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Poder Judicidtio do Estado de Minas Gerais Justica de Primeiro Grau Processo n°: 0024566-82.2016.8.13.0529; Requerente: Elaine Alves Silva Machado; Requerido: Banco do Bradesco Financiamentos S/A; Espécie: _ Agao declaratéria de nulidade de cliusulas contratuais e/e restituigio de valores pagos indevidamente. SENTENCA Vistos, ete, I-RELATORIO Elaine Alves Silva Machado ajuizou a presente ago declaratéria de nulidade de cliusulas contratuais ¢/c restituicio de valores pagos indevidamente em desfavor do Baneo do Bradesco Financiamentos S/A, nos termos da petigio inicial, que veio instruida por documentos, alegando, em resumo: = entabulou contrato com a requerida, porém, 0 contra & excessivamente oneroso, pois, hi cobranges de tarifas abusivas. como: a) cobranea_pelos_servigos_presiados_por_tereeiro no valor de R$661,10; b) despesas com servigos de correspondente no bancario no valor de RS900.0 = a requerida nJo permitiu qualquer discussio acerca das cléusulas contratuais citadas acima. Requer a declaragéio de nulidade das cldusulas abusivas ¢ ilegais que autorizam a cobranga e, ainda, condenar a requerida a restituir os valores pagos. Juntou documentos (ff. 05/09) e atribuiu a causa o valor de R$1.561,10 (um mil quinhentos e sessenta e um reais e dez-centavos). Na sesso de conciliagio, ndo se obteve éxito na composigao amigivel (f. 16). A parte requerida apresentou contestagaio (ff. 17/52), alegando, em resumo: eS 6d. 10,30.800-8 gwnto ss 21010 #4 Poder Judiciario do Estado de Minas Gerais Justiga de Primeiro Grau ~ 0 pedido formulado pela parte autora viola a Constituigao Federal, mais precisamente no que se refere a0 ato juridico perfeito, pois contraria o teor do contrato de arrendamento mercantil. = nfo houve a ocorréncia de fato posterior A contratagdo que justificasse a revisio de qualquer cléusula, pelo contrario, a parte autora foi informada de todas as cliusulas: - a cobranga pelos servigos prestados por terceiros e de correspondente nao banedrio ¢ valida conforme o artigo 1° da Resolugao 3.693/09. Requer a improcedéneia da agfo. Pelas partes foi dito que ndo havia provas a serem produzidas, requerendo © julgamento antecipado do proceso. Vieram-me os autos conclusos. ‘Tudo visto e examinado. Decido, 11 - FUNDAMENTACAO © feito comporta julgamento no estado em que se encontra, néio demandado a produgao de outras provas, QUANTO A APLICABILIDADE DO CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR F inquestionavel que o direito material que escuda o pleito formulado pela parte requerente € nascente de uma relagio contratual de consumo, existente entre o fornecedor réu ¢ 0 consumidor autor. Assim, o direito material debatido nos autos nasce de um contrato de prestagio de servigos nos exatos termos do § 2° do art. 3° do Cédigo de Defesa do Consumidor. © pedido formulado pela parte requerente de que as cldusulas abusivas sejam afastadas encontra respaldo no disposto no art. 6°, do Cédigo de Defesa do Consumidor, que assim estabelece: @ modificagdo das cldusulas contratuais que estabelecam Poder Judiciario do Estado de Minas Gerais Justiga de Primeiro Grau prestacdes desproporcionais ou sua revisiio em razdo de fatos supervenientes que as fornem excessivamente onerosas. Nos termos do § 1°, Ill, do art. 51 do Cédigo de Defesa do Consumidor: Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que se mostra excessivamente onerosa para 0 consumidor, considerando-se a natureza ¢ 0 contetido do contrato, 0 intevesse das partes e outras circunsténcias pecullares ao caso. Destarte, ¢ a abusividade da cléusula contratual, decorrente da atuago contrétia a boa-fé objetiva € © desequilibrio da equagio econémica do contrato, que autoriza a intervengao do Poder Judicidrio. Existe um interesse piblico no adimplemento das obrigagdes contratuais. Isto porque © contrato nao pode mais ser interpretado como um mero instrumento