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pontourbe Ponto Urbe 3 2008) Ponto Usbe 3 Marcio Goldman Os Tambores do Antropélogo: Antropologia Pés-Social e Etnografia Ocortada deste webs ets sujet legato francesa sobre popriadade Intelectale propradadeexcsva 0s wabatos dsponbizades neste website podem ser consutades ¢ reproduzies em papel ou supe gta sesde que a sua utlzaco sea esrtamente pessoal ou pars fis Ceticas au pedagogies, excando-se qualquer exleacao comercial. A repeducdo devers menconar ebrgatoramente 0 eto, o nome da rest, a autor e 3 refricia do document, (Qualquer outa forma de reproduce & otra salva ee autorzada previamente pel edo, excgto nos csc restos pla ella em vigor em Franca. revues.org Revues.og & um ponal de rests das clncas sacks humanasdesanalio ple CLEO, Canto gar a eagto Strona aterta (CRS, EES, UP, UAPV™ Farce). feria eeriica Natcle Goldman, «Os Tambors do atopéogo:Anopsagia Ps Socal ¢Exapai =, Pot Ure (Online 3 2008, posto alin no dla 05 Agosta 2016, consltage@ 28 Juno 2015 URL: Mtp:pontourbe revues g/1750, ot: 0.4000)ponoure1750 aa: hice de Aatroplola Urbana pipontoure revues. og penrewses og Ppsfpentoutbe revues 9730 Documente gerado automatcamente no da 28 junho 2015, (0: Tanbores do Amarone: Artepolgla Poe Socele Enagtia Marcio Goldman Os Tambores do Antropologo: Antropologia Pés-Social e Etnografia “At Las Aleanas things were pretty tense from all the work, and there wasn't anyway to eanuse yourself (..) But I discovered some drams thet the boys’ school, which had been there previously, had collected: Loe Alamos was in the middle of New Mexico, where there are lots of Indien villages. So T amused myself (..) just making noise, playing on these drums. [didn’t lnow any particular rhythm, but the rhythms ofthe Indiens were rather simple, the drums were good, and Ihad fun (..). When the war was over, and we were going back to “civilization,” the people there at Los Almes teased me that Iwouldn't be able to play drums any more because they made too much noise. And since Iwas trying to become a dignified professor in Ithaca, I sold the drum that Thad bought sometime during my stay at Les Alamos” (Richard Feynman —Primio Nobel de Fisica, 1965, que trabaihow no Projeto Menirctten). © convite para publicar o texto que se segue na Ponto Urbe, a revista eletronica do Niicleo de Antropotogia Ustama, renova a gentileza que fez com que, hi cinco anos, um artigo de ‘minha autoria tivesse sido publicado na edigto comemorativa dos 50 anos da Revista de Antropologia. A “Apresentagio” do ntimezo explicava a publicagto do texto sustentando que se tmtava de “ressaltas,ntonpenas a presenga ¢ importincia da etnografia 20 longo das paginas da Revista, desde 0s primeiros imeros (..), como 0 papel central € especifico que ocupa na pica € na andlise antropologica” (Magnani 2003: 314). B, de fato, este em um dos pontos centmais de “Os Tambores dot Mortos ¢ os Tambores dos Vivos. Btnogmfin, Antropologia Politica em Tiheus, Bahia” (Goldman 2003). Nocontite feitoagora, oeditor daquele ntimero especial, José Guilherme Magnani, me sugerit retomara questo da etnografia (“consideragbes, dilemas, desafios contemporineos...”)€ me ppenguntou se “dd ainda para tira algum som” daqueles tambores. Creio que estes, na verdade, ‘fo pararaim de tocar nesses tltimos anos. Primeino, em mim mesmo — e nffo foi por acaso {que utllizei o texto como prélogo de meu Livro sobre a politica em hus tal qual peasada pelos aivistas do movimento negro focal (Goldman 2006). Segundo, na simpatia com que fot recebido por muitos, em especial por estudantes que comegam a se envotver com o trabalho de campo. Finalmente, mas nfo menos importante, em algumas observagbes menos simpsticas que sempre acompanharam as diversas apresentagoes