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19 aya “ Eee D Pe Toca DO ESTADO Yous Este livro é 0 resultado de uma pesquisa realizada entre 1976 1980 para uma tese de dou- torado na Universidade de Glas- gow, Inglaterra. Um periodo fundamental da histéria brasi- leira foi reconstituido em ba- ses documentais. Os fatos e os personagens foram indicados a partir de registros concretos @ ndo de hipéteses ou suposi- goes. O objetivo central desse trabalho foi identificar as for- gas sociais que emergiram na sociedade brasileira com 0 pro- cesso de internacionalizacao, em sua etapa moderna, e acom- panhar sua intervengdo no Es- tado e na sociedade brasileira. Essa. hist6ria passa pela media- G80 de atores concretos, de pessoas ou instituigdes, que respondem a valores, objetivos © estratégios das forcas socials que atuam no cenério politico, em conjunturas determinadas. Aqui o que interessa nao é tanto Identificar o ator, suas Intengdes e caracteristicas pes- soais, mas descobrir no proces- 80 histérico o papel e a fun- gio des forcas soci e de que formas concretas elas fa- zem prevalecer seus Interesses © suas concepcdes no confron- to com as demais. Nossa pesquisa, no entento, fol possivel documentar a relacdo entre as atores e as forcas s0- cials, em cendrios publicos e privados, através da reconstl- tuigao da histéria feita em gran- de parte pelos préprios atores. 1964: A CONQUISTA DO ESTADO. Aséo Politica, Poder ¢ Golpe de Classe i MAGNE evis380 René Armand Dreifuss 1964: A CONQUISTA DO ESTADO Agdao Politica, Poder e Golpe de Classe Traduzida pelo Laboraiério de radugao da Faculdade de Letras da UFMG por: AYESKA BRANCA DE OLIVEIRA FARIAS CERES RIBEIRO PIRES DE FREITAS ELSE RIBEIRO PIRES VIEIRA (Supervisora) GLORIA MARIA DE MELLO CARVALHO Revisio Técnica: RENE ARMAND DREIFUSS 3° edigao y VOTES, Petrépolis 1981 © by René Armand Dreifuss Titulo do original inglés: State, class and the organic elit the formation of an entreprencurial order in Brazil (1961-1965) Direitos sobre a tradugdo ¢ publicagéo em lingua portuguesa: Epitora Vozes LtDA. Rua Frei Luis, 100 25600 Petrdpolis RJ Brasil Diagramagio Valdecir Mello Para minha mae e A meméria do meu pai Para Aurea e Danny ‘Aos amigos, que o caminhar da vida afasta, a lembranga reine Aos que, nao estudando seu passado, estdio fadados a repetir os mesmos erros. SUMARIO Agradecimentos, 11 Nota do Tradutor, 13 Lista de Abrevinturas, 15 Lista de Tabelas, 19 Capitulo I A FORMACAO DO POPULISMO, 21 Notas bibliogrificas, 38 Capitulo 11 A ASCENDENCIA ECONOMICA DO CAPITAL MULTINACIO- NAL E ASSOCIADO, 49 Introdusiio, 49 Penetracio multinacional e integragao da indGstria, 49 Outros aspectos de processo de concentracio, 60 Conclusio, 65 Notas bibliogréficas, 66 Capitulo IT A ESTRUTURA POLITICA DE PODER DO CAPITAL MUL- TINACIONAL E SEUS INTERESSES ASSOCIADOS, Ti Introdugao, 71 1. Os intelectuais orginicos do novo bloco econémico, 71 Empresérios e tecno-empresirios, 71 A tecno-burocracia, 73 Os oficiais militares, 77 2. A solidariedade de interesses do novo bloco econémico, 82 A. Escrit6rios de consultoria tecno-empresarial, 83 CONSULTEC: um esiudo de caso de entrinciiramento burocrético-em- presarial, 86 CONSULTEC: 0 escrit6rio téenico, 86 CONSULTEC: o anel de poder burocréticoempresarial, 90 B. As associagées de classe, 93 Apoio transnacional, 100 3. Da solidariedade econdmica ao ativismo politico, 101 C. A formagao de grupos de agdo IBAD, 101 Conclusiio, 104 Notas bibliogrificas, 107 Capitulo IVA CRISE DO POPULISMO, 125 Introdugio, 125 1. © periode de transicéo das titicas de lobbying 20 governo, 125 2. A ascensio de um Executivo aacional-reformista, 130 3. A arise politico-tconémica do populismo, 132 4. x paced a ew saints 136 Conclusio, Notas Pilon ies, 146 Capitulo V_A ELITE ORGANICA: RECRUTAMENTO, ESTRUTURA DE- CISORIA E ORGANIZACAO PARA A ACAO, 161 Introdagso, 161 A formacao do IPES, 162 A estratara de tomada de decisio, 172 A estrutura formal de autoridade, 173 ‘Organizacio para 2 aio, 184 Os grupos de Estudo ¢ Apdo do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais, 186 1. Grupo de Levantamento da Conjuntura — GLC, 186 2. Grupo de Assessoria Parlamentar — GAP, 190 3. Grupo de Opinio Piiblica — GOP, 192 4. Grupo de Publicagdes/Editorial — GPE, 194 5. Grupo de Estudo e Doutrina — GED, 196 © financiamento para a elite orginica, 199 O Grupo de Integragio — setor de ago empresarial, 199 A ‘limpeza" das contribuigées financeiras, 203 ‘A questéo da contribuigéo transnacional, 205 Conclusto, 208 ‘Notas bibliograficas, 209 Capitulo VI_A AGAO DE CLASSE DA ELITE ORGANICA: A CAMPANHA IDEOLOGICA DA BURGUESIA, 229 Introducéo, 229 Daas modalidades de aco, 231 Ago ideologica ¢ social, 231 Doutrinagdo geral, 232 Guerra psicolégica através do rédio e televiséo, 244 Guerra psicoldgica através de cartuns e filmes, 250 Doutrinagao espectfica, 252 Concluséo, 259 Notas bibliogrificas, 259 Capitulo VII_A AGAO DE CLASSE DA ELITE ORGANICA: A CAMPANHA POLITICA DA BURGUESIA, 281 Introdugio, 281 A asio no meio estudantil ¢ cultural, 282 Mobilizagio das classes médias e apoio feminino, 291 A contencio dos camponeses, 299 A acéo entre as classes trabalhadoras industrials, 305 A acio politica nos partidos politicos e no Congresso, 319 As fontes de finangas, 329 Conclusio, 337 Notas bibliogrificas, 338 Capitulo VII A ACAO DE CLASSE DA ELITE ORGANICA: 0 COMPLEXO IPES/IBAD E OS MILITARES, 361 Introdugio, 361 A presenga do complexo IPES/IBAD nas Forcas Armadas, 362 Os movimentos politico-militares, 368 O grupo IPES/ESG, 369 Os extremisias de direita, 370 Os tradicionalistas, 371 “a maior conspiragio das Américas” do General Olympio Moario Filho, 373 Conclusio, 396 Notas bibliogrificas, 397 Capitulo IX_O COMPLEXO IPES/IBAD NO ESTADO — A OCUPACAO DOS POSTOS ESTRATEGICOS PELA ELITE ORGANICA, 417 Introdugao, 417 A tomada do poder do Estado: o dominio politico dos interesses financeiro- industrisis multinacionais e associados, 419 A elite organica no Estado, 421 Conclusae, 455 Notas bibliograficas, 456 Capitulo X CONCLUSAO, 481 Notas bibliogriificas, 489 APENDICES, 497 APENDICE A — A composigio dos acionistas da ADELA em 1972, 497 APENDICE B — Ligacdes econdmicas da lideranga ¢ associados proeminentes do IPES, 501 FONTES DO APENDICE B, 574 APENDICE C — Correspondéncia do CBP com Eneas Fonseca, 577 APENDICE D — Lista dos colaboradores da APEC — 1970, 585 APENDICE E — American Chamber of Commerce — Lista dos membros em janeiro de 1964, 589 APENDICE F — Membros corporativos do CLA (Council for Latin America) em 1971, 617 APENDICE G — Correspondéncia da CONSEMP com o IPES, 621 APENDICE H — Lista de contribuintes do IPES, 627 APENDICE I — Lista dos associados, contribuintes ¢ colaboradores do IPES, 639 APENDICE J — Relatérios parciais da despesa do IPES em 1962, seus orca- mentos para 1963 e cartas de Ivan Hasslocher a Arthur Oscar Junqueira, 645 APENDICE K — Infiltragio Comunista: Nomes ¢ Entidades, 651 APENDICE L — Titulos dos livros ¢ revistas de publicagio ¢ circulagéo a cargo do IPES, 653 APENDICE M — Correspondéncia de B. Roguski com 0 IPES sobre a “Mo- bilizagdo Agriria do Parana" ¢ a “Carta de Pato Branco”, 657 APENDICE N — Selecao de temas para os semindrios patrocinados e organi- zados pelo IPES; correspondéncia com Garrido Torres; atividades do grupo de estudos, 669 APENDICE O — Correspondéncia de Sonia Seganfredo com 0 IPES, 689 APENDICE P — Sindicalistas brasileiros que participaram em cursos de trei- Ramento nos Estadcs Unidos, orientados pela CIA, de Most a 1964, 707 APENDICE Q — Voto de recusa do Congreso a designagio de Santiago Dantas ¢ position paper preparado pelo IPES-Rio, 711 APENDICE R — Carta de Jorge Oscar de Mello Flores a Glycon de Paiva, 721 APENDICE S — Carta de Hélio Gomide ao General Carlos Alberto Fontoura, 729 APENDICE T — Memorando de E. Fischlowitz a Paulo de Assis Ribeiro, 733 APENDICE U — “Levantamento da Amea¢a Comunista" ¢ carta @ Coca-Cola SA. 735 APENDICE V — Carta de Edgard Teixeira Leite & Confederagio Rural Bra- sileira, 743 APENDICE W — Lista dos associados € colaboradores do IPES ligados a bancos, 745 APENDICE X — Carta do IPESUL ao IPES e correspondéncia de associacSes ¢ representantes de classes a0 IPES, 749 APENDICE Y — Minuta da carta do IPES a David Rockefeller e cartas do CED, 763 APENDICE Z — Atas das reunides do IPES de 23 de novembro de 1962, de 22 de janciro de 1963 © de 8 de abril de 1963, 769 BIBLIOGRAFIA, 793 AGRADECIMENTOS Este livro € fruto de uma pesquisa cujo texto bésico foi produzido ao longo de trés anos consecutivos. Ele encerra o percurso intelectual e académico de uma década de vivéncia como estudante universi . Durante esse periodo, as mais variadas pessoas me beneficiaram com seu didlogo e amizade. Lamentavelmente, nao posso expressar meu agradecimento a cada um em particular, pois a relacao seria extensa; entretanto, algumas pessoas merecem especial destaque. Aron Neu- mann, in memoriam, foi modelo de persistencia e dedicacao, amigo nas horas certas. O Prof. Aryeh Grabois, o Prof. Abraham Yassour ¢ 0 Prof. Teodor Shanin foram exemplos de seriedade académica quando da minha passagem, como estu- dante, pela University of Haifa, Israel. Tive o privilégio de participar, na Leeds University, Inglaterra, do curso de mestrado sob a orientacao do Prof. Ralph Miliband ¢ do Prof. Hamza Alavi; nesse fértil ambiente de discussio, expandiram- se meus horizontes intelectuais e passei a esbocar muitas das questdes e problemas que levaram & definicdo da temdtica da minha tese, agora transformada em livro. Na realizagao deste trabalho, usufrui da boa vontade de muitos amigos e colegas da University of Glasgow, Escécia, que devotaram tempo e esforgo, fazendo criticas as veredes preliminares. Agradeco especialmente a Otévio Dulci, que me brindou com sua acurada compreensao da realidade brasileira, a Régis de Castro Andrade, pelo didlogo frutifero e profunda sensibilidade, a Herbert de Sousa, que visualizou o alcance deste trabalho ¢ me incentivou a realizi-lo, e a Galeno de Freitas, cujo conhecimento da vids politica do Brasil foi de grande ajuda. Meu reconhecimento vai para o Prof. Emil Rado, conselheiro para pés-graduados da University of Glasgow, e para o Prof. Andrew Skinner, diretor do Comité de Pés-Graduacao, sem cuja equilibrada intervencdo no conflito que motivou a mudanga de orientador de tese ev nao teria tido a tranqitilidade para realizar este trabalho. Minha gratidéo € imensa para com o Dr. Simon Mitchell, que assumiu a meio caminho a orientagio da tese € cuja extrema dedicagdo, sensibi- lidade ¢ criticas perspicazes foram fundamentais para concluir a tese. Brian Pollitt, professor e amigo, me estimulou durante a elaboragio do trabalho e me deu pleno apoio moral para enfrentar as dificuldades extrinsecas ao mérito da pes- quisa. David Stansfield, Francis Lambert, John Parker e Phil O'Brien, professores do Institute of Latin American Studies da University of Glasgow, também me encorajaram, Desejo registrar meu agradecimento ao Social Science Research Council da Gri-Bretanha. Sob os auspicios de seu desinteressado apoio, realizei, de 1976 a 1980, a pesquisa de campo no Brasil e nos Estados Unidos da qual extra{ fundamentos para cste livro. Uma grande parte da versio original deste trabalho foi datilografada com muito empenho ¢ carinho por Ruth Rae, em Bay Glasgow. Também coopcraram May Townsicy ¢ Anne Rea, sccretérias do ILAS, Yvonne Guerrero ¢ as bibliotecdrias do ILAS ¢ da University of Glasgow. Fui afortunado cm ter Else, Ayeska, Ceres ¢ Gloria na traducio do livro, o que fizeram ‘com dedicagdo ¢ senso profissional, corrigindo erros ¢ ajudando a melhorar o estilo. Agradego-lhes, mesmo se nem sempre soube seguir os scus conselhos, Aurea, a minha mulher, me dew secu apoio constante, sua companhia de todas as horas, fundamental para quem trabalha sob a pressio de realizar uma pesquisa desta envergadura, mesmo em detrimento de seus proprios estudos. A ela, por tanto... © por muito mais... Nenhuma das pessoas acima mencionadas tem responsabilidade alguma pelos conceitos aqui cmitidos, nem pelos dados e documentos apresentados, que € 36 minha, R. A. Dreifuss NOTA DO TRADUTOR O contetido hist6rico e a vasta documentagao da tese State, class and the organic elite: the formation of an entrepreneurial order in Brazil — 1961-1965, da qual se originou a presente obra, levam-nos a esclarecer que: 4) um confronto do texto original inglés com o atual revela uma traducio ampliade. £ que o Autor, na qualidade também de orientador técnico, valeu-se da oportunidade para atualizar dados, fazer adendos ¢ rever notas bibliogrdficas, procurando, assim, melhor atender aos seus objetivos; b) 0 livro contém citagdes originalmente em portugués que o préprio Autor verteu para o inglés e que, posteriormente, traduzimos para o nosso vernéculo, razo pela qual nos responsabilizamos pela equivaléncia semintica, mas ndo as- seguramos ter havido uma tradugdo verbo ad verbum. Consequentemente, a fide- dignidade de tais citagdes é de inteira responsabilidade do Autor. Esclarecemos, outrossim, que empenhamo-nos em traduzir com a méxima fidelidade a tese original, em detrimento, algumas vezes, do estilo. Pela equipe de tradusfo, Else R.P. Vieira Supervisora de Inglés do Laboratério de Tra- dusao da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, janeiro 1981, 13 LISTA DE ABREVIATURAS ABA — Associaggo Brasileira de Anun- ciantes ABCAR — Associag&o Brasileira de Cré dito ¢ Assisténcia Rural ABDIB — Associagso Brasileira das In- distrias de Base ABIMAQ — Associagao Brasileira de In- distrias de Maquinas ABM — Associagio Brasileira de Munici- ACLEESP — Associacio dos Clubes Ex portivos do Estado de Séo Paulo ACM — Associagiio Cristi de Mogos ACOPA — Ausociage Comercial do Pa- ren ACREFI — Associagio de Crédi ciamento ¢ Investimentos ACR] — Associagdo Comercial do Rio de Janeiro ADCE — Assoctasio dos Dirigentes Cris- tos de Empresas ADECIF — Associagiio das Empresas de Crédito, Investimento ¢ Financiamento ADELA — Atlantic Community Develop- ment Group for Latin America ADEP — Asio Democritica Popular ADESG — Associsgio dos Diplomados da ESG Finar- ADF — AssocingSo Democratica Feminina ADIPES — Associagio dos Diplomados do IPES ADP — Agio Democrética Parlamentar ADP — Acio Democritica Popular (RGS) AEF — American Economic Foundation AFL-CIO — American Federation of La- = Congress of Industrial Organiza- 4 AID — Agency for International Deve- fopment AIFLD — American Institute for Free Labor Development ALALC — Associagiio Latino-Americana de Livre Comércio ALEF — Alianga Eleitoral da Familia ALPRO — Aliansa para o Progresso AMAN — Academia Militar de Agulhas Negras AMES — Associagio Metropolitana de Estudantes Secundirios AMFORP — American and Foreign Po- wer Company ANMVAP — Associacao Ni quinas, Veiculos ¢ Autopesas ANPES — Associagdo ‘Nacional de Pro- gramagéo Econémica ¢ Social AP — Asao Popular ae — Anilise e Perspectiva Econd- ner — Associasdo. Paulista de Propa- a ASAPEC — Corpo profissional de asses sores em assuntos econdmicos para em- presas privadas e agéncias publicas AVB — Asio de Vigilantes do Brasil BEG — Banco do Estado da Guanabara BGLA — Business Group for Latin Ame- rica yal de Mae BIR — Bureau of Intelligence and Re- search (Departamento de Estado ameri- ano) BNDE — Banco Nacional de Desenvolvi- mento. Econimico BNH — Banco Nacional da Habitasio BOLSA — Bank of London and South ‘America BPR — Bloco Parlamentar Revolucionirio BRASTEC — Agéncia de Consultoria Téc- nica CAB — Curso de Atualidades Brasileiras CACB — Confederagéo das Associagies Comerciais do Brasil CACEX Carteira de Comércio Exterior do Brasil CACO — Centro Académico Cindido de Oliveira CAMDE Campanha da Mylher pela Demeci CAMIG — Companhia Agricola de Minas: Gerais CAS — Corpo de Assistentes Sociais 1S CRP — Consércio Brasileira de Produtivir dade CBTC — Confederagao Brasilsira dos Tra: bilhadores Cristios CCC — Comando de Caca aos Comunistas CD — Comité Diretor (IPES) CDFR — Cruzda atica Feminins do Recife CDM — Cruzada Democritica das Mu- Theres CE — Comité Executive (IPES) CEAS — Centro de Estudios y Accién So cial (Colbmbia) CEC — Campanha de Educacio Civica CED — Committee for Economic Deve- lopment CED — Conselho de Entidades Democré- ticas CEDES — Centro de Documentagso Eco nomica € Social CEMLA — Centro de Estudios Monetirios Latinoamencanos CEN — Consclho Executive Nacional CENPI — Centro Nacional de Produtivi- dade Industral CEPAL — Comissbo Econémica para a América Latina CERES — Centro de Estudios y Reformas Econémico Sociales (Equador) Estudos CESB — Centro de Socisis Bra- sileiros CEXIM — Cancira de apart ce Im portagéo do Banco. do cir - Confederucso Sey Familias Cris- CFR — Counell for Foreign Relations CGC — Comando Geral da Greve CHEVF — Companhia Hidroclétrica do Vale do Séo Francisco Cl — Cuma de Informagio (ESG) CIA — Central Intelligence Agency CIAP — Consetho Snteramericano Alianga para © Progresso cicyP — Comoe | Interamericano de Co- CIESP — Centro de IndGstrias do Estado de Séo Paulo CIOSL — Conlederasio Interamericana das Organizacées dor Sindicatos Livres CLA — Council for Latin America ‘CLMD — Cruzada Libertadors Militar Democritica (CLT — Consolidagho das Leis do Trabalho (CLUSA — Cooperative League of the Uni- ted States of America CMB — Campanha da Muther Brasileira CMN — Consclho Monetério Nacional CNC — Confederagiio Nacional do Co mércio 16 CNCO — Confederagio Nacional dos Cir- culos Operitios CNE — Consetho Nacional de Economia NEC — Con fedaragis Nacional dos Em: pregados no Comércio CNI — Confederagio Nacional da Indus. ria CNLD — Cruzada Nacional de Lidevanga cna — Conselho Nacional de Reforma Agraria. CNTC — Confederagto Nacional dos Tra balhadores no Comés CNTEMA —” Confederagio Nacional dos Trabalhadores Ferroviérios, Maritimos ¢ Aéreos ‘CNT1 — Confederagio Nacional dos Tra- balhadores na Indistria CNTT — Confed jo Nacional dos ‘I'ra- balhadores em Transportes Terrestres CO — Conselho Orientador (IPES) COBAL — Compan Brasileira de Ali- mentos COCAP — Comité de Coordenasio da Alianga para o Progresso CODEPAR Companhia de Desenvolvi- mento do Parand CODERN — Companhia de Desenvolvi- mento do Rio Grande do Norte COHAB — Companhia de Habitasio Po pular da Gusnabara COMAP — Comité da Aliangs para o Progresso CON — Conselho Orientador Nacional (IPES) CONCIN — Consctho de Coordenasio In- terdepartamental (FIESP, CIESP) CONCLAP — Consetho Nacional de Clas- ses Produtoras CONESP — Companhia de Construgdes Escolares do Estado de Sio Paulo CONSIR — Comissio Nacional para & Sindicalizagéo Rural CONSPLAN — Conselho Consultive do Plancjamento CONSULTEC — Companhia Sul-Ameri- Cana de Administragiio © Estudos Técnicos CONTAC — Confedersgio Nacional dos Trabathadores na Agricultura CONTCP ~ Confederagiio Nacional dos Trabathadores em ComunicagSes ¢ Publi- cidade CONTEC — Confederagio Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Crédito CONTEL — Consetho Nacional de Tele- comunicesbes COS — Centro de Orientacho Social COSIBA — Companhia Siderirgica de Bahia COSIGUA — Companhia SiderGrgica do Guanabara COSIPA — Companhia Sidertirgica Pau- HA — Conselho de Politien Alfandegéria CPDSP — Ceniro de Pesquisa ¢ Do- cumentagio Soctal ¢ Polltica CPI — Comissio Parlamentar de Inqué- rilo CRB — Confederagio Rural Brasileira (CNA apés 1966) CREIA — Corteira de Crédito Industrial ¢ Agricola CRF — Cruzada do Rosirio em Familia CSAB — Curso Superior de Atualidades Brasileiras CSG — Curso Superior de Guerra CSN — Consetho de Seguranca Nacional CTB — Companhia Telefdnica Brasileira CTB — Confederagio dos Trabalhadores do. Brasit CTESP — Conselho Técnico de Econo mia, Sociologia ¢ Politica (FCESP) CURSEF — Curso Superior de Estudos Financeiros VRD — Companhia Vale do Rio Doce DA — Diretério Académico DASP — Departamento Administrative do Setvigo Puiblico DNEF — Departamento Nacional de Es- tradas de Ferro DOPS — Departamento de Ordem Polf- tica € Social EBASCO — Electricity Bond & Share Co. ECEME — Escola de Comando e Estado- Major do Exéreito ECLA — Economic Commission for La- tin America (CEPAL) EFL — Escola de Formafo de Lideres ELD — Escola de Lideranga Democratica ELO — Escola de Lideres Operdrios EMFA — EstadoMaior das Forgas Ar- modas EPEA — Escritério de Planejamento Eco némico © Soc ESG — Escola Superior de Guerra FACUR — Frateena Amizade Cristi Un bona ¢ Rural FAP — Fundacdo Alianca para 0 Pro gresso FAREMG — Federagio das Associngdes Rurais do Estedo de Minas Gerais FARESP — Federagio das Associngdes Ruralis do Estado de So Paulo FARSUL — Federagfio dus Associngées Rurals do Rio Grande do Sul FAS — Fundo de Acho Social (organiza. 