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O DUPLO OTTO RANK artimos das ideias superstic s ainda hoje estao vi como, por exem puderam stume muito a Alemanha e tambér nais, realiz edo Natal, ose. inte teste: aquele qui Sacender da luz, nao fize ombra na parede do qua entre os judeus, rela le que, na sétima no} te da festa de Pentecostes, caminhar sob o luar: se sua sombra nio tiver cabega, morreri no 1 ano.’ Em as aldeias alemis, pisar na prépria sombra é sinal de morte.” Em oposigao a crenga da auséncia de som bra causadora da morte, uma outra supersti¢io alem’ diz: quem ver sua sombra duplicada, durante as doze noites santas, morreré.® Para F essa concep: 40, foram apresentadas diferentes teor tre a guais algumas bastante complexas. Dessas, queremos salientar as que dizem respeito sian respeito A crenca em um espirit Na opiniao de alguns pesquisadores," a crenga em um espirito protetor, que se desenvolveu a tir da superstigdo da sombra, est intimamente rela cionada com a duplicidade. Rochholz classificou 2 sombra que segue o corpo como o motivo original s histérias da segunda face, da visio de si mes mo, da sombra na poltrona, do duplo, do fantasm: no quarto de dormir (Rochholz, 1860).* Pouco pouco, a sombra, que continuou a viver além do ti mulo, havia se transformado em duplo, o qual nas: m cada crianga."* Pradel explica a cre efeito pernicioso da sombra dupla, conside que, na hora da morte, o génio aparece a pessoa e se junta a sombra.® Ai esto as rafzes da importan- c ideia para nosso tema, de que o duplo que vé a si mesmo, morrer em um ano."* Rochholz, que se ocupou especialmente com a crenga em um espiri to protetor, considera que a significagao primit dessa crenga era benéfica, e que teria mudado gra dualmente, reforgada pela crenga no além, para uma cacao desfavoravel: a morte.” “Assim sendo, a sombra do homem que, durante sua vida, era um espitito enviado para protegé-lo," se transforma em m fantasma assustador que o persegue e vitima até norte”® (Rochholz, 1860). Até que ponto isso da desde a antiguidade, a tentativa de aniquila , lien yer ledeteteicubes perk Coclnvecl do niadioevs soas ferindo seus duplos” Também segundo crengas do psicolégica do tema indianas se aniquila um inimigo ferindo no coracao As superstigdes e os medos relacionados & som: sua imagem ou sombra (Oldenberg p.508).* bra, que encontramos entre os poves civilizados de Os povos primitives tém uma quantidade enorme 10850 tempo, tém seu correspondents ent iniimeras de tabus que concernem especificamente a sombra: proibigdes (tabus) relativas & sombrachfandidasen evitam projetar sua sombra sobre certos abjetos (es F@ OS povos primitivos. Conchii-se, a partir do Fice pecialmente alimentos); temem também a sombra material do por Frazer,” que nossa “supersti s pessoas (em especial de mulheres gravidas, 40” encontra, na crenga de povos primitivos, entre outras. op. cit. p. 83 er seq.) verdadeira equi da dano infringido ‘cuidam para que ninguém pise em suas sombras sombra atinge também seu dono, como acrédita um Nas ilhas Salomio, a leste da Nova Guiné, qualquer mimero dé povos primitivos (Frazer, 1915, native que pisar sobre a sombra do rei seri conde: 8). Com isso, abre-se naturalmente um vas nado a morte (Rochholz, p. 114). © mesmo aconte po pata a feitigaria e a m ivel que, em ¢ na Nova Geérgia (Pradel, p. 21) e entre os cafres algumas das representagdes poéticas examinadas, Frazer, op. cit. p. 83). Os povos primitivos tambén " evitam projetar suas sombras sobre um morto, possa ser reconhecida uma reminiscéncia da in! éncia magica na morte do her6i, com o dano em se xo no espelho, retrato ou duplo.” De acord: Negelein, “é amplamente simulo ou atatide, e por isso os