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Cademos de Geografia, n° 17, 1998 Coimbra, FL.U.C. pp. 247-257 A DINAMICA DA PRODUCAO CARBONIFERA EM PORTUGAL: IMPACTES SOCIO-ECONOMICOS E AMBIENTAIS* Na época romana a exploragdo mineira e 2 regises rineiras eram jé importantes (Aix-la-Chapelle)e atingiam srande significado nos séculos XIII e XIV (Saxe). No entanto, a exploragio industrial carbonifera ocore, apenas, na 2* metade do século XVII, apesar de no Reino Unido © inicio ser anterior. Em 1700 produzia jé 2,5Mton. e 10Mton, em1800. No Continents as produgées ultrapassam estes valores: 0 norte de Franca (regio de Anzin) produ- zia 240M ton. em I815, Saint-Etienne 335M ton, © nas hulheiras do Império Alcmao eram extrafdas 36Mion. de carvio em 1870 (Lexar, 1971, p. 25). No Reino Unido o carvao chegou a alimentar 80% da produglo de electricidade. Todavia, nio logrou vencer a concorréncia erescente da energia nuclear e a capacidade das centrais a gés, que actualmente respondem a 50% do ‘mercado, Neste contexto, as minas de carvio estéo conde- nadas a encerrar. Por deciséo governamental esteve previsto © encerramento de 2/3 das minas (31), mas por imposigio dos Sindicatos este niimero acabou por se deter em 10, Cenétio idéntico tem ocorrido na Franga, Bélgica, Holan- dae mais recentemente na Alemanha. Na Alemanha 19% (70% na exRDA) da electricidade consumida € produzida em centrais térmicas a partir da hla linhite (a linhite tem valor calorfico até tr8s vezes menor que o da hula). No final de 1991, 0 Governo Alemao aprovou um Pla no de Reestruturagio do Sector que prevé uma quebra de produgio. Reflectindo esta Politica, a maior empresa do sector (Ruhrkohle AG de Essen) que explora 19 das 26 minas de carvao e emprega 80.000 mineiros decidiu, a © ano 2000, encerrar 4 minas, eliminando deste modo 26,000 postos de trabalho, despedindo anuslmente 5000 trabalhadores. E, os postos de trabatho restantes so man- fos & custa da redugio salarial. Para além diso, ap6s a reunificagio, a RFA promove um processo de reestrutu- tagio do sector carbonffero, que tem conduzido ao ences ramento de muitas minas e @ um esforgo de modernizagao tecnolégica das que s0 mantidas em actividad. ‘Versso reformulada da comunicago apresntada & ¢* Revo do GGnupo de Estudos UGI (Unido Geogrfic Internacional Ear Indust) Regions realizaca na University of Marland, Calle Park MD, USA, 48 69 de Agosto de 1992. Insti de Estudos Geogritios. Faculdade de Lars. Univesda- de Coin. Lacilia Caetano’ Culmina-se, assim, um processo de declinio que se tomou evidenté nesta décads, Este cenério serd, ainda, agravado por pressio das exi- sg@ncis de Bruxelas sobre os Governos dos Paises Comu- nitéros no sentido de estes redvzirem os subsidios conce- didos ao sector (na Alemanha, por exemplo, é o 2° mais fortemente apoiado depois da aericultura) e que vém, ar- tificialmente, mantendo em actividade as minas. Até final dde 1995 a Alemanha ter de abolir 0 imposto pago pelos consumidores de electricidade conhecido pelo Kho- {epfenning (criado em 1976) e a obrigatoriedade das cen- teais eléctricas adquirirem carvo alemio (a Yahriun- dertvertrag) Por outro lado, as ajudas concedidas 2s minas