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O Estado da Arte sobre os Instrumentos e Técnicas na Intervencio Profissional “Taw do Assigtente Social — uma Perspectiva Critica Clindia Ménica dos Santos ‘Karine Noronha Introducio Ese artigo apresenta um resultado parcial da pesquisa intitulada Os ins- srumentos e técnicas na intervengio profissional do assistemte social, em desenvolvimento na Faculdade de Servigo Social da Universidade Federal de Juiz de Fora,t que tem por objetivo sistematizar o debate dos instramentos e tenicas de intervencfo do assistente social a partir de autores que se orientam or uma concepeao critico-dialétic A pesquisa em tela vem-se desenvolvendo em dois eixos: 1- a leitura de documentos secundarios — livros, artigos, anais de eventos, dissertacdes de mestrado e teses de dontorado produzidos de 1990 até 2008 -, cujo objeto cen- tal sio os instrumentos e técnicas da intarvenco profissional do assistente social, no sentido de indicar os elementos comstitutivos desse debate nas pro- dugies do servigo social: 2- a entrevista e grupo focal com assistentes sociais, de Juiz de Fora que, majoritariamente, atuam nas politicas de assisténcia vol- ‘das para o piiblico infimto-fivenil, no sentido de conhecer que instrumen- ts utilizar, a partir de qual concepeio, e as habilidades e dificuldades no rmanuseid dos mesmos. Assim, este artigo tem a preoeupario de, em tm pri- ‘meiro momento, marcar os elementos fundamentals na concepedo de instra- ‘mentDs e téenicas na produglo bibliogrifica contemporinea. Em nossas"reflexdes, consideramos que os instrtimentos esto intima- ‘mente relacionados com a profissio, com as condigGes objetivas e subjecivas de trabalho e com o tipo de demanda que chega aos profissionais, sua oxigen a que ela [profissio] pretende responder. A utilizacdo dos instrumentos, em TA mesa recobe belts de inictapto ciemaica da UP e¢ pore coins da pasta "Artie as Condicses Secu Poles & Coleus «de Intevengio PreSsianl da Aassente Soe as Fmplanapio do SUAS em Juiz de Fors ¢ Repifo", werbendo cpio Sauncero da FAPEMIG (Pedago de Ampur bPenguiss de Minus Gera), pele Baia Univer e 2008 (Cada Ménics doe Seatoe ‘Kaine Noroaha consequéncia, requer dominio sobre o que é 0 servico social, sua narureza, seu objeto e seu ambite de intervencio. 1. Concepeao de instrumentos e técnicas " Dentro do limite cronolégico definido para a pesquisa bibliogréfica (1990-2008), encontramos pouca producéo no servico social brasileiro que oferece destaque ao tema dos instromentos, apesar de sempre haver algum tipo de referéncia 20 mesmo, ora na critica ao tecnicismo de nossa heranca {intelectual e cultural, ora no alerta & sua condigio de subordinagio as demais dimensGes da intervengio. ‘Na bibliografia em que ease tema é objeto cencral, os instrumentos e as ‘éenicas aparecea: inseridos na discussdo sobre: instrumental técnico-operat- ‘vo (MARTINELLI, 1994; PREDES, 2000}, instrumental sécnico (CAMPAG- NOLLi, 1993), instrumextagio técnica (GUERRA, 2007), insrumenios e téc- nicas (SARMENTO, 1984; SANTOS, 2006 e 2007). Entretanco, o instrumental se define por se constiatir dos instrumentos e técnicas, ¢ estes, por sua vez, sia ‘extendidos como elementos que comtibuem para a efetivacdo profissional Nessa diresdo, o instrumental é percebide como um conjunte articulade de inserumentos ¢ tfenivas, ado podendo serem vistos isoladamente, por si 6s, de maneirs awtonomizada, mas como uma unidade dialética (MARTINELLL, 1994). So elementos relacionais: o instrumento est sempre relacionado & véonica ¢ vice-versa, (© insrrumento considerado tim elemento potencislizador da ago; ele consiste no conjumto de recursos ou meios que permitem 2 operacionalizagio da agdo profissional. Os instrementos sio elementos “necessirios 2 atuagéo técnica, através dos quais os assstentes socisis podem efecivamenve objecivar suas inalidades’ (GUERRA, 2008, p. 47). Jd a téenica esti associada & habilt- dade no ws do inserumento; ¢ como uma qualidade atribuida aos instrumen- 0s (PREDES, 1999). Ambos sio imprescindiveis para a concretizacao do exer- cicio profissional, desde que situados no proprio projeto profissional, na pré- pila inscrumentalidade da profissdo. O instramento ¢ a técnica, portanto, constituem e slo constitutivos do modo de ser da