funerais n muitos casos, A noite (Frazer, op. cit. p. 80) O significado da morte, ate tigoes, pode-manifestar-se, també de doengas ou outros males. Quem indica convalescenga (Pradel). A satide das no faz sombra, acontecem ao passo que uma sombra mais nitid ambém estava relacionada & sombra. Alguns povos levam ainda hoje seus enfermos a0 sol para atra lta sua sombra, a alma prestes a partir. Co raz6es opostas, os habitantes de Amboina e Uliase duas ilhas na linha do Equador, nun 20 meio-dia, porque nesse horar sombra desaparece, e eles (Frazer, p. 87). Aqui entram as id curtas e longas, pequenas e cresce como o poema de Stevenson. A crenga de que as 9 tamanho de sua tence a esse imaginario A mesma c ocorre entre lus, em que asom| na um espirito ancestral, e a curta perm > defuntos. A isso se junta uma outra supersti¢ que esta relacionada com o renascim filho.® Os silvicolas que acreditav ordo com Frazer (op. cit. p.88), um: muito grande da crianca com os pais. Quando uma crianca se parecia det ais com seu pai, acred que este deveria morrer logo, porque a crianga puxa 4 sua imagem ou silhueta para si. O mesmo aconte ce com nomes, considerados parte essencial da pe sonalidade pelos povos primitivos. Ainda na culttara iiropeia, sé manteve werenga de que, em uma famé lia que tem duas criangas com o mesmo n deverd morrer.” Vale Iembrar a fobia relacionada a0 nome presente no conto “Willian Wilson’ de Poe. A mes” também est Tigada a invocagao Segundo Freud, todos os objetos tabus tém cara ter ambivalente, e alusdes a isso também aparecem relacionadas 4 sombra. A crenca, anteriormente ci a, de reencamagio da sombra paterna na crianca condu ja mencionada concepgio da sombra como espirito protetor desde o nascimento. Oposta as con: cepgoes de morte — ainda que menos difund a ideia de fertilidade ligada a sombra, segundo Pradel (p. 25 et seq.) Em oposigao & ideia de morte, que a sombra adquiriu para o homem, esté a expres: ao biblica na anunciacao 4 Maria, que esperava um filho apesar de nao ter tido relacdes com um homem: ° Espirito Santo vira sobre ti, €a virtude do altissi mo te envolvers com a sua sombra’ (Sévayus Sgiotov Emad cot, Lucas, I: 15).£ notavel que, na expres sao émayudoe, Agostinho e outros nomes da Igr considerem 0 conceito de frieza como oposigao ma concepgio derivada do prazer. Além disso, Pra del cita a frase: “Silencio, vocé nio foi coberto pel sombra do Espirito Santo’,” e menciona um mito Taiti, no qual a deusa Hina engravida da sombra, pro- jetada sobre ela, pela drvore da fruta-pao, que havia sido sacudida por seu pai, Taaroa." Os tabus rel cionados & sombra da s 4 , referidos por Frazer pedimento dessas consbuem par impedes So vod a a i, Meridional, por exemplo, é motivo de sePs are ental da sombra do homem so- racdo a projecao acidental da enema ndia Central, onde esse medo € 8 ee tam contato com neralizado, as mulheres grévidas evita “O08 mnbra de um homem, por receio de que es da com ele (Erazer, p.93)- Comparadas 3 peoes das sombras que crescem ou dim ssociada a essa variagao, ter com a virilidade @ ae s simbélica da poténcia masc a me est4 relacionada tanto com & fertilida¢ i balada “Anna’ Ge Lenau, © Si de base para a Ope nificado a fertilidade da sombra serve ' r ombra’, Cujo A mulher sem so ra de Richard Strauss “Am Je Hoffmannsthal € baseado em fonte ort? ental, texto d ne a princesa © tal, No meio da trama tem-se uma nos ombros. A Ja (confo: a no dia de seu ca sipa so poderia ser expi profecia sae faeao vermelho a princes oe m no maximo trés anos; essa uniao Os anos vao pas: a. Elaé samento) 5°, & fosse agraciada com uma erlanga. OS 2008 sando, mas 0 desejo da princesa sem sombra... No f a ‘ sek 4 Jho aparece de ovo e concede