na Eu ropa Ocidental, no ambito do Programa RECHAR (Rees- truturapio do Sector do Carvéo) introduzido em 1989, tém provocado reacges de protesto por parte dos Estados Unidos, Austria, Attica do Sul e Colémbia, 1. EVOLUCAO DA PRODUCAO MUNDIAL ‘A exploragio do carvo que esteve na base da Revolu- (920 Industrial e na industrializacao europeia do século XIX centrou em declinio a partir de meados do século XX (Qua- dro 1). Nos anos 60, 0 carvio perde competitividade face 0s hidrocarbonetos, importados a pregos cada vez mais baixos, independentemente das crises petroliferas geradas pela alta dos pregos do crude, Acrescem, ainda, as trans- Formagdes tecnolégicas operadas a nivel do consumo cenergético e das energias disponiveis (Quadros I e III), (Os mais recentes encerramentos atingicam tanto as mi nas que exploravam carvdes fésseis como minérios met licos. Quadro I - Expansio e declinio das carbontferas europeias(Mton.) 1946 [1950 [1955 | 1960 | 1965 | 1969 CECA tars | 2025 | 248,5 [2340 [2184 [1713 Reino Unido | 193,0 [2198 [2252 | 196,7 | 190.5 [1513 [Europa Leste) 67,3 | 102,0| 1313 | 1463 | 160.8 [1733 Polénia 475) 780 | 945] 1044 | 1188 [1350 CECA — RFA, Franea, Bélgica, Palses Baixos e Itlia Fonte: LERAT, 1971, p. 26 Cademos de Geografia,n2* 17 Quadro I = Evolugo da produgio mundial (Mton.) transformago do carvio, através da li- ‘quefacglo € gaseificagio, de modo a facilitar o transporte Quadro IT ~ Consumo de energia priméria nna Europa Ocidental (%) 1900 | 1950 | 1960 | 1968 | 4 % em pipe-lines e, assim, 0 consumo, tana 700 | 1s [uss | aos | 29 Duane a dada de 30 eso da ava mie Tia Ito Tg TST etig-] "na Europa Ocidental conduzin a um decréscimo anual de 10% do emprego. Ent 1988, o sector perdeu Feirdco {22 [505 [1059 | 2100 [909] aya um min de pss de ratatho (Expose, 27 (Gas naoral™ [12% | 192 [625 | 0 [466.7 | (11/91), 0 declinio waduziu-se, igualmente, no contributo Ma? do sector para a formagao do (PIB) Produto Interno Bruto 11906 (Quadro IV). Fonte: LERAT, 1971, p. 6 Apesar ds alteragdes teenoldgieas as previsdes apon- ‘am para o aumento do comércio mundial do carvio (ett. Quadro 4). Os novos patses produtores (Australia, China, Polénia, Ucrania e América do Norte) continuario a ser os principsis exportadores e a Europa Ocidental e 0 Jupiio, os 1950 [1955 1960] 1965 [1986] Portugal] Principais importadores. A Buropa ¢ alamente deftctéria fem fontes energéticas, e, no entanto, as minas de carvlo tia [700 [645 [220 363] 188) 100 | Sontinuam a ser enoenadas, Para uma prods global de Lintte 1a | 27] 69| 53] 34 energia de 90,8 milbes de tep (toneladas equivalente Petrseo | 11.7 |184|30,| 485455 | 811 | petréleo) o consumo some 1076.4 milhdes de tep. em 1988 EleewPrimévia [103 | 80] 83| 65] 14] 81 (Quadro V). 