destinado a exteriorizar a manifestagio de vontade das partes contratantes, porém, como um instrumento vivo compreendendo um feixe de obrigagdes miltiplas ¢ reeiprocas, dentro de um processo dinémico que se desenvolve ao longo do tempo, irradiando uma séric de efeitos juridicos durante a sua realizagao. Esto presentes os pressupostos de constituigiio e desenvolvimento valido © regular do proceso. Passo a anilise do mérito. E de se registrar que, no direito privado, mormente no que se refere aos contratos, no se pode descurar do principio da autonomia da vontade e dele decorre que os contratantes tém liberdade para pactuar. A possibilidade, em tese, de reviso dos contratos bancarios é matéria exaurida nos tribunais pétrios e decorre do priprio sistema juridico, tendo em vista que a adequagéo das disposigdes contratuais se insere dentro dos prinefpios da legalidade e da dou-fé objet Tom-se ainda que a revisdo dos contratos bancérios esta em consondncia com a telativizagao da aplicagao do prineipio do pacta swat servanda, bem como da anéilise da relagio entre a autonomia privada, a boa-fé objetiva ¢ a fungdo social da avenga, Sob outro aspecto, 0 fato de se ter celebrado contrato de adesio nao impli = afastamento dos encargos finaneeiros pactuados, (26d, 10.30.8008 condo 4102010, Poder Judiciario do Estado de Minas Gerais Justiga de Primeiro Grau A adesividade contratual nao subtrai a liberdade do contratante de verificar se & ou ndo de seu interesse a celebragao do negécio juridico, apondo seu consentimento no contrato, Anoto ainda que o processo sera analisado a luz. da Orientagio do eg. STJ sobre a matéria, conforme se observa abaixo: ORIENTACAO 5 - DISPOSICOES DE OFICIO. E vedado aos Juizes de 1° ¢ 2° graus de jurisdigao conhecer de oficio, isto é, sem pedido expresso do consumidor, a abusividade de clausulas nos contratos bancétios. QUANTO A COBRANCA PELAS DESPESAS E SERVICOS PRESTADOS POR TERCEIROS. Inicialmente, no que se refere & cobranga pelos servigos prestados por tereciros. 0 Conselho Monetério Nacional editou a Resolugiio 3.954/2011, vedando sua cobranga pelas instituigdies concedentes de crédito, A cobranga de despesas com servigos de terceiros trata-se de cobranga abusiva, pois além de nao especiticar efetivamente quais seriam as despesas realizadas. transfere a0 consumidor os custos da remuneragdo daqueles que prestam servigos a instituigao financeira, violando os principios da informagao e da transparéneia, consayrados no Cédigo de Defesa do Consumidor. Desse modo, com a edigao da Resolugao 3.954/2011 do CMN, a cobranga de servigos de terceiros foi proibida para contratos posteriores sua vigéncia, que se dew em 24/02/2011 Ja nos contratos celebrados anteriormente @ data citada acima, a cobranga dos servigos de terceiros nos instrumentos de natureza bancéria ou financeira & permitida desde que haja sua previsio, ou seja, com indicagdo precisa dos servigos prestados, ¢ desde que inexista abusividade no valor cobrado. Assim para que se possa exigit os chamados “servigos de terceiros a08 contratos anteriores a 24/02/2011, além de expressa previséo contratual, com Ge ein C8¢, 10:30.800-8 panto anaes Poder Judiciario do Estado de Minas Gerais Justiga de Primeiro Grau especificag3o detalhada do tipo de servigo, exige-se que o valor seja compaiivel ¢ adequado com a prestago oferecida e & pritica de mercado. A previsto desta cobranga sobre os contratos anteriores a 2011 encontra amparo joridico nos termos dos artigos 6°, II], ¢ 52, ambos do CDC, que prestigiam o principio da informagao, descrevendo sobre os diferentes produtos ¢ servigos, com especificagao correta de quantidade, caracteristicas, composiga0, qualidade, tributos incidentes ¢ prego, bem como sobre os riscos que apresenter. Art. 6° Sao direitos basicos do consumidor: IIL - a informacao adequada ¢ clara sobre os diferentes produtos e servigos, com especificagdo correta de quantidade, caracteri