que fiz do texto. ‘Assim, a0 apresentar uma de suas primelins vertOes em um encontro de antropologia, soube {que alguem comentou que etnogiafos devem escutar seus informantes, nfo tambores — ainda mais quando tocador pelos mostos. Reagto gue nfo€ dificil de compreender quando alguém se atevea utilizar como instrumentos metodolégicos uma experitncia mifstica ¢ um sono! Mas, {justamente, um outro ponto do artigo era tentar ustiare pensar os limites da nossa capacidade de levar os nativos efetivamente a serio, seja quando pesquisamos candombie, seja quando cestudamos politica Por outto fado, nfo foram poucos os que observaram, diteta ou indietamente, oestranho wo que o texto fazde muitas idéias € uns poucos conceitos extaidor do pensamento de Deleuze © Guattati. Aqui, o autor pode ser preso tanto porque tem um cachorto como porgue 1110.0 tem. Assim, do ponto de vista de antropslogos menos simpiticos As relagbes de sua disciplina com a filosofia — ou, em todo caso, com a filosofia deleuzeguatiariana —, parece dificil compreender como noptes apareatemente to abstmtas ou estranhas como “devis™ ou como “minoritésio” podesiam: servis pam pensar uma atividade to concreta ¢ to tenma-a-tesia quanto c trabalho de campo ou mermoa etogmfia, Por onto lado, clentistas sociais mais simpeticos 1 Deleuze ¢ Guattasi — pam nfo falar em filésofos mais ou menos devotos — ato deixaram de assinalar ceticamente essa tentativa pamdosal de teatar salvar uma antropotogia “tmadicional” utilizando uma filosofia revolucionéria. © problema aqui € que, ao menos do meu ponto de vista, dois dos pontos mais interessantes a filosofia de Deleuze ¢ Guatiari consistem justamente, primeino, no fato de seus conceitot orto Ube. 8 12008 (0: Tanbores do Amarone: Artepolgla Poe Socele Enagtia £6 podesem ser crindos€ uilzndos a pati de experitncas muito concreting; € segundo — pagmatismo “oblige” — de, conseqtentemente,sOexstrem em sua capncidade de wizagto « tmnsfomnagto de acordo com at varadas expericiae de diferentes urtssios dedicados a roporitor mito heterogéacor. Brnesta diego que a anttopologin pode rencontar ot porto da cxquizonnsite de Deleuze © Grats, permitindo vistumbrar usa expécie de exquizoetotogia, onde a potenciaidade,em gent reprimida, do por paciente-analist expiorda pela primeim se desoca para aquela do gar nativoretégmfo, Redefinigto da antropotogia que, por sta vez, devesaafetar€ contaminar produtivameate poten ¢ pentamientos inepimdos neetes micsttoefil6iofos. Se a tentativat coletivas de reapropriagto da vida por nici de procestos de ringuarizagto cxigem, como cxcreveu Guattari (1985: 118), tuna “nova teosia dos areaismos",e estes consstem ntoem regressbes, mas na “uiiagto diferente de elementos preesistentes, de compostamento ou de representagto, pn constr na cura superticie de vida ou um ute expago afetivo, pam disgor de um outo testérioexistenciat”, antropotogia podesa sex pte deste proceso. Bia seria, assim, uma expécie de cartogratia de testéiosexistencais reais e/ow em Vas de existir — desde que entendamot por temitoro 0 “Conjunto dor projetor ou das represetagbct sobre angus vio se desenvotver pngmaticamente uma sie de comportmentos, de investimentos, no tempo. nos expagos seca, cults, etic, cognitivos" Gostaia, pois, de aproveitas 0 convitee tentar mo apenas refer sobre quests levantadas no texto de 2003, como. principaimente entarartcu-1o com que vim fazrndodeide nto. On,comoesceviaete par “time aigum som” daqueles tambo’ € precio toca seus COuDs, dar-thes um bano de dendé eafnd-ios. Comeso, contudo, com uma lembranga mais antiga Hf mais de dez anor, em umn enconto que sexviria de aie pam a contigto do Nicieo de ‘Antropologia da Pottca (NuAP), Mencir Palmeim props que ua das questtes que todos ot membros do micico