de dor empatica, é capaz de sentir conosco as agonias da nossa existéncia. Este talvez seja o aspecto mais existencial da acao do Espirito na vida do cristao. Paulo diz: “Também o Espirito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque nao sabemos orar como convém, mas o mesmo Espirito intercede por nds sobremaneira com gemidos inexprimiveis. E aquele que sonda os coragées sabe qual é a mente do Espirito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos” (Rm 8.26,27). O Espirito sente dores nao apenas em razao de nossos pecados, mas também das nossas dores. Ele sente nao somente as dores que nossos pecados causam nele, mas também as dores que sentimos. Paulo diz que o Espirito intercede por nds quando a nossa existéncia estA imersa em profunda fraqueza. O Espirito é€ aquele que se revolve na nossa interioridade, nos levando a orar. E também ele que expressa o inexprimivel da nossa alma diante de Deus com gemidos inexprimiveis, e faz oragdes coadunaveis com a perspectiva do Pai no que diz respeito a responder de acordo com as nossas necessidades. Foi por tudo isso que eu disse que provavelmente este seja o elemento mais existencial da acdo do Espirito Santo na vida humana. Jean Paul Sartre afirmou que a vida é angustia. No caso dele era uma angistia angustiadamente solitaria porque nao havia ninguém com ele. Nao obstante 19 estivesse repleto de amigos ao redor, estava irremediavelmente sozinho. Mas quando se conhece o Espirito Santo, mesmo nos dias mais escuros da alma havera alguem conosco, gemendo nosso gemido e orando o inexprimivel paro o Pai. 4. O Espirito Santo é pessoa porque tem uma mente que pensa, e pensa de maneira livre! (Rm 8.27). Paulo fala a respeito da “mente do Espirito”. Ele nao é um programado; nao @ o mecanismo intercessor da Trindade. Ele nao faz apenas aquelas coisas que desde a antigtiidade foi determinado que fizesse. Nao € mesmo surpreendente pensar no fato de que essa pessoa da Trindade, que mora em nés, tem uma mente, e pensa? E tal poder de pensar acontece simultaneamente ao nosso! O Espirito que vive em nés é livre para pensar. E por isso que ouso afirmar que todo estado de paz mental é resultado de uma harmonizacao entre o nosso pensar e o pensar do Espirito. Quando penso numa diregao diferente daquela na qual o Espirito pensa, entao o resultado é angtistia e depressao. 5. O Espirito Santo é uma pessoa porque é capaz de ensinar. Em 1Corintios 2.11 e 13, Paulo diz que o Espirito conhece e perscruta todas as coisas até as profundezas de Deus. No v.13 esta dito que ele nao apenas as conhece e revela, como também as ensina, o que implica 0 fato de que nos ensina a pensar. Ha sentido e ha ordem quando o Espirito fala. Deus nao fala com expressées sem sentido. O Espirito nos ensina a conferir coisa com coisa (1Co 2.13). Dai a minha certeza de que, quanto mais sadiamente espiritual uma mente @, mais capaz da reflexao em bom-senso ela sera. 6. O Espirito Santo é pessoa porque é capaz de falar, Este €, de acordo com os antropdlogos, o maior sinal de personalidade consciente que um ser pode manifestar: o poder de falar. A Biblia esta repleta de textos que nos afirmam que o Espirito fala. Fala porque é capaz disso. E fala porque faz isso de modo perceptivel e compreensivel. O livro de Atos deixa isso muito claro, quando registra expressdes como: “ disse-me o Espirito”, “falou-me o Espirito...” 20 Em Atos 8:29 lemos: “Ent&o disse o Espirito a Filipe: Aproxima-te desse carro e acompanha-o.” Em Atos 10.19- 20, depois de ter Pedro uma visdo, enquanto meditava sobre ela, diz-lhe 0 Espirito: “Esto ai dois homens que te procuram; levanta-te, pois, desce e vai com eles.” Ou em Atos 13.2, onde esta escrito: “...Disse o Espirito Santo: Separai-me agora a Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado.” Vemos que o Espirito nao falava apenas no Antigo Testamento, aos profetas, mas neotestamentariamente é descrito como alguém que fala a igreja. E ele nao falava apenas 4 igreja no primeiro século porque o canon da Escritura ainda nao estava terminado. Para os judeus na antigitidade — mesmo considerando que do ponto de vista deles a revelacao tinha chegado ao fim — 0 Espirito era livre para continuar se comunicando. Isso porque eles faziam diferenga entre o que o Espirito dizia e deveria ser escrito como Escritura, e 0 que ele dizia sem finalidade redatorial. E lamentavel que boa parte da Igreja de Cristo no mundo nao acredite mais que o Espirito fala. Pois ele fala quando ilumina a Escritura, mas também fala de acordo com os parametros biblicos. Nem tudo o que o Espirito fala é para ser escrito, mas tudo o que ele fala deve ser ouvido. Uma das maximas do livro de Apocalipse é advertir as igrejas acerca do que o Espirito diz. “O Espirito diz as igrejas...” — é o que lemos. 6. O Espirito é pessoa porque tem vontade. Se nao, veja o que a esse respeito diz a Escritura. Talvez a mais importante afirmagao seja a de que ele distribui dons segundo seu alvitre, conforme lhe apraz! Ele tem volicao, no sentido do termo (1Co 12.11). 7. O Espirito @ uma pessoa porque ama. A esse respeito Paulo diz: “Rogo-vos, [...] pelo amor do Espirito, que luteis juntamente comigo nas oragées a Deus a meu favor” (Rm 15.30). O apdstolo menciona o amor do Espirito num texto cheio de apelo a solidariedade crista. Paulo pede que os irmaos assumam uma espécie de integrac&ao de almas para 21 interceder junto com ele, com base no amor do Espirito. Ora, nesta mesma perspectiva do amor, Neemias chama o Espirito de “o bom Espirito”(9.20). O Espirito Santo é realmente uma pessoa. Ninguém pode entristecer o vento oriental. Ninguem pode despertar citmes no fogo, nem produzir paixao nas aguas. Ninguém irrita a lei da gravidade. Mas ao Espirito é possivel entristecer, enciumar, provocar paixao dolorida etc. O Espirito Santo é forca, é poder, e é energia. Entretanto, e antes de tudo, ele é uma pessoa — pessoa que sente, se entristece, ensina, fala, tem vontade e ama. 22 = - am = % eo Como Age o Espirito Santo? Neste capitulo estudaremos algumas das principais express6es de acao do Espirito Santo. Isso porque, como vimos no capitulo precedente, o Espirito é pessoa. E tal atri- buto é a propulsdo essencial para a capacidade de agir com consciéncia. O Espirito age com base no que sente, pensa, sofre, ama e deseja. Em outras palavras, suas agdes sao todas coerentes com seu ser essencial. Neste capitulo estudaremos cinco das principais relagdes do Espirito Santo. Comegare- mos observando o relacionamento do Espirito com Jesus. O ESPIRITO SANTO EM RELACAO A JESUS 1. O Espirito foi o agente da fecundaco de Jesus: “Descera sobre ti o Espirito Santo, e o poder do Altissimo te envolveré com a sua sombra; por isso também o ente santo que ha de nascer seré chamado Filho do Altissimo” (Lc1.35). Este é um fato sobejamente conhecido. O milagre do nasci- mento de Jesus foi milagre do Espirito. Foi ele quem criou as excepcionais e milagrosas condi¢ées biolégicas que permiti- ram a Maria conceber sem jamais ter tido relacao sexual. 23 Assim, Jesus nao foi uma criac&o de Deus fora da criagao, mas também nao foi apenas o resultado comum e natural do ininterrupto processo humano de concepcao e transferéncia — via concepcao — de todos os nossos legados humanos de corrupcao essencial. Jesus nasce de mulher herdando huma- nidade total, sem no entanto herdar pecados e corrup¢ao essenciais. , 2. Foi o Espirito também quem ungiu Jesus. Jesus, que sumariou o Deus eterno — o qual se encarnou nele, se engendrou nele, porque era Deus —, foi também ungido pelo Espirito Santo. E o que nos diz Lucas 3.22, quando afirma que no batismo de Jesus veio o Espirito em forma corpérea, como pomba, e pousou sobre ele. Jesus é Deus ungido por Deus como homem, mostrando que nem Deus no homem que ser homem sem a uncio de Deus. O fato de que Jesus é ungido pelo Espirito nos mostra que nao ha possibilidade de se fazer ministério cristao sem a uncao do Espirito. Nem Deus-homem age na histéria sem ungao. Lucas 4.1 nos diz que Jesus estava cheio do Espirito Santo; o v. 14 do mesmo capitulo nos informa que ao voltar da tenta¢ao ele iniciou seu ministério no poder do Espirito Santo. O livro de Atos do Apostolos diz que ele foi ungido pelo Espirito para fazer o bem, curar e libertar a todos os oprimidos do diabo (10.38). 2. Eo Espirito Santo que da testemunho de Jesus. Em Joao 15.26, Jesus afirma que ele, o Espirito, daria teste- munho dele, Jesus; exalta-lo-ia acima de tudo e antes de qualquer coisa. Jesus, em outras palavras, estava dizendo que o maior, mais profundo e essencial assunto e mensagem do Espirito Santo seria Jesus Cristo, sua morte, sua ressurrei- ao, sua sabedoria, seu poder salvador e seu senhorio. Assim é 0 Espirito que glorifica. Acerca disso Jesus afirma: “Ele me glorificara porque ha de receber do que é meu” (Jo 16.14). Apés a obra terrena de Jesus, ele veio habitar o coragao dos crentes. Em Joao 16.7, Jesus diz: “Convém que eu va, por- que se eu nao for, o Consolador nao vira para vs outros; se, porém, eu for, eu vo-lo enviarei.” O interessante é@ que, no 24 cap. 14, v. 14 de Joao, Jesus fala da companhia do Espirito Santo na comunidade dos discipulos. Jesus diz: “Ele habita convosco.” Ou seja: “Ele esta influenciando tudo; esta traba- lhando o coracdo de vocés nesses trés anos do meu ministé- rio.” Mas entao Jesus promete que o Espirito néo apenas habitaria com eles, mas estaria neles, nao mais como uma simples influéncia no ambiente, mas como presenga real no interior, no coracao, invadindo tudo, se embrenhando em tudo: miscigenando-se, fundindo-se 4 alma deles; selando, lacrando, morando definitivamente em seu coracao: “Ele ha- bita convosco, mas estaré em vés.” 3. A ressurreicao de Jesus é obra do Espirito Santo. Jesus ressuscitou dentre os mortos mediante a acao glorificante do Espirito Santo. Isto esta registrado em Romanos 8.11: “Se habita em vés o Espirito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos, esse mesmo que ressuscitou Cristo Jesus dentre o mortos vivificara também os vossos Corpos mortais por meio do seu Espirito que em vés habita.” 4. O Espirito Santo foi o agente da entrega dos man- damentos aos discipulos. Em Atos 1.1 e 2, Lucas afirma que Jesus, antes de ser assunto aos céus, entregou mandamentos por intermédio do Espirito Santo aos apéstolos por ele esco- lhidos. Todo o seu ensino foi impresso na mente dos discipu- los pelo poder da manifestacao especial do Espirito Santo, que lhes gravou verdades na alma, mesmo antes do Pentecoste. O ESPIRITO SANTO EM RELACAO A PALAVRA 1. O Espirito Santo inspirou as Escrituras. Pedro diz a esse respeito “que nenhuma Escritura provém de particular elucidagéo humana; porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto homens santos fa- laram da parte de Deus movidos pelo Espirito Santo” (2Pe 1.20,21). Nao ha, a luz desse texto, margem para qualquer debulhacao critica das Escrituras, ou para descobrirmos a te- 25 ologia produzida por Paulo, Pedro, Tiago, ou quaisquer ou- tros, como se concebidas por homens, divorciadas entre si e seccionaveis para estudos que saciem a curiosidade humana. A Escritura, muito ao contrario, revela-se como um todo; toda ela é inspirada pelo Espirito Santo, ainda que tal revela- cao tenha sido gradual e progressiva. Pedro incluia, entre aquilo que ele chamava de Escritura, as cartas de Paulo. Ain- da em sua segunda epistola, cap. 3, v. 16, o apéstolo faz referéncia a elas dizendo que se equiparavam as “demais Es- crituras”. Diz o v. 16: “Nas quais ha certas coisas dificeis de entender, que os ignorantes e instaveis deturpam.” Pedro co- loca as cartas de Paulo em pé de igualdade com Jeremias, Isaias, os profetas, o Pentateuco e tudo o mais. Ele as consi- dera tao inspiradas quanto as outras partes da Palavra de Deus; corrompé-las eqitivalia, portanto, a deturpar a Escritu- ra. Afirma-se assim, mais uma vez, a inspiracao do Espirito na Palavra de Deus. Paulo, como homem, errou algumas vezes. Nem sua conversao o isentou de tal possibilidade. To- davia suas cartas foram mais que cartas. Foram cartas de Deus a igreja e a historia. 2. O Espirito Santo interpreta as Escrituras. Em Efésios 1.17 Paulo ora, pedindo a Deus que os homens rece- bam inspirac¢ao, iluminacao e espirito de sabedoria e de reve- lacgao, no pleno conhecimento e discernimento das coisas de Deus. Dessa forma a iluminacao do coracdo para discernir as Escrituras é obra do Espirito. Sem a iluminacao do Espirito é possivel conhecer muito da Escritura através dos instrumen- tos hermenéuticos. Também qualquer estudo histérico-técni- co do texto biblico é extremamente revelador em si mesmo, ainda que o estudioso nao ore e nem creia no Espirito. No entanto, tais estudos e instrumentos s6 nos possibilitam sua compreensao objetiva. E sem dtiwvida a Escritura se permite tal analise. Contudo, seu significado para hoje como Palavra de Deus dirigida a nds como pessoas, nao se da, de modo nenhum, mediante os instrumentos hermenéuticos. Ele de- corre da iluminacao do Espirito Santo. E neste sentido toda 26 instrugao e sabedoria do mundo sao totalmente intiteis. Afi- nal, quando somos estimulados pela Escritura a nela meditar e a entendé-la, somos instigados a um estudo inteligente, conferindo coisas espirituais com coisas espirituais. Nao ha, entretanto, um estudo técnico da Escritura. Tais estudos sao utilissimos quando acompanhados de piedade e reveréncia diante da Palavra de Deus. Caso contrario eles sao apenas estudos da letra morta da Palavra. Parece que foi exatamente isso que Joao quis dizer quando afirmou: “Quanto a vds ou- tros, a uncao que dele recebestes permanece em vos, e nao tendes necessidade de que alguém vos ensine; mas como a sua uncao vos ensina a respeito de todas as coisas, e é verda~ deira, e nao é falsa, permanecei nele, como também ela vos ensinou” (1Jo 2.27). 3. O Espirito transforma a Palavra de Deus em espa- da. Paulo diz, em Efésios 6.17, que ela é a espada do Espiri- to. Sem o Espirito, a Escritura é um livro que alguns tedlogos céticos conseguem reduzir a quase nada. Sem ele, ela é lida, manifesta, e amitide nao produz os efeitos esperados porque, freqiientemente, pregamos a Palavra movidos por presuncao e nao pela un¢ao que faz da Escritura a Palavra-espada de Deus. Ela é espada, mas tem que ser usada pelo Espirito. Nas maos do Espirito ela edifica; nas maos de um ser humano presuncoso e sem temor de Deus ela é uma calamidade. Ser- ve para dar base a qualquer loucura humana. Nas maos do Espirito a Escritura golpeia o pecado, constréi o amor, de- fende a verdade, promove a justica, consola o aflito e entroniza Jesus; mas nas maos do espirita, por exemplo, ela exalta Chico Xavier, porque ele a interpreta de forma completa- mente errada, dela se aproveitando de modo desastroso. 4. O Espirito Santo torna a Escritura uma realidade escatolégica: “Quando vier, porém, o Espirito da verdade, ele vos guiara a toda verdade; porque nao falara por si mes- mo, mas dira tudo aquilo que tiver ouvido, e vos anunciara as coisas que hao de vir” (Jo 16.13). E portanto o Espirito Santo quem da a Escritura essa caracteristica preditiva. Jesus 27 diz que o Espirito viria e anunciaria as coisas que haveriam de acontecer. Por isso, quando leio Paulo em 2Timéteo, que fala das coisas referentes aos “tltimos dias”, ou o Apocalipse, e encontro predicées sobre as tltimas coisas, meu coragao é confortado, pois tenho o respaldo de Jesus, ensinando e avi- sando que quando o Espirito viesse daria a Palavra e a men- sagem esse cunho escatolégico e preditivo. Por isso, ao estu- darmos os elementos escatolégicos contidos no Novo Testa- mento, as doutrinas das Ultimas coisa, sentimos a seguran¢a de nao estarmos lidando com sonhos humanos, mas com verdades de Deus para o futuro. 5. Foi o Espirito Santo quem trouxe a Palavra de Deus a meméria dos discipulos (Jo 14.26). Como pode Mateus lembrar-se de todas aquelas coisas? E Joao? Marcos narra basicamente fatos, o que é sem diivida mais facil de recordar. Ele escrevia as reminiscéncias de Pedro. Lucas fez sua coleta- nea de “assuntos em ordem”. Entretanto, Jodo apresenta mais do que fatos. Ele diz “E o Senhor disse...”e, entéo, nos apresenta em detalhes discursos inteiros de Jesus, palavra por palavra. Como tal memoria poderia ser tao precisa sem a acao direta e relembradora do Espirito Santo? Quando ainda jovem na fé eu lia o evangelho de Joao e me questionava: “Meu Deus, sem um gravador para gravar tudo isso... Como péde esse homem reter tanta coi- sa?...” Mas é ai que vem a palavra de Jesus e tira essa crise candénico-tecnolégica da nossa mente, quando diz: “Quando o Espirito Santo vier, ele vos fara lembrar de tudo quanto eu vos tenho dito.” Os tedlogos liberais tiveram muita dificulda- de em acreditar que o Evangelho era a expressao original do ensinos de Jesus, porque lhes faltava a dimensao “carismatica” do modo pelo qual a Palavra foi “preservada” na memoria” dos apéstolos e da igreja. 