um jas. Para ajudar iiltimo prazo de cinco d ed tiliza um attificio: encontra um jo tureiro que anseia ser abengoado com uma crianga enquanto sua esposa rabugenta se nega a dar-the tal graga. De modo semelhante a uma crenga comum nas lendas orientais, 2 ama tenta comprar a som bra dessa mulher, isto 6 sua fertilidade. Em troca de tesouros preciosos, um amante é conjurado, ra pidamente e de forma fantasmal, a partir de um es. pantalho. Em adverténcia, elevam-se as lamiirias das criangas nao nascidas, do fogo do fogio, onde, em forma de pequenos peixes, sio jogadas na frigidei a, através da janela. (A propésito, algo em um conto dosirmaos Grimm.) A impe ratriz sente uma profunda e humana compaixao por eles, a quem ela ndo queria privar de seu destino, que significa a quintessncia do deleite feminino. Nesse instante luzn catarse emocional, ela é cercada por uma ravilhosa e seu desejo se torna realidade. Ela, a mulher sem sombra, que até entio era transluzente 0 cristal, de repente impede a luz, langando uma a, ¢ das esferas mais altas Richard Strauss dei xa 0 coral mistico das criangas nao nascidas ressoar. Asombra também assumiu um significado de sor e, assim como quase todos os simbolos relacionados 4 boa fortuna, que eram, originalmente, simbolos de lidade. Enquadram-se aqui ndo apenas o poder de cura da sombra de certas érvores (especialmente na Biblia), mas principalmente seu papel de guar dia de tesouros (cf. Pr nesmo seu pode tica a sombra valia também le aumenté-los (na pratica : nitadora de propriedades). Na fabula india na sobre a filha do lenhador, o espitito que corteja a pobre menina fala ao seu pai: dé-me sua ila enti sua sombra crescer, seus tesouros serio bu a (Rochholz conforme a selec’ en conto or m leva Bhatta, traduzido por Brockhaus, II, 193)..Aq fe ramos de Peter Schlemihl, do estudante Balduin = de outros que foram compensados pela perda sombra com riquezas, as quais usam para tentar, em vio, conquistar a mulher amada O her6i de outras obras literrias em que o Pr lema do duplo é representado pela mudanga de sim, o conto de Théophile Gautier, ‘Avatar’, & espe e pelo Tato de mover o desejo cialmente interessante pe ? de rejuvenescimento para 0 primeiro plano, Octave se consome e definha pelo amor nao correspondido de uma condessa que Consulta um médico eee ecém chegado das Indias amoso na arte da cura, recém cheg raven eegue fazer umma transmigracao de alma en tre Octave e Olaf, o conde rival. No entanto, a fiel condessa reconhece Octave no corpo do marido ese vantém distante. Desafiado a um duelo pelo conde, que descobre o ardil, Octave tem a chance de mati Jo, mas nao o faz, pois estaria destruindo seu pré prio corpo. Depois de reconciliad ree pede 0 médico que de troca de almas. De posse de seu verdadeiro corpo, o conde Olaf vol ta para a condessa. Entretanto, ao destrocar as almas, o médico deixa escapar a alma de Octave e se apode ra de seu corpo jovem para o qual transmigra a sua propria alma, abandonando o corpo de anciao. notivo se pde em evidéncia de uma maneira especialmente dristica no grotesco romance de J les Renard Le docteur Sous-dieu [O doutor Lerne — Semideus], cujo herdi tenta resolver o pro blema com um procedimento cirtirgico, invertendo personalidade através da troca de cérebros. Lerne velho e rejeitado por Emma, a sexualidade personifi cada, toma para sio corpo de seu sobrinho, a fim de ser amado por ela do mesmo modo como ela ama 0 vigoroso jovem, Acaba sendo tao malsucedido nisso quanto 0 heréi da novela de Gautier. O duelo con 0 duplo aparece aqui no modo como o sobrinho banido em um corpo de touro, quase mata o seu eu corporal (agora com outro cérebro) num momento de citime, 20 ver 0 outro abracar a sensual