80 unticomunista de Sio Paulo criada Per empresirios associados a multinacio- als FCESP — Federagio de Coméreio do Es tado de Sio Paulo FCO — Federagio dos Circulos Operarios FCOF — Federagio dos Circulos Opera rios Fluminenses FEBRASP — Federagdo Brasileira de Pro- paganda FGTS — Fundo de Garantia de Tempo de Ser FGY — Fundacao Getilio Vargas FIEGA — Federacao das Industrias do Estado da Guanabara FIESP — Federagao das Industrias do Es: tado de Sao Paulo FINAME — Agéncia Especial de Finan: ciamento Industrial FID — Frente da Juventude Demoeritica FMP — Frente de Mobilizagao Popular FPN — Frente Parlamentar Nacionalisia FSR — Federagao dos Sindicatos Rurais FUNDECE — Fundo de Democratizagio do Capital das Empresas GAP — Grupo de Agio Parlamentar GAP — Grupo de Atuacao Patriética GEA — Grupo de Estudos ¢ Acio GEC — Grupo Especial de Conjuntura ($0 Paulo) GED — Grupo de Estudo e Doutrina GEEAT — Grupo Executivo de Ensino ¢ igoamento Técnico Grupo Executive da Industria Automobilistica GEIMAPE — Grupo Executive da Indds- tria Mecanica GEMF — Grupo Executive de Exporta- $30 de Minério de Ferro GES — Grupo de Educacio Seletiva GLC — Grupo de Levantamento da Con- juntura GOP — Grupo de Opiniio Publica GPE — Grupo de Publicacdes/Editorial GPMI — Grupo Permanente de Mobiliza §0 Industrial GTA — Grupo de Trabalho ¢ Agio IADB — Interamerican Development Bank IBRA — Instituto Brasileiro de Reforma Agraria IBC — Instituto Brasileiro do Café IBRD — Interamerican Bank for Recons- truction and Development (BIRD) IBRE — Instituto Brasileiro de Economia 1CS — Instituto de Cigncias Sociais (Univ. Federal do Rio de Janciro) ICT — Institulo Cultural do Trabalho ICFTU — International Confederation of Free Trade Unions IDB — Instituto Demoeritico Brasileiro 17 IDF — International Development Foun- dation IEPS — Instituto de Estudos Publicos ¢ Sociais — Iniernational Finance Corporetion — Instituto de Formacao Social = oo ¢ Reforma INDA — Instituto Nacional de Desenvol- INPS — Instituto Nacional dc Previdéncia Social iE — Instituto de Pesquisas Econémicas nstituto de Planejamento Eco- toene Social IPES — Instituto de Pesquisas ¢ Estudos Sociais IPESUL — IPES do Rio Grande do Sul IPM — Inquéritos Policiais Militares ISEB — Instituto Superior de Estudos Brasileiros ITS — International Trade Secretariats lucsP Instituto Universitario de Citn- cias Politicas JUL — io Universitario do Livro JEC — Juventude Estudantil Catélica JOC — Juventude Operdria Catdlica [UC — Juventude Universitéria Catélica LAIC — Latin America Info: ion Com mittee LCCC — Liga Crist contra 0 Comunismo LDS — Legiio de Defesa Social Le-Ex — Forma abreviada de se referir ao documento “Lealdade 20 Exército” re- LIDER — Ligs Democritica Radical LIL — Liga Independente para Liber tisioe — Liga da Mulher pela Democrs- Mac — Movimento Anticomunista nee — Movimento de Arregimentagio nina Mar Military Assistance Program MASTER — Movimento dos Agricultores sem Terra MDB — Movimento Democritico Brasi- ro MDM — Mobilizegéo Democrética Mi- neira MEB — pores de Educagao de Base MEC — Ministério da Educacao ¢ Cultura MECOR — Ministério para Coordenagio. Regional am — Movimento Estudantil Democré- ico MFC — Movimento Familiar Cristéo MOBRAL — Movimento Brasileiro de Al- fabetizagio MOS — Movimento de Orientacéo Sit tags0 Sind}. 18 MPIQ — Movimento Popular Jinic Qua dros MRS — Movimento Renovador Sindicel MSD — Movimento Sindical Democritico MTR — Movimento Trabslhista Renove- dor (lacgio de direita do PTB) MUD — Movimento Universitério de Des- fayclamento MUT — Movimento de Unifieasio dos Trabalhadores NSF — National Security Files OAS — Organizasio dos Estados Ameri- canos Opus Dei — organiza cat6- Be somtsclial © Ceaisoalann tasads em 1928 pelo padre espanhol Josemeria Baloguer Escriva de Organizagdo Paranaense Antico- ORIT — Organizacién Regional Intcra- mericana de Trabajadores PAEG — Plano de Acéo Econdmica do Governo PAM — Programa de Assisténcia Militar PCB — Partido Comunssta Brasileiro PDC — Partido Democrata Cristio PL — Partido Libertador PR — Partido Republicano PRP — Partido de Representacio Popu- lar (de Piinio Salgado, ex-lider integra- lista) PSB — Partido Socialista Brasileiro PSD — Partido Social Demoeritico PSP — Partido Social Pr PTB — Partido Trabalhista Brasileiro PTN — Partido Trabalhista Necional PTT! — Post, Telegraph and Telephone International PUA — Pacto de Unidade ¢ Agio PUC — Pontificia Universidade Catélica REDETRAL — Resisténcia Democritica dos Trabslhadores RFF — Rede Ferrovidria Federal RI — Regimento de Infantaria SAR — Servigo de Assisténcia Rural SEI — Sociedade de Estudos Interameri- cana . SENAC — Servico Nacional de Aprend? zagem Comercial SENA] — Servigo Nacional de Aprendi- zagem Industrial SERFHAU — Servico Federal de Habita- gio ¢ Urbanizagio SESC — Servigo Social do Comércio SES! — Servigo Social da IndGstria SFICI — Servigo Federal de InformagSes € Contra-Informagées SNI — Servigo Nacional de Informagées SORPE — Servigo de Orientagio Rural de Pernambuco SRB — Sociedade Rural Brasileira SUDAM — Superintendéncia de Desen volvimento da Amaz6nia SUDENE — Superintendéncia de Desen- yolvimento do Nordeste SUMOC — Superintendéncia da Mocda ¢ do Crédito SUNAB — Superintendéncia Nacional de Abastecimento: SUPRA — Superintendéncia da Reforma Agriria, UBES — Uniao Brasileira de Estudantes Secundarios UCF — Unido Civica Feminina UDN — Uniio Democritica Nacional ULTAB — Unilio dos Lavradores e Tra- balhadores Agricolas do Brasil Ou — Unido Metropolitana de Estudan- GNAF — Unido Nacional de AssociagGes Femininas UNE — Unido Nacional dos Estudantes Ee — Unio Paulista de Estudantes Se- USAID — United Sues Agency for In- ternational De’ USIAC — United "States Interamerican ‘Council LISTA DE TABELAS Tabcla | — Classificacdo por valor de ca- pital dos grupos bilionirios, Tabela 2 — Distribuicao por montante de capital © nacionalidade dos grupos nacio ais © multinacionais, 52 ‘Tabela 3 — Distribuieao dos grupos segun- do o setor de atividade e nacionalidade, 53 Tabela 4 — Distribuigio dos grupos mul- jondrios por ramo de alividade princi- a4 Pi Tabela 5 — Distribuicio dos grupos nacio nais € multinacionais por setor de produ- go, 54 Tabcla 6 — Relacionamento entre o néme- ro de empresas € o volume de capital dos grupos multibilionarics, 55 Tabela 7 — Grau de controle do mercado te grupos multinacionais multibilionirios, Tabela 8 — Oligopdlio nw industria meta: Irgica de Sio Paulo, 56 Tabela 9 — Civis © militares nos cursos da ESG, 81 Tabela 10 — Percentagens de votes obti- dos pelos partidos mais importantes em trés eleigdes 90 legislative no periodo de 1945 a 1962, 139 Tabela 11 — Distribuigdo do eleitorado em 1962. 154 Tabela 12 — Variagdes mo indice do custo de vida do Rio de Janeiro e de S30 Paulo entre 1954 © 1962, 158 19 CAPITULO I A FORMACAO DO POPULISMO Até 1930, o Estado brasileiro foi liderado por uma oligarquia’ agro-comercial, na qual predominavam as elites rurais do nordeste, os plantadores de café de Sao Paulo e os interesses comerciais exportadores? Essa oligarquia formou um bloco de poder® de interesses agrérios, agro- exportadores € interesses comerciais importadores dentro de um contexto neo- colonial, bloco este que foi marcado pelas deformidades de uma classe que era a0 mesmo tempo ‘‘cliente-dominante”’ Foi sob a tuiela politica e ideolégica desse bloco de poder oligirquico e também sob a influéncia da supremacia comercial britanica nos iltimos vinte e cinco anos do século XIX que se formou a burguesia industrial,® Durante a década de vinte, novos centros econémicos regionais foram con- solidados sob novas bases econdmicas como, por exemplo, um Rio Grande do Sul agrério e um Rio de Janeiro e S30 Paulo industriais. O sistema bancério, que havia em grande parte se desenyolvido a partir de interesses agrdrios, concen- trou-se principalmente em Siio Paulo, Rio de Janeiro ¢ Minas Gerais. Essas mu- dangas econédmicas forzaram um deslocamento do poder politico agrério ¢ co- mercial do nordeste para a regido sudeste do pais e das tradicionais elites agrérias para novos gtupos urbanos.* Essas mudancas abriram caminho para o surgimento de figuras politics como as de Getilio Vargas, Joao Daudt d’Oliveira, Oswaldo Aranha (Rio Grande do Sul), Vicente Galliez, Valentim Bougas, Ary Frederico Torres (Rio de Janeiro), Roberto Simonsen, Teodoro Quartim Barbosa (Sao Paulo) e Evaldo Lédi (Minas Gerais), empresérios ¢ politicos que marcaram uma era? A urbanizago e 0 desenvolvimento industrial exerceram efeitos desorga- nizadores sobre a frégil estrutura do estado oligarquico. No final da década de vinte, através de um delicado acordo entre os governos estaduais de Sio Paulo ¢ Minas Gerais (acordo este conhecido como “politica café com leite”, uma modalidade de “Bonapartismo civil’ que deu nome 20 perfodo), 0 bloco de poder oligirquico tentou opor-se ao desafio da burguesia ¢ vencer a crise da oligarquia e dos setores cafeeiros em particular. A crise do dominio oligdrquico permitiu que pressdes cada vez maiores fossem exercidas pela fracdo industrial, apolada por outros grupos socinis, principalmente pelas classes médias. A fragio industrial formou um bloco burgués que lutou por redefinir as relagées de poder dentro do Estado brasileiro, tarefa esta que foi facilitada por pressdes sofridas pela economin oligérquica em conseqiiéncia da crise capitalista de 1929" 2 A burguesia emergente, porém, no destruiu, nem polftica nem economice- mente, as antigas classes agrérias dominantes para impor sua presenga no Estado; pelo contririo, aceitou em grande parte os valores tradicionais da elite rural. E irrelevante para efeitos da presente anilise saber se isso aconteceu por nfo ter a burguesia forga politica ou econdémica suficiente para destruir os baluartes politicos ¢ a estrutura s6cio-econdmica da oligerquia, ou se foi por ndo querer ou néo precisar fazélo. © importante € que a burguesia industrial conseguiu identidade politica face ao bloco oligarquico e, 20 mesmo tempo, estabeleceu um novo “compromisso de classe” no poder com os interesses agrarios, particular. mente com os selores agro-exportadores, E precisamente através dessa dupla agiio que o aparecimento € consolidagdo da burguesia devem ser entendidos, pois sua ligago umbilical com a oligarquia teria importantes conseqiiéncias hisiéricas, ando o chamado “estado de compromisso"™ institucionalizado pela cons- tituisZo de 1934. O govemo de Gettlio Vargas teve entio de se movimentar dentro de uma complicada trama de conciliagdes efmeras entre interesses con Aitantes. Nenhum dos grupos participantes dos mecanismos de poder — as classes médias, os setores agro-exportadores, a industria ¢ os interesses bancérios — foi capaz de estabelecer sua hegemonia politica e de representar seus interesses par- ticulares como sendo os interesses gerais da nacao,’* O equilibrio instavel entre os grupos dominsntes ¢, mais ainda, a incapacidade de qualquer desses grupos de assumir 0 controle do Estado em beneficio préprio e, 20 mesmo tempo, repre- sentar 0 conjunto dos interesses econémicos privados, constitufram elementos tipicos da politica da década, expressando precisamente a crise da hegemonia politica oligdrquica, a qual foi marcada pela revolugéo de 1930. Apesar de a indtistria ¢ de os interesses agro-cxportadores haverem este- belecido um “estado de compromisso”, eles tiveram uma coexisténcia dificil e o periodo foi marcado por crises continuas a partir de 1932, 0 que levou ao est belecimento do Estado Novo em 1937." Para a burguesia industrial, que estava ‘entdo afirmando o seu poderio econémico, eram inaceitéveis as dissidéncias das classes dominantes articuladas politicamente no seu interior, tais como se mani- festaram na revolucio de 1932 ou no_movimento fascista (integralismo) da metade da década de trinta e que impregnou a ideologia nacionalista daquele perfodo. Além disso, reag6es organizadas por parte das classes subordinadas como, por exemplo, o levante comunista de 1935, a formagao de uma Frente Naciona- lista Negra’ em meados da década de trinta, ou a criagao da Alianca Nacional Libertadors'* tinham de ser reprimidas. Os industriais perceberam que precisavam ideranga forte para conseguir disciplinar o esforco nacional e para impor € administra sacificios regionals € de classe apropriados para a consolidagio da sociedade industri: O “estado de compromisso”, forjado no processo s6cio-pol{tico do inicio da década de trinta, foi entéo remodelado a partir des experiéncias de um novo Estado traduzido pelas formas corporativistas de associacdo" e apoiado por formas autoritdrias de dominio."* © Estado Novo surgiu porque 9 burguesia industrial Se mostrou incapaz de liderar os componentes oligérquicos do “estado de com- promisso” ou para impor-se 4 na¢ao através de meios consensuais, de maneira a Criar uma infra-estrutura s6cio-ccondmica para o desenvolvimento industrial.”° O Estado Novo gorantiu a supremacia econémica da burguesia industrial e moldou as bases de um bloco histérica*' burgués, concentrando as energias nacionais ¢ mobitizando recursos legitimados por nogdes militares de ordem nacional ¢ de 22 progresso,7? cujos interesses pela industrializagao mutuamente reforgavam os interesses dos industriais. Sob a égide do Estado Novo, industriais e proprietérios de terra tornaram-se aliados. Contudo, a convergéncia de interesses nao se dis- solveu em identidade de interesses.** Conflitos € tensdes marcaram o seu relacio- namento, e foi esse elemento de competigio métua que tornou possivel, e até mesmo necessério, que o aparelho burocratico-militar do Estado Novo tivesse um papel de intermedisrio,™ © que favoreceu uma interferéncia continua das Forgas de politica da na¢o. A intervencao do aparelho burocratico-militar a assegurava a coesiio do sistema, ao mesmo tempo em que se tornava um fator de ,perturbacdo nas tentativas de uma institucionalizecao po- litica a longo prazo.* A interdependéncia dos setores industrial e agrério foi marcada por quatro fendmenos. Primeiramente, a demanda dos produtos industriais originou-se em parte dos setores agro-exportadores, Em segundo lugar, os insumos necessérios a industrializacao foram comprados, em sua grande maioria, de centros estran- geiros, com receitas obtidas com exportagées. Em terceiro lugar, os setores agré- Tios eram produtores de matéria-prima para a incipiente indtstria local, assim como para empresas agroindustriais em desenvolvimento. E, por fim, houve um certo grau de interpenetracgo entre os setores agrario e industrial, resultante de Jacos familiares ou através de empresas interligadas, E importante notar que o bloco de poder empresarial operava no espago econdmico e politico aberto pelo declinio dos interesses comerciais e industriais britanicos face aos rivais interesses americanos e alemges. Esse empenho de industrializagao foi fortalecido pela re- lativa marginalizacao de interesses estrangeiros devido aos anos da depressio & ao conseqiiente envolyimento de tais interesses industriais no esforgo bélico da Segunda Guerra Mundial® A industrializacZo teve entZo um cardter especifico de “substituigiio de importagdes”, Sob a égide do Estado Novo teve inicio 0 primeiro estégio da nacionalizagao formal da economia com a criacéo de empresas estatais, autarquias mistas ¢ 0 estabelecimento do controle nacional sobre certas areas de produgSo estratégicas, como mineragio, ago ¢ petrOleo. O Estado tornow-se um importante produtor de bens ¢ servigos de infra-estrutura ¢ abriu caminho para o desenvolvimento indus- trial privado do Brasil?’ O Estado auxiliou também o capital indusirial com a criagio de uma série de mecanismés destinados a reorg: a economia, dando prioridade ao processo de expansio capitalista e transferindo recursos de outras fireas para a inddstria®? A industrializagao foi também estimulada pela vital transformagio do consumo niio-produtivo dos proprietérios de terra, através do pais, em capital de giro para os centros industriais2* Isso foi alcancado através da estrutura bancéria, que se expandiu enormemente no inicio da década de qua- renta e que se ligou em parte aos setores agrarios e @ industria através de lagos comerciais ¢ familiares, reforgando assim a interdependéncia entre a oligarquia e a indistria. . A reestruturagao do sistema politico durante 0 Estado Novo envolveu novas formas de articulagao e dominio de classe.* O pensamento corporativista, que entendia a formacao sécio-econémica como uma rede de grupos econémicos politicos “funcionais” resultantes de uma divisdo de trabalho necesséria ¢ até mesmo “natural”, influenciou cnormemente a ideologia ¢ agio do bloco de poder industrial-financeito dominante.* Tal bloco redefiniu os canais de acesso 80 centro de poder, através do estabelecimento de uma série de mecanismos para a 23 formulagio de diretrizes politicas ¢ de tomada de decisio, Essa série de mecanis- mos equivalia na realidade a uma "mobilizagio de bias” institucionaliznda contra 05 interesses agrdrios substituidos.? A industria expressava suas demandas sem intermediagéo politica, introduzindo-se diretamente no aparelho estatal.¥ O Exe- cutivo tornou-se um foco dos interesses que visavam a industrializagio, aberto ds demandas da Confederagio Nacional da Industria ¢ da Confederagdo Nacional do Comércio,® a0 passo que os interesses agririos, tendo perdido sua posigio privilegiada, conseguiam se comunicar com o aparelho do Estado através dos Institutos, conselhos de representacio dos produtores rurais.* Foi criado um Conselho Nacional de Economia onde os industriais foram os primeiros, e até 1946 Os Gnicos, grupos ccupacionais a tirar vantagem das oportunidades corpora- tivistas.”” Estado Novo também estimulou um processo “ni ial” de formulagio de diretrizes politicas, na tentativa de subordinar as liderangas regionais e intro- duzir reformas administrativas, objetivando modemnizar o aparelho estatal e con- trolar © capital estrangeiro em favor de empreendimentos locais.* Mais ainda, o Executive lancou-se a uma reformulagio drdstica da burocracia estatal criando o DASP. Departamento Administrative do Servigo Publico. Além de sua importin- cia no proceso de modernizag3o € centralizagao da administragéo publica, a criagdo do DASP teve duas outras consequéncias. Ele afetava a pratica do clien- telismo ¢ do patronato, tirando a burocracia do controle da olf Contro- lando s burocracis o DASP transferiu efetivamente, mas nio de mancira exclusiva, a pritica do patronato para o governo central, dando margem a burguesia indus- trial de langar mao de priticas paternslistas ¢ cartoriais.” © papel do Estado Novo na industrializagao permitiu e propiciou a partici- pacio de profissionais das classes médias ¢ de militares, juntamente com os pro Prict empresérios, no aparclho administrative do Estado.” A participagio dos ilitares realcou o discurso “nacionalista” que foi identificado com o desenvol- vimento industrial privado da nacéo.*' Contudo, apesar da importincia da “so- ‘a burocracia ¢ Os militares ¢ 4 convergéncia 0 desenvolvimento industrial foi guindo por dirctrizes politicas tragadas pelo bloco industrial-financeiro do centro- sul do pais Em nome de defess da “paz social’, o Estado Novo intervinha também na “regulamentigéo” da forca de trabalho utravés da promulgagio de "leis tra balhistas”, cumprindo assim um requisite bésico no proceso de acumulacio. O estabelecimento de um salério minimo em 1939 permitiu um nivelamento de sa- Mario para a forge de trebalho urbana pelo grau mais baixo possivel da escala, isto é, a nivel de subsisténcis, Dada a relativa escussez de mio-de-obra qualificada ¢ semiqualificada, o estabclecimento de um saldrio minimo impediu que as forcas de mercado estabelecessem saldrios de equilibrio a niveis mais ultos, o que ten- detia a inibir uma expanséo mais facil de industrializagéo capitulistu."