profisdio, de uma determi- nada capacidade da profissio (GUERRA, 2008, p. 47) Os instrumentos so concebidos, assim, como elementos dinémicos, devendo ser criados em consonancia com as finalidades de ago proBssional, contribuindo com a passagem da finalidade ideal - Ambito dz teoria~ & fina lidade real ~ Ambito da pation s | | (0 Faado de Arce aire of Insramets Teascas oe lacervenio Profsicual do Asineat Socal—uma Perpectia Celica Pensar os instrumentos e téciicas, nessa proposta, requer responder & ‘questo: a partir de qual referencia estamos tomando a questio da técnica ea “TGeexuestio dos instrumentos? Hii um referencial teérico subjacente & escolkia e & utilizacgo dos mesmos. A forma como os profissionais atilizam os instrumen- tos e as temnicas expressa os entendimentos sobre as dimens6es teérico-politi- cas, De acordo com Sarmento (1994, p. 245): O instrumento é semapre orientado por ura determinado conhecimento, ‘uma teoria social, ou seja, é sempre utilizado intencionalmente. f acra- ‘vés do instriimento que vamos experimentando a teotia social, na medi- da em que permite que se vi objetivando as categorias da realidade, Sendo os instrumentos utilizados como meios de efetivar wma finalida- de, 2 escolha dos instrumentos nao ¢, de maneira alguma, “neutra”, ow seja, nfo se trata apenas de um aspecto técnico, uma vez que ela visa 2 um fim que no € somente atingir uma eficiéncia e produtividade, mas determinada ef- ciéncia e produtividade: no caso, eficidncia e produtividade nas conuligfes de cordem capitalista (SANTOS, 2006). Iso significa que 2 escola do inserumen- 10 cumpre, além de uma fumgéo técnica e operacional, uma fungZo politics e ideolégica. A técnica a manifestacao do saber, de sua intencionalidade, portanto, uin ato politico, ela nfo é neutra, dado que novas ages ou atos extdo articulados comprometides com uma pritics social (ou nfo) para transformacio social (ou fancionamento social), com priticas Hbertadoras (ou mantene- doras do poder e da dominagdo). (SARMENTO, 1994 p. 247), A compreensio de técnica 0 que vai indicar o tipo de abordagem que se faz dela, uma vez que ela permite ume pauta de intervengio: pensar um “como?” a partir de um “para qué?” (conjunto dis finalidades), arriculando-o com um “quando?” e com um “onde?” O conhecimento das téenicas ¢ muito importante no-uso dos instrumen- tos, mas a técnica, em si, nfo garante uma competncia profissional. E nesse contexto que o projeto ético-politico da profissio enfatiza alguns elementos que se referem aos instrumentos e técnicas da intervencio. O primeira é situ- ar 06 instrumentos e técnicas da intervengio profissional como um dos ele- ‘mentos constitutives da dimensio técnico- operativa do servico social. O segundo € ressaitar a relago de unidaée, na diversidade, entre as dimensSes da intervencdo profissional, quais sejam: a dimens4o tebrico-metodoligica, ® : (Clindin Ménic de Sectot Kasine Nevo érico-politica ¢ téenico-operativa, O terceiro é neger a eximéncia de neurrli- dade:n0 uso das técnicas, o suposto caréter apolitico em seu uso. ‘A concepefo defendida pelos antores pesquisados nos permite ainda des- ‘acar duas questies fundamentais: o seu caréter histérico e o cardter teleolé- gico dos instrumentos. Por formar um conjunto dialeticamente articulado com as téenicas, os instramentos sd0 constantemente aprimorados por elas, face & exigincia de adequagio diante das transformagées da realidade ¢ de atendimento das mais diversificadas necessidades socizis postas na sociedade capitalista. Conforme ‘Trindade (1999, p. 81), “a criagio e 2 utilizagio de instrumentor ¢ t6cnicas configuram um processo histérico, que se coloca em determinadas coniigbes ‘econSmicas ¢ sociais, em diferentes momentos histiricos”. ‘Quanto 20 carter teleolégico, o projeto éxico-politico da protisséo con- figura-o atualmente de forma basante distinta daquela predominante na his~ rorlografia até inicio dos anos de 1980. ‘Hi cerca unanimidade na concepelo de que os instrumentos estlo rela~ ionadas as diversas imencionalidades: & intencionalidade da profissio, do profissional, da instimuic&o e dz populacdo que procure o servigo social. Tanto 2 escolha do instrument 2 ser utilizada quamto 0 dominio do mesmo zeque- yem que 0 profissional ranha consciéncia/coubecimento