cas, composiga0, qualidade, tributos incidentes e prego, bem como sobre 08 riscos que apresentem: O principio da transparéncia protege © consumidor, esclarecendo que este tem 0 direito de ser informade sobre todos os aspectos de servigo ou produto exposto ao consumo. Tecidas as consideragées pretéritas reportando-se a anélise do contrato em estudo, verifica-se que 0 presente contrato foi firmado em 23/12/2009, portanto, anterior & edigdio da Resolugio 3.954/2011 do CMN que impediu a cobranga de servigos de terceiros. In casu, apesar de estar previsto no contrato mediante o item descrito como: “Pagamentos servios de terceiros”, nao consta no contrato de forma clara, quais 6s servigos que foram prestados através de tere ‘0s, no podendo se valer das meras alegagdes da requerida, como também qual o valor dispendido para cada servigo, 0 que impede sua eventual cobranga. QUANTO A DESPESA COM SERVICOS DE CORRESPONDENTE NAO BANCARIO. Apés a Resolugéio do Conselho Monetirio Nacional n° 3.518/2007, em vigor a partir de 30.04.2008, a cobranga dos servigos bancérios para as pessoas fisicas Qu limitada as hipéteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pela 5 Cd, 10:30:800-8 passe zraez19 & SOX, Poder Judicidrio do Estado de Minas Gerais, Justiga de Primeiro Grau autoridade monetiria. Desde entdo. 0 que ndo estd incluide pelo Banco pode ser cobrado. ‘A refetida Resolugdo classifica os servigos prestados e descritos pelas instituigdes financeiras como essenciais, prioritarios, especiais e diferenciados, e a tarifa em questio nao esté descrita em nenhuma delas, A cobranga de “despesas de correspondente nao bancario”, além de nio corresponder a qualquer servigo comprovadamente prestado, implica attibuir ao consumidor 0 dnus decorrente de custos nao inerentes a natureza do contrato, mas sim da propria atividade exercida pela instituigdo financeira, violando assim o art. 51, 1V, do Cédigo de Defesa do Consumidor, in verbis Art. 51. Sao nulas de pleno diteito, entre outras, as cléusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e servigas que: IV - estabelegam obrigagdes consideradas iniquas, abusivas, que coloquem 0 consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompativeis com a boa-fé ou a equidad Neste sentido: EMENTA: APELACAO CIVEL - REVISAO DE CONTRATO BANCARIO - CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICABILIDADE - ASSINATURA EM BRANCO DE CONTRATO - MANDATO TACITO - PREENCHIMENTO POSTERIOR ABUSIVO - AUSENCIA DE COMPROVACAO - NULIDADE INOCORRENTE - ARRENDAMENTO MERCANTIL = JUROS — REMUNERATORIOS—- INEXISTENCIA - DISCUSSAO SOBRE SUA COBRANCA NA FORMA CAPITALIZADA - DESCABIMENTO - COMISSAO DE PERMANENCIA. =~ JUROS. REMUNERATORIOS DEVIDOS NO PERIODO DE INADIMPLENCIA - SUBSTITUIGAO POR CORRECAO MONETARIA CALCULADA PELO INPC - COBRANGA SN 6 264, 10.90.8008 ponmsestnanove Poder Judiciério do Estado de Minas Gerais. Justiga de Primeiro Grau (66d, 10.30.8008 ganar a0n06 CUMULADA DE CORRECAO MONETARIA, JUROS. MORATORIOS E MULTA - POSSIBILIDADE - ENCARGOS DE NATUREZAS DISTINTAS - TARIFA DE CADASTRO - LEGALIDADE - TARIFAS DE SERVIGOS DE TERCEIROS, DE INCLUSAO DE GRAVAME ELETRONICO E DE SERV. CORRESPONDENTE NAO BANCARIO - ILEGALIDADE - TARIFA DE RESSARCIMENTO DE PROMOTORA DE VENDAS - COBRANGA NAO DEMONSTRADA. - DEVOLUCAO EM DOBRO DE VALORES. INDEVIDAMENTE COBRADOS - REQUISITOS DOS ARTS. (...) E ilegal, independentemente de prévia contratacao, a cobranga das tarifas de insergdo de gravame, de servigos de terceiros e de serv. correspondente nao bancario, pois correspondem a encargos que devem ser suportados pela instituicao financeira, nao podendo, por isso, ser transferidos Para o consumidor, NZo estando prevista no contrato sob discussio a cobranga da tarifa de ressarcimento de promotora de vendas, também néo tendo autor comprovado que tal tarifa Ihe tenha sido efetivamente cobrada, mio se hi de falar em ilegalidade da cobranga de referida tarifa, A devolugdo em dobro, prevista no art. 42, pardgrafo Unico, do CDC, ¢ no art. 940 do Cédigo Civil, é condicionada A comprovagdo de mé-fé do eredor, pressupondo 0 preenchimento de dois requisitos indissociaveis, quais sejam cobranga indevida e agdo consciente do credor. (TIMG- Apelagtio Civel 1.0024.11.012052-4/001, Relator(a): Des.