28 O ESPiRITO SANTO EM RELACAO AO MUNDO 1. O Espirito Santo convence o mundo do pecado, da justica e do juizo (Jo 16.8). E ele quem da ao homem conviccao de pecado, neste nosso mundo onde dia-a-dia as consciéncias se entorpecem, se cauterizam; neste mundo onde certas correntes da psicologia ensinam que sentimentos de pecado sao apenas subproduto de condicionamentos de opres- s6es culturais, sociais e religiosas, nada mais. E que nao exis- te nenhum absoluto que possa julgar a conduta e a vida hu- manas, porque todos os absolutos foram relativizados. Numa sociedade como a nossa, somente o Espirito Santo pode con- vencer o homem do pecado. A sociedade brasileira tem atin- gido indices inimaginaveis de sodomia e perversio. Temos uma das televisdes mais sujas do mundo, e a maior expressdo de orgia publica do planeta e da historia da raga humana, que é o carnaval. Neste pais e nesta sociedade sem consciéncia, somente o poder do Espirito Santo pode convencer do peca- do. S6 0 Espirito Santo pode persuadir de pecado o ser hu- mano identificado com a cultura deste século. Todas as vezes que vejo alguém considerado “entendido” chorando, quebran- tado, eu me regozijo com o milagre. Ele convence da justica. Convence nao apenas do fato de que Deus é justo, mas de que ele é justo e justificador. Quando Jesus afirmou esta obra do Espirito, ele estava falan- do sobretudo da justica e da justificacéo. O Espirito Santo convence da possibilidade de se ficar em paz com Deus, com a consciéncia tranqiiila; e traz convencimento da justificagao. Apds convencer do pecado e da possibilidade da justificacao, se o homem confrontado com essas coisas nao se apropria delas com fé e arrependimento, o Espirito ent&éo o convence do juizo, da condenag&o que vem sobre o diabo e todos aque- les que se fazem seus filhos pela obediéncia aos seus desejos (Jo 8.44). — 2. E o Espirito Santo quem detém o poder do anticristo. Em 2Tessalonicenses 2.6-8, Paulo fala da vinda by do anticristo, da apostasia dos Ultimos dias e do poder que hoje detém tal manifestacao, para que esse mistério da impi- edade seja manifesto apenas em ocasiao prépria. Literalmente é assim que 0 apéstolo diz: “Com efeito, 0 mistério da iniqi dade jé opera e aguarda somente que seja afastado aquele que agora o detém.” Ha quem diga que quem detém a vinda do anticristo é a igreja. Outros afirmam que é 0 poder politico que esta impedindo a manifestacao do anticristo. No entanto, o que penso € que quem detém o anticristo é o Espirito Santo. Mas a luz do v. 6, seria dificil pensar que é 0 Espirito, porque o pronome que aparece ai — “e sabeis o que o detém” — tem no original um sentido totalmente impessoal; nao € pessoa, mas forca, energia. Mas 0 v. 7 anula o questionamento, quando o chama de aquele, atribuindo-lhe pessoalidade: ou seja, é uma forca pessoal que o detém. E a tnica forca pessoal ca- paz de deter o anticristo na histéria é o Espirito Santo. E por isso que até aqui o anticristo néo se manifestou. Tém apare- cido os Hitlers, os Idi Amins, os Khomeinis da vida, mas o Espirito do Senhor continua detendo a manifestagao final. No entanto chegara a hora em que o Espirito cessara de deter, e essa manifestacao sera como uma das evidéncias, claras e inequivocas, de que a vinda do Senhor esta préxima. 3. O Espirito Santo trabalha em toda a Terra. Apocalipse 5.6 diz que o Espirito de Deus é “enviado por toda a terra”. Viajo freqtientemente de avido em alturas mui- to elevadas. Olhando para baixo avisto choupanas minimas, em lugares inéspitos. A primeira vez que atravessei o Atlanti- co e vi la do alto as ilhas Canarias, pensei: “Meu Deus, tua Palavra me diz que o Espirito do Senhor esta trabalhando em vidas ali!” Algumas vezes sobrevoei 0 deserto do Saara. De vez em quando apareciam povoados. Com a mente cheia do que Jesus dizia, repetia para mim mesmo: “E o Espirito de Deus sera enviado por toda a terra para aplicar a salvacao em Jesus, e para derramar o conhecimento de Deus sobre a terra assim como os mares enchem e cobrem a terra." 30 O ESPiRITO SANTO EM RELACAO AO CRENTE As relagdes do Espirito Santo com o cristéo devem ser descritas na categoria existencial. Quando falo em cate- goria existencial estou me referindo a coisas experienciais, que se provam verdadeiras a partir de relacdes interiores e misticas com o Espirito. Neste particular dois extremos podem ser hoje ob- servados: 0 teolégico-doutrinario, que diz que tudo o que os cristaos tém que ter do Espirito € conhecimento teoldgico; e © pentecostal e neopentecostal, que dao énfase unicamente condigao existencial, experiencial da relagao com o Espirito. As Escrituras nos apresentam a validade dos dois aspectos apenas se eles estéo juntos. Separados, sao deformantes e redutores do projeto da Biblia, quanto a ensinar qual deva ser a legitima relacao do cristéo com o Espirito. Dessa forma, na Biblia, esses dois aspectos se fundern equilibradamente. Te- nho que ter conhecimento teolégico de quem é o Espirito Santo; entretanto esse conhecimento tem que ser experiencial — precisa produzir realidades existenciais, mudancas em mi- nha vida. 1. O Espirito Santo é quem nos regenera, nos trans- forma numa nova criagdo de Deus, nos faz nascer de novo (Tt 3.5 e Jo 3.5). Sem a obra do Espirito, nao ha nada novo no coragaéo humano. Somente o Espirito gera uma nova cri- atura. A moral social faz surgir um moralista. Os compromis- sos civicos fazem aparecer um cidadao responsavel. A politi- ca faz desabrochar um homem critico e esperto. A religiao faz nascer um filantropo. O amor pela familia torna o ser humano menos egoista. Mas nenhuma destas coisas faz nas- cer o novo homem, segundo a imagem de Deus. “Quem é nascido da carne é carne”, disse o Senhor Jesus. Somente o “lavar renovador e regenerador do Espirito Santo” pode fa- zer aparecer o ser humano cidadao do reino de Deus. Qual- quer outra perspectiva de fazer o Novo Homem sem um en- contro radical, essencial, revolucionario e dramatico com o 31 Espirito € totalmente utépica e fadada ao fracasso. Neste século tivemos um tremendo exemplo disso — a derrota do comunismo no seu intento auténomo de resolver o problema da natureza humana de fora para dentro, apenas com pao e justica social. O fracasso foi tao retumbante que dispensa maiores comentarios. Ainda neste mesmo filao de raciocinio, devo afirmar que a prépria igreja-instituigao tem sido outro exemplo desse desastre humano quanto a produzir 0 novo homem sem o Espirito. A tragica historia do Ocidente esta intrinsecamente ligada a hist6ria da Igreja. A Europa, os Es- tados Unidos e a América Latina foram teoricamente conti- nentes cristaos. Mas esse cristianismo nao impediu tais socie- dades de se imortalizarem pelas maiores atrocidades ja come- tidas na historia humana. Sem o Espirito, nao ha o novo homem segundo Deus, mesmo que haja abundancia de cristi- anismo. 2. O Espirito Santo @ nossa garantia de salvacao. Paulo diz em Efésios 1.13 e 14 que Deus colocou o Espirito no coracao como “penhor da nossa heranga até o resgate da sua propriedade, em louvor da sua gloria”. O que é penhor? Penhor é algo que se deixa como garantia de que se vai voltar para efetuar o pagamento; de que se vai retornar para cumprir uma promessa. Veio o Senhor e deixou o Espirito como penhor, como garantia absoluta da nossa salvacao, como prova de que nao sé estamos salvos como também ele voltara um dia, ressuscitaraé nosso Corpo mortal e o tomaré como propriedade exclusiva sua, para louvor eterno de sua gloria. 3. O Espirito Santo é nossa garantia de comunhao com Deus. Em 1Joao 3.24 esta dito: “E aquele que guarda os seus mandamentos permanece em nés, pelo Espirito que nos deu.” Eu permanego em Deus, Deus permanece em mim. Sei que ele permanece em mim pelo Espirito que me deu. No cap. 4, v. 13 de 1JoAo esta escrito: “Nisto conhecemos que permanecemos nele, e ele em nds, em que nos deu do seu Espirito.” 32 Ninguém tem que conflitar-se a esse respeito. Nao se angustie com questées do tipo: “Nao sei se ainda tenho co munhao com deus... Se a perdi..."Deus esta ai, em e com vocé, morando em seu coracao! Vocé tem o Espirito em vocé Acredite nisto! Se vocé tem o Espirito e tem comunhao com cle, e ele com vocé, ele permanece em vocé, e vocé perma- nece nele. Aproprie-se disto, pela fé. 4. O Espirito Santo é nossa consolacéo. Em Joao 14.16, Jesus prometeu enviar “outro Consolador”. Este “ou- tro” estabelece uma equivaléncia comparativa. Os discipulos de vez em quando se sentiam desanimados, tristes, alquebra- dos: “Deixamos tudo para te seguir — a casa, a familia, a pesca, tudo. Que vamos fazer agora?” Jesus vem e os confor- la: “Ougam, vocés vao ter aqui cem vezes mais. Quanto ao que est por vir, nem da para falar.” Entao eles retrucam: “Somos os parias do mundo! O que vai ser de nés?” Jesus responde: “Vocés vao reinar, vao governar no reino de Deus.” Agora Jesus esta prestes a partir, e eles estao murchos, deprimidos... Jesus lhes diz: “Pensem na mulher; quando ela esta para dar a luz ela fica abatida, sente dores! O que vocés estao sentindo agora sao as dores do parto da salvacao. Eu vou sentir as agonias. Mas vocés esto vivendo a sombra desta hora de ago- nia. A vida, no entanto, nao é sé parto. A cruz nao ficara erguida para sempre. Eu vou ressuscitar. Vocés entao vao ficar alegres como a mulher, que, ao ter o filho, toma-o nos bracos, chorando, e diz: ‘Gracas a Deus! Meu neném!’ A ressurreigdo vai fazer isso. E mais ainda: Vou mandar-lhes um outro Consolador.” Pode-se observar que, nao obstante Jesus tenha ido para o céu, o livro de Atos nao nos passa nenhuma im- pressao de nostalgia ou sentimentalismo. Pedro nao se queixa: “Ah, que saudade do Senhor! Estou triste; tudo tao vazio! [stou a ponto de ser consumido de angistia!” Isso nao aconte- ceu porque o Senhor. derramou o seu Espirito, um outro Consolador. Ele subiu ao céu, mas a igreja ficou retumbante como nunca, alegre, poderosa, transbordante do Espirito San- lo. Ela tem a presenga do Consolador, presenca animadora do Senhor, do prdéprio Jesus. 33 5. O Espirito Santo é quem da acesso ao Pai em oragdes mediante Jesus (Ef 2.18). Ou seja, por intermédio de Jesus nds nos aproximamos de Deus, “temos acesso ao Pai em um Espirito.” Jesus também disse “que Deus é espiri- to e importa que seus adoradores o adorem em espirito e em verdade”. Na minha maneira de entender, Jesus estava di- zendo a mesma coisa que Paulo posteriormente disse, con- forme o texto de Efésios transcrito acima. Nao apenas temos que adorar a Deus em espirito, mas também adora-lo no Espirito. Em outras palavras: nao ha qualquer possibilidade de relacao da alma humana com Deus a nao ser no Espirito Santo. Quando Jesus disse que a adoragao seria em espirito (espirito com “e” minusculo), ele estava afirmando a adora- ¢ao como tendo que ser livre de quaisquer materialismos condicionantes do sagrado a tempo e espaco (“nem neste monte nem em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar”). No entanto ele nao estava ensinando o culto a Deus como uma possibilidade fenomenoldgica inerente ao espirito hu- mano no seu estado de queda. O homem é capaz de ansias pelo sagrado mesmo enquanto caido e alienado; no entanto nao esta apto de fato a cultuar a Deus, a menos que tal culto se dé no Espirito Santo. 6. Ele @ nosso intercessor espiritual. Devemos aqui fazer uma diferenca entre intercessor existencial e judicial. A Biblia diz, em1Joao 2.1 e 2, que Jesus é nosso pardcleto, nosso advogado, nosso intercessor judicial: “Filhinhos meus, estas coisas vos escrevo para que nao pequeis. Se, todavia, alguém pecar, temos advogado, junto ao Pai, Jesus Cristo, o justo; e ele é a propiciagao pelos nossos pecados, e nao somente pelos nossos préprios, mas ainda pelos do mundo inteiro.” Mas em Romanos 8.26, o Espirito Santo é@ coloca- do como nosso intercessor existencial. Jesus intercede pelo que fiz de errado. Ele tira, elimina a culpa. Mas o Espirito Santo intercede existencialmente, tentando me livrar de cair no erro, de ser dominado pela fraqueza. 34 7. O Espirito é nosso vinculo vital com Jesus. E im- possivel alguém afirmar que é de Jesus se nao tem o Espirito Santo — conforme a teologia de Atos 19. Nesse texto ve- mos que os discfpulos encontrados em Ffeso se diziam disci- pulos, tinham cara de discipulos, sabiam alguma coisa de Je- sus e, nao obstante todas as realidades aparentes, ignoravam que o Espirito Santo existia. A Biblia diz em Romanos 8.9 que, “se alguém nao tem o Espirito de Cristo, esse tal nao é dele.” Quem é de Jesus tem o Espirito do Senhor. 8. O Espirito Santo é quem transforma nosso Corpo — enrugado, cansado, estressado, gasto, exausto — em san- tuario de Deus. 1Corintios 6.19 diz que nd somos templos vivos, onde Deus habita. E nossos sentimentos, atitudes, mo- tivacées e pensamentos sao a liturgia viva desse culto que tem que ser prestado a ele. 9. O Espirito é nossa fonte de sabedoria na tribula- cao. Mateus 10.20, Marcos 13.14 e Lucas 12.11 e 12 sdo textos sindticos, onde Jesus fala aos discipulos que, na hora do aperto, da tribulacao, da angustia, da opressao, dos tribu- nais, dos questionamentos; quando estivessem confrontados com homens maus e situac¢des adversas, o Espirito lhes daria sabedoria, conforme deu a Estévao — de forma tao tremen- da, profunda e poderosa que ninguém lhe podia resistir. 10. O Espirito Santo é nossa fonte de vida existenci- al. Em Joao 7.37-39, Jesus, no grande dia da festa dos labernaculos, em Jerusalém, disse: “Se alguém tem sede, venha a mim e beba. Quem crer em mim, como diz a Escritu- ra, do seu interior fluiréo rios de Agua viva.” E Joao interpre- la assim suas palavras: “Isto ele disse com respeito ao Espiri- lo que haviam de receber os que nele cressem; pois o Espirito até esse momento nao fora dado, porque Jesus nao havia sido ainda glorificado.” Com isso Jesus estava declarando que a vida cristé tem que ter uma fonte existencial cotidiana e sobrenatural. A intengdo de Jesus era que o Espirito nos livrasse da angustia de uma vida seca e sem proposito. Ele hos propiciaria a novidade de uma fonte que nao se esgota. 35 11. O espirito € quem contemporaneamente julga Os cristaos. Atos 5.1 em diante, narra o fato de que o Espiri- to exerceu juizo sobre Ananias e Safira, que haviam menti- do, enganado, usado de hipocrisia. Deus julga hoje, em ple- na “época” da graca. Existe uma outra idéia da graca, segun- do a qual o Deus que ama nao julga. Mas de acordo com 1Corintios 11.32 ele nos julga para que nao sejamos conde- nados com o mundo. Julga pelo Espirito, julga pela Palavra; julga a nossa vida pelas expressdes de dor e perplexidade que nos acometem. 12. Eo Espirito Santo quem nos santifica. 2Tessalonicenses 2.13 afirma que nos fomos escolhidos “para asalvacao, pela santificacao do Espirito”. Em 1Corintios 6.11 também esta claro o fato de que o Espirito nos santifica, mas nao apenas metafisicamente. Paulo, no contexto anteceden- te, diz que os impuros, beberrées, adulteros, injustos, maldi- zentes, ladrdes, nao herdarao o reino dos céus. A seguir declara: “Tais fostes alguns de vés.” A igreja de Corinto era uma grande casa de recuperac4o, um hospital, uma comuni- dade terapéutica, mas Paulo diz: "Viestes para cd beberrées, prostitutas, homossexuais, mas fostes feitos Santos." Se nao, veja o texto: “Tais fostes alguns de vés; mas vés vos lavastes, mas fostes santificados [...] no Espirito.” Tal santificagao po- dia realmente ser vista na vida deles através de mudancas praticas e perceptiveis. 13. E 0 Espirito quem fortalece o nosso intimo (Ef 3.16). Ele fortifica o nosso homem interior com “dynamis”, com poder maravilhoso, para néo sermos como aquelas horri- veis hienas: “O més, 6 dia, 6 ano, 6 azar!..” Quando lemos o livro de C.S. Lewis, Cadeira de prata, conhecemos um sapo chamado Paulama, que murmura: “O dia! Nao vai dar certo! Dia de sol é prentincio de dia de chuva...”Mas o que acontece para quem tem Jesus no coracao é algo maravilhoso: vem o Espirito e fortalece 0 coragao com poder; o homem interior com “dynamis”, com explosdo, com forga miraculosa. 