* Tal poll- tica apresentava ainda dois beneficios significativos quanto & acumulugdo capi- talista: primeiramente, so determiner op sslérios institucionalmente, essa politica permitia um célculo econdmico efetivo, enquanto o aumento de produtividade niio eta incorporado ao aumento dos saldrioy. Em segundo lugar, um efeito im- portante da imposicéo de um salério minimo foi « cooptagdo das classes traba- Shudoras, mostrando assim a “face admissivel do corporativismo”. O Estado entio 24 fol projetado ¢ percebido como protetor dos pobres, tendo a frente a figura pa- ternalista de Getélio Varga: Ao se aproximar o fim da Segunda Guerra Mundial, mudangas substanciais ocorreram. A agitagio nas classes trabalhadoras, oriunda de condiges mise- réveis de vida, atingia seu ponto maximo em meados da década de quarenta, apesar da existéncia de sindicatos controlados, que haviam canalizado durante anos as reivindicagdes da classe, Novos e independentes sindicatos foram criados nos Estados mais industrializados do pais, flanqueando a estrutura de controle do Ministro do Trabalho ¢ Justiga, Alexandre Marcondes Filho. Sindicatos na- cionais vieram a tona como, por exemplo, o Movimento de Unificacao dos Tra balhadores ¢ a Confederagao dos Trabalhadores do Brasil (CTB), criada em 1944, fa precdria “sociedade civil'® de meados da década de quarenta, o ressurgimen! da esquerda, que havin sido atingida violentamente pelo Estado Novo, e, cularmente, o crescimento do Partido Comunista junto a organizacdes inc das classes trabalhadoras pareciam & burguesia uma séria ameaca fora de seu controle, Foi nesse clima de incerteza que as associagdes empresariais convocaram convengdes € congressos nacionais, a fim de repensar o seu papel no periodo pés- guerra, O mais importante desses foi a Primeira Conferéncia das Classes Produtoras do Brasil, realizada em Teres6polis em maio de 1945. A conferéncia foi convo- cada pela Federagio de Associagées Comerciais do Brasil ¢ pela Confederacao Nacional da Indistria, e foi presidida por Roberto Simonsen. Cerca de seiscentas associages rurais, comerciais ¢ industrinis de todos os Estados do pais estiveram presentes A conferéncia, Apés cinco dias de reunides, uma Carta Econémica foi apresentada, a qual cautelosamente proclamava o desejo dos participantes de se unirem na construgdo de uma nova ordem social. A “Declarago de Principios” dos empresérios baseava-se na associaco de liberdade e empresa privada, carac- terizada por “‘preceitos de justica” e “limitasdes inevitiveis impostas pelos inte- resses fundamentais da vida nacional”, e para cuja realizagio a burguesia reco- nheceria como necessério um certo grau de interferéncia do Estado. Além disso, a resolugio nferéncia conclamava a um “desenvolvimento harmonioso de todas as regides”, a uma garantia para homens da cidade e do campo, de um salirio que Ihes permitisse “viver com dignidade”, a “necessidade de planejamento econdmico” e a recomendagéo de que o Estado tivesse papel mais ativo na preservacio do meio ambiente, no desenvolvimento da agricultura, na produgéo de energia ¢ expansio dos transportes, no protecionismo alfandegario, no desen- volvimento de indistrias bésicas, no impedimento da formacao de cartéis, no controle da importacio e, sobretudo, no estimulo a investimentos estrangeiros que, 20 término do esforgo de guerra, haviam oportunamente renovado sua participagZo na economia brasileira’? em fins da década de quarenta, E necessério que alguns comentarios sejam feitos sobre 2 chamada burguesia “nacional”, que tanto havia se desenvolvido sob a égide do Estado Novo. De acotdo com a crenga intelectual popularizada, assumida pelo Partido Comuniste ¢ abragada mais tarde por intelectuais nacionalistas, principalmente os do Insti- tuto Superior de Estudos Brasilciros, ISEB," havia “‘duas burguesias.” Uma era considerada entreguista, diretamente ligada a capital transnacional, e 2 outra nacionalista, oposta A agiio de interesses estrangeiros. A burguesia “nacionalista” era procurada politicamente ¢ considerada, teoricamente, pelos intelectuais nacio- nalistas como aliada em potencial, se nao de fate, das classes trabalhadoras ¢ dos setores das classes médias que se opunham ao imperialismo, em razBo do que se 25 esperava fossem as diretrizes pollticas dos industrials de reforcar os centros locais de tomada de decisao, e de sua alegada viséo do Estado como instrumento de oposigao A penetragao estrangeira. Os intelectuais nacionalistas atribuiam tam- bém a esses setores “nacionais" industriais e financeiros “objetivos progressistas”. Em particular, acreditava-se que os sctores industriais estivessem interessados em alguma forma de desenvolvimento nacional redistributivo e em spoiar uma atitude reformista contra estruturas agrérias arcaicas. Porém, a esperada confron- taco nacionalista-entreguista baseave-se em avaliagéo errada, falando-se em antagonismos estruturais onde somente existiam conflitos conjunturais. A burgue- sia industrial brasileira poderia ter mostrado uma dualidade de tendéncias em seu crescimento, sendo uma de associagao direta a interesses multinacionais ¢ a outra de ligacces indiretas para obter o know-how estrangeiro.” Mas a motive: gio da burguesia era uma s6, o capital. Na medida em que a burguesia brasileira se desenvolvia ¢, conseqiicntemente, a economia do pais, os industriais “nacionais" eram menos uma forca vital do Brasil do que agentes da integracéo do pais no sistema produtivo internacional dominante, isto é, 0 capitalismo. O “entreguismo” de um grupo ou de um setor da burguesia expés a sua relado conjuntural com um polo de influéncia transnacional especifico, a saber, a subordinagdo & nacio hegeménica, os Estados Unidos, mas ocultou 0 compromisso estrutural sistemé- tico da burguesia.” compromisso este que seria eritico. As premissas dos politicos nacionalistas e intelectuais sobre ume pretense posigéo nacional-reformista da burguesia “nacional” correspondiam mais a ideologia do nacional-populismo do que aos interesses dos industriais, A burguesia brasileira era, com toda certeza, nacional, apesar de nio ser necessariamente nacionalisia. Em sua convengao nacional de 1945 os empresdrios adotaram vérias de- mandas populares como seus slogans politicos obviamente dirigidos as classes médias ¢ trabalhadoras, refletindo o sentimento crescente entre as classes dominantes de que uma mudanca era esperada, pelo menos nos centros urbanos. Entre os slogans adotados estavam os apelos para a “uta contra a pobreza", 0 “aumento da renda nacional”, o “desenvolvimento das forgas produtoras", a “democracia econémica” e a “‘justiga social,"* Estava se tornando claro para as classes dominantes que novas formas de governo teriam de substituir as medidas coercitivas do Estado Novo. © descontentamento popular deveria ser esvaziado, absorvendo sua lideranca e tentando conseguir uma burocratizagiio de suas de- mandas através de instrumentos de repressio pacifica como aqueles fornecidos pelo Estado patrimonial e cartorial.* Além disso, a onda antifascita Irazia consigo uma reagéo das classes médias contra 0 autoritarismo do Estado Novo. Isso ficou particularmente claro no comportamento das Forgas Armadas. O governo brasileiro, que no periodo inicial da guerra oscilava entre a neutralidade ¢ uma posicio pré-Eixo, a0 mesmo tempo em que oficiais superiores como o General ‘Gées Monteiro © o General Eurico Gaspar Dutra manifestavam simpatia pela Alemanha, declarava-se a favor dos aliados enviando inclusive um contingente & Europa, a Forga Expedicionéria Brasileira — FEB, que participou da campanha na Itélia sob 0 comando dos americanos. O resultado dessa participagado foi uma nga estreita entre oficiais brasileiros ¢ americanos, quando uma série de smizades pessoais se formaram e persistiram, até mesmo intensificando-se nas duas décadas seguintes. Varios desses oficiais foram enviados aos Estados Unidos de onde voltaram com novas idéias sobre desenvolvimento industrial ¢ organiza: 80 politica do pals. Os oficiais, decididamente oposios a Getilio Vargas, a quem 26 consideravam como chefe de um regime neofascista, conspiravam contra ele. © ponto culminane dessa reagdo contra Getslio Vargas foi a criagio da Frente Democratiea que, abrangendo um amplo leque de posigées ideolégicas, apresenta- vase como uma convergéncia politica alternativa ao regime vigente. Gettlio Vargas também compreendeu a necessidade de mudanga ¢ tentou deslocar a base sécio-politica do Estado Novo para um alinhamento formado pelas classes trabalhadoras ¢ a burguesia industrial, na tentativa de constituir um sistema politico trabalhista de centro-esquerda com tendéncias nacionalistas. Eleicées nacionais foram marcadas para dezembro de 1945, para as quais Getilio Vargas estimulou a criagao de dois partidos, o Partido Trabalhista Brasileiro — PTB, baseado na maquina sindical de Marcondes Filho, e o Partido Social Democritico — PSD, que nao possufa coisa alguma em comum com seus homé- nimos europeus e se baseava nos interventores estaduais, nos Paulo e nos chefes politicos oligdrquicos, os conhecidos coronéis.™ A ‘oposigao de centro-direita criou a Unido Democratica Nacional — UDN, um conjunto amplo de posigdes anticomunistas, antinacionslistas e anti-Vargas (mais tarde antipopulistas), cuja base eleitoral encontravase principalmente nas classes médias € que era liderada por profissionais liberais, empresirios © politicos. Getilio Vargas concedeu anistia politica e tentou ganhar para o seu Jado as classes trabalhadoras urbanas e 0 Partido Comunista através de medidas de reforma Jo politica, tentando organizar sua propria base de novo regime, Forgas s6cio-econdmicas emergentes, assim como novas demandas sdcio-politicas, necessitavam ser acomodadas. A limitada convergéncia de classe no poder, o corporativismo associative ¢ © autoriterismo do Estado Novo foram integrados e sintetizados numa férmula nacional de “desenvolvimento”, que, sob © nome genérico de populismo, tentava estabelecer uma hegemonia burguesa a partir de meados da década de quarenta.* Através do populismo, o Executivo procurava estabelecer um esquema de limitada mobilizagio politica nacional das massas urbanas, baseado em uma estrutura sindical controlada pelo Estado e no apoio institucional do PSD e do PTB, Esses dois partidos, apesar de imprecisos em seus apelos programaticos, eram efetivas maquinas de dominio ideol6gico ¢ controle social, o primeiro deles operando como 0 partido do poder e o segundo como 0 partido de legitimaséo da ordem vigente. Apés anos de autoritarismo e predominincia do Executivo, 0 populismo favorecia a reentrada em cena do politico profissional, junta fe com a participacao de industriais e banqueiros em atividades politico-partidarias no entao reativado Congreso. Contudo, a posi- gtio privilegiada que os industriais haviam conseguido no Executivo através de uma estrutura corporativista de associago foi preservada, embora controlada pelo Congreso. A estratégia de Getiilio Vargas foi vista com alarme peles classes dominantes e com suspeita pelas classes médias, pois tal estratégia somente aumentaria 0 apelo carismético do proprio Getilio Vargas junto as classes trabalhadoras e real- garia o seu papel no comando do Estado como intermediério politico, A mobiliza- g&o das classes trabalhadoras, apesar de limitada, era temida pelas classes dominantes, pois poderia der « Getdlio Vargas 0 apoio necessirio para o esta: belecimento de um Executivo relativamente independente. Tal Executivo seria um andtema tanto para os industriais quanto para a oligarquia, e colocaria 27 Genilio Vargas acima do controle das Forgas Armadas. Além disso, a estratégin de Gewilio Vargas vinculava o desenvolvimento da cconomia a um caminho nacionalista € estatizante-distributivo, Todas essas reformas, porém, foram vistas como remanescénclas de excessos indescjdvels do Estado Novo. sso era precisa: mente 0 que os industriais e outros tentavam reprimir, pois cles es momento procurando fortalecer suas ligagdes com interesses multi tentativa de conseguir capital ¢ tecnologi ‘Anles que Gettilio Vargas conseguisse consolidar sua estratégia e formar um novo bloco de poder, 0 Exéreito, tendo como ponta-delanca os oficiais da FEB, entrou em a¢io ¢ 0 depés, apoiado por um alinhamento que compreendia 08 industriais locais, a oligarquis, as classes médias e, finalmente, as empresas multinacionais que haviam renovado seu interesse pelo Brasil. Embora o préprio Getilio Vargas ¢ suas propostas politicas nfo tenham sido accitos, os empresitios adotaram o seu modelo politico e o sistema partidirio que ele havia fomentado, A passagem do Estado Novo para uma forma populista de dominio ¢ articulsggo de interesses foi atenuada pelo fato de que a mesma elite politica e econémica que havia comandado o regime deposto permaneceu no poder ap6s 2 destituicso de Gettilio Vargas de seu cargo, foi sob a diregio dessa elite que as primeiras eleigdes nacionais foram promovidas. Além disso, a continuidade foi salientada pelo fato de a Constituigao de 1946 haver deixado praticamente intacto 0 marco institucional do Estado Novo.7 As cleigées foram vencidas pelo Marechal Eurico Gaspar Dutra, Ministro da Guerra durante o govern de Getilio Vargas, encabegando 0 PSD ¢ apoiado pelo PTB, que, tendo sua candidatura endossada pelo proprio Getilio Vargas, competiv com 0 Brigadeiro Eduardo Gomes, candidato pela UDN. Para surpresa reral, 0 Partido Comunista, que havia sido legalizado pouco antes ¢ disputava as cleicacs independentemente, (eve a mesma porcentagem de votos que o PTB. Sob o manto de democracia liberal que envolvia o regime do Marechal Eurico Dutra, ficaram ainda m ieristicas centrais do Estado Novo, princi- palmente @ posigio pri dentro do Executivo ¢ as relagées autoritérias das classes dominantes para com as classes trabalhadoras. Mas algu- mas mudangas importantes de faio aconteceram, principalmente o restabelecimento do Legislative como foro de atuasio polfiica, Os membros eleitos para o Con- gresio, dentro de certos limites, ocuparam suas tribunas para o debate politico, que atingia » sociedade em geral#* . Embora o Marechal Eurico Dutra tivesse sido eleito pelas méquinas politicas do PSD e do PTB ¢ tivesse sido apoiado por Getilio Vargas, ele mostrou logo de inicio que suas idéia politicas diferiam grandemente das de seu predecessor, principalmente no que dizia respeito as suas posi¢ées quanto ao nacionalismo & 8 participasio das classes trabalhadoras, A mudanga do rumo do governo do Marechal Eurico Dutra foi caracterizads pelo {ato de cle haver levado para o seu ministério figuras de destsque da UDN como, por exemplo, o empresério Raul Fernandes, que se tornou seu Ministro do Exterior. O governo do Marechal Eurico Dutra foi foriemente influenciado por empresdrios, os quais ocuparam de mancira quase exclusiva os postoschave na adminisiracio. O governo favoreceu © laissez-faire na érea econdmica ¢, depois de tentar desenvolver, por um curto periodo, um sistema de participacio pluralista, passou a defender um forte con- trole politico das classes subordinadas.” A direiriz econdmica do governo do Marechal Eurico Dutra favorecia claramente a empresa privada, Orgonizagoes 28 estatais foram desativadas e a tendéncia para o nacionalismo e desenvolvimento es- tatizante sofreu um retrocesso. Tanto o governo do Marechal Eurico Dutra, quanto a UDN em particular, examinavam as possibilidades de travar um relacionamento especial com os Estados Unidos e, conseqiientemente, a economia foi reaberta ao capital estrangeiro em condigdes muito favordveis, Além disso, sob a égide do Marechal Eurico Dutra, 0 governo estabeleceu a Escola Superior de Guerra — ESG, para a qual acorreram oficiais anti-Vargas ¢ pr6-UDN. Estabeleceu tam- bém a Comissio Mista Brasil-Estados Unidos, com o objetivo de estudar a situago brasileira e esbocar um programa de desenvolvimento econdmico para o pais. © bloco de poder oligdrquico-empresarial, que apoiava o governo do Ma rechal Eurico Dutra e que tantava conseguir 0 consentimento politico das classes subordinadas € impor consenso entre as fragdes subalternas das classes domi- nantes, usou para esses fins, inicialmente, meios de dominagio e téticas que se caracterizavam sobretudo pelo paternalismo. Durante os agitados anos de 1945 ¢ 1946, a Federagao das Industrias do Estado de Sao Paulo — FIESP, e o Centro de Industrias do Estado de Sao Paulo — CIESP, estiveram engajados no apaziguamento das crescentes demandas dos trabalhadores através de dois esforgos relacionados. A FIESP e o CIESP instaram seus membros a contril para oO estabelecimento de Comissdes de Eficiéncia e Bem-Estar Social, com o objetivo de prestar servicos de cardter paternalista, principalmente através da venda de generos alimemticios € artigos de vestudrio a precos de custo. A FIESP e 0 CIESP formaram, também, a Comissao de Relagdes com o Piblico, destinada a modificar as demandas dos trabelhadores através de um servico de relacdes ptiblicas e doutrinagao, defendendo assim os interesses da indistria privada pau- lista. Para tanto, em junho de 1946 o Marechal Eurico Dutra, em resposta a pres- sdes pessoais de Roberto Simonsen ¢ Morvan Dias de Figueiredo, lideres da FIESP e da Confederagio Nacional das Indiistrias — CNI, assinou um decreto criando © Servigo Social da Indtistria — SESI, com o objetivo, a longo prazo, de comba- ter 0 reaparecimento de organizagdes auténomas entre as classes trabalhadoras e de construir no scio do operariado urbano uma base ideoldgica ¢ de comporta- mento politico em consonéncia com uma sociedade industrial capitalista. Varios meses depois, em conseqiiéncia de esforcos dos empresérios, o industrial Morvan de Figueiredo tornou-se Ministro do Trabalho, Indistria e Comércio, reunindo, por assim dizer, os mecanismos de controle do trabalhador ¢ a expressio dos interesses dos empresérios sob um mesmo ministério cartorial, fazendo dele o ministério capitalista por exceléncia. Porém, o impeto da organizagao das classes trabalhadoras © a expansio de sua consciéncia politica dificultaram esse tipo de manipulagao. Os primeiros sintomas da “Guerra Fria” coincidiam com uma nova demonstragao de forga do Partido Comunista nas eleigdes estaduais de janeiro de 1947, quando sua posigdo de quarto maior partido em termos de yoto popular foi reiterada, E, mais ainda, o Partido Comunista venceu a UDN, tornando-se o terceiro partido em termos de voto popular no importante Estado industrial de Sio Paulo; conseguiu também uma maioria dos membros nas eleigdes para a Ciimara Municipal na prépria Capital Federal. A frdgil “sociedade civil’, um legado do Estado Novo, nao era uma estrutura apropriada de contengio das classes trabalhadoras, tornando dificil a institucionalizagio do regime. Além disso, o PTB demonstrava niio ser péreo para o Partido Comunista, nem ideol6- gica, nem orgonizacionalmente,"? Naquele mesmo ano, a pedido do governo, o Partido Comunista foi declarado ilegal por decisio judicial. O Marechal Eurico 29 Dutra dissolveu também a Confederacdio dos Trabslhadores do Brasil — CTB, ¢ intervejo nas atividades de quatrocentos sindigatos em decorréncia de uma suposta Tigagdo desses com 0 jé ilegal Partido Comunista, além de promover um expurgo no funcio: uiblic ‘jo da expressio auténoma das classes trabalhadoras resultou em medidas autoritdrias dentro do sistema politico e do regime populista. Mesmo assim, cra possivel construir uma certa medida de consentimento ¢ de consenso a partir da nogdo de igualdade democrdtica de tedos os cidadios, exceto aqueles estigmatizados como “comunistas” — os anal- fabetos, que foram totalmente excluidos do processo eleitoral, e os trabalhadores Turais, cujo recrutamento para partidos de oposigdo era dificultado por estarem sob a tutela dos coronéis e de prdticas clientelisias. Em resumo, o populismo sustentava uma igualdade democritica urbana, por sinal muito seletiva.~ Um sistema “excludente” havia sido criado.