Emma. O extremo s6 ¢ evitado porque © tio, no momento crf ico, interrompe o bizarro duelo entre eu-humano e eu-bestial com o clamor: “Querido ami Nessa configuragao do motivo do duplo, assim como em outras, o tema da impoténcia recebe um foco especial, por ser, muitas vezes, a motivaca¢ direta para a troca de formas envolvendo o re Em outros casos, come na novela de Arthur Schnitzler, intitulada Casanovas Heimkei (© regresso de Casanova], essa tendéncia se reve ent si, que ja no € nenhum jo Jmente quando o herdi, que j ; ompra uma noite de amor com uma bela e fré Jha, na aparéncia, gil mulher, cujo amante se asseme ; Casanova em sua juventude. Em circulos psicanaliticos, hd muito sur ombra de Schlemihl fn ra falta d ideia de considerar a \ de Robert Hamer como impoténcia (Stekel),"” alg do Homiinculo ([1888] livro al Peter Schlehmil; 0 co ling também parece aludir: “..Pe é thecido homem (0 coitado!) sem sombra..”. Tam ben agio ligado »ém se presta para o significado de cas da da sombra, o conto de Oscar Wilde “C cador e sua alma A casa das romas), Si quer se livrar da prépria alma, que se coloc Ao tentar si aba se si s individuais da tema ent ido simbélico-sex 2.0 problema mais amplo da im ctor ¢ entre certos nati transformada de espirito pr i localiz: n consciéncia que ent > qual parece bastante conso. : persegue e atormer ‘ que esté intimamente rel ligdes folcldricas. Os folcloristas, una cionada com a sombra (choi). Entre os massim Saray egatytledhedy Nova Gu ‘ano. Daf derivam tanto o particula: aalma de um morto, © que tem o mesmo significad os tabus e crendices a ela de som .é Britanica, chama-se arugo o espirito ot Ima do ser h i respeito que é dedic Sl a relacionados, quar 1 reflexo do espelho (p. 207 ‘ Nova Guiné Al ansgredi-los, j4 que > ferimento, o dano a perda da sombra sio seguide ap le morte, T ou parte dela (p. 267) P pisar sobre eferindo-se & identificacio da som sombra. Na Melan pala a.com aalma no - nio ou niono designa somb: habitam os I povos primitivos , in res mais remotos da Tasmania, di antes das ilhas Fidji sombra, yaloyalo, é uma reduplicagao d ima yalo (p. 412). Ao observar os nativos das ilhas do Estreito de Torres, que x palavra mari para de mbra ou reflexo, Frazer supos que o termo para a alma humana, em muitos povos do reflexo do corpo na agua (p. 173) nv clore mostrou, sem diivid es relacionadas ao fol alguma, que os homens primitivos consideram seu misterioso du Os habitantes das ilhas Fidji brae que v rem que ao Hades, e outra lumino- a qual permanece préximo ao seu local de mort A partir desse significado da sombra, expdem-se su ficientemente as 1 is precaugdes e proibig bus) que onam a el abus) que se relacio Se perguntarmos pela origem da crenga na alma como sombra, entao as noges de povos selvagens e nbém de antigos povos civilizados mostrario que mais antiga concepgio de alma era, como expressa Negelein, um “monismo primitivo’, no qual a alm ‘epresenta um andlogo 4 imagem do corpo. Ass sombra, inseparivel da pessoa, torna-se uma das pri tes de que o primeiro ser humano visse sua imagem em um espelho! lein, 1991) A crenga da alm: ana como uma imagem exata do corpo, difundida por povos selvicolas do mundo todo, foi inicialmente percebida na sombra," sendo, também, entre os anti gos povos civilizados, a crenga primeva em uma alma sundo Erwin Rohde, provavelmente o mais arguto crengas e cultos 4 alma entre primitivos na permanéncia de uma sustentada também por Spiess (op. cit. p. vvés da indicagio de uma vasta literatura. Segundo el ceS08 ob a expressao hebraica Rephaim também designa aqui Pan ee acnserie 0 que permanece apds a morte de uma pessoa, “os abstracio. Sogn «psi he ‘opacos ou 0 fracos, ou seja, as sombras, os