14. E o Espirito quem nos inunda de amor na tribu- 36 lagéo, nas situagdes amargas e dificeis. Romanos 5 contéma conhecida seqtiéncia que fala da tribulacao que produz perse- veranca; a perseveranca, experiéncia; e a experiéncia, espe- ranga. Apés o que o Espirito de Deus se derrama no cora- cao. Ha uma especial inundacao do Espirito no coragdo do crist4o que persevera esperancoso em Deus. 15. O Espirito é o Espirito da alegria. Essa alegria nao é simples resultado de musica alegre, animada — uma espécie de festival evangélico. Pode até ser; de vez em quan- do isso é bom. Mas alegria espiritual nao é brincadeira; é fruto do Espirito do Senhor em nossa alma. O Reino de Deus nao é comida nem bebida. Nao é através disso que sou feliz. Nao é pelo fato de me fartar de delicias que me encho de contentamento. Paulo afirma que o Reino de Deus nao é nada disso; pelo contrario, “é paz, justica e alegria no Espiri- to Santo.” Em 1Tessalonicenses 1.16 Paulo diz que a igreja de Tessalénica, mesmo em meio 4 tribulacdo, “transbordava de alegria no Espirito Santo.” 16. E 0 Espirito quem nos concede a mente de Cris- to. O Espirito conhece as profundezas de Deus. Sd ele sabe realmente o que Deus pensa. E é ele quem compartilha conosco o pensar de Deus. Dessa maneira podemos alcancar o milagre de termos a “mente de Cristo” (1Co 2.14,15). A harmonizagdo da nossa mente com a mente de Cristo é, portanto, obra do Espirito, mediante sua capacidade de im- primir as mais fortes impresses de carater e da vontade de Deus em nossa mente. Tal trabalho nao nos dispensa a rela- c4o com a Palavra de Deus na nossa conformacaéo mental a seus padrées. Todavia, requer-se de nds mais que leitura e estudo da Palavra. E necessdrio que se mantenha essa rela- ¢ao com ela enquanto se assume singeleza intelectual. Atra- vés de tal singeleza nossa mente se oferece ao Espirito de Deus a fim de que ele nos “imprima” a Palavra de Deus no coragao. Essa atitude nos assegura uma relacao com a revela- «Ao dos referenciais basicos da mente de Deus (a Palavra), enquanto se tem também percepcao da mente de Cristo em 37 relacao aos aspectos particulares da nossa vida (pela aplica- cao que o Espirito faz da Palavra). Ou seja: a Biblia nos oferece a certeza de como é 0 carater de Deus. Mas é medi- ante uma profunda relagao com o Espirito que somos capaci- tados a discernir quais s4o os aspectos da mente de Cristo que tém relacao com nossa vida individual. Tal discernimento é a especificacao da vontade de Deus com respeito a nos, e que se da dentro dos referenciais do carater de Deus, confor- me definidos de maneira inequivoca na Escritura. 17. E 0 Espirito quem nos proporciona vida e paz. Romanos 8.6 diz que “o pendor da carne da para a morte, mas o pendor de Espirito da para vida e paz.” Isso porque ele nos capacita também a viver em obediéncia a vontade de Deus, ainda que libertos da lei. Romanos 8.4 diz que agora estamos aptos, capacitados pelo Espirito a cumprir a lei do Espirito e da vida, porém isentos da lei moral. Isso parece contraditério, mas nado é. De fato, Cristo nos libertou da lei moral a fim de que vivamos a vontade de Deus. A lei moral é inobedecicel porque determina que a relacdo do individuo com ela tem que ser de obediéncia objetiva absoluta. Caso contrario se esta morto. No entanto, a fé crista nos apresen- ta nossa relacao com Deus como sendo livre da moral, a fim de que sejamos escravos do seu amor. Para muitos, isso pode parecer a mesma coisa, mas nao é. No primeiro caso (da lei moral), o individuo é pressionado a obediéncia de fora para dentro. Sao preceitos externos que se tornam nos referenciais da vida dele. Jé no segundo caso (escravidao ao amor de Deus), nossa obediéncia é resultado de um constrangimento de amor nao culposo que é derramado pelo Espirito da graca no nosso corac4o. A lei gera uma obediéncia assustada culposa. O Espirito da graca da origem a uma obediéncia livre, santa, nascida no interior do ser. E o que diz Galatas 5.23 quando afirma que quem anda no Espirito manifesta o fruto do espirito, que é “amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, mansidao e dominio préprio.” No final desta afirmagao Paulo diz: “Ora, contra estas coisas nao ha lei.” 38 Nao ha lei porque o amor cumpre toda a lei, dai resultando que aquele que a cumpre nao se sente cumprindo. Ele apenas experimenta a sensacao de estar vivendo em obediéncia ao amor de Deus. Tudo isso é obra do Espirito no nosso cora- cao: “Andai no Espirito, e jamais satisfareis as concupiscénci- as da carne” (GI 5.16). 18. Eo Espirito quem da testemunho da nossa filiacao a Deus. E para que se alcance esse objetivo nao é preciso haver qualquer forma de condicionamento mental, ou lava- gem cerebral do tipo que enfia conviccao na cabega das pes- soas pela via de repeticdes como esta que se ouve por ai: “Meu filho, vocé é filho de Deus; vocé ja fez essa declaracao, lembra? Vocé é filho de Deus, é filho de Deus, é filho de Deus...”Faz-se muito disso em nossos dias. Contudo, o que a Biblia diz em Romanos 8.16 é que “o proprio Espirito testifica com © nosso espirito que somos filhos de Deus”. 19. E 0 Espirito quem nos conduz a imagem de Cris- to. Em 2Corintios 3.18 esta dito que nds estamos sendo trabalhados, esculpidos, transformados e burilados pelo Espi- rito 4 medida que contemplamos a gléria do Senhor como que por um espelho. Vemos a imagem de Cristo no espelho da Palavra. Mas essa contemplagao nao é ainda nitida. Ve- mos como que em diagonal, contemplando a imagem as ve- zes turva. No entanto o Espirito Santo esta agindo em nds, fazendo com que nos conformemos a imagem de Cristo que estamos vendo na Palavra. Se olharmos para Jesus, dia a dia o Espirito nos vai tornando mais semelhantes a ele. E quan- do o Senhor vier e nos transformar plenamente na sua ima- gem glorificante, esta tera sido também uma obra do Espirito em nossa vida. O ESPiRITO EM RELACAO A IGREJA Neste ponto temos de admitir que vamos trabalhar sobre um ideal, nao exatamente em torno de nossas constatacdes contemporaneas. O que estou querendo dizer é 39 que o que aqui vai ser tratado nao diz respeito as nossas observacées sobre a igreja, mas ao ideal contido nas Escritu- ras, com referéncia ao Espirito Santo movimentando-se nela e nela produzindo trabalho. Em outras palavras: nao estou descrevendo 0 que a igreja @, mas o que ela pode ser, caso se renda ao Espirito. _ 1. O Espirito Santo faz da igreja seu grande santua- rio. E o que esta dito em 1Corintios 3.16 e 17, onde a palavra “santuario” aparece num contexto no qual se fala em edificagao da igreja — seus alicerces. Paulo afirma que aque- les que destruirem o santuario de Deus (que é a igreja), Deus os destruira. O apdstolo nao esta se referindo a cristaos como individuos-santudrios de Deus — apesar de em 1Corintios 6.19 serem eles individualmente assim chamados. Mas no contexto de 1Corintios 3.17 e 18, a idéia que nos vem a mente é que o apostolo esta se referindo a igreja, nomean- do-a templo. Quando dizemos, por exemplo, que vamos es- tar & porta da igreja, estamos tomando isto no sentido mate- rial. A igreja a que a Escritura se refere tem em Jesus a sua porta. Essa igreja pode inclusive estar reunida debaixo de uma manqueira, um pé de jamelao, uma jaqueira. Ela existe em qualquer lugar onde haja cristéos juntos, congregados. Ali onde ha dois, trés ou mais reunidos esta uma catedral do Senhor. E mesmo que nao estejam juntos, é dessa maneira que o Espirito vé a igreja — uma grande catedral espiritual, conforme diz 1Pedro 2.5 e 6. Pedro neste texto também a chama de “casa espiritual para habitagdo de Deus no Espiri- to”. Efésios 2.20,21 a nomeia “casa”, santuario que esta sendo dedicado e consagrado ao Senhor. A primeira relagao, pois, que o Espirito Santo man- tém com a igreja é nesse nivel — de santuario, catedral, casa espiritual onde ele habita. E o verdadeiro templo, onde se oferecem sacrificios espirituais para o louvor de Deus em desus Cristo. 2. O Espirito Santo habita também em sintese quali- tativa na Igreja. Em Efésios 1.22 e 23, Paulo diz que Deus 40 estabeleceu Cristo como cabeca e Senhor de tudo, e lhe deu a igreja para ser o seu Corpo; e mais: que ela agora é habita- da pela plenitude daquele que enche o cosmos. O Deus que extrapola tudo e todas as coisas habita nela em sintese quali- tativa. E a plenitude daquele que tudo enche em todas as coisas. O interessante é que Efésios 4.3 e 4 nao nos permite separar a igreja do Espirito. Neste texto, falando sobre a unidade do Espirito, o vinculo da paz, Paulo diz que "ha um so Senhor, uma sé fé, um sé batismo”. Ao afirmar que ha um so Corpo, ele nao coloca uma virgula para em seguida afir- mar que ha um sé Espirito. Ele nao separa as expresses, de modo nenhum — nem mesmo em termos literarios. Paulo diz: “Ha somente um Corpo e um Espirito”, porque é impos- sivel fazer referéncia igreja como Corpo de Cristo, sem falar do Espirito. 3. Eo Espirito quem promove a vida comunitaria da igreja. Encontramos esta verdade registrada em Atos 2.42 a 46. O Pentecoste aconteceu, 0 Espirito banhou, lavoua Igreja, se derramou sobre ela. Contudo, a mais caracterizadora de- monstracao de que ele trabalhou nela nao foi exclusivamente o dom de linguas; tampouco os milagres. Acima de tudo, o que mais marcou sua presenca e atuacao foi o estilo de vida comunitaria que ela passou a vivenciar. Essa @ a evidéncia maior, a preocupacao principal de Atos. Lucas descreve como, depois do Pentecoste, a igreja passou a viver uma vida comu- nitaria intensa. Eles repartiam seus bens, perseveravam na doutrina dos apdstolos, no partir do pao e nas oragdes, co- mendo com singeleza e alegria de coracao. E todos tinham tudo em comum. Essa é uma das manifestacdes mais podero- sas do Espirito de Jesus nas igrejas: a intensificagéo da koinonia, da comunhao, da troca, da vida que se doa, se integra, se mistura na vida dos irmaos. . 4. O Espirito promove a unidade da igreja (Ef 4.3). E “a unidade do Espirito no vinculo da paz”, no Corpo de Cristo. Sem o Espirito seriamos a mais dividida e beligerante de todas as comunidades. As nossas intimeras divis6es nao 41 nos permitem ver ainda aquilo que seriamos se o Espirito nao estivesse agindo em nés. Mesmo extremamente dividos, ainda somos um povo que se entende sob a mesma bandeira. A prova disso é que apesar das inimeras nomenclaturas, quan- do as coisas nos assolam, atingem o Corpo de Cristo, logo descobrimos que somos filhos do mesmo Pai, temos que viver na mesma familia e nos amar com amor fraterno. 5. Eo Espirito quem faz da igreja a comunidade portadora da mensagem viva da salvagao. Somente ele pode tomar essa igreja de gente complicada que somos e transformé-la numa mensagem para o mundo. Em 2Corintios 3.2 e 3, Paulo chama a igreja de Corinto, nao obstante ela mesma, de “carta viva”, escrita no coracgdo para ser manifes- tae lida por todos os homens. A simples evidéncia disso vem do fato de que o testemunho da fé chegou até nds. Ja sao dois mil anos de testemunho em meio as mais variadas con- tradicdes da igreja. Suas ambigiiidades sao intimeras, mas a mensagem continua a ser lida na vida daqueles que vivem Jesus na comunidade da fé. 6. Foi o Espirito quem controlou e dirigiu a evangelizacao da Igreja Primitiva. Este é um ponto que nos interessa tratar apenas como idealismo, visto que nos nossos dias nem sempre é€ o Espirito que dirige a genuina evangelizacao. Quase sempre quem diz hoje onde a igreja tem que ir e determina 0 que ela deve fazer sao nossos pro- gramas engabinetados, produzidos num local de administra- ao fria, quase num esquema de marketing. Na Igreja Primiti- va isto nao acontecia; era o Espirito Santo que controlava de maneira soberana. Todavia, é somente o Espirito quem nos capacita a verdadeira evangelizacao, porque é exclusivamen- te ele quem concede poder para testemunho no mundo (At 1.8). Ele enviou evangelistas a lugares improvaveis, mas onde havia necessidade (At 8.29). Foi o caso de Filipe, que evangelizara multiddes nas cruzadas de Samaria. E agora é um evangelista consagrado naquele lugar. Mas vem o Espirito Santo, acaba com todo aquele frenesi e diz: Filipe, “dispde-te 42 e vai para a banda do sul, no caminho que desce de Jerusa- lém a Gaza [percurso de 33 a 40Km, mais ou menos]; este se acha deserto.” Imagine o impacto de tal noticia para um ho- mem de multidées — cruzadas em Samaria, povo se conver- tendo! Vem o Espirito e o direciona a algo aparentemente absurdo: “Vai para aquela estrada deserta, evangelista!” Mas ele era obediente. Ele foi, encontrou 0 etiope, evangelizou, e algo fantastico aconteceu. Assim, é também o Espirito quem deve determinar a esfera de atividades dos seus evangelistas. Quando Filipe acabou de evangelizar 0 etiope e o batizou, diz a Biblia que o Espirito do Senhor arrebatou Filipe. Ele “yeio a achar-se em Azoto". Nao escolheu campo missiona- rio: estava no meio do deserto, acabou de batizar, de repente se desmaterializou. Diz a Biblia que 0 etiope nao o viu mais. O homem evaporou! E se materializou em Azoto. O mesmo processo de soberania do Espirito aconteceu em relacao a conversao da casa de Cornélio. E o Espirito quem se mani- festa a ele através do anjo. E ele que esvazia de preconceitos a mente de Pedro, a fim de que entenda que seria valido ir a casa de um gentio. E ele que se derrama poderosamente no momento de sua pregacao. Ele monta todo o esquema da salvacao da casa de Cornélio, e o faz de maneira soberana. Ainda mais: separa missionarios e os envia. Atos 13.1-3 diz: “Separai-me agora a Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado.” Ele impede certos alvos missionarios e conduz outros. Em Atos 16.6-10 vemos Paulo desejando ir para a Bitinia, na Asia. Entretanto, o Espirito o empurrou para o coracdo da Europa — porque esse era o plano de Deus. 43 a Fs = = Ad \) Plenitude vo Espirito Santo Quando comecei a estudar o tema da plenitude do Espirito Santo deparei-me com duas significativas surpresas. A primeira delas é que, no Novo Testamento, em momentos algum encontramos a expressao “plenitude do Espirito San- to”. Para quem acredita que ao referir-se a ela esta usando um termo eminentemente neotestamentario, fica aqui a sur- presa. O que acontece é que intmeras bandeiras teolégicas e doutrinarias se erguem com base em expressdes como esta, digladiando-se sem que nem ao menos possam justificar in- clusive a expressao em funcao da qual entram numa acirrada guerra — guerra tola, sem sentido, indcua e nao biblica. Isto mostra quanto das nossas divisdes doutrinarias e teolégicas se levanta sobre chavées e tradicdes infundadas. Isto me faz lembrar o que aconteceu no meio dos israelitas, quando Jefté — tendo saido a enfrentar um pais inimigo — convidou a tribo de Efraim a ir junto. Ele se preparou com os gileaditas e convidou os efraimitas, mas estes nao foram. Ao confrontar os adversarios, eles os venceram; e ao voltar, encontraram os efraimitas irritados e belicosos, os quais lhes disseram: “Vocés foram enfrentar os inimigos e nao nos chamaram?” Jefté 45 respondeu: “Mandei-lhes um recado, e como vocés nao vie- ram eu fui.” Os efraimitas contestaram: “Entao por causa dis- to haverad guerra entre nds.” E comecou a guerra entre gileaditas e efraimitas — irmaos, membros da mesma na¢ao. Gileade venceu a guerra. Os efraimitas fugiram a noite, pelos vaus do Jordao, na terra de Gileade. Jefté, querendo vencer definitivamente a peleja, declarou aos soldados que fizessem plantao nos vaus do Jordao e, sempre que chegasse um ho- mem, lhe perguntassem: “De que tribo tu és?” Se a resposta fosse “Eu sou de Efraim”, deveria morrer. Mas, como nin- guém o diria, ele elaborou uma maneira de descobrir quem era e quem nao era de Efraim. Disse entéo a seus homens: “Quando eles chegarem, vocés os detenham e ordenem que pronunciem a palavra “chibolete” — pois os de Efraim ti- nham dificuldade em pronunciar CHI, s6 conseguiam pro- nunciar SI. Assim, mal diziam “Si...”, nao terminavam a pala- vra: a espada interrompia a prolacao. Muitas das nossas questées evangélicas sao tolas, ridiculas. Uns falam de um jeito, outros de outro, e em razao dessas e de outras ninharias nos identificamos como irmaos ou nos matamos uns aos outros nas nossas guerras fratricidas. A segunda surpresa que se tem quando se pensa no tema da plenitude do Espirito Santo é com relagao ao verbo grego que aparece como equivalente a “ser cheio de", empre- gado quase