** E mais, 0 baluarte populista do Mi tério do Trabalho, o peleguismo e os partides politicos populistas eram respons: veis pela incorporacao ao Estado das forgas sociais que haviam se desenvolvido em decorréncia da modernizacao. Eles eram simultaneamente responsdveis pela desagregacao e conformismo das classes trabalhadoras” e pela Iegitimagio da sociedade capitalista.” Em 1950 houve eleigSes com o Partido Comunista ainda ilegal ¢ os sindicatos ainda sob intervengao. Gettilio Vargas era 0 candidato do PTB, aliado ao Partido Social Progressista encabegado por Adhemar de Barros, protétipo do chefe popu- lista do industrial Estado de Séo Paulo, onde o PSP controlava os trabalhadores. © candidato em oposicéo a Getiilio Vargas era o Brigadeiro Eduardo Gomes, da UDN, que tinha o apoio de Plinio Salgado, antigo lider integralista que comandava o Partido de Representagao Popular — PRP. O PSD apresentou candidato a parte. Gettlio Vargas fez uma campanha entusidstica através do pais, Embora modificasse sua énfase dependendo da platéia, Getélio Vargas apresentava vérias posigdes bésicas em seu programa. Ele prometia retomar a campanha em favor da industrializagio nacionalista com 0 apoio do Estado, industrislizagao esta que havia sido negligenciada durante o regime do General Eurico Dutra, Getilio Vargas investiu contra a inflacdo e a falta de progresso real nos salérios dos trabalhadores urbanos, prometendo uma renovada campanha de protegao do proleiariado através de medidas de bem-estar social. Apesar de enfatizar a reforma social, cle silenciou quanto a assuntos rurais e fez referéncias esparsas, quase insignificantes, & reforma agraria ¢ @ sorte dos camponeses. Ele agiu assim na esperanca de conseguir votos dos chefes locais do PSD, 0s coronéis turais. Foi procurando os votos do PSD que Gettlio Vargas conseguiu fazer um acordo em Minas Gerais, centro do pessedismo, com Juscelino Kubitschek, jovem politico em ascensio ¢ candidato a governador do Estado. Getilio Vargas apoiou a sua candidatura e, em troca, foi capaz de fazer incursdes no voto pessedista, Apesar de seu compromisso com 2 industrializagio nacionalista e de defender © direito do Brasil de possuir e desenvolver seu petréleo ¢ recursos minerais, Gettilio Vargas deixou claro em sua campanha que aceiti de bom grado inves: fimentos esirangeiros, mostrando assim uma certa continuidade com as suas atitudes passadas e manobrando de maneira a no entrar em atrito com interesses que haviam sido fortalecidos no regime do Marechal Eurico Dutra, Getilio Vargas estendeu a mao ao governo americano ¢ a investidores privados, numa tentativa de reconciliagdo € visando a um programa de desenvolvimento semelhante a0 Kt) Plano Morshell, deixando claro, 20 mesmo tempo, que o pais nfo apoiaria os americanos em seu envolvyimento militar na Coréia, indo contra o apoio que o Marechal Eurico Dutra havia insinuado. Gettilio Vargas foi reconduzido ao governo, com uma ampla maioria de votos, por um bloco populista que se estendia de norte a sul do pais, reunindo politicos dos mais diversos partidos abrangendo o tradicional alinhamento de empresdrios locais, de interesses agrdrios, principalmente do sul, e das classes trabalhadoras urbanas. Getdlio Vargas formou um ministério heterogéneo, onde muitos dos membros eram empresirios e de formagao oligérquica, refletindo a composiy’io do bloco populista que o havia apoiado, e refletindo também o conjunto de diretrizes politicas que ele pretendia implantar. Contrariando as expectativas populares, ele deu ao PTB apenas uma cadeira no seu ministério, o critico Minis- tério do Trabalho, sublinhando tanto a posicZo central desse posto ministerial para a manipulagdo das classes trabalhadoras quanto o papel de legitimador do PTB. O PSD ficou com a maior parte dos ministérios, provando assim ser o partido do poder, Get s nomeou Jodo Cleofas para Ministro da Agricul- tura, um lider conservador da UDN de Pernambuco, Estado onde a pobreza tural cra escandalosa ¢ onde a UDN se assemelhava ao PSD, retribuindo dessa maneira o apoio que havia recebido da oligarquia rural. A marcante adesdo 20 PSD e o aparente desprezo pelo PTB implicaram nao apenas um conjunto de diretrizes politicas mais conservadoras do que 0 prometido durante a campanha, como também teve o efeito de que os militares tinham de uma repiblica “‘sindicalista” da qual Perén parecia ser 0 protétipo, indicando que havia uma disposigiio por parte de Getilio Vargas de trabalhar com a maioria pessedista do Congresso, Durante a segunda administrasao de Getulio Vargas, o sistema politico ¢ o regime sofreram mudangas significativas, © Congresso ficou mais forte e politica- mente mais importante, tornando-se, lado a lado com 0 Executive, um foco de articulagdo de interesses. O Congresso representava o lugar onde as diferentes fragées das classes dominantes tinham a possibilidade de compartilhar do governo junto como bloco de poder dominante. O Congresso tornou-se uma instituizgo basicamente regulada por conciliagdes e aliangas, pois exercia um certo grau de controle sobre as medidas politiess a adotadas pelo Executivo. As reivindicagdes do eleitorado do presidente como um todo ecoavam através de alianga PSD/PTB no Congresso, € os interesses de seus eleitores imediatos através de diretrizes econdmicas do Executivo.® No regime populista de convergincia de classes, o controle do Executivo tornava-se a questo politica central as lutas pela parti- cipag3o no Executivo favoreciam uma intensa personalizscSo da vida politica, personalizagao esta que se tornou um fator fundamental nas varias crises do perfodo. © Congresso tinha um papel duplo de representacdo. Por um lado, através da alianga PSD/PTB, pressées populares eram agregadas e canalizadas. Os partidos podiam pressionar o sistema, estruturar suas alianges e ganhar apoio popular em suas tentativas de alcancar o poder através do Congresso. Por outro lado, as classes de proprietérios de terra, que nao haviam sofrido muito durante © governo de Getulio Vargas, pois o sistema de autoridades e propriedade perma- fecia intacto mas dreas rurais, também apresentayam suas demandas politicas através do Congresso. Apesar da consolidacao das relages capitalistas de trabalho da proeminéncia econ6mica que os empresérios haviam conseguido durante a década de quarenta, a supremacia industrialfinanceira nfo se traduzia em 3 hegemonia nacional politica ¢ ideolégica. O “general Café” (que havia se diversi- ficado em bancos ¢ inddsirias) ¢ suas forgas subalternas agro-comerciais estavam ainda no poder", Os interesses rurais permaneciam econamicamente poderosos e politicamente ativos com um papel crucial exercido através do sistema bicame- ral mantendo a Cimara dos Deputados ¢ 0 Senado como focos de rotinizagio de demandas, de agregacao e institucionalizagao de pressdes populares, refletindo a crescente participagio politica das classcs médias ¢ trabalhadoras. ‘A segunda administragio de Geilio Vargas foi dividida em trés periodos.”” A primeira fase foi caracterizada por uma forte presenca empresarial, uma politica antiinflaciondria e uma procura entusidstica de ajuda econdmica dos Estados Unidos, Essa fase terminou em meados de 1953 sob a pressio conjunta de sindi- catos ¢ diversos grupos nacionalistas. O governo fracassou em sua tentativa de controlar a inflag3o, enquanto os beneficios da ajuda externa nio se concretiza- vam. Em meados de 1953 0 ministério foi reorganizado e comegou o segunda fase. Apesar de manter as suas opgdes abertas tanto em relagao ao bloco oligdr- quico-industrial quanto aos Estados Unidos, ao nomear Oswaldo Aranha, Vicente Rao ¢ José Américo de Almeida, Getdlio Vargas recorreu intensamente as classes trabalhadoras como um grupo de pressio. Ele substituiu o seu Ministro do Trabalho por Joio Goulart, um jovem militante do PTB do Rio Grande do Sul, seu protegido politico ¢ que assumiu o seu cargo com um enfoque muito mais radical, Nesta segunda fase, a crescente polarizagao politica ¢ ideolégica ‘em torno de assuntos nacionalistas ¢ trabalhistas andou passo a passo com uma crescente oposigéo do Exército a Getilio Vargas ¢, conseqiientemente, 2 Joao Goulart, culminando com o famoso memorando dos Coronéis assinado em feve- reiro de 1954 por mais de oitenta oficiais influentes, 0 que levou & demissao de Joio Goulart e do Ministro da Guerra General Estillac Leal, nacionalista ¢ getu- lista, A terceira fase foi inaugurada sob considerivel presséo militar, pressio esta fortemente apoiada por empresirios e pelo governo americano. Esta fase foi, verdade, uma Jonga sucesso de manobras getulistas defensivas ¢ com propé- sitos definidos e limitados, manobras que foram intensamente alacadas no Con- Bresso ¢ na imprensa por politicos mordazes e agressivos, como Carlos Lacerda,” figura de proa da UDN do Rio de Janeiro; essa fase culminou com um golpe de Estado e suicidio de Getilio em 1954.” Sob a presidéncia de Gettlio Vargas, a estratégia de acumulacio de capital ¢ industrializacao baseava-se principalmente em dois mecanismos de funcionamen- to: a manutengao da politica cambial ¢ controle das taxas cambiais, transferindo-se parte do excedente do setor agroexportador para o setor industrial, e uma contencao relativa dos saldrios reais, abrandada em seus efeitos sobre os t Ihadores pelo fato de as empresas estatais ¢ privadas produzirem bens ¢ servigas subvencionados, transferindo assim parcialmente o poder de compra para os traba- Ihadores assalariados,”* Getdlio Vargas tentava impor uma politica nacionalista de desenvolvimento capitalista, apoiado por uma combinagio de empresas industriais estatais e privadas.% Essa politica materializou-se na criago altamente controvertida da Petrobris™ ¢ na formulagéo de uma diretriz politica de desenvolvimento geral que tentava combinar o crescimento econdmico com a democracia social,” B mais ainda, o tipo de regime ¢ sistema politico almejado pelo Executivo sob as rédeas de Getilio Vargas, inclufa a reapresentagio de uma proposicio que j4 havia sido vencida uma vez. Essa proposigiio enyolvia a consolidagio de um 32 aparelho administrativo de Estado e formulador de diretrizes politicas, relative mente livre da influéncia exclusiva das classes dominantes, de mente desenvolvia-se um esforgo tendente a assegurar a implementagaéo de um bloco industrial-trabalhista apoiado pelo Estado e a acomodagao de interesses agrérios. Porém, como jé foi visto antcriormente, os empresfrios locais, longe de serem hostis & penetragio multinacional, até favoreceram-na.” Os empresdrios enfatizavam a campanha nacionalista muito mais em torno da produgao industrial em solo brasileiro, do que em torno da origem do capital ou da tecnologia envol- vidos. Os empresérios temiam também uma forma de desenvolvimento nacionalis- ta liderada pelo Estado, O processo de concentrac3o de capital desenvolver-se-ia ent&io [ado a Jado com um process de internacionalizaggo da economia. Além disso, 0 arranjo politico e econémico concebido por Getilio Varges trazia A tona outro sério problema, Os interesses multinacionais que estavam rein- gressando na economia brasileira apés sua retragio durante a Segunda Guerra Mundial seriam deixados nesse arranjo sem adequada representago nos canais formuladores de diretrizes politicas. Os interesses multinacionais tentariam agres- sivamente mudar essa situagéo, juntamente com interesses locais que temiam a as- cendéncia politica de Getilio Vargas e com forgas reaciondrias acuadas com as medidas sécio-democriticas com as quais Getulio Vargas parecia ameagé-las. Derrotado por outro golpe militar em 1954, GetUlio Vargas recusou-se a renun- ciar ¢ suicidou-se, Agindo dessa forma, ele explicitamente condenou, na sua carta-lestamento, 0 que percebeu ser uma conspiracéo antinacional de forgas reacicndrias apoiadas por interesses imperialistas.* Com o suicidio de Getilio Vargas em 1954 e a subseqiiente orientagao das diretrizes econdmicas por Eugénio Gudin,” Ministro das Finangas durante o intersticio presidencial de Café Filho, iniciava-se um periodo radicalmente dife- rente em termos de politica econémica. A direiriz politica do governo explicita- mente favorecia corporacdes multinacionais que concordassem em importar equi- pamento industrial para a producio de bens considerados altamente prioritérios pela administragao. Em 1955 0 governo de Café Filho apresentou a famosa Instru- go 113, da Superintendéncia da Moeda e do Crédito — SUMOC, permitindo que corporacSes multinacionais importassem equipamento por abaixo das taxas ¢ isentando-as da “‘cobertura cambial” necessit de maquinério, beneficio este no desfrutado por firmas Trasletras’® O breve governo de Café Filho, apoiado por uma alianca informal de centro-direita entre empresétios, politicos da Unizo Democratica Nacional (UDN) ¢ do Partido Social Progressista (PSP), visava & contengio das classes trabalhadoras e 20 estimulo da penetraczo de interesses multinacionais através de um entendimento politico com setores cafeeiros e financeiros. Apesar de todos os esforgos, o que foi, Por pouco tempo, um bloco de poder liderado pela UDN, ele foi derrotado nas eleigces seguintes por uma alianga de politicos do PSD ¢ do PTB, sindicalistas e empresérios. Essa alianca foi encabeada pela chapa Juscelino Kubitschek- Joao Goulart. A alianca PSD/PTB correspondia em termos gerais & formagio de uma “frente nacional” — que era uma coligaco de forcas sociais expressando © desejo de um processo de desenvolvimento nacional bascado na expansio da industria no Brasil. A alianga PSD/PTB incorporava a burguesia industrial, um setor da burguesia comercial especializado no comércio de produtos industriais locais e as classes médias progressistas (profissionais liberais, administradores), 33 assim como politicos urbanos ¢ sindicalistas."' Joio Goulart, herdeiro aparente de Getilio Vargas, baseava sua campanha no que parecia set uma continungio dos aspectos mais estatizantes, nacionalistas ¢ abertos a reformas dos diretrizes politicas da scgunda administragao de Getuilio Vargas. Enquanto isso, Juscelino Kubitschek fazia sua campanha em favor de um programa ambicioso de plane- jamento ¢ desenvolvimento, Porém a administragao de Juscelino Kubitschek, em- bora aparentemente baseada na mesma correlagio de forgas politicas do regime de Getilio Vargas, implementou uma politica de desenvolvimento que resultou em uma mudanca dristica no modelo de acumulagao, reforgando um padrio de “desenvolvimento associado™ com a realizago de scu chamado Plano de Metas de 1956 a 1961." Além disso, a estratégia de desenvolvimento adotada por Juscelino Kubitschek levou a uma redefinicdo do papel e fungao da maquina estatal ¢ de seu relacionamento com a socicdade civil, acabando por esgotar as possibilidades de combinagio das forcas politicas que haviam sido sua base de sustento original. Sob a cobertura das politicas desenvolvimentistas de Juscelino Kubitschek, tnedrava-se um pacote tecnoldgico direcionado as indistrias de proa incipientes como. por cxemplo, a industria automobilistica ¢ construgao naval, produtos quimicos ¢ fermacéuticos, maquinaria e produtos elétricos. papel e celulose. proporcionando a mairiz econdmica para o renovado desenvolvimento de uma burguesia associads."* Esperava-se que o acesso 4 tecnologia e técnicas gerenciais estrangciras, assim como a ajuda financeira transnacional, fossc solugdo para o problema da falta de acumulacio primitiva de capital ¢ também um tratamento de choque para uma economia essencialmente agro-exportadora que sofria uma escassez relativa de maquiniirio, equipamento ¢ know-how." A politica de desen- volvimento de Juscelino Kubitschek impulsionava as transformagoes que ja se faziam sentir na cstrutura sdécio-cconémica do Brasil como, por exemplo, uma maior sofisticacio do mercado interno, o crescimento das empresas, uma produ- gu mais completa. a expansio das indistrias basicas,” a tendéncia para urbani- Zacéo € concentra¢éo metropolitana, uma ¢ de desigualdedes sociais € regionai: to de Juscelino Kubitschek estabelecia as condigdes para a proeminéncia econd- mica do capital oligopolista multinacional ¢ associado. As relagdes internas do Brasil nese momento eram o resultado de uma combinacdo “original” ¢ mesmo sui generis, a seber, 3 convergéncia de classe populista ¢ sua forma de dominio interaginde com o capital monopolisia transnacional. Porém surgiram problemas 2 nivel institucional, a medida que se tornavam evidentes as inadcquacocs pol s ¢ administrativas a um modelo de desenvol- vimento to concentrado ¢ centralizado. O Congresso jnicialmente epoiaria Jusce- lino Kubitschek através da alianga PSD/PTB, aporando o seu programa de desen- volvimento “conduzido pelo Estado”, desde que o governo representasse os interesses da maioria parlamentar. Porém, a medida que o Executivo se envolvia ¢m sua politica de modernizayio, o Congresso consolidava a sua presenca politica através de uma atitude conservadora em relago ao Executivo ¢ inleresses indus- izantes que cle representava, A presenga conservadora do Congresso cristali- em decorréncia da légica dus aliungas ¢ da necessidade de conciliagdo, do clientelismo, dos interesses tradicionais ¢ dy oligarquia rural que até entio ele representava.”” Assim, as praticas do sistema politico populista faziam do Con- gresso um reduio comservador, que cra lento © impréprio para a articulagio 4 dos interesses multinacionais ¢ associados favorecidos pelo governo de Juscelino Kubitschek. © Congreso permitia também 2 dentincia da penetracao multinacio- nal e das condigées especiais nas quais ela se dava ¢ era, a0 mesmo tempo, © foro onde representantes das classes trabalhadoras se {a3 ouvir e participa- vam de um certo controle sobre as diretrizes politicas do Executivo. Outro sério efeito polftico consistia na falta de habilidade bésica do estado cartorial de funcio- nar satisfatoriamente, em conseqiiéncia da pequena burocracia firmemente esta- belecida em seu interior ¢ também de escaldes mais altos da administracao que agiam de acordo com interesses tradicionais, junto a um grande ndmero de “fun- ciondrios relativamente parasites designa ra postos piiblicos relativamente intiteis”.”” Os interesses multinacionais € associados tive de procurar outros fa- lores pata produzir diretrizes que levassem a sua consolidagéo econdmica. Jusceli- no Kubitschek proporcionou essa estrutura apropriada. Com efeito, com a implan- tago do seu Plano de Metas, e como pré-requisito para a sua realizacao, foi criada uma ampla gama de organismos de planejamento e consultor trabalho, os Grupos Executivos.” Eles formavam uma “administr coexistindo com 0 Executivo tradicional e duplicando ou substituindo burocra velhas ¢ iniiteis. Essa administracdo paralela, composta de diretores de empresas privadas € empresérios com qualificagées profissionais, os chamados técnicos, € por oficiais militares, permitia que os interesses multinacion: iados igno- Tassem os canais tradicionais de formulacao de diretrizes politicas € os centros de tomada de decisio, contornando assim as estruturas de representagao do regime Na realidade, isso significou incorporar ao sistema politico e ao regi- anais exclusivos de formulacao de diretrizes politicas industriais que permitiriam a coexisténcia de capital local e multinacional. E mais ainda, os novos interesses evitariam os mecanismos de controle e autoridade populistas, como 0 Congresso e a critica publica que poderia ser dirigida aos interesses multinacionais e associados por parlamentares da oposi¢lo. Isso ocorria pelo i riam parte da administragéo paralela nao so- i fem sob a cobertura ideolégica de uma “racionalidade técnic: as tornava imunes a pressdes partidérias ou privadas. Além disso, usando os mecanismos de “‘mobilizaggo de bias” e evitando a apuracao piblica, a adminis- tragdo paralela conseguia favorecer ou bloquear, de acordo com sua vontade, ‘© acesso & ajuda financeira e tecnolégica por parte de diferentes grupos e cor poragoes. Havia, no entanto, uma falha no esquema. A eficiéncia da administragio paralela dependia amplamente da atitude fae da boa vontade que o Executivo demonstrasse quanto a seu funcionamento, Tornava-se necessério, entéo, que os interesses multinacionais ¢ associados conseguissem o comando do Estado e 2 ocupagao de postos burocraticos na administracio. Foi sob o Plano de Metas que ocorreu o que podemos chamar de segundo estégio da “nacionalizagio formal” da economi Estado transformando-se em produtor direto de bens e servicos estratégicos para a infra-estrutura e tornando- se controlador indireto de substanciais mecanismos da politica econdmica. Po- rém 0 papel do Estado como fator de desenvolvimento conseguiu dissimular 0 dom{nio resol do capital. Apesar da expressiva presenga do Estado na economia, ele nio “orientav: nova estrutura de produgiio. Pelo contrario, era o capital transnacional que, tendo penctrado os setores dinfmicos da economia, controlava 35 © processo de expansio copitalista.™ A intervensio do Estado nn economia no s para atividades privadas era pelos grandes empresiirios. A perspectiva idcoldgica dos em- presirios industri Além disso, a ja considetdvel influéncia econd- mica do Estado oor 9 tradicional receio por parte do empresariado de uma crescente interferéncia nos negécios.“ Reafirmar a necessidade absoluta da posse privada dos meios de produgao tornava-se a bandeira de luta dos empresétios © até mesmo dos militares.” A politica de desenvolvimento de Juscelino Kubitschek acarretava também transformagdes na divisso social do trabalho, através da criacio de enorme classe trabalhadora industrial, de maior urbanizaggo do pajs, da expansio de atividades terciérias ¢ da formacao de novos segmentos de empregados assalariados. O popu- lismo, com suas caracteristicas clientelistas, cartoriais ¢ paternalistas, serviu, por um breve periodo, para reproduzir ideologicamente ¢ recriar politicamente idéia de um Estado neutro e benevolente, mito que seria destruido em princi- pios da década de sessenta.™ Através do populismo, as classes dominantes visa- vam também preservar a falta de diferenciagio sécio-politica que havia sido a caracteristica dos regimes anteriores, em uma tentativa de abafar o aparecimento de organizacdes auténomas das classes trabalhadoras. A consecucgao de tais obje- tivos foi reforceda por medidas autoritérias como, por exemplo, a persistente ilegalidade do Partido Comunista ¢ as restrigées sobre 0 sindicalismo auténomo. Contudo, a arrancada industrializante da administragao de Juscelino Kubitschek continuava, repidamente, eumentando o numero e a concentragao das classes trabalhadoras nos grandes centros urbanos, modificando dessa maneira os contor- nos politicos ¢ ideolégicos do regime e estabelecendo as pré-condigdes para a crise do populismo.”” No final da década de cingiienta, a luta de classes irrompia dentro da corrupta estruturs politica institucional que controlava as classes traba- thadoras com sua retrica de nacionalismo e sua atilude demagégica em relagio ‘a0 progresso econdmico.