habitar homen 2s veaes, em sia forma tes do reino dos mortos, um nome andlogo ao terme perceptivel eem sua imagem invisivel,a qual 6 s E liberta na morte. Issa, e nada além, é sua psi Sen Nas pessoas viva, eae A mais antiga crenca na alma est ligada a m itante, um como Spiess mostrou particularmente com os povos ivilizados, mas em especial como Frazer mostrou também com os mais primitivos selvagens. A primei ncepcio de alma dos povos primitivos, també a mais importante para a histéria da humanidade, é dos espiritos dos mortos, que na maioria dos casos los como sombras, assim como nds f Também no Egito, a forma mais antiga da alma era lamos ainda hoje do “reino das sombras”,referindo: a sombra (Negelein, segundo Maspero) ¢, s i aoe. nos aqueles que partiram. Moret," os conceitos de alma, duplo (Ka), ima, Sse permntaramn mas néo produzem sombras, como, por éxemplo, 0 Jé queas almas dos mortos so sombras, elas mes es dal persas afirmam diretamente sobre os que desperta bra ram novamente para a vida.!"* De acordo com mu tos autores,* a observacio de que os corpos mortos tribuido para a aceitagio da ideia na sombra, Assim a regiao sagrada dos arcadianos, 0 banged slein) porque nao tem sombra, Liceu, onde impera a inexisténcia de sombras, tam. porque ela é um fantasma. Segundo crengas russas, 0 bém foi considerada como reino dos condenados. Jiabo, assim como deménios malignos, também nao Segundo Pausanias (VIII, 38, 6), a entrada nessa re em sombra e por isso é tao vido das sombras dos gito era la is pe juem nao respeitasse a lhumanos (cf.o pacto de Schlemihl, Balduin, entre ou proibicao, morreria dentro de um ano. A auséncia de tros). Quem esti a mercé do diabo nao apresenta, p sombra aponta aqui, com quase tod cia isso, uma sombra (Pradel). upersticiosas, para a morte iminente, cuja auséncia que o diabo é passado para tris em seu pagamento, a0 penas” a sombra no lugar da alma que lhe de sombra antecipa. Ea sundo Rochholz (op receber cit. p. 19), no Abaton do monte Liceu, “o deménio 2 de direito,"” ja parecem representar uma reagio erda da sombra. Ori protetor abandona 1a do abengoado intruso e ande significincia d xa-lhe o terror da morte” "’ Nao apenas alma, mas nalmente, como Peter Schlemihl e si m, a pessoa poderia s feiticeiros‘"” proximos a ela sio despossuidos de som no prezava muito a sombr Fa, porque eles s2o originalmente sombras, ou seja, aia almas. Os espiritos e elfos, que segundo o pensamen. to dos neozelandeses nao tém nada levam consigo do que € oferecido, nad: som Negelein, por meio de um vasto material folclo. ristico de va ilizagbes, mostrou que “as ideias e os ritos s ciosos origindrios da imagem do es. pelho assemelham-se em todos os seus pontos prin Cipais’: Aqui também est em primeiro plano o mede da morte e da desgraga. Em terras germanicas, nao permitia colocar um cadaver frente a um espelho ou olhé-lo através de um espelho, pois, do contririo apareciam dois cadaveres, e 0 segundo atrairia um: outra morte." De acordo com superstigdes da Dal: ncontradas em Oldenburgo, aquele que se olhasse no espelho, enquanto houvesse um defunto na casa, morreria. A forca desses medos pode ser comprovada pela crenga, amplamente difundida e a eles relacionada, thos a fim a alecido nao pert icadovna os judeus, lituanos e ou pode entio se torn cias. Na Silésia, dize nite do ano novo, se puser em frent 5 com duias velas acesas e chamar pelo nome Je um morto, ele apareceri no espelho.'