exclusivamente pelo evangelista Lucas. No Novo Testamento ele tem dois importantes usos. Em primeiro lu- gar, Lucas o empregou para denotar caracteristicas gerais de pessoas. Em Lucas 4.1 lemos que Jesus estava “cheio do Es- pirito Santo”. Em Atos 11.24 diz-se que Barnabé, tendo ido a Antioquia, “vendo a Graca de Deus alegrou-se porque era homem bom, cheio de {é e do Espirito Santo.” Portanto, a idéia que Lucas apresenta quando usa esta palavra relacio- na-se a caracteristica dominante na vida da pessoa. Ele nao emprega o verbo com aplicacées exclusivas ao Espirito San- to. Ao contrario, ele também usa 0 verbo em relacdo a outras situacdes e com caracteristicas negativas. Seja como for, as 46 ocasides e situagGes nas quais 0 evangelistas usa a expressdo “cheio de”(mesmo naquelas em que se vale deles negativa- mente) nos serao muito tteis, pois nos ajudarao a entender o peso e 0 significado de tal expressao no Novo Testamento. Lucas 5.12, por exemplo, nos diz que um certo le- proso se aproximou de Jesus, e que ele estava cheio de lepra; ou seja, ele estava tomado de feridas, do alto da cabeca a planta dos pés. Observe que, no texto grego do Novo Testa- mento, Lucas usa a mesma expressao que também emprega para definir a plenitude do Espirito Santo. Em Atos 13.10, 0 apéstolo Paulo nos é apresentado tentando evangelizar o procénsul Sérgio Paulo, mas Elimas, o magico, se lhe opunha. Elimas criava toda sorte de obstacu- los a tudo quanto Paulo dizia. A ponto de, em meio a conver- sa, 0 apdstolo — cheio do Espirito Santo — o repreender, dizendo: "O filho do diabo, cheio de todo engano e de toda malicia, até quando nao cessaras de perverter os santos e retos caminhos do Senhor? Eis ai esta a mao do Senhor so- bre ti, e tu ficaras cego por algum tempo.” E foi exatamente o que aconteceu a Elimas. Ora, no grego a palavra cheio, que aparece no texto — “cheio de todo engano e toda malicia”’— éa mesma usada por Lucas nas ocasides em que ele se refere a plenitude do Espirito Santo. Nos exemplos por mim dados acima, a idéia que fica a respeito da palavra “cheio” é a de que tal pessoa “cheia” esta repleta e totalmente dominada por aquilo: como o lepro- so (totalmente cheio de lepra). Com relac¢ao a estar-se cheio do Espirito Santo, a idéia é de alguém habitualmente gover- nado e controlado pelo Espirito do Senhor. No Novo Testamento, a expressao “cheio do Espiri- to” aparece também em contextos nos quais se permitem observar duas situacGes basicas as quais a expresso esta rela- cionada: aquela que se refere a arraigadas caracteristicas de toda uma vida com Deus, mas também a repentina inspira- cao de um momento. Em outras palavras: o Novo Testamen- to nos apresenta duas possibilidades de vivermos na presenca 47 de Deus cheios do Espirito Santo. A primeira delas é através de um crescimento paulatino, diario, intermitente e contudo freqtiente, até o ponto de mantermos essa plenitude de ma- neira cada vez mais sistematica e continua. A segunda situacao na qual o Novo Testamento tam- bém apresenta essa idéia de plenitude do Espirito Santo @ aquela na qual acontece como coisa que tem a ver com uma positiva crise de momento. Ou seja, o Novo Testamento nos lanca duas possibilidades: a de que se fique cheio do Espirito Santo num crescendo, num caminhar diario e paulatino com o Senhor, ou a de que essa plenitude sobrevenha através de uma crise poderosa, profunda, * :pentina, como uma mani- festacao inequivoca de Deus. Vejamos, entao no Novo Testa- mento, os textos que nos apresentam essa plenitude como vinda através de uma crise instantanea, e outros como um estado a ser desenvolvido gradativamente. A PLENITUDE DO ESPiRITO COMO EXPERIENCIA DE CRISE Observemos a relacao da plenitude do Espirito Santo com uma experiéncia de crise. Examinemos Atos 2.1-4, 0 conhecido texto que narra o Pentecoste, quando a plenitude do Espirito veio sobre os discipulos na forma de uma podero- sa e repentina experiéncia carismatica: “Estavam todos reuni- dos no mesmo lugar, quando de repente veio do ceu um som como de um vento impetuoso e encheu a casa. Todos ficaram cheios do Espirito Santo e passaram a falar em outras lin- guas, conforme o Espirito lhes concedia que falassem.” Nes- se texto a plenitude sobressai de repente: subitamente todos ficam cheios do Espirito Santo. Em Atos 4 a mesma experi- éncia acontece: os discipulos, tendo sido oprimidos pelas au- toridades judaicas, uma vez postos em liberdade encontram- se com os irmaos e, alegres, felizes, fazem uma oracao de gratidao pelo privilégio de sofrer em nome de Jesus. Exaltam a Deus, o Criador dos céus e da terra, e celebram sua 48 soberania, referindo-se 4 sua obra no controle absoluto dos eventos aparentemente ingovernaveis relacionados 4 morte de Jesus. Depois disso eles oram pedindo a Deus que confir- me a palavra que estéo pregando em seu nome, operando sinais e prodigios enquanto pregam. Diz o v. 31 do cap. 4 que quando acabaram de fazer esta oracdo houve um tremor de terra — tremor esse localizado —, do qual o epicentro foi exatamente a casa onde se reuniam em oracao. Era 0 Espiri- to do Senhor. E diz a Biblia que “todos ficaram cheios do Espirito Santo”. Vale a pena lembrar ainda o texto de Atos 13.9, ja referido neste capitulo. Trata-se da confrontacao de Paulo e Elimas. Subitamente o apéstolo interrompe a contradi¢ao de Elimas — Lucas diz que Paulo estava “cheio do Espirito San- to”—, trazendo graves e duros juizos sobre a vida do bruxo, com as implicacées imediatas. Os exemplos acima nos ajudam a entender que a ple- nitude do Espirito pode vir 4 nossa vida através de uma expe- riéncia de crise, numa reuniao de oracao, num instante de devogao, busca, quebrantamento, entrega, abrir de alma; pode vir de repente, num piscar de olhos, de maneira instant&nea, pela intervencdo de Deus. Em ocasiées diferentes na minha vida com o Senhor tenho experimentado plenitudes do Espirito que me vem como experiéncias de crise. Deixe-me contar-lhe uma delas. Ha al- guns anos, certo dia apés 0 almoco, dirigia-me ao escritério da VINDE, a missdo que lidero, aquela altura em Manaus, hoje em Niterdi, Rio de Janeiro. Quando ia chegando ali, um rapaz saiu la de dentro — um paraibano normalmente muito alegre. Nesse dia ele nao estava alegre, mas muito atordoa- do. Eu ia entrando porta adentro quando ele colocou a mao no meu est6émago e disse, rapido como de habito num paraibano: — Pastor, nao entra, que ele fura o bucho! — O qué? — perguntei. — Nao entra, que ele fura o bucho! 49 — Irmo, eu nao estou entendendo nada, fale deva- gar. — Pastor, nao entra que ele fura o bucho — repetiu. — Fura o qué? — insisti. — Fura o bucho! Fura o estémago! Ha um homem com uma faca ai dentro, ele vai furar sua barriga — explicou. — Ah, €? E quem é que esta com uma faca ai dentro? — Um endemoninhado! — ele respondeu. Ai eu olhei pela fresta da porta e vi o rapaz responsa- vel pelo trafego de fitas cassete do programa de TV, PARE E PENSE, e um outro que trabalhava na publicidade do ministé- rio, encostados a parede, rendidos — a parede branca, eles tao brancos quanto ela, num verdadeiro mimetismo. — O que foi que aconteceu ai? — perguntei. — Esse homem chegou endemoninhado com essa faca na mao e disse que se alguém abrir a boca par dizer o nome de Jesus ele mata. La dentro os rapazes tartamudeiam: “Nome... Nome dele...” Mas ele bota a faca no pescogo e eles nao dizem mais nada. Minha secretaria tinha conseguido se esconder no banheiro, e um dos mocos escapara pela janela. E o paraibano, como nao tinha entrado, achou que a melhor politica era fi- car do lado de fora. Disse a mim: “Pastor, entre!” Fiquei pen- sando... E nessa hora que os cabelos ficam em pé, arrepia- dos. Pensei, e falei: “Olhe, irmao, deixe-me avaliar isto bem, com oracao”. Entrei no meu carro, dei uma volta no quartei- rao orando: “Senhor, o que fago?“ E me lembrei do procurar meu pai no templo. Fui la, chamei-o, e disse-lhe: “Pai, esta havendo isto e isto. Senti o impulso de entrar e enfrentar esse endemoninhado armado, mas confesso que também senti vontade de fugir. Por isso queria que o senhor orasse comigo. Vamos até la juntos.” Ent&éo fomos e paramos a porta do escritério da VINDE. Oramos ao Senhor, e quando eu estava acabando de orar, sucedeu exatamente aquilo que o livro de Atos revela haver acontecido algumas vezes com os discipu- los na Igreja Primitiva: num momento, de repente, a alma foi 50 invadida por uma graca, um poder, um enorme jubilo no Es- pirito do Senhor. Entao me veio a certeza absoluta de que aquela vitoria estava de antemao ganha. Quando me apercebi, estava saindo do carro, gritan- do, no meio da rua. Ergui a voz e comecei a andar, clamando: “O que habita no esconderijo do Altissimo, e descansa a som- bra do Onipotente, diz ao Senhor: Meu reftigio e meu baluar- te, Deus meu, em quem confio...”. E quando ia entrando, as pessoas dos escritérios vizinhos, da sorveteria ao lado, olha- vam... Fui atravessando a rua e dizendo: “... Nenhum mal te sucedera, praga nenhuma chegara a tua tenda. Porque aos seus anjos dara ordens a teu respeito, para que te guardem em todos os teus caminhos. Eles te sustentarao nas suas mos, para nao tropegares nalguma pedra. Pisards 0 leao e a aspide, calcards aos pés 0 leaozinho e a serpente. Porque a mim se apegou com amor, eu 0 livrarei; pé-lo-ei a salvo, porque co- nhece o meu nome. Ele me invocara, e eu lhe responderei; na sua angustia estarei com ele, livra-lo-ei, e o glorificarei. Sacié-lo-ei com longevidade e lhe mostrarei a minha salva- cao.” Quando ia entrando, ja gritando as Ultimas palavras deste salmo, o endemoninhado — que tinha cerca de um metro e oitenta — largou os mocos e recuou. Ostentava uma faca enorme, de sapateiro, assustadoramente reluzente. Fui en- trando, e ele foi gritando, antes mesmo que eu colocasse o rosto la dentro: “Eu odeio este desgracado. Ele é meu inimi- go, eu o detesto!” E quando enfiei a cabeca dentro do escrité- rio, ele voou para mim, com aquela faca horrivel, e eu disse: “Em nome de Jesus, sai dele!” Ele caiu uns dois ou trés metros para tras, pegou a faca de novo, correu e eu insisti: “Em nome de Jesus, sai dele!” Ele caiu outra vez, apanhou a faca, caminhou uns passos e aproximou-a do meu rosto, tentando enfid-la. Garanto que em qualquer outra circunst&ncia eu te- ria ou me defendido, ou teria azulado dali. No entanto, o que aconteceu @ que no meu coragao nao havia a menor divida de que faca nenhuma deste mundo entraria no meu rosto ou 51 no meu Corpo! Ele a aproximou bem rente ao meu rosto, sem conseguir mové-la. Sua mao foi sendo torcida. Parecia que guerreava. Entao abriram-lhe a mao, a faca caiu, e ele caiu junto, aos meus pés. Ai exclamei: “Sai dele, em nome de Jesus!” E o deménio o deixou. Abrindo os olhos, atoleimado, espantadissimo, perguntou: Onde é que estou? Que lugar é este? Eu estava trabalhando Ia no mercado... Sou sapateiro; estava cortando couro, quando senti uma personalidade en- trar em mim. Nao me lembro de mais nada.” Narro este fato apenas para mostrar que a manifes- tacao da plenitude do Senhor pode nos alcangar como uma experiéncia de crise. Isso porque 0 que aconteceu comigo naquele dia foi sem diwvida uma dessas experiéncias. Eu esta- va cheio de medo e diivida. Mas de repente o Espirito me invadiu com coragem, confianca e ousadia, que absolutamen- te naquela hora nao existiam em mim. E importante saber que a plenitude do Espirito pode nos vir numa dessas crises. No entanto parece que o Novo Testamento ensina — em mais vezes e mais doutrinariamen- te — que a experiéncia de plenitude do Espirito Santo é comumente algo que acontece num processo gradativo, pau- latino, galgado. perseguido diariamente, no nosso cotidiano. A PLENITUDE DO ESPiRITO COMO UM PRO- CESSO NA VIDA Os textos que falam a este respeito sao basicamente os seguintes: Atos 4.8, onde nao se diz que Pedro ficou, mas que era cheio do Espirito Santo; Atos 6.5, onde o homem, para ser escolhido para o ministério de servico na igreja, nao tinha de ficar cheio do Espirito, mas ser cheio do Espirito. Na passagem de Atos 6 nos é dito que Estévao era homem cheio do Espirito Santo. Também em Atos 13.52, a plenitude do Espirito se manifesta na vida dos discipulos, que “transborda- vam da alegria e do poder do Espirito”, indicando um estado continuo e crescente, nado apenas uma crise repentina. 52 Portanto, o Novo Testamento nos apresenta esses dois lados: uma experiéncia de crise, e também o galgar, o caminhar diario e cotidiano na presenca de Deus, onde a re- alidade da plenitude do Espirito se vai consolidando. Para ilustrar isto, passo a narrar 0 que aconteceu conosco, durante um retiro que organizamos para jovens, em 1974. Aquela altura havia na igreja que serviamos, na cidade de Manaus, apenas uns 35 a 40 jovens. Para 0 retiro levamos conosco uns oitenta mocgos, nao crentes. Eram, pois, cerca de cento e vinte — muito pouco sal para tanta massa! E fo- ram quatro dias pavorosos, nos quais jejuei e orei da manha a noite, pedindo ao Senhor que interviesse, que fizesse alguma coisa que se manifestasse, que salvasse aqueles mocos. Con- tudo nada acontecia. Havia uma confusao generalizada, uma leviandade total, uma indiferenca absoluta. Nos cultos a noite era como se estivéssemos lutando de fato contra principados e potestades horrorosos. No ultimo dia, depois de ter orado e jejuado, estava pregando, quando no meio da pregacao um moco que se sentara no primeiro banco fez “Uah!” abrindo escancarada- mente os bragos, e fazendo a cadeira quebrar com o violento gesto. Ai foi aquela risada geral. Pensei comigo: “Meu Deus, decisivamente nada acontecera neste retiro.” Atalhei meu “es- boco” como pude, para terminar o sermao antes do tempo, e disse a mim mesmo: “Vamos despedir este povo.” Quando acabei de pregar comecei a ouvir uns ruidos... Alguns esta- vam sentados em torno do salao, onde havia madeira a volta, e batiam com o calcanhar atras: um, um, um, um... Meu pai tinha estado conosco os quatro dias de reti- ro, e nao dasse uma sd palavra. Ficou sentado la atrés o tem- po todo, apenas observando. Naquele més ele estivera espe- cialmente na presenca de Deus, orando e jejuando. E durante vinte e um dias — nao @ que vinte e um seja um namero mistico, mas ele escolheu este referencial para orar e jejuar — ficou comendo pao e bebendo Agua apenas, orando, e pedindo a Deus que renovasse seu ministério e a igreja. E 53 continuava la atras. Entao, para finalizar, eu disse: “Gostaria de chamar o meu pai aqui a frente para fazer uma oracao, encerrando este retiro.” Ele veio andando pelo corredor. Meu pai usa muleta desde a mais tenra infancia. Quando ia se aproximando, senti que alguma coisa comecava a acontecer, em meio a um soberbo siléncio. Ele pegou o microfone e falou: “Amados irmaos, vamos orar ao Senhor.” E quando ele disse “O Pai..” e pds-se a orar, comecou uma choradeira, um quebrantamento, e eu vi aqueles mocos caindo de joelhos — algo incrivel comecou a acontecer naquele lugar! E [a esta- va eu, estupefato, boquiaberto. Entao pensei: Meu Deus, eu sussurrei, gritei, falei, e nao aconteceu nada. Ele veio aqui, quietinho, com sua muleta, pegou o microfone e disse “O Pai...”e o povo foi de chofre quebrantado. O nome disso é uncao! Hoje temos pastores, espo- sas de pastores, presbiteros, diaconos, rapazes e mocas lide- res em muitas igrejas, todos convertidos naquela noite. Portanto, nao vemos o fendmeno acontecer apenas no Novo Testamento; nossa propria vivéncia nos ensina que a plenitude do Espirito pode vir como uma experiéncia de crise, ou de forma mais normal, geralmente como uma pro- gressao na rendicao, na entrega, na vida que busca e se defi- ne dia a dia na presenca do Senhor. Entretanto, a questao basica — ja que sabemos como essas coisas podem acontecer em termos de manifestagdes — € perguntar como se da a plenitude do Espirito Santo con- forme o Novo Testamento; como chegar a ela. OS SETE PRINCIPIOS SOBRE COMO OBTER A PLENITUDE DO ESPIRITO Deste ponto em diante quero mostrar a vocé como o Novo Testamento nos apresenta a plenitude do Espirito. Em outras palavras: como é possivel obter e manter essa plenitu- de. Pessoalmente acredito que este é 0 capitulo mais impor- tante deste livro. Isto porque todas as outras coisas sobre as 54 quais ainda irei tratar, s6 serao realmente importantes e Uteis se as verdades relacionadas a plenitude do Espirito tiverem sido bem estruturadas na sua vida. Dialogo e Comunhao A plenitude do Espirito do Senhor pode vir 4 nossa vida pelo didlogo e a comunhao dos santos. O texto registra- do em Lucas 1.40-41 nada nos diz, doutrinariamente, sobre ela. No entanto ele nos apresenta um principio. Isso porque Isabel, mae de Joao Batista, esta gravida, tendo Joao no ven- tre como um ser de 6 meses. Ela recebe a visita de Maria, mae de Jesus, que agasalha Cristo no ventre como embriao de um més. Entao Maria entra na casa de Isabel e faz uma saudagao: “Graca e paz!” E acontece que, apéds essa sauda- cao, o bebé Joao Batista no ventre de sua mae estremece de alegria, fica cheio do Espirito Santo. O principio, entao, é este: a plenitude do Espirito pode vir 4 nossa vida numa rela- cao dialogal. Quando uma pessoa tem dentro de si a obra estabelecida do Espirito Santo —— gente em cujo interior o Espirito esta formando realidades — ao se encontrar com outra, nessa troca pode surgir a plenitude. Em algumas ocasiédes, em reunides de pastores, en- contros de lideres, em coléquios agradaveis, numa troca farta de experiéncias e de informagées daquilo que Deus esta fa- zendo, nao raramente ouco no final algum colega sugerir: “Bem, agora, irmaos, vamos orar um pouquinho porque ja perdemos muito tempo hoje. Ainda nao oramos. Vamos pe- dir ao Senhor que venha nos visitar.” E eu contesto: “Olhem, irmaos, vamos é agradecer ao Senhor pelo que ele ja fez em nds, porque nessa relacdo dialogal nossa vida ganhou exube- rancia, ficou plena de tantas realidades do Espirito do Senhor que nosso cora¢&o esta cheio de alegria.” Realmente, nessa troca de relacdes dialogais, na comunh&o santa com homens e mulheres cheios do Espirito, nossa vida € enriquecida, e a plenitude do Senhor pode nos vir ao coracao. 