* O desenvolvimento industrial e a urbaniza¢ao haviam transformado 2 psicologia e a consciéncia coletiva das classes trabalhadoras, enfra- quecendo o dominio ideolégico que as classes dominantes tinham sobre as subor- dinadas. Além disso, a Ligas Camponecsas, que haviem aparecido cm meados ds década de cinquenta, mobilizavam os trabalhadores rurajs, e as primeiras tentati- vas cram feitas no sentido de sindicalizar as massas trabalhadoras rurais. O final da década de cinquenta testemunhou o florescer de atividades sindicais e de organizaOes de classes trabalhadoras, assim como de uma intensa mobilizacio estudantil ¢ de debates no interior das Forsas Armadas, debates estes que pola- rizavam as atitudes politicas em toro da questéo do nacionalismo com uma ténica distributive. A massa dos trabalhadores industriais e mesmo os campo- neses tiveram de ser finalmente reconhecidos como contenedores politices, apesar de continuarem a nio ser reconhecidos como forgas politicas legitimas pelas classes dominantes. Néo foi por acaso que durante o regime de Juscelino Kubits- chek as nopdes de seguransa militar interns se concretizeram; foi o préprio Jus- celino Kubitschek quem, ao falar @ Escola Superior de Guerra, insistiu para que essa se dedicasse ao estudo da potencisl ameaga subversiva de forcas sociais desencadeadas pela modernizaséo contra a ordem vigente. A énfase no consenti- mento levada adiante pela administracdo de Juscelino Kubitschek ndo deve ser lo- mada como um sinal de passividade por parte da burgucsia. De fato, o crescimento 36 do aparelho repressive do Estado, sua reorganizagaio e a crucial mudanga ideolé- gica e operacional na orientagio das Forcas Armadas, passando da defesa do territério nacional para uma estratégia de contra-insurreigao e hostilidade internas, assim como 0 uso intermitente de medidas coercitivas, foram caracteristicas desse perfodo, Nao se deveria permitir a retérica pluralista e liberal de meados da década de cinqlienta obscurecer essas caracteristic istragdo de Juscelino Kubitschek ficou claro que o seu iento”, apesar de suas realizages, havia se esgotado; 0 proprio governo admitiu implicitamente esse fato, adotando ostensivamente uma politica de “adiamento de problemas.’ O adiamento tatico era visivel; visava ‘a transferir para a administracao seguinte os problemas que se acumulavam sem serem resolvidos. O adiamento estratégico consistia em ter conseguido uma trégua com os setores rurais reaciondrios enquanto permitia um crescente dese- quilibrio entre os sistemas urbano-industrial e rural-agricola, aumentando a desi- gualdade regional com o fortalecimento econdmico do centrosul as expensas do resto do pais. O adiamento estratégico permitia também que as instituigdes politicas continuassem a funcionar, principalmente através da politica de cliente- la, obscurecendo 0 préprio sentido dos partidos politicos ¢ deixando-os inoperan- tes e incapazes de obter uma coeréncia em seus programas. No inicio da década de sessenta, a convergéncia de classes populistas no poder ea forma populista de dominio foram desafiadas por duas forgas sociais divergentes, que haviam surgido durante a concentrada industrializagao da década de cingiienta, propiciada pelo governo Juscelino Kubitschek. Essas duas forcas sociais fundamentais eram os interesses multinacionais e associados € as classes trabalhadoras industriais, cada vez mais incontrolaveis. As duas forges em con- junto, embora opostas, minaram, no principio da década de sessenta, 0 mito da existéncia de um Estado neutro desenyolvido pela administragao de Juscelino Kubitschek. Os interesses multinacionais e associados achavam-se em proemir cia econdmica no final do perfodo de Juscelino Kubitschek ¢ durante @ adminis- trago de Janio Quadros, como seré visto no Capitulo II. Para evitar os controles do Congresso e a pressdo popular, os interesses multinacionais ¢ associados es- timularam a criagiio de uma administragao paralela, a qual provia a representac3o exclusiva de tais interesses. Além disso, esses interesses foram endossados pelos ideais antipopulistas e antipopulares da Escola Superior de Guerra, cujos valores modernizantes eram, em linhas gerais, congruentes com os interesses multinacionais ¢ associados, como seré visto pormenorizadamente no Capitulo Ill. Enquanto isso, as classes trabalhadoras industriais, como parte das chamadas classes po- pulares,’ fizeram do Congresso uma plataforma vez mais eficiente para a expressao dos seus interesses em oposi¢ao direta ao bloco oligérquico industrial, ¢ contra os interesses multinacionais ¢ associados. Com as crescentes demandas nacionalistas ¢ reformistas pressionando o Executivo e com 0 Congresso também funcionando como um foco de expressio dos interesses regionais e locais, tornava- se imperativo para os interesses multinacionais ¢ associados ter 0 comando politico da administragio do Estado, Isso foi parcialmente conseguido com a ascensiio de Janio Quadros a0 poder. Sob grande pressiio, cle tentou resolver as contradigoes do regime através de uma manobra “Bonapartista civil",!°! apés somente sete meses no jo, como mostra o Capitulo 1V. A sua rentincia nao teve a reper- cussiio desejada e Joio Goulart tornou-se presidente inesperadamente, liderando um bloco nacional-reformista.’” Uma situagdo radical ¢ altamente desfavordvel 37 desdobrou-se para o bloco multinacional e associado que langou uma campanha, apresentada nos capftulos V, VI, WII e VIII, para conseguir um novo arranjo politico que expressasse os seus interesses entiio bloqueados. Essa campanha en- globau a msioria das classes dominantes, incluindo a chamada burguesia “‘na- cional”, da qual tantos politicos e intelectuais ¢ até mesmo oficiais militares esperavam um posicionamento 1 nacionalista ¢ reformista, Contrariando tais expec- tativas, a burguesia “nacional” assistiria passivamente e até mesmo apoiaria a quéda de Joio Goulart, condenando na pratica a sua alternativa sécio-econémic distributiva e nacionalista e ajudando, a despeito de sua propria condi¢ao, a ancorar firmemente o Estado brasileiro a estratégia global das corporagdes mul- tinacionais. NOTAS BIBLIOGRAFICAS 1. O termo oligarquia, da forma em que & sudo nesta anilise, engloba capitalistas com interesses comerciais exportadores, la- tifundisrios ¢ elementos da burguesia agri ria, designando 9 circulo restrito das classes dominantes ds Republica Velha € que ain- da eram economicamente poderosos duran: te a Segunda Republica. Sobre 0 conceito de oligarquia ¢ 2 ques- tho da legitimacdo oligarquica. vide Alain ROUQUIE. Oligarquia 0 burguesia: ef pro- blema de fos grupos dominantes ens Amé- rica Latina. Bielefeld, mar. 1978. Mimeo- srafodo. 2. Para uma anilise do periodo, vide (2) Fernando H. CARDOSO & Enzo FALET- TO. Dependéncia € desenvolvimento na América Latina. Rio de Janeiro. Zshar, 1970. (b) Luciano MARTINS. Pouvoir et développement économique, Paris. Ed. An- thropos, 1976. Cap. 1. 3. Sobre 0 conceito de bloco de poder, vi- de Nicos POULANTZAS. Political power and social classes, London, NLB, 1975. p. 141, 220.45, 4. Octavio IANNI et alii. Processo politico € desenvolvimento econbmico. In: Politica € revolugéo social no Brasil. Rio de Janci- 10, Civilizag3o Brasileira, 1965, p. 16417. 5. Sobre 2 origem da indGstria, vide Sérgio SILVA. Exponsio cafecira e origens da in- diistria no Brosit. Rio de Janeiro, Ed, Alfa- Omega, 1976. crescimento da inddsiria foi extraordi- nario, Os estebelecimentos indusitiais subi- 38 ram de 600 em 1890 para 14.000 em 1920, Peter EVANS. Dependent development: the alliance of multinational, state and lo- cal capital in Brazif. Princeton, Princeton Univ. Press, 1979. p. 104. Em 1930, cerca da metade do capital estrangeiro existente no Brasil era_brité nica € 0 quarta parte americano. Vide chard S. NEWFARMER & Willard F. MUELLER. Multizational corporations in Brazil and Mexico: structural sources of economic and non-economic power. Wash- ington, US Government Printing Office, agosto 1975. p. 96. (Relatério para o Sub- Committee on Foreign Relations do Senado dos Estados Unidos). 6. A partir de 1920, « regido sul respon- sabilizava-se por m da produsdo agriria total cabia também Aquela regio. Enquanto isso, 0 nordeste a regido leste produziam menos de 43%, Vide (a) Paulo de Assis RIBEIRO. Quem elege quem. Rio de Janeiro, IPES, 1962, p. 4. Mimeografado. (b) P. EVANS, op. cit. Cap. 2 ¢ 3. (c) Warren DEAN. The industrialization of Séo Paulo 1880-1945. Austin, Univ. of Texas Press, 1969. 7. Sobre 0 papel desses empresirios, vide (a) Eli DINIZ. Empresério, Estado e capi- talismo no Brasil 1930-1945, Rio de Janci- 10, Paz e Terra, 1978. (b) Warren DEAN. op. cit. (c) Luciano MARTINS. op. cif Cop. 2. Uma grande paric desscs emprestrios, seus filhos © outros parentes cstariam na lideranga do golpe de 1964, 8. O conceito de “Bonapartismo” ¢ usado como um cinone de interpretagdo histéri- ca ¢ niio para se referir & combinagiio mi- litr-imperial concreta que 1emou o poder na Franga, Vide Quentin HOARE & Geoffrey NOWELLSMITH. Selections from the prison notebooks of Antonio Gramsci. London, Lawrence & Wishart, 1973. p, 216-17, 227, O termo “Bonapartis- mo” @ usndo em relagio a reestabilizasdo do equilibrio politico ameagndo, isto 6, a supremacia das classes governantes através da intervengio politica, a qual reprime o movimento polftico, O acordo entre as eli- tes civis dos Estados de Sao Paulo e Mi- nas Gerais com o objetivo de se unirem e controlarem a situagdo representou a intervengio repressora mencionada. Os go vernadores desses dois Estados agiram co 0 “partidos”, acima e além dos préprios partidos. 9. (a) E. DINIZ. op. cit. p. 5051, ‘b) Francisco de OLIVEIRA. A economia bra- sileira: critica @ razio dualista. SelecGes CEBRAP, Sio Paulo, (1):9, Ed, Brasilien- se, CEBRAP, 1975, 10. Getilio Vargas e a burguesia industrial abracaram uma ideologia tutelar, visando, porém, uma transformagdo parcial da so- ciedade. Sobre 0 conceito de ideologi. telar, vide Samuel HUNTINGTON & ment H. MOORE. Authoritarian politics in modern society: the dynamics of estaBli- shed one-party systems. New York, Basic Books, 1970. p. 510. ‘Outra forma de controle que desmentia 2 eriagio de um Estado burgués em 1930 foi a recusa do sufrdgio universal & po pulagio brasileira, Até 1933, foram regis- trades 1.500.000 eleitores, aproxim: te 4% de populasio total. Vide Paulo de Assis RIBEIRO, op. cit. p. 5. Até mesmo os Tenentes, que com seu {mpeto modernizador haviam sido os pon- tas de Ianga da Revolugdo de 1930, e que poderiam ter sido o fator ideolégico © or ganizocional de coalizio na formagio de um bloco antioligirquico © de classes mé- dias ¢ industriais no poder, foram rapida- mente absorvidos pela politica regional ou pela hicrarquia militar, ow foram desmem- brados em decorréncia de futas faccion rias, 11. Sobre as condigdes que leyaram & for- * mag&o do “estado de compromisso", vide (a) Juarez Brundia LOPES, Desenvolvi- mento ¢ mudanga social: formagzo da so- ciedade urbano-industriat na Brasil, Sio Paulo, Companhia Editora Nacional, MEG, 1976. (b) Francisco WEFFORT, El popu- lismo ¢n Ja politica brasilefia. In; BERNA- DET, Jean Claude et alii, B hoy. Méxi- ca, Siglo XX1, 1968. p. 64-71. 12. Para uma andlise dos varios grupos eco némicos conflitantes, dos choques entre as classes sociais ¢ do sistema politico do pe- rfodo entre a Reyolugio de 1930 ¢ o Ey tado Novo, vide (a) E gard CARONE. A repiiblica nova: 1930-1937. Sio Paulo, be FEL, 1976, p. 21-77, 81-151, 155-279. (b) Luiz Wemeck VIANNA. Liberalismo e sin. dicalismo no Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976. Cap. 5, 4 € 5. (©) Moniz BAN- DEIRA. Presenca dos Estados Unidos no Brasil. Rio de Janeiro, Civilizagdo Brasilei- ra, 1973. Parte 3. (d) Glauco CARNEIRO. Histéria das revoluges brasileiras. Rio de Janeiro, Ed. © Cruzeiro, 1965. V. 2, Cap. 16, 17, 18 ¢ 19. (¢) José Maria BELLO. A history of modern Brazil 1889-1964. Stan- ford, Stanford Univ. Press, 1968. p. 279-96, 13. Para a sucessio de conflitos politicos e soci conspiragSes € tentativas de golpe, vide (a) Leéncio BASBAUM, Histéria sin- cera da repiiblica: de 1930 @ 1960. Sio Pau- Jo. Ed. Fulgor Lida., 1968. p. 13-101. (b) Edgard CARONE, op. cif. p. 285-378. 14, Os integralistas foram a versio brasi- lcira dos fascistas, Vide (a) Hélgio TRIN- DADE. A agio integralista brasileira: as- pectos histéricos ideolégicos. Dados, Rio de Janeiro (10):25-60, IUPERJ, 1973, (b) Hélgio TRINDADE. Integralismo: o fas- cismo brasileiro na década de 30. Sto Pau- lo, DIFEL, 1974. (c) José CHAZIN. O in. tegralismo de Plinio Salgado. Sic Paulo, Ed. Grijalbo, 1978. (d) Evaldo Amaral VIEIRA. Oliveira Vianna & 0 estado cor- porativa, Sio Paulo, Ed. Grijalbo, 1976. 15. Vide Eduardo de Oliveira ¢ OLIVEI- RA, Movimentos politicos negros mo ini- cio do século XX no Brasil ¢ nos Estados Unidos. Caderno de estudos sobre a con- tribuigéo do negro na formagae social bra- sileira, Rio de Janeiro, Univ. Federal Flu- 39 minense, 1976. p. 610 (Instituto de Cién- cias Humanas ¢ Filosofia). 16. A Aliana Nacional Libertadora, fun: dada em 1935 logo spés a criagdo de fren- tes populares na Europa, alianca esta que foi considerada ilegal no mesmo ano, tor nowse a primeira organizscao politica na- cional das classes populares. Vide Ronald H. CHILCOTE. The Brazilian communist Party — 1922-1972. Oxford, Oxford Univ. Press, 1974. 17. O. IANNL op. cit. p. 49. 18. Phillipe C. Schmitter fez um estudo aprofundado do corporativismo associative mostrando-o como uma forma de articula- gio © exclusdo de interesses, o qual ¢ ex- tremamente valioso para 0 entendimento desse periodo. Vide Interest, conjlict and political change im Brazil, California, Stan- ford Univ. Press, 1971. 19. Para uma anilise completa de uma supervisio politicamente autoritéria do mo- vimento trabalhista brasileiro ¢ das classes trabathadoras, vide Kenneth Paul ERICK- SON. The Brazilian corporative state and working class politics. Berkeley, Univ. of California Press, 1977. 20, Vide Régis de Castro ANDRADE. Pers- ptctives in the study of Brazilian popu- lism. LARU Working Paper, Toronto, (23):9-17, 5. ed., 1977. 21, O conceito de bloco histérico € toma- do a Anténio Gramsci. Em linhas gerais, um bloco histérico pode ser definido co mo a “unidade de estrutura ¢ superestrutu- ra, de elementos oposios ¢ distintos", “ou s¢ja, 0 conjunto complexo, contraditério ¢ discordante das superestruturas é a re- flexio do conjunto das relagdes sociais da produgio”. Vide (3) Q. HOARE & G. NOWELLSMITH. op. cit. p. 137-38, 356- 57, 366, 376-77. (b) A. GRAMSCI. Hl mate- Fialismo storico. Roma, Ed. Riuniti, 1971. p. M7. © conceito de bloco histérico € empre- gado como 2 “articulagio interna de uma dads situagio histérica”, isto ¢, a integra- $80 © incorporacio [articulagio] de dife- rentes classes sociais (opostas) ¢ categorias acciais [distintas) sob a lideranga de uma classe dominante ou bloco de fragées. Essa clusse dominante ou bloco de poder conse- gue assegurar 0 consenso € o consentimen- to dus classes © grupos subordinados ¢ 40 subalternos em decorréncia de sua capaci dade de definir ¢ manicr as normas de ex- cluso social ¢ politica. Assim, a traducio politica da mogiio de bloco histérico ¢ de hhegemonia. No entanto, nao se deve en- tender hegemonia como uma mera legitima- ¢80 ov aquiescéneia a um conjunto de va- lores, pois ela envolve o exercicio de di- ferentes formas de coergio na propria de- finigio das basicas relagGes classistas de forga. Sobre hegemonia e bloco hist6rico, vide (a) Hughes PORTELLI. Gramsci y ef bloque histérico. México, Siglo XXI, 1979. p. 70-91, 119. (b) Maria Antonict MACCIOCHI. A favor de Gramsci. Rio de Janeiro, Paz ¢ Terra, 1976, p. 148-50. © bloco histérico € entio aufgehebt (preservada e encoberto, anulsdo ¢ repro. duzido) pelo Estado, isto €, pela “socieda- de civil ¢€ politi Vide (a) Christine BUCI GLUCKSMANN. Gramsci ¢ fo sta- fo. Roma, Ed. Riuniti, 1976. p. 63-88, 95- 140. (b) B. de GIOVANNI, V. GERRATA- NA & L. PAGGI. Egemonia, stato, parti- to in Gramsci. Roma, Ed. Riuniti, 1977. 22. A burguesia industrial ¢ os novos in- teresses ligados ao desenvolvimento empre- sarial precisavam de uma forga nova — 0 “Novo Estado“ — independente de qual quer compromisso ou condisio anteriores, forga esta que se tornaria o poder tutclar da nagio. Nio se esperaya que o “Novo Estado" fosse o “Srbitro” das classes j4 mencionadas, mas sim o supervisor de um bloco histéri ado pela burguesin, no qual os inleresses agrirlos tradicionais e outros fatores de pressio fossem acomoda- dos. O Estado, aparentemente colocado aci- ma ¢ além das classes e diferencas regio- nais, tornou-se o partido de todo o bloco dominante, Contudo, o apelo burgués quan- to @ ume soluggo burocritico-militar para es problemas sociais © econdmicos di tisfcita com a exclusiva “dominagio de scus interesses. Ela queria que seus pré- prias elementos ¢ id¢ias governassem. Con- seqiientemente, durante o Estado Novo (1937-1945) ¢ mesmo apés, figuras empre- sarlais tiveram posigdes-chave no Executi- vo. Somente apds a queda do Estado Novo € que os politicos tentaram gencralizar as Propostas particularistas do empresariado, A forma pela qual o Estado Novo foi apro- vado pola burguesia pode ser vista cm Ed- ord CARONE, A ferceira reptiblica: 1937. 1945, Siio Paulo, DIFEL, 1976. p. 349-97, Atengio especial deve ser dada a carta aber- ta a Getdlio Vargas publicada cm O Esta- do de Sia Paulo, em 19 de abril de 1942, assinada pela Federagio das Indistrias, pe- la Associagiio Comercial de Sio Paulo ¢ por um grande némero de corporagées tintas. Vide também (a) Régis de Castro ANDRADE. op. cit. p. 15 ¢ nota biblio grafica 23. (b) Eli DINIZ, op. cit, Cap. 2, p. 94.109, 23. O termo “convergéncia de classes” apli- case a uma siltagdo onde diferentes clas- ses se acham reciprocamente acomodadas no aparelho do Estado com um relaciona- mento contraditério ¢ competitivo. Elas sao basicamente reconcilidiveis em decorréne de sua ligacdo estrutural, com dominio politico servindo de mediador, Sobre essa convergéncia de interesses, vide Hamza ALAVI, The state in post colonial socie- ties: Pakistan and Bangladesh. New Lejt Review, London, (74):59-82, s.d. Este ca- pitulo foi estroturade basicamente @ partir da anflise de Hamza Alavi. Sobre 2 forma histérica concreta de tal convergéncia, vide L. MARTINS. op. cit. p. 114-20. Sobre a supremacia dos interes ses industriais, vide E. DINIZ. op. cit. Cap. 45, 24. Para interpretasio do papel politica € econdmico do Estado Novo, vide (a) E. CARONE, A terceira... op. cit. p. 134 et passim. (b) L. BASBAUM. op. cil. p. 105-06, (c) E. CARONE, O Estado Novo: 1937-1945. Sio Paulo, DIFEL, 1976. (d) E. DINIZ. op. cit. Cap. 5 © 6. (e) L. MAR- TINS, op. cit. p. 202-56, 288-309. 25. Pera interpretagdes do papel pollti ico des Forgas Armadas durante esse vide (a) Edmundo CAMPOS, Em busca de identidade: 0 exército e a politica na so- ciedade brasileira, Rio de Janeiro, Foren- se Universitéria, 1976. (b) E. DINIZ. op. cit, p, 292.95, 26. Vide (a) Magda FRITSCHER. Desar rollo de Ja politica nacionalista en Bra: Latino América; anudrio de estudios latino- amsericanos, 3. 1. (4):135, 1971. (b) Teotd- nio dos SANTOS. El nuevo coricter de In dependéncia. In: MAR, José Matos ed. La crisis del desarrollismo y la nueva depen- dencia. Buenos Aires, Amorrortu Ed., 1969, p. 64-5 (Instituto de Estudios Peruanos). (c) Nelson Mello de SOUZA, Subdesenvol- vimento. industrial. Cadernos Brasileiros, Rio de Janciro, 1967. p. 2834, (d) Maria da Conceigio TAVARES, Da substituigio de importacdes co capitatismo financeiro. Rio de Janeiro, Zahar, 1975, p. 67-79. (0) W. DEAN. op. cit. (f) P. EVANS. op. eit, 21. Sobre o papel cambiante do Estado, vide (a) P. EVANS. op. cit. p. 85-90, (b) E. DINIZ, op. cit, Cap. 6 ¢ 7. (c) Octavio JANNI. Estado y planificacién ecandmica en Brasil: 1930-1970. Buenos Aites, Amor- |, 1971. p. 18-70. 28, Vide (a) Paulo SINGER. A politica das classes dominantes. In: Politica e revolu- go... op. cit. p, 86-90. (b) Francisco de OLIVEIRA, op. Essa nacionalizagao foi apoinda de fato e até mesmo conduzida pelos préprios industriais, Vide E, DINIZ, op. cit. p, 103.05. 29. Régis de Castro ANDRADE, op. cit. po 30. E. DINIZ. op. cit. p. 767. 31. Vide (a) Evaldo Amaral VIEIRA. op. cit. Cap. 5 e 4. (b) E. DINIZ. op. cit. p. 94109. 32. Sobre o canceito de “mobilizasio de bias”, vide Peter BACHRACH & Morton S. BARATZ. Two faces of power. The American Political Science Review, s. \., 56:63242, Dec. 1962. 