de suas finalidades, ‘uma ver que of instrumentos fazem parte do processo de busca do aleance dessa Ginalidade (SANTOS, 2006). f uma instincie que se constréi 2 partir das finalidades da aco. A existéncia de objetivos, porém, nio é suficiente, ¢ necessicio que eles sejam perseguidos de mancira efetiva e que encontrem condigdes objetivas nz realidade, que passem do ambito do ideal para o do seal, da possibilidade para a eferividade (SANTOS, 2006). Sinretizando, na producSo pesquisada, o debate sobre os instrumentos € séenicas parte dz concepso de que os mesmos sfo: a) elementos da dimensio séenico-operativa da profissio e, portanto, parte constitutive do inscrumental de imtervencii, constizuindo ums relagso de unidade na diversidade, sendo os instrumentos os pétencislizadores dss Intencionaliades tebrico-politicas para 4 eferivagio da ago; b) elementos direcionados ao alcance de finalidades: ¢) produto da agio humana, o que thes confere um earéter histérico, Com base nisso, 0 processo de escolha dos instrumentos no é neutro. Ao escolher os instramentos de intervensio, 0 profissional deve levar em conside~ aco as condiges objetivas do trabalho, as finalidades da aco, as finalidades da profissio, as Snalidades da instimicgo, bem como pensar sobre a demanda, sua fancionalidade frente & realidade em que a populacao esté inserida, as babi- Udades necessérias ao seu manuseio ¢ seu compromisso ético-politico. 30 (sade de Ars tobe of Instramenine # Técsica a Tnvevengio ProBional do Avcnente Social ~ ama Perpectiva Cin Tendo come Fundamento essa concepedo do instrumental de interven- Glo, trataremos de alguns instrumentos de nossa heranga intelectual e cule- ‘al igdicandoo debite en torno dels na bibliogrfa pesquisa, 2. Alguns elementos do debate acerca dos instrumentos na intervengo profissional Como foi dito, é reduzido 0 mimero de fontes pesquisadas no perfodo de 1990 a.2008 que abordam a questio dos instrumentos. Porém, mais redurido ainda € o mimero daquelas que descrevem os tipos de instramentos utilizados ‘no servigo social. Dentre as poueas produgSes, a maioria & de artigos, alguns no publicados, e apenas dois livros. De acordo con: essa parca bibliografia, os instrumentos privilogiados sdo: o parecer ~ 0 que se explica pelo grande ziimero de assistentes sociais que atuam no Poder Jadicirio, no juizado da Tngincia ¢ Juventude — a entrevista, a reunido/o grupo e a visita domicilia. Essa constatagéo coincide com o resultado de nossa pesquise de campo. As assistenses sociais afirmam utilizar, em ordem decrescente, os seguinces instramentos: 1 entrevista/encaminhamento/visita domiciliar ¢ instinucional 2 reunifo/grupo/sala de espera 3 relatério/parecer/evolugio Considerando esses resultados, priorizamos investigar o escado da arte da entrevista, da visita domiciliar, do grupo « do parecer téenico, buscando situ- ar o debate sobre os mesmos, também, nos autores que se orientam por um referencial teérico critico-dialético, 21. A Entrevista [Na literatura atl, esse instrumento é tido como um espago que possidi- Tita ndo $6 0 conhecimento mituo, a amplizcdo de consciéncia, tanto dos ustérios quanto dos assistentes sociais, como também 0 contato com as ques- ‘Bes do cotidiano trazidas pelos que buscam os servicos sociais. Por meio da entrevista, o assistente social deve trabalhar os aspectos sociais, politicos, ideclégicos, culturais, afetivos e religiosos postos durante o seu desenvolvimento, O momento da entrevista deve oportunizar & populzclo ‘uma rellexao sobre sua insereao na sociedade, Jéo assistente social, a0 se . Acesso em: dez. 2006. FAVERO, E.T. O estudo social: fandamentos e particularidades de sua cons- ‘tmugio na drea judicidria. In: CFESS (Org.). O estudo social em perlcja, Laudos e pareceres técaicos: contribuicio ao debate no judicidio, peniten- irio e previdéncia social. Szo Paulo: Cortez, 2004. GUERRA, Y. A.D. A instrumentalidade do trabalbo do assistenté social. In: ‘Consetho Regional ée Servigo Social de Minas Gerais ~ 6+ Regifo (Org) ‘Simpésio Mineiro de Assistentes Sociais. 1 ed. Belo Horizonte: CRESS & Regio, 2008, v. 1, p.50-51. MARTINELLI, M. L; KOURMOWYON, E. Un novo olhar para a questo dos instrumentais véenico-operativos em Servico Social. 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