55 Nutricao do Amor A plenitude do Espirito pode vir nossa vida através da manifestacao e nutricao do amor no nosso homem interi- or. Em Efésios 3.16,17, lé-se que Paulo faz uma oragao na presenca do Pai, de quem toma o nome toda familia, tanto no céu como na terra. O apéstolo faz esta oracao: “... para que, segundo a riqueza da sua gloria, vos conceda que sejais fortalecidos com poder, mediante seu Espirito no homem in- terior, e assim habite Cristo nos vossos coracées, pela fé, es- tando vés arraigados e alicercados em amor...” Observe que neste texto Paulo parte do efeito para a causa. No entanto, ele sé pode ser entendido se partirmos da causa para 0 efei- to. Paulo faz primeiramente uma oracao pedindo a Deus que o poder, o “dynamis”, a forca milagrosa do Espirito Santo enrique¢a o homem interior dos cristaos. Em segundo lugar, que essa plenitude seja tao intensa, que em si mesma caracte- rize a plenitude de Cristo habitando nosso coracao. Mas nao se trata do habitar primario, relacionado a salvacao. A pala- vra grega habite, aqui, da idéia de tomar conta de todos os compartimentos. E uma habitacao plena; @ manifestacao do senhorio total de Jesus. E Paulo diz como isso acontece: “... estando v6s arraigados e alicercados em amor, Cristo habita em todos os compartimentos do coracao de vocés, e o Espiri- to Santo, entéo, segundo a riqueza da sua gloria, enche o homem interior de cada um com poder milagroso, extraordi- nario.” Dessa forma, para que compreenda a seqiiéncia ldgi- ca do que o apéstolo esta ensinando, vocé tem que ir da cau- sa para o efeito. Ficaria mais ou menos assim: estando vocé alicergado em amor, inevitavelmente Cristo vai habitar todos os compartimentos de sua vida, e o Espirito Santo energizara com poder milagroso seu homem interior. Assim é possivel perceber a indissociavel relacao en- tre vida arraigada em amor e plenitude do Espirito Santo. Ninguém que nao viva a realidade do amor cristao pode cres- cer no Espirito. E para tal realidade nao ha substitutos. Pode- se orar, jejuar, ler a Biblia, freqiientar os cultos, evangelizar 56 etc, mas nada disso nos dara a possibilidade de crescermos no Espirito. Ecumenicidade Outro Principio sobre como viver de modo pleno a realidade do Espirito Santo se encontra em Efésios 1.23, tex- to ja referenciado. Em tal passagem a plenitude é afirmada como sendo o resultado da comunhio e da relacao global com o Corpo de Cristo. Em Efésios 1.23, Paulo diz que a igreja hoje é seu “Corpo, a plenitude daquele que tudo enche em todas as coisas”. Por essa razao posso afirmar que na igreja manifesta-se a sintese qualitativa do poder de Deus. Chamo agora sua atenc&o para o texto de Efésios 4.4, onde literalmente Paulo faz separacdo entre todos os elementos teologicos da unidade: ha somente uma {é (virgula-separa- ¢ao), um sé batismo (virgula-separacao), um s6 Senhor. Mas quando ele diz que ha somente um Corpo e um Espirito, ele nao separa os termos um Corpo e um Espirito. Assim fazen- do, ele nos mostra que nao pode haver “virgula” entre o Espi- tito Santo e o cristéo. Ou seja, so se vive a plenitude do Espi- rito quando se vive a comunhao do Corpo de Cristo, sem preconceitos e sem “virgulas relacionais” entre nds e os ir- maos. E nao somente na nossa igreja local ou denominac¢ao, mas em relacao a “todo o Corpo”, na sua plenitude e catolicidade. S6 existe Corpo de Cristo onde ha o Espirito de Cristo, sem preconceitos e sem “virgulas relacionais” entre nds e os irmaos. E nao somente na nossa igreja local ou de- nominagao, mas em relacao a “todo o Corpo”, na sua pleni- tude e catolicidade. S6 existe Corpo de Cristo onde ha o Es- pirito de Cristo; e onde quer que ele se manifeste salvadoramente, ai esta esse Corpo. E onde esta esse Corpo — com base em Efésios 1:23 —, ai habita a sintese qualitati- va do poder daquele que tudo enche, em todas as coisas no cosmos. De modo que as implicagées, as deducdes e inferéncias deste raciocinio nos levam a concluir que relacdes profundas, .legitimas, no Corpo de Cristo — em servico e em 57 comunhao —, inevitavelmente produzem plenitude na vida daqueles que mantém de modo sadio essa relacao. Quanto mais se vive no Corpo de Cristo, mais se vive no ambiente existencial onde a plenitude de Cristo se adensa. O Ciclo de Efésios A plenitude do Espirito Santo chega ainda a nossa vida quando vivemos no ciclo de Efésios 5.18-21. Paulo diz: “E nao vos embriagueis com vinho, no qual ha dissolugaéo, mas enchei-vos do Espirito, falando entre vés com salmos, entoando e louvando de coracéo ao Senhor, com hinos e c&nticos espirituais, dando sempre gracas por tudo a nosso Deus e Pai, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo.” E inte- ressante observar que Paulo nos coloca isso na perspectiva do mandamento, tratando-se, portanto, de um imperativo. Assim, 0 apostolo desafia cada um de nds — nao apenas os pastores e liderangas da Igreja, mas todos, indiscriminadamente, sem excecao, de modo global — a sermos “cheios do Espirito”. O desafio esta feito, é um mandamento, @ um imperativo, e é plural — é para todos! “...Enchei-vos do Espirito.” Alem disso, o verbo grego traduzido em portugués por “enchei-vos” da a idéia de verdadeira rendicao. Em ou- tras palavras, o que Paulo esta dizendo poderia ser colocado da seguinte maneira: “Entreguem-se ao Espirito, para que ele os encha.” Isso significa que o Espirito Santo esta mais inte- ressado em encher-nos do que nés mesmos em sermos dele cheios. Isso nos traz 4 mente 0 episédio de Maria com o Espi- rito, quando ela diz: “Aqui esté a serva do Senhor; que se cumpra em mim conforme a tua palavra.” Aquele foi um dos supremos atos de rendic&ao humana ao Espirito. Inclusive, e sobretudo, rendicdo da reputacdo, do casamento, da respei- tabilidade moral, do futuro etc. Porque aquilo que o Espirito estava gerando nela poderia ter implicagGes perigosissimas em todas aquelas areas. Nenhuma mente humana carnal acei- taria que © que acontecera a ela era obra do Espirito Santo. Portanto, essa rendi¢o a Deus implica entrega radical de nossa 58 vida e futuro a ele. A plenitude do Espirito passa pelo cami- nho dessa entrega ativa de nossa vida ao Espirito. E mais ainda. O tempo do verbo (enchei-vos), no gre- go, é 0 presente, o que sempre nos faz pensar num ato con- tinuo, de algo que nao cessa, nao tem limites, nao tem teto, pode continuar indefinidamente, nao tem status definitivo. Dessa forma o texto poderia ser assim traduzido: “Encham-se sempre, todo dia.” Desse ponto em diante Paulo diz como tal plenitude pode ser alcancada e mantida. Primeiramente ele afirma: “... Enchei-vos do Espirito, falando entre vés com salmos...” Quan- do alguém aprende a falar com salmos: quando a boca esta cheia daquilo que edifica, da Palavra de Deus; quando o falar é rico em instrugdes; quando a sabedoria é o assunto das nossas conversas, essa plenitude nos vem ao coracao, porque “a boca fala do que esté cheio 0 coracdo”. Nao é apenas a plenitude do Espirito que rcs faz falar com salmos, mas é também o falar com salmos que nos enche do Espirito. Ha um ciclo retro-alimentador: uma coisa leva 4 outra, num aben- coado circulo de virtudes em nossa vida. Assim, vocé conhe- ce uma pessoa cheia do Espirito pelo que ela fala e pelo que deixa de falar. E vocé pode ser alguém cheio do Espirito San- to se mudar a sua agenda de conversas: falando com salmos, falando para edificagao, para louvor, falando a verdade, fa- lando com prudéncia, falando a linguagem da Palavra de Deus. Contudo, preste atencéo: nao o estou instruindo a falar abu- sando de chavées religiosos, travestidos de pseudopiedade. Ao contrario: meu interesse € que vocé fale uma linguagem normal, porém cheia do contetido da Palavra de Deus. Nao se trata de decorar e repetir versiculos biblicos, mas falar com o contetido da verdade de Deus, ainda que com palavras se- culares. Paulo entao prossegue nos ensinando sobre como viver a plenitude do Espirito. Ele diz: “... entoando e louvando de coracao ao Senhor.” Vocé conhece um ser humano cheio do Espirito Santo pela maneira como ele adora ao Senhor. 59 Nao por sua coreografia — se levanta ambas as mos, a es- querda ou a direita; se salta de alegria ou nao; se é efusivo ou totalmente quieto durante a liturgia. Muitas vezes gosto do gestual mais carismatico quando adoro a Deus. Mas se parti- cipo de tal gestual apenas porque assim se convencionou que uma pessoa livre para louvar a Deus deve fazer, entdo serei apenas um ator, e meu louvor nao tem nada a ver com o fato de eu estar cheio ou nao do Espirito. Além do que, tais liturgias carismaticas so tao littrgicas quanto as tradicionais. Mesmo os carismaticos mais espontaneos tém uma forte liturgia. De fato, tais exteriorismos littrgicos tm pouca ou nenhuma sig- nificagao diante de Deus. Pessoalmente, ha dias nos quais tudo 0 que eu quero é uma liturgia bem tradicional, através da qual possa adorar solenemente ao meu Deus. Mas como ja disse, muitas outras vezes sinto que minha alma pede um pouco mais de descontragao littrgica. Tudo depende do dia e da hora. Liturgia deveria ser sempre uma expressao existencial da alma. Ora, estou dizendo tudo isso ainda para afirmar que vocé conhece uma pessoa cheia do Espirito pela maneira como adora, porque adora ao Senhor “de corac&o”. Plenitude do Espirito Santo tem a ver com adoracao ao Senhor; adoracao desde o intimo, as entranhas, o cerne da alma. E tal expres- sao da alma pode ser alcancada através das expressdes litargicas as mais variadas. Sinceridade nao conhece formas, conhece apenas contetidos. Sinceridade prescinde de todas as maneiras convencionais de expressa-la. Sinceridade é. E s6 Deus a discerne em seu contetido mais verdadeiro. Ainda pensando no fato de que a plenitude do Espiri- to pode ser vivida através do louvor e da adoracao, devo acres- centar algo que para mim é totalmente importante. Hoje tem- se associado demasiadamente o louvor ao fato de o povo de Deus estar reunido para cantar. Assim, atualmente, véem-se grupos inteiros especializados em louvor. Vemos também muitos que tém esse ministério. Todavia, tal associacéo ape- nas ao tempo de cancées espirituais no culto é extremamente 60 reducionista e empobrecedor da idéia biblica do louvor. Quando Paulo diz que podemos ficar e nos manter cheios do Espirito Santo através do louvor sincero, ele esté pensando em louvor como um projeto de vida, como uma constante e ininterrupta atitude do coracdo diante de Deus. Trata-se, portanto, do cul- to da vida e de uma vida de culto. Tal louvor transcende liturgias, horarios marcados, e se embrenha na vida como um todo. Tal louvor é vida em Deus! Neste ciclo de Efésios, Paulo diz ainda que ndés_nos enchemos do Espirito Santo quando aprendemos a reagir com gratidao a vida, sem lamtrias, dando por tudo gracas ao nos- so Deus e Pai. Nao como 0 sapo Paulama, do livro A cadeira de prata, de autoria de C.S. Lewis — 0 Paulama, que recla- mava o dia inteiro. E quanto a isso temos que ser sensiveis a fim de percebermos as préprias arapucas que 0 coragaéo nos arma para levar-nos 4 murmuracao. Isso porque muitas vezes somos induzidos pela nossa alma a atitudes de disfarcada pie- dade, mas que n&o passa, na esséncia, de pura amargura. Somos assim amargos nao apenas quando nao somos gratos a Deus, mas também quando nao somos gratos aos homens. Conheco pessoas muito “espirituais” que aparentam ser mui- to gratas a Deus, mas sao incapazes da mesma atitude essen- cial de positividade grata para com o proximo. Estou enfatizando isso porque nao tenho a menor dtivida de que reac6es de gratidao a vida e a tudo na presenga de Deus pro- duzem esse ciclo de Efésios: a nossa vida vai sendo enchida da plenitude do Espirito. Paulo ainda nos diz que nds nos enchemos do Espiri- to Santo quando aprendemos a _nos sujeitar uns aos outros “no temor de Cristo”. Eo que diz o v. 21. A essa altura o apéstolo entra numa area de plenitude do Espirito Santo que nds raramente abordamos. Ele diz quais sao os niveis de sujei- cao. E uma pena que no mundo todo as entidades que fazem traducées e publicacdes da Biblia tenham interrompido a se- qiiéncia do texto original, inserindo palavras em negrito, do tipo das que encontramos aqui em Efésios 5, entre os v. 21 e 61 22: “O lar cristao: marido e mulher.” Se nao houvesse isto na Biblia, seguir-se-ia direto a seqiiéncia expositiva do texto, a fim de encontrarmos uma conexao imediata entre os v. 21 e 22. Paulo diz no v. 21: “Sujeitai-vos uns aos outros no temor de Cristo.” E a pergunta é “Qual a primeira sujeicao?” Na seqiiéncia do texto isto fica claro: “As mulheres sejam sub- missas aos seus proprios maridos”, diz o v. 22. A licao é simples: mulheres cheias do Espirito Santo submetem-se ao marido. E mulheres que aprendem a se submeter ao marido no temor do Senhor sao mulheres que ficam cheias do Espiri- to Santo. Esta é a promessa da Palavra de Deus. Mulheres que dizem: “Ah, eu estou cheia do Espirito Santo, j4 nao pos- so mais obedecer ao meu marido, porque agora nao obedeco mais a homens, mas somente a Deus”, est&o cheias de qual- quer coisa, menos do Espirito.