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Filipe Monteiro Assstente Hospital dicina Intensics m Biodtics radyado de Pneumlogi Subespecialist em Me Eutanasia: a propdsito do manifesto “Direito a morrer com dignidade” De entre as varias questées bioéticas contemporaneas, a eutandsia - qui¢d o mais Controverso, sensivel ¢ fracturante dos dilemas éticos do fim da vida — lem vindo a merecer, muito frequentemente, a atengao de varios sectores da nossa socledade. A titulo individual, diversas per- sonalidades dos mais variados quadrantes — politicos e univer- sitéries, entre outros — expressa- ram recentemente a sua opiniio através do manifesto “Direito a morrer com dignidade”. Uma discussao séria sobre esta te- matica deve considerar aspectos médicos e éticos, principalmen- te no que diz respeito a0 fim de vida. No intuito de tornar mais compreensivel arazao de ser des- te dilema, este artigo terd em con- sideracao, de unta forma sequen- cial, es questées que, em nossa opinido, séo fundamentais para a reflexio sobre o mesmo: +O fim da vida: 0 processo de morrereo momento da morte; + Eutandsia: definicao e signi- ficado; * Os limites de intervensao terapéutica; 7 fim da vida: 0 proceso de morrer e o momento da morte Na_perspectiva dos cuidados meéadicos, o fim da vida tem duas ‘componentes — “o proceso de morrer’ eo”momento da morte” — e € fundamental destringé-los dlaramente. Reflectindo sobre estes. concei- tos, constata-se que o processo de morrer ou a caminhada para a morte é um tempo em que a pessoa pertence 20 dominio dos vivos e, como tal, na area da sati- do, esta sujeita 3 responsabilidade dos seus profissionais. O médico, com 05 meios tecnolégicos ao seu dispor, pode actuar quer no ser tido do encuriamenio da vida quer no do seu prolongamente, No processo de morte, a pessoa, estando viva, alimenta e vive 0 tempo de esperanca. Por seu lado, a motte ou © mo- mento da morte pertence a0 do- minio do desconhecido, sendo Impossivel a sun descrigao. E 0 momento da ireversibilidade. As quetelas éticas do fim da vida centram-se, pois, no agir do médi- co no provesso de morrer. No seu abreviar (Eutanisia) ou prolon- gar (Distandsia), indevido, etica~ ‘mente inaceitavel, reside 0 ceme da questao. Eutandsia: definigdo e significado Definigdo: Actointencional de proporcionar a morte sem sofri- mento a um doente atingido por uma gfeccio incuritel e que pro- luz dora: intolerdvwis, O acto & pra ticado por uma pessoa a pedido de outra, aa Sinénimos utilizados: Morte a: sistida, morte por compaixio. Na leitura e interpretacao da defi- nigo acima apresentada — que é, em nossa opiniso, 2 mais abran- gente —, ficam, contudo, por es clarecer algumas premissas que tentaremos dissecare analisar Para um entendimento correcto sem ambiguidades deste dilema Stico, iremos avaliar © comentar 08 enunciados da definicso que esto na origem do debate e da Dores intoleroeis Na farmacopeia modema 2 dor pode ser totalmente controlads através da administracSo de um ou mais férmaces. © problems Teside nas consequéncias ds anal gesia A analgesia e 0 duplo efeito Edo conhecimento tas patologias, nomeadamente as do foro oncolégico, provecsm mes seus estadios mais avancados do res muito fortes, por wens ixaal= raveis, e refractarias 8 anallesi= instituida, o que obtigs a0 escalo- namento dos analgésicos; dai po- dem resuitar consequences que, em Ultima instancia podem estar na origem da depresSodocentm respiratorio e 2 consemsente pars gem cardior Serd entio accitivel, mama pers ectiva étics, que um acto medion ppossa ter um du um deles pode pérem risco pro- pria vida do doente? Nao podera esta postura ser uma forma encs- potada de eutanasia? O duplo efeito dos farmacoséum tema que tem merecido 2 atencio das mais variadas esferas da so- iedade que lidam com as ques- ‘t6es de satide, nomeadamente na rea da ética do fim da vida. A luz de principios bioéticos. no ora. jo efesto. em que caso do duplo efeito de analgesia, parecem estar em conflito dois deveres que devem ser respei- tados em todo 0 acto médico: 0 dever de nado infligir o sofrimento 0 dever de suprimir 0 mal ou 0 sofrimento. E evidente que, a coberto do du- plo efeito, um farmaco analgésico pode ser utilizado como instru- mento de eutandsia. Qual a solu- so paraesta situacao? Em nossa opiniao a resposta pode ser encontrada num muito co- nhecido discurso do papa Pio XI igido a um grupo de médicos, no qual fez a diferenciagao clara entre a eutandsia e 0 principio do duplo eleito. Na sua opiniao, “se nine 2 narcose e 0 encurtamento a vida nfo existe nenhum nexo | directo, posto pela vontade os interessados ou pela nature- 2 das coisas (e seria 0 caso se a supessio da dor n&o pudesse ser obtida sendo por meio do en- curtamento da vida), e se, pelo contrétio, a administragio de narcsticos produz por si mesmo ois efeitos distintos, 0 alivio das Gores € 0 encurtamento da vida, entao ¢ licita”. Este argumento fi- cou conhecido como o intuito da prescricio. Qual o sentido de “doenga incu-

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