deveriat contemplar cma dor efcitor produzidos peo fato de 2 pesquisa politica em contextoetnogsfices onde © mesmo pesquiadr, em outro momeato, havia pesquisado outro tema qualquer. Nunca ievamo efetvamente a sro, deforma coletva, 4 nugest2o, sas, pessoamente, devo dizer que ela nunca sain da minha cabega. Sem diida, porque, partir de 1996, fui estudr politica no mesmo lugar em que, anos antes, eu havin cxtudado candombie © texto sobre o¢ tmboressefletia, assim, este movimento de pastagem de um estudo sobre condomblé pam um estudo sobre politic no mesmo contextoetogrfico. Om, hi cerca de dois ano, estou tetando retomar aoe eros sobre © candomblé — sempre no Matanita ‘Tombenci Neto, teeiro de nagto angola, stuado no bnisro da Conguita,em Ihéus, no sl da Bahia, O que tomar possvel completa a reflexto do texto anterior a paris deste segundo movimento, desta ve2 da pottica ao candombe ise tomo ao candomble,enetanto, fo nto inftuenciado eat certo ponto, determinado, por uma experiencia teorico-pedagégica que eu ¢ Béuado Viveiros de Casto (sew antigo cxieutador © atal coiega) tentamot conduit js hi cerca de tits ano no PPGAS do Muse Nacional. Experiacia que envolveu, entre outiascoita,a ciagto de dois sites de tipo “wii” naTnteret (© Amazone ¢ 0 Abaeté —atulmente em fase de migragto pam outm patafonna). de uma “rede", que batizamos de “Rede de Antropologa Simetrica Abaeté”, da realizagto ‘ninterupa de temindvios todasas setasfeims tarde (1) ede dois cursos realizados em 2006, ‘um no Mureu Nacional eum aa USP. O curtodo Museu fi pornét batizadode “Tntiodugton sua AntropologiaPOr-Sociat: Redes, Maltiplicidadese Simetsiagbes"; oda USP se chasnou “Simetn, Reveribildade e Reflexvidade na Antropologia Contemportnea” Como excreveu Guimartes Rosa (em Tutencia), “ado se fngeprimeiro; gesmina auttatico ¢ depois”. Foi apenas a0 longo deste cuztos qe comeganior a leva a srioa exprestto “pox- socint" Fomot compreendendo, cei, que #fa2sentidoempregnro pefixo "pst" quandocie € sindnimo de “pre”. Ou ej, 46 vale a pena fala em “pos-secal” quando se ext pensando emaigoainda por vir, mas que nto sabemos e nfo podemos saber oque €, Este pontoé cra porte «6 artim podemor nos livas dot fantasmae evolucionisas que expreitam expressbet como estas: aportimos em um furwo, mas nto sabemos € nto pedemos saber que futaso € cxse.B se 0 chanado "por-modemisno” (dentro e for da antropotogia) mica fi capaz de orto Ube. 8 12008 (0: Tanbores do Amarone: Artepolgla Poe Socele Enagtia sugerirrespostas tio interessantes quantoas questdes que Ievantava, isso se deve, exatamente, A sua insisténcia em se apresentar como um “estigio” posterior (¢ superior) a modemidade, com lugae de se pensar como pura transigto. 22 Oprimeizo passo na diregto desse futuro que ato podemos saber qual € consiste em esbogar ‘nguagens conceituais altemativas, capazes de subsituir nogbes tdas por adquitidas. Por que? Porgue jf faz algum tempo que nogées como sociedade, identidade € historia (entre outs) comegarm a se assemelhar a estes rem€dios que pesdesam seu przo de validade (Latour 2005: 160) ¢ que, em um primeiro momento, se tornam inécuos para, mais tae, passarem. 1 produzir efeitos essencialmente negativos. Em outyos temios, estas nogdes parecem ter pendido seu poder de nos fazer pensar. Para readquirir esse poder, mo basta, € claro, se contentarcom os “outnos” que cada nogto destas contém como seu reverso: individuo, cultura, ‘nature, pluralismo, relativismo etc. Mais, ou menos, que “crticé-las”, tata-se de abandons Jas de forma mdical em beneficio de novas construgdes conceitunis. Ocorte, apenas, que no caso da antropotogia — ciéncia empirica e citncia do observado, como jf lembrava, if muito tempo, Lévi-Strauss — essas constugdes conceituais esto necestariamente submetidas