(Porque o Espirito Santo s6 enche as pessoas que estao vivendo de acordo com os pa- drées da sua Palavra) Depois vem a segunda sujeicao. No v. 25 esta dito: “Maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja e a simesmo se entregou por ela.” Maridos cheios do Espirito Santo amam suas mulheres, mas amam-nas de modo altruista; sao capazes de se entregar por amor delas. Na me- dida em que fazem isso, Deus os honra e os enche com o Espirito Santo. E nesse ponto que encontramos o perfeito equilibrio entre a submissao da mulher e 0 amor altruista do marido. Quando esses principios biblicos sao obedecidos, ja nao ha maridos machistas, nem mulheres esmagadas. Nao ha nem mesmo a necessidade de que tais papéis sejam por eles relembrados. O marido nao necessita lembrar 4 mulher que ela deve se submeter a ele; e a mulher nao precisa lem- brar ao marido que ele deve ama-la como “Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela”. O problema é que na maioria das vezes apenas as mulheres sao lembradas de seu dever cristaéo de submissdo, enquanto os maridos nao sao igualmente lembrados de seu tremendo dever de serem gene- rosos e efusivos em suas expressdes familiares e conjugais de 62 amor, tendo como referéncia o padrao — Cristo. A vivéncia de tal projeto conjugal traz, automaticamente, a plenitude do Espirito ao coracao que a ele se submete em amor a Deus. _A terceira relacao de sujeicao no temor do Senhor é cesta: “Filhos, obedecei a vossos pais” (6.1). Os filhos cheios do Espirito Santo sao submissos aos pais. O apdstolo prosse- gue: “Pais, [...] criai-os [os filhos] na disciplina e na admoesta- cao do Senhor.” Na epistola aos Colossenses Paulo diz: “Nao os trateis com amargura”, “Nao provoqueis vossos filhos a ira” — acrescenta. De fato, os filhos que se submetem aos pais no temor do senhor tém a promessa de que serao cheios do Espirito Santo. E 0 mesmo sucede aos pais que discipli- nam os filhos com amor e sabedoria, nao exercendo sobre eles nenhum tipo de amor opressivo: “Nao provoqueis vos- sos filhos a ira.” A quarta relagao de submissao esta em Efésios, cap. 6, a partir do v.5. O apéstolo diz que os empregadcs devem se submeter aos patrdes como ao Senhor. Isto da a vida secu- lar um papel de culto, liturgia. Transforma nossas atitudes no trabalho e em relacao aos nossos patrdes — seja o Estado, seja o empresario, seja a diretoria da companhia, seja a dona da casa — num ato de expressao de nossa honestidade crista secular diante de Deus. Eu, pessoalmente, reconheco que nos dias de hoje tal principio tem sido questionado nas suas ba- ses. Isso porque viemos de um extremo a outro. Durante muito tempo fomos pessoas submetidas a uma subserviéncia indig- na. Todavia, no momento parece que fomos para o outro extremo, caindo numa situagao na qual ha uma incapacidade quase essencial de aceitarmos qualquer tipo de autoridade e a ela nos submetermos. Paulo estabelece as relagées de trabalho como um dos elementos através dos quais a plenitude do Espirito opera em nossa vida. O apéstolo diz que no trabalho devemos: J) “Servir com sinceridade de [...] coragao, como a Cristo”; 2) “Nao servir a vista, como para agradar a homens, mas como servos de Cristo”; 3) “Servir de boa vontade, como ao 63, Senhor, e nao como a homens.” Deus honra esta atitude de sujeicao. Vale observar o que se diz: “Como a Cristo... como servos de Cristo... como ao Senhor.” Ora, isso coloca nosso trabalho secular na perspectiva ctltica. Paulo esta nos estimu- lando a realizar o trabalho chamado secular numa perspecti- va ministerial. E vai mais longe ainda, lembrando-nos que tal trabalho secular teré sua recompensa eterna, quando feito como para o Senhor: “Certos de que cada um, se fizer algu- ma cousa boa, recebera isso outra vez do Senhor, quer seja servo, quer seja livre.” Deus é 0 recompensador do trabalho humano. O trabalho secular feito em Deus tem uma recom- pensa que transcende os préprios beneficios materiais com os quais é pago na histéria. -— Paulo prossegue tratando do assunto. Relaciona ago- ra os mesmos principios aos patrées. Ele diz que estes devem saber mandar nos empregados; quando assim procedem com base no temor do Senhor, Deus os enche com 0 Espirito San- to. Se nao observe: “E vés, senhores, de igual modo procedei para com eles, deixando as ameagas, sabendo que o Senhor, tanto deles como vosso, est nos céus, e que para com ele nao ha acepcao de pessoas” (6.9). O apdstolo comeg¢a evo- cando a base motivacional dos mesmos principios pertinen- tes aos servos. Por isso diz: “De igual modo procedei para com eles.” Ora, isso leva os patrées que querem viver cheios do Espirito Santo a se conscientizarem de que devem tratar seus empregados como se eles fossem o préprio Jesus traba- lhando para eles. Além disso, ha ainda duas coisas especificas que 0 apéstolo relaciona exclusivamente aos patrées: 1) “Dei- xando as ameacas, sabendo que o Senhor” do homem nao é o homem, mas é aquele “que esta nos céus”; 2) “Para com Deus nao ha acepcao de pessoas.” Este ultimo principio é um lembrete aos patrées de que eles sao seres iguais a seus ser- vos. Nao ha privilégios sociais transferiveis diante de Deus. Também parece estar claro que o empregado nao é um tipo dificil de ser humano, ao contrario do que as vezes muitos patrdes tentam fazer crer. 64 E vivendo nesta perspectiva que patrées e emprega- dos cristaos estarao aptos a viver e desenvolver a plenitude do Espirito Santo. Caso contrario, suas oragées e piedade religi- osa fora do trabalho nao terao qualquer significado espiritual, capaz de ajuda-los a ficar cheios do Espirito Santo. Ainda na mesrna seqiiéncia acerca do ciclo de Efésios Paulo diz que a plenitude do Espirito passa também pela vivéncia do ministério crist&o — uma vida de servigo que nao foge 4 guerra espiritual. E ele conclui dizendo: “Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e na forca do seu poder.” Ai entao o apéstolo introduz o assunto da guerra espiritual nos lugares celestiais (6.11-20). Na sua mente a seqiiéncia @ uma so: “Enchei-vos do Espirito.” Como? Pelo que vocé fala. Como? Pela maneira como adora. Como? Pelo modo como reage. Como? Pela forma em que se relaciona na familia — com a esposa, 0 marido, os filhos, os pais. Como? Pelo modo como trabalha ou trata aqueles que o servem no trabalho. Relacione-se certo do ponto de vista de Deus, e Deus o hon- rara e o enchera do espirito Santo. Sofrimento e persequicao As Escrituras nos ensinam que a plenitude do Espiri- to Santo também pode vir nossa vida através do sofrimento eda persequicao. E 0 que esta dito em 1Pedro 4.12-14: “Ama- dos, nao estranheis 0 fogo ardente que surge no meio de vés, destinado a provar-vos, como se alguma cousa extraordinaria vos estivesse acontecendo; pelo contrario, alegrai-vos na medida em que sois co-participantes dos sofrimentos de Cris- to, para que também na revelacdo de sua gloria vos alegreis exultando. Se, pelo nome de Cristo, sois injuriados, bem-aven- turados sois, porque sobre vés repousa o Espirito da gloria e de Deus.” No v.15 0 apéstolo diz que nao devo sofrer como “assassino, ladrao, malfeitor, ou como quem se intromete em negocios de outrem”. Devo sofrer como cristao, e, sofrendo, glorificar a Deus com esse nome. Observe agora 0 v. 14, que fala sobre a plenitude do Espirito. S6 que muitas vezes nao 65 levamos esse texto muito a sério, pelo fato de ele nao ter as feicdes carismaticas da nossa preferéncia. Pedro diz o seguin- te: “Se pelo nome de Cristo sois injuriados, [blasfemados, oprimidos, atribulados], bem-aventurados [ou felizes] sois, porque sobre vés repousa o Espirito da gléria [o Espirito de shekind] e de Deus”. Vocé jé havia pensado nisso? Jé pensou no fato de que quando vocé é sujeito ao sofrimento injusto, quando sustenta a justica do Reino de Deus, quando assume a vida de santidade, apesar do ridiculo ao qual tal projeto tantas vezes o submete, quando nao afrouxa o compromisso da obediéncia a Deus apesar das sedugdes em volta, sobre vocé repousa o Espirito da gloria e de Deus?! Se soubéssemos disso, certamente usariamos de maneira diferente o sofrimento e a persequicéo. Emprestariamos aos dis- sabores da existéncia e a toda forma de opressao ou ridicularizacao sofridas no e pelo evangelho fins liturgicos. Tais situacdes tornar- se-iam parte do nosso sacrificio do louvor e adoracao ao Senhor. Diriamos: “Senhor, obrigado pela promessa de que sobre mim repousa 0 Espirito da gloria e de Deus! Aquele Espirito da gloria, de shekind, que encheu o templo de Salom&o com gléria tama- nha que os sacerdotes néo puderam permanecer ali. Assim, aju- de-mea sofrer em tie no teu amor, sem permitir que meu coracao se encha de amargura e autopiedade.” Vocé ja ouviu a historia de Salomao Ginsburg, um jovem judeu que se converteu ao evangelho? Sua familia inteira — tradi- cionalmente judaica, comprometidos todos religiosamente com o judaismo — chamou-o a fim de lhe oferecer uma chance de apostatar do que consideravam heresia crista. Mas 0 jovem estava amando a Jesus. Entéo um dia, a familia reunida, alguém lhe perguntou: -—— Vocé é capaz de apostatar de Jesus Cristo? — Nao! Tentaram persuadi-lo, mas ele, mantendo-se firme, declarou: — Nao! A familia entéo 0 desconsiderou. Abrira-lhe as Escri- 66 turas em Deuterondmio, e leram o texto que fala das maldi ¢6es da lei que recaem sobre os judeus que nao obedecem a Palavra de Deus: — Maldito seras ao entrares. Mas Salomao Ginsburg ouvia outra coisa. Ele ouvia: — Bendito seras ao entrares. — Maldito seras ao saires. -— Bendito seras ao saires — era o que escutava. — Quando plantares a terra ela nao dara o fruto. — Tudo que plantares eu vou abencoar — ouvia. Liam-lhe as maldicées e ele ouvia as béngaos. E ele foi ficando embriagado, cheio do Espirito. E quando a leitura das maldicdes acabou, disseram-lhe: — Fora, cao! E saiu Salomao, trocando as pernas, agarrou-se a um lampiao, e ficou ali louvando a Jesus: — Aleluia, gloria ao teu nome! Nisto um guarda, de longe, vé aquele rapaz agarrado ao lampido. “Tao novinho a uma hora dessas, bébado! Vou la. Vou prendé-lo”, pensou. — Meu filho, vocé esta bébado? — Nao, seu guarda, nao é vinho, é outra coisa. E olhando para ele sorriu e comecou a falar. E foi falando de Jesus, e o guarda, quebrantado, disse: — Desse vinho eu quero! Ese ajoelharam ali, e oraram, o guarda entregando a sua vida a Cristo. “Se pelo nome de Cristo sois injuriados, bem-aventurados sois, porque sobre vés repousa o Espirito da gloria e de Deus.” A Vida de Oracao A Palavra de Deus também nos ensina que a plenitu- de do Espirito vem a nossa vida através da vida de oragéo. Quando falo em ora¢&o estou falando do ato sistematico de orar, da busca intensa de Deus, com expectativas de que ele nos visite. Nao se trata de oracées-rezas-evangélicas, feitas 67 mecanicamente, mas ora¢ées cheias de santa expectativa di- ante de Deus. Como em Atos 2, quando o Espirito se derra- mou enquanto oravam as 9:00 horas da manha; ou em Atos 4.32, quando o Espirito estremeceu a casa e os encheu en- quanto oravam. Em Lucas 11.13 Jesus nos estimula a orar cheios de expectativa: “Se vés, que sois maus, sabeis dar boas dadivas aos vossos filhos, quanto mais o Pai celestial dara o Espirito Santo aqueles que lho pedirem?” E através da oragao que vocé inspira o amor divino. E mediante ela que vocé pode dizer: “O Deus, enche a minha vida. Estou aqui como uma esponja para beber, absorver a realidade da tua graca.” Nao tenha a menor duvida de que Deus esta mais interessado em enché-lo do que vocé em ser cheio de Deus. Estou convencido de que essa realidade da oracao precisa ser urgentemente redescoberta por nés, pelo simples fato de que nos tornamos uma geracao que nao ora. Mesmo os movimentos evangélicos que no passado mais se caracte- rizaram pela vida de oracdo j4 néo oram com a mesma inten- sidade, dedicacdo e fé singela e expectante. A tragédia do cristianismo brasileiro, pelo menos a parte protestante dele, é que 4 medida que o resto do pais se torna mais voltado para as realidades espirituais — ainda que tantas vezes as negati- vas —, nés temos nos tornado cada vez mais materialistas, tendendo a absolutizacao da dimensao politica acima de qual- quer outra, ou cedendo a tentagao de uma existéncia crista bem arrumada doutrinariamente, porém totalmente vazia da- quela esperanga que faz orar. Sem vida de oragao nao ha a menor chance de se viver qualquer projeto de vida com a plenitude do Espirito Santo. A Palavra A plenitude do Espirito também acontece em nossa vida pela relacao diaria, devocional, na presenga de Jesus, com sua Palavra, com o estudo das Escrituras. E 0 texto de Joao 7.37, que nos diz que no ultimo dia da festa dos 68 Tabernaculos, Jesus exclamou: “Se alguém tem sede, venha a mim e beba.” O interessante é que o original grego desse versiculo nao da idéia de algo definitivo. A nocao que ele da é de uma atitude didria, continua. Como faco isso? Jesus disse: “Quem cré em mim, como diz a Escritura, do seu interior fluirao rios de Agua viva.” Isto ele diz com respeito “ao Espiri- to que haveriam de receber os que créssem, visto que até aquele momento o Espirito nao havia sido dado, pois Jesus nao fora ainda glorificado”(Jo 7.39). Entéo, como bebo de Jesus todas as vezes que tenho sede? Em Joao cap. 6 Jesus ensinou que o Verbo que se fez Carne agora se transformou outra vez em Verbo. “O Verbo se fez carne e habitou entre nds.” Todavia, foi o proprio Jesus que disse que deveriamos comer sua carne e beber seu sangue, a fim de que tivéssemos parte nele mesmo (Jo 6.53-55). Os discipulos interpretaram esta sua afirmagdo numa perspectiva antropofagica. E assim muitos se escandalizaram. Em outras palavras, o que alguns deles disseram foi: “Que coisa terrivel! Esse homem é um antropéfago! Ele nos manda comer carne e beber sangue!” (Jo 6.60-61). Jesus entao os chamou e lhes disse: “Oucam: Eu nao estou falando de carne... O espirito é 0 que vivifica; a carne para nada aproveita: as palavras que eu vos tenho dito sao espirito e vida” (Jo 6.63). Dessa forma aprendo que o Verbo que se fez carne agora se faz vida para a minha vida pela Palavra. A unica maneira de eu comer a carne e beber o sangue de Jesus é através da absor¢ao da Palavra, que é espi- rito e vida. De modo que todas as vezes que estou precisando me renovar tenho que fazer isso; sempre que tiver fome e sede tenho que comer e beber, isto é, ir a ele pela Palavra. E cle promete que do meu interior fluirao rios de Agua viva: havera plenitude! Todas as vezes que estou com a Palavra, meditando nela, aprendendo, deixando que ela forme o carater de Jesus em mim, que me transforme, tornando-me semelhante ao Senhor, pela acao do Espirito Santo; sempre que deixo esse Verbo se fazer carne de novo na minha existéncia, o Espirito 69 fluir em mim, eu me transformo numa espécie de chafariz de Deus. E 0 que diz 0 texto: “Do seu interior fluirao rios de agua viva” (Jo 7.38). Lembra-se daqueles bonequinhos das pracas, gordos, de marmore, que ficam com a boquinha aberta, sol- tando Agua a vida inteira? E assim o milagre! Vocé tem sede, vai la e bebe. Isto diz respeito ao fato de que, nesta relacao devocional com a Palavra, como meio de graca para a minha vida, em cada pouquinho que absorvo, na experiéncia siste- matica devocional, tenho o suficiente para esse chafariz de Deus, que abengoa vidas, o tempo todo. Pois assim é a vontade de Deus: que sejamos cheios do Espirito Santo, pelo didlogo e a comunhiao santa; pelo amor aos irmao, germinando e crescendo no coracao; pela comunhao de servigo com o Corpo de Cristo; e pelo ciclo de Efésios, cap. 5; pelo que falamos; pela maneira como adora- mos; o modo como reagimos; a forma em que nos submete- mos no temor do Senhor. Esteja cheio do Espirito Santo, reagindo de modo certo a persegui¢gdo e a tribulacdéo — pela vida diaria, cotidiana, ininterrupta de oracao. Seja cheio do Espirito, indo ao Se- nhor todas as vezes que tem sede, e na forma como hoje ele se substancia na sua vida: através da sua Palavra. Sinais da Plenitude Quais sao os resultados visiveis e caracterizadores de uma vida cheia do Espirito Santo? O Novo Testamento ensi- na que sao sinais espirituais, morais e éticos. Vocé pode ter dons, carismas, manifestacoes milagrosas e ser tao carnal como os membros da igreja de Corinto. Vidas cheias do Espirito Santo evidenciam isso, através de certos sinais. Galatas 5.22- 23 nos fala do fruto, a evidéncia do Espirito: amor, alegria, paz longanimidade (a palavra grega é macrotomia, que sig- nifica ser paciente como Deus tem sido conosco); benignida- de (docgura sobretudo com os humildes), bondade (generosi- dade), mansidao (placidez, modéstia), dominio prdprio (con- trole sobre vicios etc.), esperanca (Rm 15.13). Outro sinal da 70 plenitude do Espirito é isencao de legalismos, de condiciona- mentos opressivos, conforme diz 2Corintios 3.17: “Onde esta o Espirito do Senhor ai ha liberdade.” A santificacao é outra marca, conforme mostra 2Tessalonicenses 2.13: O Espirito nos santifica porque Deus nos elegeu “para a salvacao pela santificagao do Espirito”. E facil descobrir pessoas cheias do Espirito Santo. Eles, por exemplo, nao produzem divisées carnais na igreja. Judas 19 diz que vivem de modo incompativel com 0 pecado, © que implica nao promover divisées — resultado de nossa sensivel e egoista animalidade. Que Deus nos encha com 0 Espirito Santo! A ordem do Senhor para hoje, e sempre é esta: “Enchei-vos do Espiri- to!” Transborde o Espirito! Deixe-se dominar por ele. Permita que ele va se infiltrando de tal maneira na forma de vocé pensar, ser, viver, que se misture, se funda no seu ho- mem interior. 