33. Em meados da década de trinta e int- cio da década de quarenta, foram criadas ou reativadas quatro categorias de érgios com © objetivo de apoiar 2 expahsio in- dustrial: a) os institutos destinados a regular 0 consumo © a produgao nos setores agririos © extrativos; 'b) organismos destinados a aplicar me- ne de incentivo para a industria pri- como a Comissio de Similares, o Consetho Nacional de Politica Industrial ¢ Comercial, 0 Conselho Técnico de Ecano- mia © Finangas, a0 passo que industeiais dirigiam agénciaschave de tomada de de- cisio como, por exemplo, a Carteira de Ex- portasio © Importagio do Banco do Bra- sil — CEXIM; 41 ©) entidades que visavam a implemen: tar a expansio ou inspegdo de servigos b& sicos de infra-estrutura para a industriali- zasie, como era o caso da Comissio do Vale do Rio Doce, Consclho de Aguas ¢ Energia, Comissio Executiva do Plano Si- denirgico Nacional, Comissio do Plano Ro dovidrio Nacional, Comissio de Combus- tiveis ¢ Lubrificantes, Conselho Nacional de Ferrovias ¢ Comisséo Nacional de Ga- como mineragio e siderurgia. Vide (a) Maria do Carmo Campello de SOUZA. Estado e partidos politicos no Brasil 1930 a 1964. Sio Paulo, Ed. Alfa- ‘Omega, 1976, p. 98-100. (b) E. DINIZ, op. cil, p. 151, notes bibliograficas 1 © 2, 44, E, Diniz, op. cit. p. 10607, 35, Entre 1930 € o final do Estado Novo em 1945, varias organizagées de classe fo- ram criadas como, por exemplo, a Federa- géo das Industrias do Estado de Sio Pau- lo — FIESP, o Centro de Indiistrias do Es- tado de Sio Paulo — CIESP, 0 Centro In- dustrial do Rio de Janeiro ¢ as vérins Ax sociagées Comerciais do Rio de Janeiro, Sio Paulo, Parand, Rio Grande do Sul, Mi nas Gerais ¢ Pernambuco, assim como a Confederagao Industrial do Brasil e 0 Con- selho Nacional de Inddstrias, Seus Iideres exam Roberto Simonsen (CBI), Euvaldo Lo- di (CNI), Joao Daudt d’Oliveira (Associa- so Comercial), Ricardo Xavier da Silvei- ra (Centro Industrial do Rio de Janeiro) ¢ Vicente de Pavla Galliez. ‘%6. Entre esses institutos ou conselhos de representagio estavam os do agGcar ¢ do Sicool, da mandioca, trigo, algodio, café, fumo, sisal, Sleos vegetais, vinho, pinho, came e sal. Alguns produtores se faziam representar por Conselhos Regionais tais como o Institute do Arroz, a Federasdo dos Produtores de Li, 0 Instituto da Carne do Rio Grande do Sul € 0 Instituto do Cacau da Bahia, 37. (a) M. Carnpella de SOUZA. op. cit. p. 85. (b) Philippe SCHMITTER. ap. cit. p. 181-83. (c) E. DINIZ. op. cit. Cap. 4 6. 38. E. DINIZ. op. cit. p. 94109. As liga ges Ideoldgicas © politicas entre 0 nacio- ‘nalismo, o desenvolvimento industrial ¢ © autoritarismo foram englobadas pela ideo- 42 login de desenvolvimento de Roberto Si- monsen, ideologin esta forlemente influen- ciada por Mihail Manoilesco. Apesar de hayerem rejeitado a adogio de uma ideo logia explicitamente integralista ou franca- mente fascisia em decorréneia de scus as- pectos de mobilizngiio ¢ do clevodo gra de autonomia que tal ideologia legava ao aparelho burocriticomilitar do Estado, os industrisis adotaram muitos de seus prin- fpios econdmicos e politicos. Porém & im- portante observar que muitos empresérios @ profissionais come Pupo Nogueira, Ant6- nio Gallotti, Conde Matarazzo, Rodolfo Crespi e Miguel Reale eram integrali apoiavam essa ideologia. , 39. O DASP foi criado em 1938 © sua fi gurachave era Lufs Simdes Lopes, que se tornaria um dos diretores da Hanna Mining Co, Vide 0 Capitulo TIT deste livro, Para um relato sobre o DASP, vide (a) Marin Campello de SOUZA. op. cil. p. 968. (b) Lawrence GRAHAM. Civil service reform in Brazil. Austin, Univ. of Texas Press, 1968. p. 27-30. 40. T. dos SANTOS. op. cit. p. 23. Sempre que figuras burocréticas ou militares eram colocadas em posigées de lideranga dentro do novo aparelho do Estado, posigées apa- rentemente dominantes, tais figuras se mos- uravam na realidade “funcionais” € em con- seqiiéncia verdadeiramente subalternas, em decorréncia de seu compromisso com @ or- dem 0 ptogresso empressrial. Ao envol ver 0 desenvolvimento industrial em uma trama burocriticomilitar, 0 Estado dava a impressio de ser uma entidade onipresen- fe, considerado tanto como um adminis trador imparcial quanto um franco benfei- tor das “classes produtoras” (os industriais) e das classes trabalhadoras. Vide (a) P. SCHMITTER. op. cit. p. 181-82. (b) E. CARONE. A terceira.... op. cit. p. 349-52. © bioco industrialfinanceiro entrinchei- rouse em torno da pericia da burocracia e do Exército, apoiado por um aparelho es- tatal cujo quadro de funciondrios provinha das classes médias, ss quais agiam objeti- vamenie como classes auxiliares, O cresci- mento indusirisl equiparado a0 desenvol- vimento nacional reforsou 0 mite de um lanciamento ideal por parte do Estado. Pela mesma razéo, a nosio de consirugio nacional recebeu um contetido preciso & definido de classe. O Estado, ocultando a supremacia da burguesia, representou en- to um papel nacionalista enquanto desem- penhaya uma funcdo de classe empresa- rial. Sobre 0 conceito de empresério, vide Fernando H. CARDOSO. Empresdrio in- dustrial e desenvolvimento econénsico. Si0 Paulo, DIFEL, 1972. Cap. 1, 3 4. 41, Sobre © papel das Forgas Armadas, vi- de (a) Maria Campello de Souza. op. p. 101-04. (b) E. DINIZ. op. cit. p. 274. 42. Sobre o conceite de “sociedade politi. ca”, vide (8) Q. HOARE and G. NOWELL- SMITH. op. cit. p. 12, 206-09, 268. (b) H. PORTELLI. op. cit. p. 27-44. 43. Vide (a) P. EVANS. op. cit. Cop. 3, (b) E. DINIZ, op. cit. Cap. 3, 5 € 6 (c) W. DEAN. op. cit. p. 209-39. 44. Para uma descriggo da legislagio tra- balhista brasileira, vide (a) José Albertino RODRIGUES. Sindicato e desenvolvimen- to no Brasil. So Pavlo, DIFEL, 1968. (b) Kenneth ERICKSON. op. cit. p. 27-46. 45, Vide (a) Richard BOURNE. Gettilio Vargas of Brozif 1883-1954. London, Char- les Knight & Co, Ltd., 1974. Cap. 4 (b) L. MARTINS. op. cit. p. 309-20. (c) Moniz BANDEIRA. Presenga... op. cit. Cap. 46, Sobre 0 conceito de “sociedade civil”, vide (a) Q. HOARE & G. NOWELL- SMITH. op. cit. p. 1213, 235-38, 245. (b) H. PORTELLI. op. cit. p. 13-26, 30-44. 47. (a) E. DINIZ. op. cit. Cap. 6. (b) P. SCHMITTER. op. cit. p. 182-85. 48, Vide Caio Navarro de TOLEDO. ISEB: fébrica de ideologias: andlise de ituiggo. Tese de doutorado. Fa- culdade de Filosofia, Letras ¢ Ciéncias de Assis, 1975. Mimeografado. 49. Para um entendimento da profunda li Bagdo entre 2 inddstria local © os interes- ses multinacionais em decorréncia da de pendéncia tecnoldgica, vide Werner HAAS, A contribuigao do know-how estrangeiro & indistria brasileira, Sdo Paulo, Ed. BANAS, 1961, 50. Sobre o papel de lideranga do indus- trial local em sua associagio com o capi- tal estrangeiro e seus esforgos para estimu- lar o investimento estrangeiro no Brasil, vi- de E. DINIZ. op. cit. p. 160-68. SL. P, SCHMITTER. op, cit, p, 18283, 52. Sobre o significado e usos das nogdes de estado cartorial ¢ estado patrimonial, vide (a) Raymundo FAORO. Os donos do poder. Rio de Janeiro, Ed. Globo, 1958, (b) Riordan ROETT. Brazil; politics in a Patrimonial society. Boston, Allyn & Ba- lism. [0: VELIZ, Cléudio, ed. Obstacter to change in Latin America. London, Ox- ford Univ. Press, 1965. p. 16287. 55. Sobre 0 ide A. STE PAN. The mil changing patterns in Brazil. Princeton, Princeton Univ. Press, 1971. p. 87, 117, 128. Para uma anilise das atitudes cambien. tes dos militares, vide (2) R- BOURNE. op. cit. p. 114-18. (b) Lourival COUTI- NHO. O General Goes depoe. Rio de Ja- neiro, Ed, Coelho Branco, 1955. p. 395. 463. 54. L. MARTINS. op. cit. p, 132. Ainda nio existe uma andlise histérica apropria- da do PSD ¢ do PTB. Sobre a UDN, vide Octiévio DULCI. A Unido Democrdtica Nacional e 0 antipopulismo no Brasil. Dis sertag3o de mestrado. Belo Horizonte, Univ. Federal de Minas Gerais, 1977. 55. O populismo tem recebido varias in- terpretagGes. Para efeito ds presente ané- lise, seré considerado o populismo como © bloco histérico construido pelas classes dominantes dentro das condisées parti. culares do Brasil, isto é, a integrasio © ar quico-industrial. Mesmo sendo a forma que tentou encobrir a supremacia de clas- se dese bloco de poder, 0 populismo per- mitiu a existéncia de um espaso politico ‘no qual as classes trabelhadoras foram ca- pazes de expressar algumas de suas reivin- dicagdes € de desenvolver formas organi- zacionais que tentaram quebrar a ca de-forga ideolégica ¢ politica populista. Vi- deo Capitulo IV deste livro. para maiores discussdes sobre o assunto. Para anilises sugestivas do populismo, vide (0) Michael Lee CONNIFF. Rio de Janeiro during the great depression 1928-1937: social reform and the emergence of populism. Tese de doutorado, Stanford Univ., 1976. (b) Ré& gis de Costco ANDRADE, op. cit. (c) Transcrigdes da conferéncia de 1978 na Uniy. de Toronto: Populism and concep: tualization of popular ideologies. LARU 43 Studies, Toronto, 3(2-3), s.d. Edigio espe- cial. (d) Ernesio LACLAU. Politics and ideology in marxist theory: capitalism, fas- cism, populism. London, NLB, 1977. p. 145.99. (¢) Fernando Henrique CARDO- SO. Ideologias de la burguesta industrial en sociedades dependientes. México, Siglo XX, 1972. () Francisco WEFFORT, Et populismo en la politica brasilefia, Int Brasil hoy. op. cit. 56. A deposicio de Geuilio Vargas foi au: xiliada pelo embaixador americano Adolf Berle, que desencadeou a série de aconte- cimentos que levou a derrubada do poder. Vide Arthur SCHLESSINGER. A thou sand days. Estados Unidos, Dell Paperba- ck, 1967. p. 66. 57. M. CAMPELLO, op. cit. p. 64. 5B. Régis de Castro ANDRADE. op. cif. p 26-7. 59. Osvaldo Trigueiro do VALE. O Ge neral Dutra e a redemocratizagdo de $5. Rio de Janeiro, Civilizagao Brasilei. 1979. 60, Vide Octavio IANNI. Estado... op. cit. p. 84-97. Sobre a formacio da ESG seu Siuniicado politico, vide A. STEPAN. on eit. Cay Sobre a ‘nese € 0 CIESP, vide P. SCHMITIER. op. cit. p. 180-203. 62. Os objetivos especificos do SESI ram “estudar, planejar © orientar, diretn Ou indiretamente, os meios que contribuem para o bemestar social dos trabathadores industriais e objetivos semelhantes". Em- bora a sua fungio imediata fosse baixar o eusto de vida concedendo varios beneff- cios aos irabalhadores, 0 SES! procurou também abafar © protesto politico “atra- vés da estimulago do sentimento € espi- Tito de justiga social entre as classes". © objetivo a longo prazo era langar a “base I para a soci " O SESI visava dos trabalhadores divi- didos em grupos pequenos, proporcionan- do “uma compreensio clara de seus deve- res frente A comunidade” © mostrando thes “a possibilidade de uma melhoria profunda em suas condigdes econdmicas, socinis ¢ morais... sem que se tornasse necesséria uma revolugéo ou uma ruptu- ra das tradigdes da nossa civilizesio crit ti". A concepco de Simonsen ulirapassa- 44 ya os limites de uma doutrinagao crus. Os trabalhadores deveriam ser também ins. truidos quanto a “seus direitos dentro dos leis trabalhistas ¢ a0 fato de terem advo- gados 2 sua disposiciio", a0 passo que so zacionais aos Iideres das classes trabalha. doras e apoiar financeiramente suas asso. cingdes. Somente um movimento traba. Ihista forte, bem organizado e bem infor mado poderia assegurar o tipo de paz so- cial imaginado por Simonsen como a baso da socicdade industrializada brasileira, A estratégia empresarial enyolvia também a educagao social dos empregadores, “expli- cando a cles a func3o social da propric- dade privads, tornandoos familiarizados com as limitagdes necessérias do poder econdmico ¢ polftico para a realizagio de uma democracia capitalista”. P. SCHMIT- TER. op. cil. 1971, p. 18586. Entre os participantes desses cursos achava-se um jovem professor, Jénio Quadres, que se tornnria presidente em 1961 como o cane didato das grandes empresas. Vide o Ca pitulo LV deste livro, 63. Alberto Pasqualini, idedlogo expoen- te do PTB ¢ um dos maiores colaborado- tes de Getilio Vargas na criagio do par- tide no Rio Grande do Sul, Estedo natal dessas duas figuras politicas, explicou que: “Eu néo sou um homem de esquerda ow de direita. Certamente no sou um socia- lista. Penso apenss que a burguesia deve- ria dar uma certa contribuigio. Hi muito egofsma entre os ricos, A mim me parece que os burgueses estilo se tornando cada vez mais cegos ¢ surdos”, Vide R. BOUR- NE. op. cit. p. 148, &. F. C. CARDOSO. Ideologias... op. cit, Cap. 2. 65. S, HUNTINGTON & C. MOORE, op. cit. p. 510. 66. E. ERICKSON. op. cit. Cap. 2, 3 e 4. A intensa migragio interna de trabalha- doses sem tradigio polftica que vinham de 4seas rurais atrasades para a cidade, os quais cram responsiveis pela composisfio “suralurbana” dos classes trabalhadoras, explica em grande parte a ingenuidade po- (fice da massa industrial brasileira. Vide Octavio IANNI. Crisis in Brazil. New York, Columbia Univ. Press, 1970, p. 51, 67. Atrayés do peleguismo estabeleceram- se, enire oulras, @ Coniederaczo Nacional dos Trabalhadores na Indéstria (CNTI), 2 Confederagio Nacional dos Trabalhadores no Comércio (CNTC) em 1946, a Confe- derasio Nacional des Trabalhadores em Trabalhadores em Transportes Fluviais, @ Confederagio Nacional de Trabslhado- res em Empresas de Crédito (CONTEC) em 1958, a Confederagso Nacional dos Trabalhadores em Transportes Fluviais, Maritimos © Aéreos (CNTFMA) € 2 Con- federacao Nacional dos Trabalhadores em ComunicasSes ¢ Publicidade (CONTCP) em 1960. Um controle maior foi exercido através de um sistema de protesao politica que ~ mantinha os sindicatos dependentes do Ministério do Trabalho pela administragzo dos recursos financciros. O. IANNI. op. cit. p. 51. 68. Para uma andlisc da ideologia de Adhemar de Barros, politico e empresario sagaz, proprictério da Carbonifera Brasi- leira S.A., vide Guita Grin DEBERT. Ide- ologia @ populismo. Sio Paulo, T.A. Quei- roz Ed, Ltda., 1979. Cap. 3. 69. Sobre as relagdes entre o Executivo ¢ 0 Congresso, vide (a) Sérgio ABRAN- CHES, O processo legislative: conflito concitiagdo na politica brasileira. Disseria- Go de mestrado. Univ. de Brasilia, 1973. p, 1-15. Mimeografado, (b) Celso LAFER. sistema politico brasileiro. Sao Paulo, Ed, Perspectiva, 1975. p. 62-8, 70. Vide R. BOURNE. op. cit. p. 160-61. Tl. Sobre uma anilise da ideologia de Carlos Lacerda, vide Guita GRIN. op. cit. Cap. 5. 72. Para uma avaliagdo dessa fase ¢ das questes-chave envolvidas, vide Moniz BANDEIRA. Presenga... op. cit. Cap. 40-42. 73. Francisco de OLIVEIRA. A econo mia da dependéncia imperfeita. Rio de Ja neiro, Graal, 1977. p. 79-80. 74. Para uma discussio das tendéncias nacionalistas da segunda administracio de Getilio Vargas, entre 1950 € 1954, vide (a) 0. IANNI. Estado... op. cit. p. 98-123. (b) Gabriel COHN. Petrdleo e nacionalis- mo. Sio Paulo, DIFEL, 1968. (c) Medeiros LIMA, Jesus Soares Pereira: petrdleo, energia elétrica, siderurgia: a tuta pela emanciposéo, Rio de Janeiro, Paz e Ter- ra, 1975. (d) Moniz BAINDEIRA. op. cit. P- 325-65. (e) John D. WIRTH. The poli- tics of Brazilian development, Stanford, Stanford Univ. Press, 1970. 75. (a) R. BOURNE. op. cit. p. 161-64. (>) G. COHN, op. cit. 76. (a) Hélio JAGUARIBE. Political stra- tegies of national development in Brazil. Studies in Comparative International De velopment, St. Louis, Missouri, 3(2):31-2, 1967/8. (Social Science Institute, Washi- ngton Univ.). (6) R. BOURNE. op. cit. 77. Uma versio da competigio © colabo ragao desses interesses € apresentada em P. EVANS. op. cit. p. 131-45. 78. (2) M. BANDEIRA. op. cit. p. 363-65, (b) R. BOURNE. ap. cit, p. 185.97. 79. Eugenio Gudin era um dos diretores da Companhia Forga ¢ Luz Nordeste do Brasil, da Electric Bond & Share Co, — EBASCO (LTT), das Empresas Elétricas Brasileiras, da Paulista de Forga e Luz (AMFORP) e da Standard Oil. Ele era_ também um economista importan- te da Fundagdo Getilio Varges. 80. (2) Frank ACKERMAN. Industry and imperialism in Brazil. Review of Radical Political Economics, .1., 3(4):17-21, Spring 1971. (b) Nathaniel LEFF, Economic poli- eymaking and development in Brazil 1946- 1964, Estados Unidos, John Wiley & Sons, 1968. p. 59-66. (c) R. NEWFARMER & 'W. MUELLER. op. cit. p. 97. (4) M. BAN- DEIRA. op. cit. p. 365-72. 81. Hélio JAGUARIBE, Problemas do de senvolvimento latino-americano. Rio de Janeiro, Civilizaséo Brasileira, 1967. p. 12. 82, Para anilises do modelo de desenvol- vimento propiciado por Juscelino Kubits- chek ¢ do seu periodo politico, vide (a) ©. IANNI. Estado... op. cit. p. 12464. (b) Carlos LESSA. Quinze anos de poli- tica econdmica. Cadernos do Instituto de Filosofia e Ciéncias Humanas. Séo Paulo, UNICAMP, Ed. Brasiliense, 1976. (c) Ma ria Victoria de Mesquita BENEVIDES. O governo Kubitschek: desenvolvimento eo- némico ¢ estabilidede politica 1956-1961. Rio de Jantiro, Paz ¢ Terra, 1976. p. 199 240. 83. Celso LAFER. The planning process and the political system in Brazil: a study of Kubitschek’s target plan — 1956-1961. 45 Ithaca, Corel! Univ., Dissertation Series n. 16, 1970, (Latin American Studies Pro- gram). 84, F. de OLIVEIRA. op. cil, p, 854. 85. Em 1959, havi de 400 empre- sas de origem americana operando no Bri Vide ESG. Documento n, Tp-10-59, p. 17. Gs interesses indusiriais locais mos: travam uma tendéncia marcante a sc liga: rem a companhias oligopolistas multinay cionais. Vide Nelson de Mello ¢ SOUZA. op. sil, p. 2&9, Nio é de se surpreender, Portanto, que a terga parte das cmpre- ‘say multinacionais americanas entrou ori- ginalmente no mercado brasileiro através da aquisiggo ¢ nao arriscando investimen- fo novo. Além disso, entre 1960 ¢ 1972, a Quarta parte do aumento no ativo das fire mas americanas deveuse ao fato de clas haverem assumido o controle de outras firmas. E mais ainda, houve uma mudan> ga na cscolha sctorial de peneiragio por parte do investimento americano directo. Enquanto em 1929 o investimento ameri- cano cra responsive! por 64% do comér cio, utilidades publicas ¢ outros ¢ somente por 24% da manufatura, deixando 12% Para os sctores extrativo € primfrio, em 1950 os numeros eram, respectivamente, 39%, 44% © 17%, sendo que o investi- mento em manufatura mostrava uma mar- cada tendéncia para um crescimento con- tinuo. Em 1929. © valor contdbil do inves- timento americano direto era de 134 mi- Thées de délares € em 1946 esse valor atin: giu 325 milhdes de d6lares. Em 1950 0 valor era de 644 milhdes de délares, che- gando a 953 milhGes de délares em 1960. ‘Vide P. EVANS. Continuity and contradic» tion iin the evolution of Brazilian depen- dence. Latin American Perspectives, s.1., 3(2):44, Spring 1976. 86. (a) FP. de OLIVEIRA. A economia... ‘op. cil. p. 85, 11617, (b) M. BANDEIRA. op. cil, p. 375. (c) H. Ferreira LIMA. Ca- pilais curopeus no Brasil. Revista Brasi- liense, Rio de Janciro, (4):45-44, mar/abr. 1956. 87. O resultado das dircirizes polfticas de Juscelino Kubitschek foi extraordinirio. Indastrias que em 1949 imporiavam mais da melade de seu ecstoque tornaram-se ceniroschave de crescimento para os se- tores industriais, Entre 1949 € 1962, a in- 46 distria quimica proporcionava 14.8% do crescimento total, seguida pelo sclor de transportes com 14,4%, metals com 11,34, industrializagéo de alimentos com 10,8% ¢ pela industria 1éxtil com 8,9%, A quote de crescimento total da produgio das em: presas multinacionais foi ecstimada em 33.5% durante a cxpansio manufatureira de 1949 a 1962 ¢ em 42% no que dizia respeito ao crescimento da industria de substituigéo de importagdes. Vide R. NEW: FARMER & W. MUELLER. op. cit. p.97. 88, Em 1955, Roberto Campos fez co mentarios extraordinariamente francos so bre o que seria a base Idgica do perfodo de Juscelino Kubitschek: “Optar pelo de- senvalvimento implica 3 aceitagio da idéia de que ¢ mais importante maximizar o in: dice de desenvolvimento ccondmica do que corrigir desigualdades sociais. Se 0 ritma de desenvolvimento for ripido, a desigualdade pode ser tolerada © contro- Inda com a tempo. Se o ritmo de desen- volyimenio cair em decorréncia de incen- livos inadequados, praticar a jusliga dis- tributiva transforma-se em parlicipagio na pobreza, Obviamenic, isso ndo quer dizer que se deya deixar sem controle os instin- tos predaléries que ocasionalmente se acham presentes em certos setores capite- listas. Isso significa meramente, dentro do nosso estégio de evolugéo cultural, que a Preservacéo de incentivos para © cresci- mento da producéo deve ter prioridade so bre medidas que visem a sua_redisiril gio”. Vide Thomas SKIDMORE. Politics in Brazil 1930-1964: an experiment in de mocracy. Oxford, Oxford Univ. Rress, (967. p. 387, nota bibliogrifice. 89. C. LAFER. op. cit. p. 89. 9. H. JAGUARIBE. Political strategies... op. cit. p. 40. Contrariamente a argumen- tos neoweberianos, o desenvolvimento de burocracias governamentais nio apresen- fava normas implicitas de tratamento uni- versal para casos scmclhantcs de acordo com um cOdigo de regras. Ao contrario, as burocracias governementais incorpora- sistema de nomeasio pater nalista de familiares © amigos. Vide C. LAFER. op. cit. p. 67, 91. O empresirio AntOnio Carlos do Amaral Ovério, que teria um papel muito importante nos acontecimentos que leva- riam A queda de Jodo Goulart, observou Potteriormente que a industrializagio de Juscelino Kubitschek “gerou uma série de problemas dentro das estruturas econdmi- cas, sociais e politicas. No campo da ad- ministragio public idustrializagao] (c- ve repercussio com a criagéo de uma sé rie de organizagées peralelas dentro do Estado,,, com o propésito de satisfazer as necessidades que surgiam em conse: qlitncia de problemas econ6micos ¢ so clals que se acumulavam”. Vide também L. MARTINS, op, cit. p. 136. Vide A. C. do Amaral OSORIO. O Ex tado. revaluciondrio © 0 desenvolvimento econdmico. In: O proceso revoluciondrio brasileiro. Rio de Janeiro, AERP, 1969, p, 114, 92, Vide P. EVANS. Dependent... op. cit, Cup. 4 ¢ 5. 93. F. de OLIVEIRA, op. cit. p. 3940. 