(a) José de Carvalho Barbosa , 13° CAMARA CIVEL, julgamento em 28/04/2016, publicag&o da simula em (06/05/2016) (newritei. “ ... 3. Tarifa de Registro de Contato, insergfio de Gravame ¢ Servigo Correspondente Prestado Financeira, A eae Poder Judiciario do Estado de Minas Gerais Justiga de Primeiro Grau abusividade da cobranca desses valores reside em transferir a0 consumidor despesa a ser suportada pelo fornecedor, porquanto necessaria para atender servigos essenciais de sua titularidade. Nesse ponto, resta mantida a sentenga que determinou a devolugio simples das quantias despendidas a tal titulo. 4. Recurso conhecido ¢ parcialmente provido para excluir da condenagdo o valor referente 4 Tarifa de Cadastro, de modo que o valor da condenacdo passa a ser de RE 1.161,37 (um mil cento ¢ sessenta e um reais ¢ trinta e sete centavos), com juros & corregio monetiria nos moldes estabelecidos na sentenga combatida, (Acérdao n.799115, 20130610161416AC3, Relator: FLAVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA, 1* Turma Recursal dos Juizados Especiais Civeis e Criminais do DF, Data de Julgamento; 24/06/2014, Publicado no DIE: 01/07/2014. Pag.: 450) (negritei) Desse modo, a cobranga da denominada taxa de despesas com correspondente nao baneario ¢ ilicita, uma vez que o respective valor decorre de despesas insitas & propria atividade exercida pela instituigao financeira, pois, esta deve arcar com esse custo, sem repassé-lo ao consumidor, Il - DISPOSITIVO Posto isto julgo PROCEDENT ES 03 pedidos formulados na peti¢do inicial, CONDENO a parte requerida a restituir ao autor, na forma simptes, os valores correspondentes as despesas com correspondente no bancério no valor de R$900,00 (novecentos reais) e, despesas com_servigos prestados por terceiros, no valor de RS661,10 (seiscentos e sessenta ¢ um reais e dez centavos) que devero ser corrigidos monetariamente pelos indices da Egrégia Comegedoria Geral de Justia de Minas Gerais, desde a data do contrato (23/12/2009), acrescida de juros de mora de 1% ao més com supedineo no art, 406 do Cédigo Civil de 2002 c/e art. 161, § 1°, do Codigo Tributirio Nacional, a partir da citagao. Em consequéncia desta decisio, declaro 0 processo extinto, com a resolugio do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I do Codigo de Processo Ci Po C04. 10.80.8008 puntos entre Poder Judicidrio do Estado de Minas Gerais Justiga de Primeiro Grau Custas processuais na forma do artigo 55 da Lei 9.09/95. ‘Transitada em julgado esta decisio, dar-se baixa e arquivem-se os autos PRI Pratapolis/MG, 19 de agosto de 2016. Miz de Direito 66d, 10.30.8008 panto stone A Poder Judiciario do Estado de Minas Gerais PODER JUDICIARIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS JUSTICA DE 17 INSTANCIA Juizado Especial Civel COMARCA DE PRATAPOLISIMG TIMG Férum “Desembargador Monteiro Ferraz” ua Evangelista de Pacia, n° 138 - Contro~ PratapoliiMG ~ CEP. 37.970-000 FonefFax (39) 9593-1755. esmall: profeecrotarla@timg vs.br CERTIFICO que a PUBLICACAO retro foi disponibilizado no Diario Judicidrio Eletrénico n° 154/2016 do dia 26/08/2016, publicado na data de 29/08/2016. 00022 - 0024566.82.2016.8.13.0529 Autor: Elaine Alves Silva Machado; Réu: Banco: Bradesco Financiamentos S.A, Julgado procedente 0 pedido. Sentenga completa disponibilizada no Portal TIMG. Adv - Ana Carolina Silva Vasconcelos Faria, Evandro Silva Faria, Guilherme Octavio Santos Rodrigues, Marina Guimaraes Ribeiro. Por ser verdade, dou fé. MG Willa’C, Soares Esiagiério Pratapolis, 01 de setembro de 2016.

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