71 = S = G i O Batismo com o Espirito Santo A nivel de introducao deste capitulo desejo esclare- cer, antes de mais nada, que nao é minha inten¢ao, sob hipo- tese alguma, aticar polémica em torno deste tema santo, de- licado demais para nos agredirmos por meio dele. Contudo, devo admitir o fato de que nao ha assunto ou teologia na igreja evangélica contemporanea que maior ntmero de inter- pretacdes e polémicas tenha suscitado do que este. A constatacao de tal realidade é facil quando se vé um numero enorme de grupos e de perspectivas teoldgicas sobre o batis- mo com, em ou no Espirito Santo. Entre as muitas perspecti- vas pelas quais se vé este tema, tem-se a dos reformados- conservadores, dos reformados-abertos, dos reformados- carismaticos, do carismaticos de linha nao reformada, dos catdlicos carismaticos e dos pentecostais. Estes, por sua vez, se subdividem em outros grupos: os pentecostais-tradicionais (representadas no Brasil por igrejas como a Assembléia de Deus), os pentecostais-renovados (igrejas como as Batistas Renovadas ou Presbiterianas Renovadas) e os pentecostais- folcléricos (genuinamente representados pela Universal do Reino de Deus). Sao tantos os ramos, que sO posso lamentar 73 tantas divis6es. Portanto, nao é inten¢ao deste livro ajudar a aumentar ou acirrar tais segmentacdes. ‘ Também para abrir este capitulo quero afirmar algo que o Rev. John Stott tem enunciado como um principio de sabedoria e cautela em estudos deste género e que eu, como nao poderia deixar de acontecer, vou adotar neste livro. Ou seja: nao podemos criar doutrina em cima do livro de Atos. Digo isto baseado no fato de que a maioria das teologias a respeito do Espirito Santo atribuem a ele sua principal, as vezes Unica, “referéncia doutrinaria.” Mas o livro de Atos — como 0 proprio nome diz — é um livro de atos, de experién- cias, nao de doutrinas. E atos, experiéncias, ndo sao padronizaveis, nao podem ser absolutizados a sua forma: s6 doutrinas tém tal possibilidade. Se fossemos erguer doutrinas com base em Atos, imagine que doutrinas — como a da con- versao — ganhariam um lugar sem precedentes na vida e na experiéncia de Paulo. Porque se ha uma experiéncia de con- versao extraordinaria, em Atos, esta é a do apéstolo: “Subita- mente uma luz do céu brilhou ao seu redor e, caindo por terra, ouviu uma voz... e ficou cego.” Baseado nisso eu pode- ria escrever um livro sobre “Os sintomas e as evidéncias da conversao”, no qual afirmaria o seguinte: “O homem conver- tido é aquele que viu uma luz no céu — mais precisamente ao meio-dia (Nao valeria 4s 6 da manhf, as 10, ou as 11 horas). Ouviu uma voz e ficou cego trés dias.” Jé imaginou pessoas construindo doutrina Sobre conversao em cima da experién- cia de Paulo? Estariamos todos perdidos! Quantos de nés tém encontrado Cristo desse modo? A absolutizacao da conversao de Paulo como o verdadeiro padrao doutrindrio-experiencial iria criar duas realidades: um grande grupo de neurdticos pro- curando viver, sentir e produzir os mesmos fendmenos de con- versao; e um grupo de mentirosos afirmando que experimen- taram tais fendmenos. Portanto, transformar experiéncias em padres doutrinarios pode ser uma catastrofe. \ Também a nivel de introduc&o devo dizer que preci- samos estar dispostos a renovar a mente quanto aos nossos 74 conceitos. Abro aqui um paréntese para dizer que a posicao que partilho neste livro é minha apenas desde 1978. Tive minha genuina experiéncia de conversdo numa igreja das Assembléias de Deus em Manaus, uma quarta-feira a noite; fiz meu compromisso com Jesus com um pastor presbiteriano na quinta (meu Pai); fui inicialmente muito ajudado por um pastor da Igreja Batista da Renovagao (Israel Guerra), e tive a certeza de que Deus me havia chamado para o ministério sagrado numa experiéncia com um bispo anglicano do Liba- no (Samuel Doctorian). E mais: convivi intensamente com ir- maos batistas e de todas as denominacées; contudo minha pneumatologia era originalmente pentecostal. Nos quatro primeiros anos da minha vida de convertido era um ardoroso defensor da teologia do Espirito Santo conforme classicamente ensinada pela igreja pentecostal. Digo isto apenas para mos- trar que nao estou teorizando quando afirmo que devemos estar dispostos a renovar a mente — se for o caso —, com honestidade, bom-senso, e a luz das Escrituras. Eu mesmo tenho tido que rever outras posigées a luz da Palavra de Deus. Algum tempo atras, fazendo este mesmo estudo, ao termina-lo (fago-o quase que anualmente para grupos diver- sos), uma rapaz me procurou e me disse: “Pastor Caio, estou absolutamente convencido pela Biblia de que o senhor esta certo, mas acontece que tudo isso nega o meu sentimento.” Entao argumentei: “Mas irmao, enganoso é 0 coracao, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto — quem o entendera? Meu coracao pode dizer mil coisas, mas o meu compromisso é com a Biblia, e é com ela que desejo estar em absoluta harmonia.” Mas meu arrazoado pouco ajudou. O moco dava mais atencao aos seus sentimentos do que a razao que lhe vinha a mente pela Palavra de Deus. Este é um exem- plo tipico de alguém que nao esta disposto a se abrir para o convencimento que vem pela Palavra. 75 ATOS NAO SERVE A TEOLOGIA SISTEMATICA Como ja vimos, 0 livro de Atos nos impossibilita de fazer qualquer sistematizacdo de uma formula teolégica sobre como se da o batismo com o Espirito Santo. Ele nao oferece doutrinas, apenas relata experiéncias, e estas nao obedecem a um padrao. Prova disso sao aquelas relacionadas com o recebimento do Espirito Santo. Observe o seguinte. Com os discipulos de Jesus e os cento e vinte que receberam o Espiri- to Santo no dia de Pentecoste, qual foi o caminho de fé que eles tinham percorrido até aquele momento? Em primeiro lugar, eles nutriam fé em Jesus, e isso desde o ano inicial do seu ministério (At 1.13-22). Eles haviam sido batizados — ou por Joao Batista, ou no comeco do ministério de Jesus; fo- ram discipulados por Jesus durante trés anos, e no dia de Pentecoste receberam o Espirito Santo. Nesse mesmo dia trés mil pessoas creram na pregacao de Pedro. E 0 que lhes acon- teceu? Pedro os convidou a receber o mesmo dom que havi- am recebido (At 2.38). E qual foi a seqiiéncia espiritual, até receberem o Espirito? Arrependimento, batismo, e a promessa do Espirito Santo. E 0 que diz Atos 2.38: “Arrependei-vos, e cada um de vés seja batizado [...] e recebereis o dom do Espi- rito Santo.” Assim, trata-se de uma ordem de fatos totalmen- te diferente da dos 12 discipulos ou dos 120 da manha de Pentecoste. Temos também aquele grupo de Samaria que se con- verteu com a pregacao de Filipe. Diz a Biblia que eles creram, foram batizados, e inclusive houve um interregno, até que Pedro e Joao foram la, oraram, e eles receberam o Espirito Santo. Aconteceu entao a conversao de Paulo, e a seqtiéncia foi: arrependimento, fé, recebimento do Espirito Santo (quando Ananias orou com ele) e batismo. Depois vem Cornélio, que ouviu a Palavra, reagiu com fé, recebeu o Espirito Santo e foi batizado. Apds ele vem a dos discipulos de Efeso, em Atos 19. Eles ouviram a Palavra, receberam o batismo, depois o Espirito Santo 76 Com base nessas experiéncias, como se poderia afir- mar — conforme alguns livros de doutrina pentecostal basea- dos em Atos — que a primeira coisa a se fazer é esta, a se- gunda essa, a terceira aquela? Ou que acontece o batismo com ou sem gua, e s6 depois o batismo com o Espirito San- to? Ou seja: antes, obrigatoriamente, tal passo tem de acon- tecer, caso contrario nada absolutamente sucederé. Em mui- tos casos trata-se quase de uma formula como para se ligar um liqiiidificador. Pessoalmente, nao creio que seja possivel definir como essas realidades relacionadas a obra de Deus “funcionam” . TEOLOGIA SISTEMATICA, SOMENTE NAS CARTAS DOUTRINARIAS Desejo mostrar-lhe que a doutrina do Espirito Santo tem que ser erigida com base nas cartas doutrinarias, ndo em Atos. Em primeiro lugar, nao podemos construir doutrinas em Atos e confirma-las nas cartas. O contrario é que é o certo. Em Atos ha somente fatos, nao a interpretacao teold- gica deles. A seqiiéncia que as cartas nos apresentam sobre o recebimento do Espirito Santo tem a ver sempre com a pre- gacao da Palavra de Deus. Leia Romanos 10.17, onde se diz que a fé salvadora “vem pelo ouvir, e pelo ouvir a Palavra de Deus”. Observe ainda o que diz Galatas 3.2 e 5, onde esta registrado que o Espirito é concedido quando as pessoas es- tao ouvindo a Palavra com fé. Paulo pergunta: “Recebestes o Espirito pelas obras da lei, ou pela pregacdo da fé?” Atente sobretudo ao v. 5: “Aquele, pois, que vos concede o Espirito e que opera milagres entre vés, porventura o faz pelas obras da lei, ou pela pregacao da fé?” O que Paulo esta dizendo é que “a fé vem pela pregagao, e a pregacao pela palavra de Cristo” (Rm 10.17). E mais, quando ouvimos a Palavra de Deus e ela pro- «luz fé no coragao, o Espirito do Senhor vem sobre nds — isto acontece na experiéncia primeira, no encontro, a que 7 chamamos regeneracao e conversao. O que também faz sen- tido com Atos 10.44, que revela que o Espirito Santo do Senhor caiu sobre todos os que ouviram a Palavra na casa de Cornélio, na hora da pregacao. A salvacao, portanto, vem com a invocacao do Espirito Santo. E “o Pai celestial dara o Espirito Santo aqueles que lho pedirem” (Lc 11.13). O Espirito Santo @ concedido aqueles que ouvem a Palavra de Deus com fé. Isto na experiéncia primeira, quando o Espirito vem selar, salvar, regenerar, colocar-se como penhor na alma de todo aquele que cré em Jesus (Ef 1.13-14). Portan- to, qualquer recebimento do Espirito Santo —- teologicamente falando — tem a ver com a pregaco das Escrituras. Sem ela nao ha fé salvadora. Sem fé salvadora o Espirito nao se derra- ma em selagem, em regeneracao salvadora no coracao. Se todos os que sao de Cristo tém o Espirito Santo (conforme diz Rm 8.9: “E se alguém nao tem o Espirito de Cristo, esse tal nao é dele”), entao qual é a experiéncia cristé que deve receber o nome de batismo com o Espirito Santo? O BATISMO COM O ESPiRITO SANTO CONFOR- ME O NOVO TESTAMENTO Os pentecostais afirmam que é a segunda béngao. Isto € o que diz a teologia pentecostal convencional: “Batismo com 0 Espirito Santo nao é conversao, nem regeneracao, mas uma segunda béncao, que acontece apés a conversio, e é caracteri- zada pelo falar em outras linguas.” Os reformados explicavam isso de modo diferente. Eles diziam que a terminologia “batis- mo com o Espirito Santo” é teologicamente sinénima de rege- nera¢&o e novo nascimento, sendo equivalente 4 obra da con- verso. Sao terminologias sindnimas para definir o mesmo acontecimento, afirmavam. Concordo com eles! Vocé pode chamar a mesma experiéncia de novo nascimento, regeneracao, conversao ou batismo com o Espi- rito Santo. Sao termos diferentes para descrever 0 mesmo acontecimento intimo. 78 JUSTIFICATIVAS QUANTO A AFIRMACAO PENTECOSTAL DE SER O BATISMO COM O ESPiRITO SANTO UMA SEGUNDA BENCAO. » Primeiro argumento: No Pentecoste, Pedro, Tiago, Joao os apéstolos e os 120 que tiveram experiéncias de discipulado e de caminhar com Jesus (portanto ja salvos) fo- ram batizados com o Espirito Santo. Conclusao: o batismo com o Espirito Santo é para pessoas que ja foram salvas, sendo portanto uma segunda béncdo. Que resposta se pode dar a esta argumentacaéo? + Minha resposta é que o Pentecoste nao constitui pa- drao, pelo fato de ser o derramamento inicial do Espirito San- to. Os implicados no derramamento viviam uma situacéo sem precedentes, porque o Espirito nao havia ainda sido derrama- do. O que aconteceu com os 120, repito, ndo constitui pa- drao; seria padrao se durante aqueles trés anos que convive- ram com Jesus 0 Espirito do Senhor ja houvesse sido derra- mado. Mas o Espirito nao tinha nem mesmo vindo sobre eles. Entao o que antes lhes sucedeu — fé, batismo, discipulado — nao foram passos anteriores ao batismo, mas apenas dispensagées distintas da historia da salvacao. Uso aqui o ter- mo “dispensac&o” apenas para me referir a um periodo his- térico em que o modo existencial pelo qual o Espirito estava se relacionando com o homem nao era ainda tao “interior” e generalizado quanto @ agora. Meu uso do termo nada tema ver com os rigorismos metédicos e, por vezes, domesticadores de Deus dos chamados dispensacionalistas. Isso porque mes- mo antes do Pentecoste a Escritura ja atestava a relacao do Espirito com o “intimo humano”, se bem que esse nao fosse ainda padrao, como é hoje. S6 depois que Jesus foi assunto aos céus e derramou o Espirito — e dai para a frente é que se pode estabelecer uma teologia sobre o receber do Espirito, vis- to que aqueles homens estavam vivendo com Jesus num con- texto onde o Espirito nao havia ainda sido derramado. Portan- to, a experiéncia deles nao padroniza esse tipo de teologia. 79 + Também o Pentecoste nao constitui padrao por ter em si 0 cumprimento simultaneo de duas promessas. Pensa- mos normalmente que nele ha o cumprimento de apenas uma, o que nao é exatamente um fato, pois na realidade sao duas: batismo no Espirito Santo e derramamento de poder para testemunhar ao mundo. Parece-me que é justamente isto que se mistura na mente da maioria das pessoas. Atos 1.5, por exemplo, faz uma primeira promessa — a do batismo com o Espirito Santo, onde Jesus cita Joao Batista e diz que depois que ele fosse assunto aos céus os discipulos seriam batizados com 0 Espirito, Entéo os que estavam reunidos indagam: “Se- nhor, sera este o tempo em que r2staures 0 reino a Israel?” E desus lhes responde: “Nao vos compete conhecer tempos ou épocas que 0 Pai reservou para sua exclusiva autoridade; mas recebereis poder, ao descer sobre vés 0 Espirito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém, como em toda a dudéia e Samaria, e até os confins da terra.” O que esta dito no v. 8 sobre a concessao de poder espiritual nao é uma resposta ao v. 5, mas ao contexto antecedente imediato, em que os discipulos perguntaram: “Senhor, sera este o tempo em que restaures o reino a Israel?” Ou seja: “Vais voltar logo para esta restauracao?” E Jesus responde assim a uma per- gunta escatoldgica: “A questao escatolégica de vocés sobre o fim — quando vem, quando nao vem — n&o tem que ser respondida com datas, anos, épocas. A grande resposta a esta questao é a evangelizacao do mundo, realidade para a qual eu prepararei vocés, através do poder do Espirito Santo que lhes serd concedido.” Isto @ quase Mateus 24.14: “Em outras palavras: Vao por todo o mundo, preguem o evange- lho a toda criatura! E quando o mundo tiver ouvido a Palavra, vocés estarao mais préximos do que nunca da época em que todas as coisas serao restauradas.” Portanto, ali no Pentecoste duas promessas se cumpriam simultaneamente: a primeira, batismo com o Espirito Santo; a segunda, derramamento de poder, para que aqueles homens fossem testemunhas efica- zes de Jesus, em toda a terra. 