a ‘peequisa etmogsifica e a um ponto de vista que nfo € 0 nosso. (Claro que a elaboragto de Linguagens altermativas nunca foi coisa fécil, nem consensual —e ‘nem haverin porque sé-1o. Apesar disso, no caso brasileiro, onde dificilmente discordancias intelectuais so aceitas como motores potencinis par a produgfo de novas idéins, a tarefa parece particulamente complicada. Como sabemos, aqui adoramos os debates intelectuais © ‘mandamos noss0s alunos estudar, por exemplo, as famosas disputas entre Leach e Fortes ou cate Sablins ¢ Obeysekere. Mas nds 0: adorumos detde que sejam travados bem onge, em ‘Cambridge, em Chicago on em algun outro lugar do primeiso mundo antropolégico. Quando (os debates acontecem agui mesmo, entre n6s, costumamos imediatamente procurar as (ais) inteagbes pesscais subjacentes € imputara pelo menos um dos lndos em oporigto propotitos divisionistas destrutivos, concluindo que © methor ¢ evitar o assunto. Tudo se passa, como observou judiciosamente Ordep Serra (1995: &9), como se entre nés tendesse a vigorar “una ccuriosa segin da etiqueta (...): a prise de 16 discutir com os mortos” — quando qualquer ppestoa de bom senso sabe que, bem 20 contritio, que com 0s mortos nto se deve discutir! 14 Nonosso caso, a dificuldade talvez derive de dois pontos sobre 0: quais, nfo obstante, nto € ppossivel deixar de insistis. Paimelso, uma secusa — metodologica, eu ditia — de aceitar como dados ou como definitivos autores ¢ conceitos consagsados. O fato de tex crindo tum conceito de sociedade, nso concede, por exemplo, nenhuma etemidade a Durkheim; reciprocamente, (© fato de ter sido criado por Durkheim, nfo faz com que o conceito de sociedade tenba que ser aceito como definitive. Segundo, a necessidade absoluta de (e)aproximar a “etnologia indigena” da “antropotogin das sociedades complexas”, reaproximago que, curiosamente, parece particularmente imitante. Provavelmente porque — além, € claro, de nfo respeitar co fendos institucionalmente estabelecidos — leva as titimas consequéncias a secuia do cvolucionismo ¢ do progresso cujas virtudes o¢ antropélogos cantam, mias praticam cada vez mais munmente nessa época de sucesso de certas modalidades contemporineas de antropologia aplicada, obrigadas, por definigto, a conceder universatidade a valores, prinefpio e modos de pensar sempre particulares ¢, mais grave, dominantes. - 15 Ntobf nenhum romantismo, nem nenhum democratismo, aqui. Bevidente que consideramos co que fazemos mais interessante do que que nto quesemos fazes. Apenas mo € necessatio conceder a essas prefestacias neuhum fundamento tansceadente ou absoluto. A criagto cu ativagto de novas idéias € conceitos pode ser efetuada por meio de um procedimento que cu denominaria “nisetatamento” (idéins, conceitos, ou mesmo teorias, podem ser . Ponto Urbe [Oaline].3 12008, posto online no dia 05 Agosto 2014, consultado © 28 Juako 2015. URL [nnp:/gontousbe sevues ong/1750 ; DOT : 10 4000/pontousbe 1750 Autor Marcio Goldman ‘Mascio Golda € Professor Astocindo do Programa de Pér-Graduagto em Antopologia Social, ‘Museu Nacional, Univessdade Fedesal do Rio de Janeiro; pesquizados do CNPq e basis da FAPERI. B autos de Razto e Diferenga. Afetvidede, Revionalidade e Relatvisao ao Peasamest de Lévy-Bruhl (1994), Alguana Anuopologia (1999) ¢ Come Funciona a Democmcia. Una Teosia -Etaogrifia da Politica (2006) além de oxgaaizador, em colabornse com Moacis Palmeisn, de Anuopologia, Voto e Represeatas20 Politica (1996). Direttos de autor ONaAU Notas do autor ‘Trechos deste texto foram apresentados em conferéncins no CEBRAP (SP), Universidade Federal de Pelotas (RS), Universidade Federal de Julzde Fora (MG) ¢ Universidade Estadual de Santa Cruz BA), orto Ube. 8 12008

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