™* Na Franca, ve mo na hora da mor dizem que ¢ possivel ver a si mesmo na te, a0 conduzir certa ceriménia diante do espelho n: Noite de Reis jas se relacionam as proi bigoes de olhar para o espelho durante a noit Prissia Orie € que atris de para o espelho aparece a n lial Jguém percebe ao lado de seu 5, entio logo morrerd antes n do espelho € nta para pelho, mias.' Der ‘senta um sinal de morte em toda Aleman embora junto a isso jemi Ihar por tiltimo para um espelho rachadc reze pessoas sentarem juntas, morrerd aquel que sentar contra o espelho."*S Em certas regiées, para se proteger dessas forcas misteriosas, se faz re fletir a imagem de um gato em um espelho novo." Além disso, nao se deixa de modo algum que crian as pequenas se vejam no espelho, por medo de que seu duplo sofra graves danos."” Acredita-se que, com isso, a crianga ficaria orgulhosa e frivola ou qu eceria e morreria.!™ Segundo Negelein, faz part crenga no duplo a convicgio de que o espelhor coisas ocultas, dai decorrendo 0 uso magico do Iho para predicao do futuro, Dizem, em Oldenburgo, por exemplo, que & possivel ver o futuro no espelho colocando-se diante dele, A meia-noite, com duas: acesas e olhando atentamente dentro dele, enquanto se repete 0 proprio nome trés vezes. Nesse context dos ritos mencionados, fica claro que o “futuro” nao se refere a “o qué’, mas sim ao “se’ isto é, aquilo que nteressa ao homem, seu tempo de vida. Contrastandc com esse significado, fica em segundo plano aquele do espelho como profeta do amor, embora a moga 4 pratica ritos semelhantes veja, no espelho, na maioria das vezes,“o prometido” (para ela, 0 mesmo que“ fu turo”).."” No entanto, as mogas vai cara do diabo|* ese elas quebram um espelho, acre ditam que nio terio nenhum homem por sete anos. ‘Omitiremos aqui 0s sos magicos e manticos do espelho (¢ também do esp aos quais Negelein e Haberland se referem,'*" e passaremos di retamente para a origem deles entre os povos primiti vos. Assim como na sombra, os selvagens veem uma corporifiagio'* da alma no vidro, na gua ou na re- producao da imagem em retrato, a que também esti relacionados muitos tabus.'* Em uma tribo das Indias Orientais holandesas, adolescentes nao ousam.olhar no espelho, porque acreditam a beleza € deixé-las feias.!* Os aulus nao Pantano sujo porque ele nao reflete sua imagem gue teria sido roubada por uma criatura que mora ali acreditando que, se olhassemy, iriam morrer. Entre o: basutos, quando alguém morre repentinamente, sem nenbuma causa aparente, diz-se que um crocodile te ria puxado a sombra da pessoa para dentro da égua Segundo Frazer,'** 0 medo do retrato e da foto grafia da prdpria pessoa, por motivos semelhantes, € comum em todo 0 mundo, podendo ser encontra do entre esquimés, entre indios americanos, tribos da Africa Central, da Asia, nas Indias Orientais ¢ Europa. Como eles relacionam a imagem da pesso: com sua alma, temem que qualquer reprodugao dela em mis alheias possa ser um meio de trazer-Ihe in uéncias danosas, até mesmo mortais. Muitos povos Primitivos acreditam que morreriam imediatamente ao ter sua imagem reproduzida ou em maos alheia Histérias divertidas sobre o medo da fotografia, entre os povos primitivos, sio contadas por Frazer, assim como, mais recentemente, pelo missionério Leusck ner sobre os Jautz na China meridional." Esse medo propria imagem, por motivo da crenga na alma, se idea qualquer tipo de figuragao. Assim conta Mei nhof: “Uma reprodugao plistica da imagem de uma pessoa pode perturbar muito os africanos, podendo contecer de a reprodugio ter que ser destrufda para acalmar as pessoas nervosas’. Sobre os Waschamba, Warneck!” relata que nao queriam ficar sozinhos com as fotografias de pessoas que os missionarios haviam pendurado em sua sala; tinham medo de que as fotos pudessem adquirir vida e persegui-los Segundo crendices alemas, uma pessoa nao pode $e deixar pintar,* porque pode morrer."