80 *Eo grupo pentecostal dos trés mil — os que ouviram a pregacao de Pedro e se converteram no dia de Pentecoste — que constitui padrao normal de recebimento do Espirito Santo. Em Atos 2.37-41, quando se diz que Pedro pregou explicando 0 que estava acontecendo, alguns retrucaram: “Eles estéo embriagados... Como péde isto suceder?” Pedro anun- ciou Cristo, e quando terminou a pregacao eles pergunta- ram: “Que faremos, irmao?” E ele respondeu: “Arrependei- vos [...], sede batizados [...] e recebereis o dom do Espirito Santo". Esse é 0 grupo padrao — grupo de pessoas que nada sabiam do Espirito Santo, além do que haviam presenciado. Tudo o que Pedro conhecia era 0 que experimentara; e tudo quanto oferecia era o que ele mesmo provara — e ofereceu de maneira nao dramatica, dizendo simplesmente: “Arrepen- dam-se, creiam, sejam batizados, e receberao o dom que re- cebemos.” O convite de Pedro para que os judeus recebessem o mesmo dom que havia recebido — o do batismo — deu-se em funcao do fendmeno pentecostal, que atraiu a multidao. No entanto, nada é dito a respeito de terem tido experiéncias idénticas as dos 120, naquela mesma manha de Pentecoste. Duvidar de que eles tenham recebido de fato o que Pedro prometeu apenas em raz&o da auséncia dos “fendmenos pentecostais” € 0 mesmo que descrer da conversao de al- guém pelo fato de nao haver visto uma luz ou ouvido uma voz no meio do caminho, como Paulo. Com base neste episddio do Pentecoste, o batismo com o Espirito Santo @ obra de conversao e regeneracao, nao a chamada segunda bénc&o. ‘* O segundo argumento pentecostal diz que é possivel ser batizado e convertido, mas ainda nao ter sido batizado com o Espirito Santo. Neste caso o batismo seria uma segun- da béncao. E o que muitos amados irmaos e irmas dizem, baseando-se em Atos 8.4-25, no chamado Pentecoste Samaritano. Vejamos 0 que aconteceu em Samaria. Filipe saiu para pregar o evangelho, depois da morte de Estévao, quando veio a opressao sobre os crentes de Jerusalém, que 81 os dispersou por aquelas regides. Ele pregou aos de Samaria, expulsou deménios, curou enfermos, e houve grande alegria na cidade; diz ainda a Escritura que Filipe batizou os que iam crendo. Inclusive o proprio mago da cidade, Simao, abragou a fé e foi batizado. Alguns dias depois, os apdstolos em Jeru- salém souberam que Samaria havia recebido a Palavra de Deus, e enviaram para la Pedro e Joao. Chegando, impunham as maos sobre os discipulos e eles recebiam o Espirito Santo, porque o Espirito nao tinha “descido ainda sobre nenhum deles”. Nesse caso, pelo menos aparentemente, cristaos teri- am sido batizados com o Espirito Santo, como uma segunda experiéncia. Que resposta se pode dar a esto? * Segundo parece, havia necessidade de uma autenti- cacao apostélica no caso da obra missiondria em Samaria, visto tratar-se das primeiras iniciativas da igreja fora de Jeru- salém. A viagem missionaria a Samaria foi a primeira que a igreja fez. A igreja, que estava enclausurada em Jerusalém, é agora semeada pela perseguic&o para pregar a Palavra. Ela nao tivera até entéo qualquer experiéncia explicita com a pre- gacdo da Palavra fora da Judéia, muito menos numa area complicada como Samaria. Isso faz o grupo dos cristaos samaritanos ser o primeiro a receber o Senhor fora do con- texto imediato de Jerusalém e da Judéia — fato este que tor- na aquele acontecimento algo muito especial e que deveria ser lido na perspectiva dos “comecos”. A Biblia tem uma teo- logia apostdlica dos comegos. Se n&o, vejamos: em Mateus 16.18 e 19 Jesus diz a Pedro que lhe daria as chaves do reino dos céus, e aquilo que fosse ligado na terra teria sido ligado nos céus; e vice-versa. Em Joao 20.22-23, Jesus lega — ago- ra nao apenas a Pedro, mas a todos os apdstolos — 0 minis- tério de autenticar e legitimar a fé e a conduta dos converti- dos, especialmente no tocante a perdao de pecados. Jesus deixou claro que os apéstolos desempenhariam de modo ini- cial, na nossa era, um papel extremamente importante no que diz respeito 4 autenticacdo da fé cristé. O que de fato aconteceu. Talvez essa seja uma das razdes pelas quais 0 82 Espirito esperou pelos apéstolos. O Espirito sempre da chance a igreja de ser seu instrumento. E s6 quando a igréja se nega a ser veiculo de Deus, ou titubeia a ponto de ameagar atrasar o calendario divino, que ele age sem ou fora dela, come na casa de Cornélio, onde o Espirito se antecipou a Pedro, a fim de eliminar-lhe as dividas do coracéo. No mais, o Espirito deixa a igreja ser instrumento. Ora, nos dias apostdlicos tal “abertura” do Reino era, primordialmente, funcao deles. Outra possivel razao de o Espirito ter esperado Pedro e Joao a fim de derramar-se sobre os cristaos samaritanos era a necessidade de romper 0 bloqueio entre estes e os judeus. Em Joao 4.9 lemos que judeus e samaritanos tinham proble- mas sérios. Ora, 0 evangelho é sobretudo evangelho de re- conciliagdo (Rm 2.11-22). Por isso, a igreja que foi evangelizar Samaria era da Judéia. Tal questo nao deve ser encarada como sendo de somenos importancia. Isso porque a rixa entre judeus samaritanos se manifestava entre os préprios apéstolos. Es6 ler Joao 4.27, onde se vé que o fato de Jesus estar conver- sando com uma mulher samaritana causou neles admiragao — prova do seu preconceito em relacao aos samaritanos. Também era necessario romper © bloqueio entre o apéstolo Joao e estes. Para mim esta @ uma das razdes pelas quais Joao foi também a Samaria com Pedro, a fim de orar por aqueles irmaos. Em Lucas 9.54, quando caminhava na dire- cao de Jerusalém, antes da sua morte, Jesus instruiu os disci- pulos a lhe prepararem pousada. Joao foi um dos que partici- param de tal misséo. Mas quando Jesus apareceu entre os samaritanos, estes perceberam que seu semblante era de quem nao queria parar ali, mas dirigir-se imediatamente a Jerusa- lém. Por isso nao lhe ofereceram pousada. Diz Lucas que Joao ficou irado, chamou Jesus e lhe disse: “Senhor, queres que facamos descer fogo dos céus sobre esses samaritanos?” Jesus argumentou: “Nao sabem vocés de que Espirito sao? Eu nao vim destruir a alma dos homens, e sim salva-la.” Era preciso mudar aquela situacao. Acaso seriam Pedro e Joao 83 diferentes de nos? Ha menos de um ano Joao odiara aquela gente, e estava agora sentido necessidade de se confrontar com eles para abencoa-los. Antes da béncao precisaria haver reconciliagao, perdao mtituo. Sem reconciliagao nunca hou- ve, hd ou havera genuino derramar do Espirito. Nesse caso, em Samaria, o derramar do Espirito nao era a segunda béncao, mas primeira. Atos 8.15-17 nos diz que “o Espirito nao havia sido dado a nenhum deles”. Portan- to, o que aconteceu nao foi uma segunda béngao em si, mas primeira. Ali nao existia nenhum cristao. Romanos 8.9 diz: “Se alguém nao tem o Espirito de Cristo, esse tal nao é dele.” A Biblia deixa claro que o Espirito nao havia caido sobre ne- nhum deles. Conversao alguma acontecera ali, apenas exci- tacao, frenesi de milagre, cura divina e outras coisas. O crédi- to que até entdo havia sido dado a Palavra de Deus baseara- se mais nos sinais presenciados do que na Palavra ouvida. Em Atos 8.6-8 tomamos conhecimento de que curas, milagres e expulsdo de deménios haviam sido testemunhados. Por isso Simao, o mago da cidade, pensou: “Descobri um poder mai- or do que o meu. Quero abracar esta fé! Que coisa extraordi- naria! A prova de que a fé daqueles homens nao estava firma- da no arrependimento e na Palavra de Deus, mas apenas no delirio dos milagres, é a qualidade de fé que o proprio Simao manifestou. Nos v. 12 e13 vemos que “ele abracou a fé”. Nos v. 18 e 19, entretanto, ele propée algo muito excéntrico a Pedro e a Joao. Ao perceber que os apdstolos impunham as m&os e as pessoas recebiam o Espirito Santo, perguntou: “Quanto custa? O que é isto, afinal? Impdem as maos e eles recebem? Que mistério é esse?” Chamou-os a parte e chegou ao cimulo de oferecer-lhes dinheiro em troca do mesmo po- der. Pedro entéo o censurou: “Seja o teu dinheiro contigo para perdicdo.” E lhe trouxe uma palavra de juizo, dizendo que ele estava em fel de amargura, e 0 juizo de Deus pesaria sobre ele caso nao mudasse de atitude. Precisamos observar que o crédito que os samaritanos haviam dado a Palavra era o equivalente 4 mesma qualidade 84 de fé a que Jesus nao atribuiu valor algum. Joao 2.23-25 diz que em Jerusalém Jesus operou sinais, e que os homens, vendo-os, creram nele; “contudo Jesus nao confiava neles.” Observe 0 contexto no qual isso aconteceu. O inicio do cap. 3 registra: “Havia entre os judeus um tedlogo chamado Nicodemos.” Em razao do seu status, prudentemente foi visi- tar Jesus a noite. Chegando [a, disse: “Senhor, sabemos que tu és Mestre vindo da parte de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus nao estiver com ele.” Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade te digo que se alguém nao nascer de novo, nao pode ver o reino de Deus.” Nicodemos tinha o mesmo tipo de fé dos homens do contex- to anterior, que viram sinais, creram em Jesus, mas nos quais o Senhor nao se confiava — eram pessoas que ainda nao haviam nascido de novo. Néo obstante haverem crido nos sinais, obra nenhuma profunda do Espirito de Deus havia sido feita no coracao deles. Em Atos 8.26-40, vemos 0 caso do ministro da Fa- zenda da Etiopia que se converteu. Diz a Escritura que ele recebeu Jesus e seguiu seu caminho com alegria. Este exem- plo contraria toda especulacao a respeito do assunto. Sabe-se que o etiope ouviu a Palavra, creu nela, foi batizado em nome de Jesus, e seguiu alegre seu caminho; no entanto, nao se faz qualquer mengao a algum sinal espetacular acontecido em sua vida. Por outro lado, nao existe aluséo alguma ao fato de nao haver sido completa a obra dele. Nao se diz que falou em linguas, que profetizou, ou qualquer outra coisa especial. Tampouco se vé Filipe sendo arrebatado para Azoto e dizen- do: “Que pena! Aquele pobre homem foi [4 para a Etidpia sem ter tido uma experiéncia carismatica. Alguma coisa lhe faltou — ele nao recebeu a segunda béncao!” Mas Lucas, o escritor de Atos, nao pensava assim. Pelo contrario, conta ele que o etiope seguiu cheio de jiibilo o seu caminho. E foi sd: estava completa a obra na vida do homem ao qual ele minis- trara. O mais era crescer no Senhor. ‘w Terceiro argumento: Na casa de Cornélio a evidéncia 85 do recebimento do Espirito Santo foi o falar em linguas. As- sim, a maior demonstracao do batismo do Espirito é o falar em linguas! Quem recebeu, fala. Isso porque quando a pala- vra foi aceita na casa de Cornélio, eles interromperam a pre- gacao falando em linguas e profetizando — um acontecimen- to maravilho (At 10.44-45). Mas sera que é isto que a Escritura ensina? A evidén- cia de quem recebeu o batismo com 0 Espirito Santo é 0 falar em linguas? Qual a resposta que se da a isto? » Devo dizer que nao esta em questéo aqui — pelo menos da minha parte — o fato de o recebimento do dom de linguas poder acontecer no instante ou nao da conversao ou do recebimento do Espirito Santo para regeneracdo. E até possivel que aconteca assim; mas nao é norma; e nao é algo absoluto. Mas eu ja tenho visto pessoas que no momento em que estado se convertendo, que estao entregando o coracéo a Jesus — gente que vem do mundo, de fora —, prorrompem numa experiéncia carismatica como a de Cornélio. Isto po- rém nao significa uma segunda béngdo, mas a primeira. A conversao, insisto, pode, esporadicamente, vir acompanhada desse fendmeno. O que esta sendo questionado é 0 fato de ser ou nao o dom de linguas evidéncia do recebimento do batismo com o Espirito Santo. Pode acontecer, mas nao é 0 padrao. E qual é oO padrao? O padrao nos é dado pelos trés mil de Atos 2.41, que creram no Senhor Jesus, sem que no texto nada se diga a respeito de terem falado em linguas ou nao. O padrao séo os dois mil que se agregaram a fé alguns dias depois, em Atos 4.4, sem que nenhuma referéncia haja ao fato; diz-se apenas que creram em Jesus e foram batizados. O padrao é Atos 5.14, que fala sobre a multiddo de cristaos que se entregaram ao Senhor com alegria no coracao. O padrao sao os discipulos que se uniram a fé, em Atos 6.7, durante o ministério de Esté- vao, quando a “Palavra de Deus crescia e se multiplicava o numero de discipulos; a Palavra prevalecia e muitos sacerdotes obedeciam a fé”. O padrao é Atos 9.17-18, que narra a 86 experiéncia de Paulo e sua conversao (digo em relacao ao Espirito Santo). Ele apenas creu, foi batizado e, informa a Biblia: “Ficou cheio do Espirito Santo.” Também ai nada se diz sobre ter ele falado ou nao em linguas. O padrao é o de Antioquia, em Atos 11.21-23, onde se conta que creram na Palavra de Deus, e a graca do Senhor estava sobre eles, a ponto de o préprio Barnabé ficar estupefacto com o que ob- servava. E mais ainda. O padrao é Lidia. Atos 16 14-15 diz que o Senhor abriu o corac&o dela para ouvir as palavras de Paulo. Ela creu no Senhor e foi batizada com toda a sua casa. O padrao é Atos 16.32 e 33, que fala sobre o carcereiro de Filipos, que creu na Palavra e foi batizado. Ele creu no Se- nhor com alegria, e toda a sua casa, mas nada se fala a res- peito de qualquer sinal incomum. O livro de Atos sobeja em experiéncias de pessoas que creram em Jesus, receberam-no com alegria, mas nada relata sobre fendmenos extraordinari- os. No entanto esses textos citados — sem nos referir a int- meros outros — quase nunca sao levados em consideracao quando as teologias pentecostais sao escritas. E assim que doutrinas sao erigidas sobre um, dois ou trés textos aqui e ali, que no sdo a norma, apenas exce¢&o; nao absolutizam nada, mostram tao-somente que o Espirito é livre e soberano para agir como quer. E ainda, respondendo a essa questao levantada pela teologia pentecostal referente a experiéncia de Cornélio, po- demos dizer que o que aconteceu ali foi a demonstragao de que o batismo com o Espirito Santo é a propria obra da con- versao. Leia Atos 11.14, onde Pedro, em Jerusalém, explica © que havia acontecido na casa de Cornélio; conta ele que este recebera da parte de um anjo a instrucéo de mandar chamé-lo, pois ouviria de seus labios palavras mediante as quais seria salvo — ele e toda a sua casa. Cornélio tinha obras, esmolas, piedade, liturgia e uma série de coisas, mas nao era salvo. Foi isto que Pedro disse. O que aconteceu, entao, em sua casa? As vezes o equivoco é esse: julga-se que Cornélio ja era cristao e que Pedro foi ape- 87 nas 1a para lhe conceder a “segunda béncao”. A verdade & que ele nem salvo era. O que houve ali foi a primeira béngdo com 0 adicional das linguas e das profecias, para mostrar aos preconceituosos judeus o que realmente sucedera aos gentios —o mesmo que com eles, judeus, no Pentecoste. Observe Atos 10.47, onde Pedro diz aos seis homens judeus que estavam com ele: “Porventura pode alguém recu- sar a agua, para que nao sejam batizados estes que, assim como nés, receberam o Espirito Santo?” As linguas e a profe- cia tinham por finalidade acabar com os preconceitos dos judeus; s6 assim eles creriam que o que acontecera na casa de Cornélio era realmente auténtico. Sem essa evidéncia eles nao aceitariam o fato, sob hipdtese alguma. O grupo de Cornélio esta, portanto, dentro do padrao doutrinario do re- cebimento do Espirito Santo. Galatas 3.2 diz que o Espirito é recebido mediante a pregacdo da fé. E também o que diz Atos 10.44. Foi enquanto “ouviam a Palavra” que se derra- mou sobre eles 0 Espirito Santo; e isto faz sentido com o que a Escritura ensina sobre o assunto. E mais: a prova de que para Pedro o batismo com o Espirito era obra de regenera- cao é que ele sabia que n&o poderia negar 0 simbolo a quem ja tinha a realidade. Leia novamente o que diz o v. 47: “Porventura pode alguém recusar a Agua, para que nao sejam batizados estes que, assim como nés, receberam o Espirito Santo?” Esta é a argumentacao teoldgica de Pedro: 0 batismo com o Espirito Santo, como obra de regeneracao e conver- sao, é um acontecimento interno, cuja manifestacdo externa é simbolizada na realidade do batismo. O apostolo diz: Se eles ja receberam a realidade, como vou negar-lhes o simbo- lo? Pedro sabia que o batismo do Espirito Santo vem com o surgimento da fé salvadora. ‘ Veja como isto esta claro no cap. 11 de Atos. Atente bem aos v. 16, 17 e 18. Pedro, pregando em Jerusalém, explicando 0 que acontecera na casa de Cornélio, diz que se lembrou desta palavra do Senhor: “Joao, na verdade, batizou 88 com Agua, mas vos sereis batizados com o Espirito Santo.” Portanto, para Pedro, o que aconteceu ali foi o cumprimento de uma palavra de Jesus relacionada ao batismo com o Espi- rito Santo: “Pois Deus Ihes concedeu o mesmo dom que a nds nos outorgou” (At 11.17). Mas quando concedeu Deus esse dom? A resposta esta na continuacao do v. 17: “Quando cremos no Senhor Jesus, e quem era eu para que pudesse resistir a Deus? E, ouvindo eles estas coisas, apaziguaram-se e glorificaram a Deus, dizendo..." Dizendo 0 qué? Dizendo isto: “Logo, também aos gentios foi por Deus concedido o arrependimento para a vida” (At 11.18). Observe a conexao: arrependimento, fé, e batismo com o Espirito Santo! Esta aqui muito evidente: é sé ler e ficara claro. Leia de baixo para cima, porque a presente seqiiéncia do texto vai do efeito para a causa. Temos que ir da causa para o efeito: arrependimento para vida quando creram no Senhor Jesus; e receberam o batismo com o Espirito Santo na mesma hora. Também nao é sabio dizer que houve diferenca entre 0 grupo de Cornélio e as converses normais — apenas em razao das linguas e profecias, como se isso lhes conferisse uma espécie de segunda béncao. Se assim fosse, teriamos de negar a experiéncia inicial de Paulo com o Espirito Santo — sem linguas, sem profecia, sem coisa nenhuma. E bem verda- de que ele se tornou impar no falar em linguas espirituais. Escrevendo aos Corintios, diz: “Dou gracas a Deus porque falo em outras linguas, mais do que todos vés” (1Co 14.18). Mas no dia em que recebeu a plenitude do Espirito Santo — conforme diz Atos 9.17 —, quando Ananias impés sobre ele as maos, dizendo “O Senhor me enviou [...] para que recupe- res a vista e fiques cheio do Espirito Santo”, ele foi batizado, comeu, sentiu-se fortalecido, e nao se diz nada mais de especi- al. Certamente, se algo houvesse acontecido, Lucas nao teria perdido a oportunidade de fazer mencao ao fato, visto que em lodas as ocasides em que houve o fendmeno ele o registrou. *¥% Quarto argumento: Encontra-se em Atos 19: em [feso havia um grupo de discipulos, pessoas jé convertidas, 89

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