94, C. LESSA, op. cit. p, 65, 95. Em principios da década de sessenta, as alternativas de um desenyolvimenta na- clonalista liderado pelo Estado ou de as- sociagio com interesses estrangeiros ¢ de- senvolvimento integrado reaparcceram co- mo um dilema crucial. A posicao contra 6 Estado foi amplamente defendida por figuras militares influentes como o Mare- chal Ignacio José Verissimo, que era en- tio um importante ativista antipopulista. Durante uma reuniao da FIESP, 0 Mare- chal Verissimo adyertiu que “Quando brasileiros presenciam, sem piscar os olhos, a ago do Estado para se tornar o chefe _ supremo do ferro através do complexo de Volta Redonda ¢ da Companhia Vale do Rio Doce, 0 chefe supremo do transporte ferroviirio através da Rede Ferrovi Federal, 0 grande construtor de navios através da Léide, ITA, Navegacio do Pra- ta ¢ Navegagio da Amaz6nia, 0 chefe su- premo de uma série completa de ativida- des econdmicas através dos Institutos do Sal, Pinho, Café, Agicar e outros ¢, mais ainda, para se (ornar proprietério de este g6es de rédio, jornais, apropriandose de empresas de energia elétrica ¢ tornandose © produtor dnico de petréleo, possuindo indiistrias produtoras de dlcali, automé- veis, alimentos, calgados etc., quando bra- sileiros presenclam tais acontecimentos gem se periurbar, entiio eles estio come- rakiri" [sic] moral.” Palestra proferida ‘pelo Marechal J. Verissimo na FIESP, transcrita em O Estado de Sao Paulo de 20 de fevereiro de 1963. %6, Uma anélise do papel do ISEB — Instituto Superior de Estudos Brasileiros no desenvolvimento de tal idéin € apresen- tada em M. BENEVIDES, op. cif. p. 241- 43. 97. Os trobathadores industrials aumen- taram de 450,000 em 1930 para 2,100,000 em 1960, nGmero este que quase dobrou de 1950 até © final do perfodo de Jusce- lino Kubitschek. Vide Edmundo Macedo SOARES. ESG. Documento n. C-25-63. p. 223, 98. Sobre a ideologia do desenvolvimento como consolidacio de um proceso hege- ménico, vide Miriam Limoeiro CARDO- SO. La ideofogia dominante. México, Si- glo XXI, 1975. 99. H. JAGUARIBE. Political Strategies... op. cil. p. 37. 100. Sobre o conceito de classes popula- res, vide Francisco C. WEFFORT. Classes populares e politica. Tese de doutorado. Faculdade de Filosofia, Citncias ¢ Letras da Univ. de Séo Paulo, 1968. p. 1. Sobre a nogdo de classes, vide F.C. WEFFORT. Politica de massas. Politica ¢ revolu- 80 social no Brasil. p. 173-78. 101. Para uma anilise do “Bonapartismo janista”, vide (a) Hélio JAGUARIBE, Economic and political development: a theoretical approach and a Brazilian case study. Cambridge, Mass. Harvard Univ. Press, 1968. p. 184. (b) Carlos Estevam MARTINS. Brasil — Estados Unidos dos anos 60 aos 70. Lima, Instituto de Estu- dios Peruanos, set. 1972 (trabalho para 0 Seminar on Political Relations between Latin America and USA). 102. O termo bloco nacional-reformista designa a “frouxa” composigio das forgas politicas representadas no circulo ao redor de Joio Goulart ¢ que favorecia as dire- trizes politicas da industrializagio macio- ‘nalista fortemente apoiada pelo Estado, a reforms agraria com distribuigio de terra, a nacionalizagéo dos recursos noturais, medidas para o bem-estar social, uma po- Iitica externa neutralista ou alinhada ao Terceiro Mundo, um forte controle das 47 > oo corporaées multinacionais ¢ até mesmo 2 desapropriagéo em muitos casos. E impor tante observar que Jodo Goulart repetiu, dez anos mais tarde, 0 mesmo modelo de tcomposigéo de ministério € implementa: 48 gio de diretrizes politicas que oho te oe Getilio Varga, se you, posteriormente, @ prdpria queda . Joio Goulart, depois de perder o o das classes dominantes como um toa CAPITULO II A ASCENDENCIA ECONOMICA DO CAPITAL MULTINACIONAL E ASSOCIADO Introducao A Segunda Guerra Mundial pode ser considerada um divisor de aguas crucial que marcou s consolidagao econémica € a supremacia politica do capital mono- polista nos centros industriais ¢ financeiros* As novas formas de capitalismo, que se realizavam a nivel global através de uma articulacdo complexe ¢ contra- ditéria com as varias formacies sociais nacionais, tiveram como expressio orga- nizacional basica as corporagdes multinacionais* O capitalismo brasileiro, tardio ¢ dependente, viria a ser tanto transnacional quanto cligopolista ¢ subordinado aos centros de expansio capitalista. O capital “nacional”, que fora predominante no governo de Getiilio Vargas, conseguiria coexistir de modo significativo somente em sua forma associada ou em empresas pertencentes ao Estado.’ Mesmo nesse Ultimo caso, o capital transnacional teria ainda um papel central através de joint ventures (empreendimentas conjuntos) entre o Estado e corporagdes multina- cionais, além de exercer controle multinacional parcial das aces de empresas estatais brasileiras, Penetraciio multinacional ¢ integragio da indistriat As mudangas na divisio internacional do trabalho® ¢ a penetracio na eco nomia brasileira de um bloco multinacional liderado por interesses americanos deram lugar a novas relagdes econémicas ¢ politicas, tais como: a) uma crescente concentragao econdmica e centraliza¢ao de capital com a predominancia de grandes unidades indus ¢ financeiras integradas; b) um processo de controle oligopolista do mercado.” O crescente peso econdmico e¢ a relativa importéncia Politica do bloco de poder multinacional ¢ associado no Brasil em principios da década de sessenta foram claramente revelados através dos dadas fornecidos pat uma pesquisa se- minal realizada no Instituto de Ciéncias Sociais — ICS — da Universidade Federal do Rio de Janeiro.* Através da pesquisa foi feito um levantamento de dados dos grandes grupos econdmicos ¢ estimado um universo de 276 grupos bilionérios. Desses grupos, 221 tinham um valor de capital mais reservas das empresas que se situavam na faixa de 900 milhdes a 4 bilhdes de cruzeiros. Foram identificados 55 grupos cujo copital préprio ultrapassava a cifra dos 4 bilhdes de cruzeiros; esses foram cha- mados de “grupos multibiliondrios”. 49 Esses 55 grupos, que tinham um papel estratégico na economia brasileira, cocupavam as posigdes de lideranga nos setores principais onde operavam, con- trolando uma parte substancial da produsio ¢ circulagao de bens.” Mais da me- tade desses grupos tinha a sua sede em Sio Paulo, aproximadamente um terco deles no Rio de Janeiro e um pequeno ntimero em Minas Gerais. O estudo do ICS examinou 83 grupos biliondrios escolhidos para integrarem uma amostra aleatGria de um universo estimado em 221 unidades. Desses 83 grupos, . Vinte € cinco dos 54 grupos nacionais, ou seja, 46%, tinham ligagdes através de empreendimentos comuns com grupos multinacionais. Se essas percentagens forem generalizadas ‘em relasio a0 universo de 221 grupos bilionérios, elas mostrariam 144 “‘nacio- nais” (65,1%) ¢ 77 multinacionais (34,9%), dos quais 43 (55,2%) eram grupos multinacionsis nic-americanos."* De um total de 144 grupos “nacionais”, so- mente 78 nio tinham ligages bem definidas com interesses multinacionais, A classificagéo por valor de capital dos grupos biliondrios permitiu compor a Tabela 1. Tabele 1 Grupos estrangeiros Fonte: T. dos Santos, 1969. p. 52-53 J. Anténio Pessoa de Queiror, ICS, 1965. p. 152 (Em 1962, 0 valor do délar aumentou de Cr$ 100.00 para Cr$ 200,00 no fim do ano). Apesar da superioridade numérica dos grupos nacionais na faixa dos grupos fs se ressentiam de uma menor capacidade de concorréncia, com itada por desvantagens tecnolégicas, tendo de operar dentro de ‘um mercado cligopolista controlado por companhias multinacionais, Além disso, 58% dos grupos bilionérios transnacionais € 37,5% dos grupos nio-americanos faziam parte do nicleo predominante do mercado de seu produto principal. Dez grupos de posigao importante (8 americanos e 2 multinacionais) cram os maiores produtores em seus respectivos mercados." © capital teansnacional americano era proeminente dentro dos grupos multinacionais biliondrios. Os americanos representavam 13 grupos (48%) do total de 29 grupos multinacionsis bilionSrios. Os americanos representavam também 48% do \otal de interesses multinacionais © 15,6% do totél de grupos biliondrios nacionais e multinacionais. 50 Dos 55 grupos multibilionérios encontrados no Brasil, 31 deles (56,4%) cram multinacionais ¢ 24 deles (43,6%) eram locais ou “‘nacionais” dos quais, Por sua yez, 62,5% tinham ligegdes variadas com grupos transnacionais. Desses 24, somente 3 grupos (37,5%) nfo tinham agdes nas maos de corporagdes mul- tinacionais, a0 passo que 2 deles tinham directories interligadas com as de corpo- ragdes multinacionais.* A supremacia multinacional mostrava-se mais intense & medida que erem feitas comparagées entre as diferengas do montante de capital de grupos multinacionais e locais. Dezenove grupos “‘nacionais” (79,0%) de um total de 24 tinham capital entre 4 € 10 bilhdes de cruzeiros, enquanto 18 grupos € 10 multinacionais (32,0%). No limite mais alto, acima de 20 bilhdes de cru- zeiros, havia 2 grupos nacionais (10,8%) e 3 multinacionais (10,0%). O capital ixa mais alta de capital préprio. Dentro dos grupos multinacionais multibilionérios, os americanos mantinham uma po- 0 proeminente. Quinze de um total de 31 grupos eram americanos (dois desses grupos cram americano-brasileiros ¢ um canadense-americano). Os outros 16 compreendiam 4 alemies, 3 britinicos, 2 franceses, um canadense, um anglo- holandés, um holandés, um argentino, wm italiano, um suigo e um anglo-belga- americano. Os 12 grupos americanos, mais os trés que tinham ampla participagao de empresas dos Estados Unidos, representavam 48,0% dos grupos multinacionais multibilionérios e aproximadamente 30% do total de grupos multibilionérios nacionais ¢ multinacionais.'* A Tabela 2 mostra a distribuico por montante de capital e nacionalidade. O conjunto dos grupos econémicos multinacionais bilionfrios ¢ multibilion4- rics somados aos grupos “‘nacionais” ligados ou associados s interesses multina- cionais constituie 68,4% do total, ou seja, 189 grupos de um total de 276 grupos econ6micos com um ativo acima de Cr$ 900 milhdes. As conclusdes a que se pode chegar sio claras. As grandes empresas “‘nacionais” ¢ os grupos que as controlavam eram predominantemente multinacionais, firmemente interligadas atra- vés de uma dependéncia tecnolégica ou financeiramente integrados a grupos multinacionais, A grande corporacgo “nacional” era principalmente uma empresa associada, Esse processo de internacionalizacao seria estendido ainda mais depois de 1964. © controle oligopolista de mercado bascava-se principalmente na prefertncia multinacional pela penetragio setorial seletiva, especializada concentrada, e na integragao tecnoldgica e financeira, Até a década de cinqiienta, o capital trans. nacional havia se estabelecido em servigos, extragio ¢ comercializacao de pro- dutos agricolas © em menor grau, em empresas industriais. Através do Plano de Metas, os interesses multinacionais no Brasil redirecionaram seus investimentos Para outros setores ¢ expandiram a economia local em direc&o & manufatura, no que foi chamado de “segundo estégio de substituigo de importagSo”.* Esse pro- cesso pode ser visto claramente no padrio dos investimentos americanos. Em 1929, a metade dos investimentos americanos ia para companhias de utilidade publica, Mineracio, petréleo e comércio representavam 26% do total. No fim da guerra, a manufatura achava-se no mesmo plano das companhias de utilidade publica, cada uma com 39%, ¢€ 0 resto dividido entre 0 comércio, mineraso € petréleo, St Tabcla 2 Capital — Grupos multinacionais 1 Grupos nncionais lig: dos a grupos cstran- geiros através de ages uN Namero Outros grupos nacionals Total % dele Bilionfrios 900 milhdes a 4 bilhdes Multibilionérios acima de 4 bilhdes 55 83,7 TOTAL 276 68,4 Fonte: T. dos Santos, 1969. p. 38 Em 1950 a manufatura jé representava 44%, subindo a 54% em 1960 ¢ atin- gindo 68,0% em 1966." No infcio da década de sessenta, 78,1% dos grupos multibiliondrios tinham como atividade principal a industria, sendo que nela eles estavam distribuidos num niémero yariado de ramos. Em comparagéo com grupos multinacionais, os grupos multibiliondrios locais destacavam-se nos setores de importagao-exportacao, nos bancos € na industria de bens de consumo nio-duriveis. Eles se equilibravam com os interesses multinacionais no que dizia respeito ao setor de investimento € na indastria de base, onde o Estado tinha uma participacao relevante, ¢ aproxi- mavam-se dos grupos multinacionais, Os grupos “‘nacionais" levavam franca des- vantagem em todos os demais setores: distribuigéo, servigos de utilidade publica, bens durdveis e maquindrio pesado."* Os grupos multinacionais (principalmente os americanos) preferiam clara- mente o setor industrial.” A distribuigaio dos 55 grupos multibiliondrios ¢ dos 83 grupos biliondrios, segundo o setor de atividade e nacionalidade, pode set vista na Tabela 3. Tabela 3 BILIONARIOS MULTIBILIONARIOS SETORES Estrangeiros Nacionais Nacionais Nr | 9% Industria Comércio Bancos 2 69 4 1 | 1 32 4] 167 TOTAL 29 | 100.0 54 | 10,0 31 | 1000 24 | 1000 Fonte: T. dos Santos, 1969. p. 54 M. Vinhas de Queiroz, ICS, 1965. p. 65 A distribuigiio dos grupos por ramo de atividade principal em princfpios da décnda de sessenta é mostrada na Tabela 4. 53 Tabela 4 Multinacionals Setor de Atividade dustriais (1 pac. + 2 multin. tos (I nac. + 1 multin), distribuiglo (1 nac. Tmt) | 833%) | 7 eo2%) Industrial Bens de consumo nioduriveis 8.333%) | 5 (172%) Bens de consumo duriveis 142° %) | 7 (24.1%) Maquinétio pesedo 142 %) | 4 (13.3%) Sic 6 (25 %)| 8 (24.1%) 24 (100%) | 31 one: M. Vinhes de Cuslven, OOS, 155%. p. 25 L. Martins. ICS, 1976. p. 437 fH Cardoso, CEBRAP N. bp. A forte integrapdo tecnolégica do capital também teve relevincia para a posigéo de primazia transnacional ocupada no mercado pelas empresas multi nacionais. A integrarSo tecnolégica favorecia a tendéncia de concentragio em setores especializados de atividade, permitindo assim uma maior integracio das companhias multinacionais, as quais tendiam a dominar o mercado em sua concor- rencia com grupos econémicos “nacionais”. Em contraposicéo, a diversificagio e falta de unidade de cardter tecnolégico eram mais acentuadas nos grupos eco- ndmicos “nacionais”, como € mostrado na Tabela 5. Tabela 5 MULTIBILIONARIOS BILIONARIOS Alividedee yerteelmente selacionsdes com pouca diversificagio . Fonte: M. Vinhas de Queiror, ICS, 1965. p. 65 T. dos Santos, 1969. p, 5456 Além da unidade tecnol6gica e da especializacio da produgio, outro indice da integragio dos grupos multinacionais comparados 20s grupos “nacionais” € © relacionemento entre o mtimero de empresas e 0 volume do capital, tal como 6 visto na Tobela 6. Tabela 6 NACIONAIS MULTINACIONAIS Grupos Empresas Capital Grupos Empresas Capital Ey 506 2189359 31 24 305.737.7 bilhoes bilhoes Média por empresa: 432 milhdes Média por empresa: 1307 milhdes (Os ndmeros sio representados em cruzeiros Fonte: T. dos Santos, 1968, p. 448 M, Vinhus de Queiroz, ICS, 1965. p. 6+ Entre a amostragem dos 83 grupos biliondrios, 10 multinacionais ¢ somente 2 nacionais ¢ram os principais ou tnicos produtores nos setores onde exerciam suas atividades principais. Dois grupos nacionais possuiam empresas ocupando o segundo lugar no setor de sua atividade principal, 3 grupos possufam empresas entre aquelas em posigao de controle do mercado onde operavam e um grupo tinha monopélio efetivo em seu setor principal. Grupos nacionais biliondrios também operayam numa estrutura de mercado oligopolistica ou num mercado de concorréncia imperfeite, apesar de ndo terem posigo de lideranga como os seus correspondentes multinscionais. Quatorze dos 29 grupos multinacionais biliondrios operavam numa estrutura de mercado oligopolistica; 4 grupos (todos americanos) funcionavam em condi- ges de quase-monopélio e 9 operavam num mercado de competigio imperfeita (ou concorréncia monopolistica); 5 deles operavam em mercado de concorréncia monopolistica concentrada, isto é, onde um grupo controlava mais de 50% do mercado, e 4 grupos operavam em concorréncia monopolistica sem concentracio."” © grau de controle do mercado por grupos multinacionais, multibiliondrios pode ser aferido na Tabela 7. Mais de 65% dos grupos multinacionais operavam em dreas de atividade onde tinham controle total, ou quase total, do mercado. Os grupos americanos operavam em setores onde tinham controle total, ou quase total (92,4%), do mercado, Nenhun dos grupos americanos agia em mercado de concorréncia mo- nopolfstica sem concentrago ou em setores onde as multinacionais no tivessem um acentuado controle do mercado. 55 Fonte: T, dos Santos. 1968. p. 43 Dezessete (58,6%) dos grupos multinacionais (menos da quinta parte do total dos 83 grupos bilionarios da amostragem) pertenciam 20 niicleo produtivo predominante do mercado ¢ somente J2 grupos (41,696) estavam fora dele. A situagZo dos grupos biliondrios locais era diferente. Somente 8 grupos (14,8%) tinham posi¢éo de controle no mercado onde operavam, e 46 grupos (85,2%) estavam fora dele. Mesmo assim, deve-se lembrar que cerca da metade dos grupos 4 is” tinha ligagdes relevantes com grupos multinacionais, Onze (84,6%) dos americanos compusham © niicleo predominante como produtores tini como primeiros produtores na faixa dos grupos miliondrios.** Evidéncia da tendéncia dos grapes multinacionais para 0 estabelecimento de um controle oligopolistico do mercado pode ser obtida na Tabela 8, que mostra o grau de mo- nopolizagio no setor metaliirgico sediado em Sio Paulo.” Tabela 8 Estruturas metilicas 6 Instrumentos sgricolas 7 Arados 76 Motores elétricos 86 Refrigeradores a Miquinas de lavar . Fonte: T, dos Santos, 1969. p. 38 56 Grandes companhias multinacionais ¢ mesmo “nacionais” dominavam a economia.” Interesses multinacionais predominavam no setor secundério, 0 mais dinamico deles. Através de seu controle oligopolista do mercado, as companbias vam o ritmo e a orientaséo da economia brasil Nos centros capitalistas (Estados Unidos e Europa), o capital financeiro reinava supremo no circulo de hegemonia americana. O capital americano, que detinha somente 2,0% dos investimentos no exterior no primeiro quarto do século, passou a ocupar em 1960 uma posi¢éo proeminente. possuindo perto de 60% dos investimentos es- trangeitos. Enquanto isso, a participacgo da Gri-Bretanha, Franca e Repdblica Federal alema caia para 30%,** Um relatério do Bureau of Intelligence and Re- search do Departamento Estado americano, elaborado no inicio de 1963, apre- sentou uma importante visio geral dos empreendimentos privados americanos no Brasil. Ao delinear o “caréter dos grandes empreendimentas privedos americanos naquele pais em termos de seu tamanho, localizacéo e origem corpors relat6rio objetivava servir para “situar no seu contexto esse fator significativo na economia do Brasil ¢ no relacionamento Estados Unidos Bri De acordo com © relatério, os investimentos estrangeiros privados no Brasil totalizzvam cerca de 3,5 bilhdes de délares. Os interesses americanos formavam o maior grupo individual de investidores estrangeiros, com aproximadamente a terga parte do total do capital transnacional. Contrariamente ao modelo de investimento dos Estados Unidos em muitos outros paises latino-americanos, as agdes americanas em panhias de utilidade publica e companhias de mineragdo no Brasil eram relati mente poucas em relagdo aos investimentos americanos na produgao de maq\ nario, automotores € utilidades domésticas. A maior parte dos investimentos no Brasil era feita por corporagGes americanas multinacionais de maior importincia, organizadas localmente de acordo com a lei brasileira de modo a usufruir van- tagens administrativas e tributa Em alguns casos essas corporagées eram or- ganizadas sob um nome tal que nfio as ligava, A primeira vista, 4 matriz, a fim de ganhar identidade local.”* Esses investimentos eram feitos em sua maior parte em inddstrias cuja produgio ajustavase a um mercado consumidor de classe média e néo tanto para a exportagio. Foi esse altamente necessério mercado in- terno que seria consolidado, depois de 1964, pelo fornecimento das camadas médias em detrimento das classes trabalhadoras industriais ¢ rurais, O relatério do Departamento de Estado apresenta categorias gerais de transnacional no Bra: s eram: 1) indtistria de base e indiis- tria pesada, 2) indtistria de base ¢ industrializagio de alimentos, 3) stividades nio industriais ¢ 4) servigos de utilidade publica. Os interesses americanos pre- do todo 0 capital relatério indicava também que 0 capital americano abrangia cerca de 40% do investimento estrangeiro em indiistrins de base, seguido da Alemanha Federal com 15% e da Gra-Bretanha com 11%, Na indiistria leve bras 38% dos inves- timentos estrangeiros eram de origem americana; a Argentina representava cerca de 13% do capital estrangeiro nesse setor ¢ a GraBretanha 12%. Os Estados Unidos haviam investido 40% do capital estrangeiro privado em financiamento ¢ comércio, contra 10% da Gri-Bretanha e Franga.