* Frazer ve ificou' a mesma crenga também na matte sia e na Albania e encontrou vestigios dessa na In glaterra e Escécia atuais. Ideias equivalentes a essas crendices aparecem em civilizagdes antigas, como, por exemplo, entre os gregos ¢ indianos, que seguiam a regra de nao olhar o seu reflexo na dgua,'S porque isso traria a morte em sree." “Nao poder mais ver seu proprio eiSwhov no espelho é um sinal de morte’, * Entre os gregos tam: m era um agouro de morte olhar seu reflexo na 4gua em um sonho.' Na crenga germanica, a imag superficie da 4gua tinha igualmente um significado de morte, mas nos sonhos, por vezes, era considerada como um sinal de vida longa." Entendemos isso nio apenas como contraste do desejo, mas também da possibilidade de considerar sonhos com gua como representativos do nascimente Aquise incluem as interessantes tradicoes mitol6gi cas que, também em sug es com o espelho, mos: tram 0 efeito fertilizador que é atribuido a sombra. A isso interessa principalmente o mito de Dionisio e 08 mistérios a ele relacionados. Jé sua mie, Perséfone, olhou-se no espelho'* antes de dar & luz Zagreu, 0 que Negelein entende como “uma concepeio a teracao entre personalidade ¢ o dupl de certo modo, como compensacao por sua primeira concepgao puramente feminina, ficou entio conheci do pelo renascimento como Dionisio, realizado unica mente por Zeus em sua coxa. Também nessa histéria to, hé a participagao de um espelho. O pelho feito por Hefesto, quando os titis enviados pela iga Hera chegam e © partem em pedacos apesar da sua transformagio. Somente 0 coracio foi salvo, por meio do qual Semele geraria Dionisio da maneira an: tes mencionada." Proclo narra outro importante mitc relacionado a Dionisio: ele teria se olhado no espelho forjado por Hefesto e, atraido por sua propria imagem, teria criado todas as coisas." Essa concepgio helénica tardia da criagdo do mundo material tem seu modelo na cosmogonia indiana, que reconhecia a autorrefle xo do ser primordial como base do mundo material e prossegue nas doutrinas neoplaténicas e gnésticas. Os gnésticos afirmavam que Adao, ao se contemp um espelho e se apaixonar pela propria imager perdido sua natureza divina Os efeitos danosos oriundos da contemplagio Jo espelho sao claramente representados por Plu: arco,'* na lenda de Entelidas, 0 qual encantado por seu reflexo na agua, adoece com o proprio olf doso, perdendo a satide e Os doislados da crenga se em uma sintese singular na conhecida histéria de Narciso, na iltima forma como essa veio a nés. Ovidio conta! que, no nascimento de Narciso, perguntara ao vidente Tirésias se a crianga teria uma vida | a0 que ele respondeu: se ele nao se vir. Um dia, no en. tanto, Na iso, que era frio com nna agua seu reflexo e se apaixona de tal modo pelo jo- que brilha diante de si que se consome de desejo por ele, Segundo crengas tardias, Narciso se suicida apés ter se apaixonado por seu reflexo. No submun do, ele ainda admira sua imagem no Estige. Segund¢ uma concep¢io racionalista posterior, de Pausinias, Narciso fica desolado apés a morte de sua irma gémea, que se parecia muito com ele no traje e na aparéncia, ae olha para seu reflexo e, embora sai do apenas sua sombra, sente um certo alivio da dor de amor. Ainda que admitamosatualmente que o ques. tionamento de Tirésias e outros elementos" tenham sido acrescen dos, e nio pertencam a lenda original, nao podemos ter a certeza, como suste de que a histéria de Narciso tenha sido, a principio, apenas uma expressio postica da supersticio de qu refletida na agem (0 seu duplo) gua, e que a paixao pela prépria imager que constitui a esséncia da lenda de Narciso, s6 foi utilizada para esclarecimento, mais tarde, quando este sentido original ja nao era mais conhecido.

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