** © memorando da pesquisa mostrava um exome mais detalhado das reas nas quais os investimentos americanos predominayam entre o capital estrangeiro. Na categoria de indistria de base ¢ indiistria pesada que atraia cerca de 40% de 37 todo o investimento multinacional privado (aproximadamente 1,4 bilhiio de dé. Jares de um total de 3,5 bilhdes de délares), os investimentos americanos chega- vam a cerca de 45% do total do capital transnacional. Os sctores mais impor- tantes nos quais fundos americanos haviam sido investidos cram: a) industria de automotores, de utilidades domésticas ¢ outras indtstrias de méquinas, onde os investimentos americanos constitufam mais da metade dos investimentos estrangeiros de cerca de 830 milhdes de délares. Em seguida vinham os interesses da Alemanha Federal e os britanicos, As industrias de automotores americanas no Brasil eram a General Motors, Ford Motor Co,, Willys Motors ¢ International Harvester. Companhias importantes na fabricagio de tratores ¢ equipamento rodoviirio eram a Caterpillar, Fruehauf, Le Tourneau-Westinghouse e Hyster. As inddstrias mais importantes em pecas para automéveis inclufam a Clark Equipment e Armstead (ex-American Steel Foundries). Os maiores aquinatio e produgdo de utilidades domésticas eram a General Electric, IBM, Singer Sewing Machine, RCA, Timken Roller e Muncie Gear Works: b) 0 setor de indiistrias de ago e metal era dominado por investimentos belgas, seguidos pelo Japdo. O capital americano representava cerca de 15,0% do total do capital transnacional privado, estimado em 275 milhdes de ddlares A seguir vinham os interesses do Canadé e da Alemanha Ocidental. As industria metaltirgicas americanas inclufam, entre outras, a Gillette Co. e a Revere Cooper; ¢c) os maiores investidores americanos nos setores de mineragao e petréleo eram a Bethlehem Steel em mineragdo e as Standard Oil, Texaco e Atlantic Refining na distribuigéo do petrdleo, Os investidores americanos haviam inves- tido cerca de 65,0% do total do capital estrangeiro pri ava a 200 d) nos setores de cimento e vidro a Franca tinha a primazia nos investi- mentos, seguida pelos Estados Unidos ¢ Suica. A Pittsburgh Plate Glass, asso- ciada a interesses franceses, e a Corning Glass eram as inddstrias americanas mais importantes na produc3o de vidro. A Lone Star Cement e a Dolphin Shipping, ¢ssa Gltima associada 2 uma companhia it: a, eram importantes produtoras americanas de cimento.* Na categoria de indistrias leves ¢ industrializasao de alimentos, cujos in- yestimentos chegavam a cerca de 1,1 bilhao de délares (um tergo dos investi- mentos transnacionais), o capital americano, que representava mais da terga parte, distribuia-se da seguinte maneira: a) produtos quimicos, farmacéuticos ¢ plisticos com 420 milhdes de délares de investimentos transnacionais, 40% dos quais provinham de companhias ame- ricanas. Entre as mais importantes estavam a Union Carbide, Celanese Corporation ¢ a Eastman Kodak. Os outros investimentos transnacionais eram principalmente franceses, alemaes ¢ suicos; b) na industrializacao de alimentos, os interesses britanicos tinham primazia no volume de seus investimentos, seguidos pelos Estados Unidos ¢ pela Argentina (principalmente Bunge & Born). De um (otal de 240 milhdes de délares de capital transnacional, os Estados Unidos detinham aproximadamente a quarta parte dos investimentos. As corporagdes americanas mais importantes eram a Corn Products Company, International Packers e Anderson Clayton; ©) Os interesses transnacionais investiam cerca de 165 milhdes de délares na rea téxtil, Esse setor era liderado por interesses briténicos ¢ franceses, enquanto 58 03 Estados Unidos tinham 12,0% do total. A J. B. Martin ¢ a Ranch River Wool, associada a interesses franceses, eram as corporagdes americanas proeminentes; d) nos setores de borracha, madeira ¢ couro, de um total de 150 mil de délares de investimentos estrangeiros, os Estados Unidos responsabilizam-se por 50,0%, seguidos pela Italia ¢ Gra-Bretanha. Os gigentes americanos cram a Firestone, Goodyear ¢ a B. F, Goodrich, ©) empresas industriais com interesses em miltiplos setores incluiam cor- porngSes engajadas em uma variedade de atividades, tanto industriais quanto comerciais. O grupo de investimento Bunge & Born liderava esse setor, com as cor poracées americanas responsiveis pela terca parte do total de 92 milhdes de dé lares de capital iransnacional. A Anderson Clayton era a maior entre os interesses americanos, seguida pela United Shoe Machinery ¢ pela Minnesota ing and Manufacturing; f) © papel ¢ a celulose respondiam por cerca de 70 milhées de délares do inyestimento _estrangeiro, com os Estados Unidos responséveis por 70% deles. As corporagdes mais importantes eram a Champion Papers e a International Paper.” Em atividades néo-manufatureiras, que incluiam financas, comércio, publi- cidade, im6veis e agricultura, cerca de 280 milhdes de délares foram investidos, dos quais a terca parte, aproximadamente, provinha dos Estados Unidos. Nos setores bancério e financeiro, os Estados Unidos lideravam o investimento trans- nacional com cerca de 25% de um total de 152 milhdes de délares. O Canada vinha em segundo lugar, seguido pela Gra-Bretanha, Franca e Alemanha Federal. Os grandes interesses americanos incluiam o First National City Bank e 0 First National Bank of Boston, ao passo que o mimero de corporacées manufatureiras estendiam suas atividades para as reas de crédito e investimento como, por exemplo, a General Electric, Bethlehem Steel e Eastman Kodak. No comércio predominavam os interesses americanos com cerca de 55% do total de 80 milhdes de délares de investimento transnacional. A Gra-Bretanha vinha em segundo lugar. ‘As maiores corporacdes americanas cram a Sears Roebuck, a Pittsburgh Plate Glass" e a Singer Sewing Machine. Nos setores de publicidade, iméveis e agri- cultura, 0 total do capital transnacional era de cerca de 50 milhdes de délares, dos quais 40% era americano. A Esteve Brothers e o King Ranch estavam entre os maiores investidores americanos em agricultura, e a McCann Erickson em publicidade.” No setor de utilidades publicas os investimentos americanos privados detinham somente uma pequena parte, A holding canadense Brazilian Light and Traction- Brascan” responsabilizava-se por aproximadamente 85% do total de investimentos estrangeiros, Os interesses americanos de maior importancia no setor de utili- dades, a American and Foreign Power ¢ a International Telephone and Telegraph, respondiam por quase todo o restante do capital estrangeiro nesse setor. O relatério do Departamento de Estado apresentava também uma lista das irmas americanas no Brasil totalmente controladas ou com predominincia de capital americano, Elas cram, em ordem decrescente de acordo com o volume aproximado de capital e reservas, volume este que yariava de 60 a 10 milhdes de délares: General Motors do Brasil S.A., Ford Motors do Brasil S.A., Esso Brasileira de Petrdlco S.A..°* Willys Overland do Brasil S.A., General Electric S.A., Forga ¢ Luz de Minas Gerais — EBASCO (Grupo Morgan),”* Indistria de Pneu- miticos Firestone S.A., Industrias Reunidas Vidrobrés, Texaco do Brasil S.A., 59 International Harvester Maquinas S.A., Champion Cellulose S.A,, Union Carbide do Brasil S.A., Industrias Anderson Clayton & Co. — ACCO, Bendix do Brasil Lida., Cia, Goodyear do Brasil, Cia. Paulista de Forga ¢ Luz (American & Foreign Power), ITT. Caterpillar do Brasil S.A.. Refinagdes de Milho (Corn Products Co.), IBM do Brasil, Cia. Energia Elétrica da Bahia (American & Foreign Power), Sears Roebuck S. ja. Atlan de Petréleo S.A. (Atlantic Refining Co.), B. F. Goodrich do Brasil S.A. ¢ Swift do Brasil.** Deverse ressaltar neste ponto que no esforgo de cunho ideolégico, politico ¢ militar organizado pela burguesia para derrubar o Executive de Joao Goulart, fariam parte empresdrios importantes, que nele ocupariam posigdes-chave, ligados 4 maioria das corporagdes ds quais o estudo do JCS faria referéncia; também participariam desse espago a maioria das companhias mencionadas no relatério do Departamento de Estado. Muitas dessas corporagées, algumas através de suas subsididrias e outras diretamente ou através de associagdes de classe, seriam tam- bém importantes contribuintes financeiros para a campanha que levaria & queda do regime populista. Outros aspects do processo de concentragio O processo de concentragéo industrial foi acompanhado por uma extrema concentragio de posse de terra, De 1950 a 1960 0 ntimero de grandes proprieda- des baixou de 2,3% do total de estabelecimentos agricolas para 0,98%. Assi mesmo, esses Ultimos controlavam até 47.29% da terra,” a0 passo que 104% dos estabelecimentos agricolas controlavam 79,9% da terra. O comércio agricola estava ligado a uma grande parte da estrutura bancdria. No setor bancario, o processo de concentracdo determinou, entre 1958 ¢ 1963, © aumento do numero de agéncias bancdrias de 3.937 para 5.943, enquanto 0 nidmero de matrizes diminuiu de 391 para 324. Esses niimeros ganham maior significado se se considerar o alto grau de interpenetragdo entre as diretorias dos grandes bancos, as suas operacoes conjuntas ¢ a parcela do fluxo de caixa ¢ ope: ragdes financeiras controladas- por estabelecimentos individuais dentre os 30 maiores bancos. Esses tinham 3.563 agéncias de um total de 5.943. Eles adminis: travam ainda depésitos de 2.736.632 de cruzeiros de um total de 3.398.737 de cruzciros. Vinte ¢ cinco eram privados ¢ 5 pertenciam ao Estado. Dez eram se- diados em Sao Paulo, 9 em Minas Gerais e 5 no Rio de Janeiro." Os bancos tornaram-se agentes centrais do processo de concentragio ¢ acumulagio,?” © proceso geral de concentraggo € centralizagdo econdmicas internacionais Apresentava outro aspecto além do processo de monopolizagio de mercado. A concentragio econé: dava-se também a nivel financeiro, e realizava-se através de um processo de integracdo entre as empresas ¢ através do controle de um nico grupo sobre vérias empresas. O processo de integragdo entre as empresas dava-se principalmente através de holdings transnacionais — organizagoes finan- ceirss que mantinham e geriam o controle de agdes © as operagdes de um certo grupo de empresas. J4 0 mesmo nio acontecia com os grupos nacionais. Neles essa integragao tinha caracteristicas de uma organizacio interfamiliar. A familia ocupava um lugar tio significativo na estrutura de controle e administragio das empresas que sc pode falar de grupos nitidamente familiares, scjam cles uni ‘ou multifamiliares, Foi esse 0 caso de grupos oligopolistas como os de Ermfrio 60 de Moraes, Bueno Vidigal, Quartim Barbosa, Villares, Mourio Guimaries ¢ Ma- tarazzo, entre outros. Os grupos nacionais eram controlados por grupos familiares que distribu(am as ages € as posicdes administrativas entre si, seus parentes, ou entre grupos familiares menores, ligados as families nucleares, mas nio necessa- riamente aparentados, como cra o caso do grupo Almeida Prado. Em principio da década de sessenta, somente 3 dos grupos nacionais multibiliondrios nao se- guiriam essa estrutura familiar; 7 eram formados pela reuniéo de empresarios isolados ¢ somente 12 grupos podiam ser considerados como liderados por admi- nistradores. Dos 55 grupos, 28 (50,9%) possuiam holdings puros dentre as firmas que os compunham, sendo que a maioria deles era de grupos nacionais de origem local ¢ nao de imigrantes. Os grupos multinacionais operavam através do controle aciondrio majoritdrio de suas empresas.” Os grupos multinacionais multibiliondrios viam de 80 a 90% de suas agdes em poder da matriz ¢ somente 3 exerciam controle minoritério de suas empresas, Os grupos multinacionais biliondrios mostravam tendéncias semelhantes, a0 paso que era mais acentuado 0 controle minoritério nos grupos multibiliondrios locais. Nenhuma formacio é mais representativa do processo de integracéo capita- lista (internacionalizagiio, centralizagio organizacional ¢ fusao e inlerpretagio financeiro-industrial) que ocorria em meados da década de cinqiienta ¢ princfpios da década de sessenta do que a do gigantesco Atlantic Community Development Group for Latin America, mais conhecida por sua sigla ADELA. A ADELA foi formada em 1962 a partir de recomendagdes feitas por um think-tank* enca- begado pelo vice-presidente da Standard Oil of New Jersey (grupo Rockefeller) ¢ pelo vice-presidente da FIAT (complexo Agnelli)."” A ADELA foi posta em agio por parlamentares da OTAN ¢ stmadores dos Estados Unidos, entre os quais exerceram papel importante Hubert Horatio Humphrey ¢ Jacob Javits, entio senadores ¢ membros do Council for Foreign Relations. A ADELA foi registrada no Grao-Ducado de Luxemburgo em setembro de 1964, operando na América Latina através de um escritério em Lima, Peru. A organizagao consolidou-se no fim da década de sessenta ¢, em fit 1972, os acionistas da ADELA incluiam cerca de 240 companhias industri: bancos ¢ interesses financeiros de 23 paises, cuja lista é apresentada no Apéndice A. A organizacao € financiada por alguns dos maiores complexos industriais financeiros internacionais, o que faz com que cla tenha consideraveis recursos ¢ canais de informago. A ADELA € também capaz de exercer forte pressio sobre os governos dos paises onde opera.” As suas funcdes séo explorar as oportuni- dades de investimentos para as corporagdes multinacionais ¢ criar um clima favordvel para investimentos usando sdécios locais, um papel politico que era anteriormente exercido pelos governos dos paises onde as matrizes destas com- Panhias estavam situadas. Além disso, a ADELA objetiva o desenvolvimento de uma estratégia de penetracdo através de investimentos diretos, assisténcia técnica ¢ pericia administrativa, andlise de mercado e comunicagées com focos locais de poder. A ADELA se propde também a realizar contratos com instituigdes financeiras internacionais, estendendo suas atividades a praticamente todos os selores econdmicos. de NT: grupo de especialistas organizado por uma empresa, agéncia governamental etc € comissionado para reslizar estudos intensivos ¢ pesquisa de’ problemas especificos 61 A lista de corporagdes multinacionais que fazem parte da ADELA sugere claramente 0 poder subjacente & organizagio. A ADELA € uma organizagio su- pranacional para o marketing internacional, Mas isso nfo 6 tudo. Além de ser uma orgenizag3o de consultoria, a ADELA opera também como investidora ¢ esté diretamente envolvida em atividades econémicas. No Brasil, s ADELA ope- rava diretamente através das companhias apresentadas no Quadro 1. A ADELA assumiu também o papel de mediadora entre instituigSes finen- ceiras internacic ¢ 08 paises latino-americanos no planejamento do desenvol- yimento desses ultimos, O Relatério Anual de 1968 mostrou que a ADELA tinha, em conjunto com a International Finance Corporation — IFC ¢ o Banco Interamericano de Desenvolvimento, “contacto continuo ¢ livre troca de infor- mages, de mancira a evitar duplicidade de esforgos nas éreas de desenvolvimento ¢ perticipar conjuntamente das anélises de oportunidades para investimentos”. A ADELA tinha um grande numero de projets em comum com a IFC are joint ventures (empreendimentos conjuntos) em grandes investimentos.“* A IFC foi fundada em 1956 em bases semelhantes as da ADELA. A IFC investe isola- damente ou em conjunto com outras corporagdes multinacionais em alguns dos associados e empresas publicas do Brasil. O Quadro 2 mostra ‘8 sua rede operacional, © interessante notar que companhias participantes da ADELA e ligadas & IFC estariam a frente da campsnha contra o governo de Joao Goulart, dando apoio financeiro ¢ agindo através de seus diretores que operariam como ativistas politicos, © capital monopolista, mediado pela penetracio de corporacies multinacio- nais, redefinia a divisio internacional do trabalho ¢ estabelecia um novo centro produtivo-chave e um bloco organizacional dentro da estrutura sécio-ccondmica brasileira. A industrializa¢o do Brasil seria integrada ¢ absorvida por corporagées multinacionais de acordo com a estratégia de expansio do capital global, subli- nhando os novos graus de internacionalizacdo, centralizagic e concentracgo de capital. O capital monopolista transnacional ganhou uma posic&o estratégica na economia brasileira, determinando o ritmo e a dire¢do da industrislizagio & forma de expansio capitalista nacional. para 2 desnacionalizagio, concentragio ¢ predominancia em setores industriais especfficos das multinacionais aumentou fundamentalmente apés 1964, uma vez que as condigSes politicas ¢ econdmicas para esse movimento ascendente foram impostas. Nesse proceso, o capital ‘arvericeno estabeleceu a supremacia entre os interesses multinacionais. Em 1969, a “‘apropriacio” da economia brasileira por interesses multinacionais era um fato consumado, Compa- nhias multinacionais controlavam 37,7% da inddstria do ago, 38% da indistria metalérgica, 75,9% dos produtos quimicos ¢ derivados de petréleo, 81,5% da borracha, 60,9% das m4quinas, motores ¢ equipamentos industriais, 100% dos automéveis e caminhdes, 77,5% de pecas e acessdrios para veiculos, 39,8% da construgo naval, 71,4% do material para construcio de rodovias, 78,8% dos méveis de ago e equipamentos para escrit6rio, 49,1% dos aparelhos eletro- domésticos, 37,1% do couro e peles, 55,1% dos produtos slimenticios, 47% das bebidas, 90,6% do fumo, 94,1% dos produtos farmactuticos, 41% dos perfumes e cosméticos ¢ 29,3% da industria téxtil."* 62 Quadro 1 ADELA INVESTMENT Co S.A. Luxembourg ADELA ADMINISTRACAO E SEAVICOS Lida ADELA EMPREENGIMENTOS E CONSULTORIA Lia 7 ' IND. TECN. DE ARTEFATOS| 7 FRANGOFRITO CHICKEN-IN }}-===—}- PLASTICOS DISTRIBUIDORA Grams ca] LU. Marine Midlaed, hes j pgm INDUSTRIA NOVA ARMAZENS CEAAIS FRIGORIFICO UNIAO| CIA_DE INDUSTRIAS OUIMICOS DO NORDESTE =CiQUINE> troquiae, Brasil Mitsubiahi, Japiio Rayal-Dutch Shell ===. International Finance | Corp, W'ton.. Kiabie |rmdos. Oronit Monteiro. Arenhe, Brasil! _ Fonte: Guia Interinvest, 1973, p. 722. Quadro 2 OXITENO S.A. IND. E COM. Monteiro Aranha, Brasil PETROOUIMICA fe farne Mi UNIAO. “ne Moreira Sales. ne == === 9090 Peet Ie, Brest ————— | | | — Petroquisa, Brasil 1 1 i Y i! | | [POUOLEFINAS \| | 1 Utd if | ' ¥ {| Phillips Petre | woe | | i National Dist fips oleum. USA | | Villers, USA | | Lokab, Brasil ' | | Brasil — Luutharenni.|¢—————-——— SARIN + Klabin Irmios, Brasil ra “ Brasil AGOS VILLARES| Stupe Dumont- Villares, Brasil LL. August Thyssen Hatte 1 J 1 1 1 | + CIA, DE CIMENTO Financiére, Glaris Fonte: Guia Interinvest, 1973, p. 723. Em um estudo preparado para o Subcommittee on Multinational Corpora- tions do Committee on Foreign Relations do Senado americano, Richard New- farmer ¢ Willard Mueller mostraram que a intensa penetragéo de investimentos multinacionais na economia brasileira e a sua concentracao em setores econdmit chave levaram a uma desnacionalizagéo industrial significative. Mencionaram ainda que as tomadas de decisio empresa ias domi nacionais pareciam ter sido transferidas efetivamente para as matrizes no exterior.‘? ‘a, aproximadamente 70,0% dos 7 bilhdes de trangeiros no Brasil em 1972 jam para a manufatura, responsdveis por mais de 3/4 do ativo liquido americano e por das vendas das indtist “Além disso, poucas corporagdes multinacionais con- trolam, em cada setor industrial, a maior parte do ativo e¢ das vendas, Firmas se de outros paises respondem por 158 das 500 maiores empresas iras no Brasil em todos os setores. Na industria, elas totalizam 147 das 300 maiores firmas. Mais importante ainda, corporacdes multinacionais controlam 59 das 100 maiores corporagdes industriais (as 100 companhias do- minantes possuem mais de 3/4 do ativo das 300 maiores)”."* Conseqiientemente, Newfarmer e Mueller chamavam a atencao para o fato de que as empresas privadas brasileiras gozavam uma posicao semelhante de proeminéncia somente em trés setores industriais: minerais nao-metalicos, produtos de madeira ¢ papel ¢ industria alimenticia, Empresas estatais predominavam na produgso de aco ¢ refinamento de petroleo (as empresas estatais associavam-se a multinacionais na produgo de ago). Newfarmer © Mueller também salientavam que a “desna- cionalizagao se interliga & concentraggo industrial j4 que as corporagdes multina- cionais acham-se geralmente localizadas em mercados concentrados. A manufa- tura é geralmente bastante concentrada: em 176 de 302 industries, as 4 fabricas dominantes produziam mais de 50% do valor da produgao. Firmas estrangeiras possufam 3 ou 4 das fébricas dominantes em 32 inddstrias, 0 que respondia por 26% da producao industrial. Quando combinadas as industrias nas quais pelo menos 2 das 4 fabricas dominantes pertenciam a corporasGes multinacionais, as firmas estrangeiras dominavam -66 industrias, compreendendo 44% da produgio manufaturei irmas estrangeiras mostravam uma concentragdo 6 mais alta do que as firmas nacionais, pelo fato de operarem mais

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