2» 1986 ‘i i Freee onethnT 960.12; 2, EXPLORACAO CARBONIFERA EM PORTUGAL HUROSTAT Este subsector, no contexto das indistrias extrativas tem posigio secundaria (Quadros VI e VII) Na Europa, apenas recrudesce actividade mineira em sectores de grande interesse econsmico, por efeito da con- ccentragdo metélica das jazidas (caso das Minas alentejanas Quadro V — Produedo ¢ consumo de energia Neves Corvo em que o teor de cobre pode ir até sos 20%) (1988, M tep.) ¢ ma exploragio de rochas omamentais. Produgto Consumo Exeepglo para o Leste Europeu onde a exploragiio carbonifera constitu, ainda, o suport da industralizagéo [CE 3908 10764 (ft. Quadro 1). Destes, a Poldnia (com as 70 minas em [Portugal 13 128° actividade) conjuntamente com a Ucrinia (Donbass) € 3) Consumo por habltante ~ 01 kg eps Sibéria Central so, actualmente, 0s mais importantes pro- "Media BC 1491 Ke ea/abitant, dutores de earvlo da Europa de Leste. Nestes pases, projec- Foner Eurostat Quadro IV ~ Indicadores do sector earbonifero Totat [Austria | Asin | América | Atria | Furopa | Europa MMton do Norte Ocidental | de Leste 17% | 3400 Produsio | 1980 | 3600 | 4 | 28 26 4 10 8 % 1990 | so | 6 | 37 26 5 6 20 TEmprego | 1980 242.5" aie | Le 4000) | 1990 Bis aaa 1970 33 | 120 70 | Ba | 14 pipe % | 1980 oo jie | ag | us | 07 19900 zs_[isem | ase | ne | 0,06 4) sector mineiro: b) 1989; b1) 1985; e) India; é) Canad; e) sem USA, Franca e Polénia, respectivament, Fontes etiled table, United Nations, 1992. (Caboragdo propria) ‘Annual Ballin of Col tastes fe Europe, United Nations, 1992. Navona Aécounts Satistis: Main aggregate and A dindmica da produsdo carbonGfera em Porm: impactes sécio-econémicos ¢ amblentais ‘Quatro VI ~ Indicadores (%4) da inddstria extractiva (Portugal) Tndiistria Extractive Carvio Total 970 | 1981 | 1988 | 1991 | 1970 | 1981 | 1985 | 1991 | Indstria Emprego [5.7 [24 [23 | 17 [030 [020 [020 |@ | 100 ‘Volume Negécios [1.8 | 10 [os | 17 |007 |o04 | 003 |@ | _ 100 Export. [34 | 82 [50 | 46 [0,00 [000 | 000 [oo | 100 4) Dados nia disponive’s, Fonte: INE (Elaboragio propria), ‘Quadro VII ~ Indicadores da produgio de carvao 1960" | 1965" | 1974" | 1980% | 1987 | 190° | 19926 Minas activas 3 2 Tit t 7 T Produgio (0? ton.) soos | 3173 | 2216 2038 | 2329 | 2116 Emprexo aS 757 | 1163 987 | 889 | a59 Minelros [ren 1062 [906 ors [307 Tmportagio GOMO_| 02 oa | 26 | 46] 45 [Exportagio (mton.) | 155.5 2s [ag | sn (©) - Minas do Pejio'e S. Pedro da Cova () - Minas do Pejfo Fone: INE ¢ ECD (Elaborago prépria) A pesquisa e explorago de carves f6sseis iniiam-se nos finais do século XVIIL A primeira exploragio feta no Cabo Mondego remonta 1773. Em 1802 seguem-se pesquisas em Ervedosa e em S. Pedro da Cova. Ao mesmo tempo, defende-se a uilizagio dos “Paos Bituminosos da Lousi, Aveiro, Carapinheira, Ourém e Carvocira, além da ‘urbe ou Turfa da Compost e de muitos lugares paludosos do Reino” (VaNpt.t,p. 434). O volume e a qualidade de produgo do carvlo permitiu que se deixasse de importar este produto de Inglaterra. Destacam-se as Minas de S. Pedro da Cova, Pejfo © Cabo Mondego. Destas, apenas a Mina do Pejio manteve actvidade mais longa (no entanto, as velhas Minas do Pe- ‘fo, na margem sul do Douro, estio encerradas hi longo tempo, tendo sido aexploragdo transferida para 0 jazigo de Germande, mais a norte). Entretanto, em Conselho de Ministros de 4 de Outubro de 1990, foi decidido 0 seu encerramento em Julho de 1994, e, posteriormente, adiado para 30 de Dezembro de 1994. As Minas empregavam cerca de 500 trabathadores dos quais 300 eram minciros. ‘A Mina de S. Pedro da Cova enesrrou em 1970 ¢ @ do Cabo Mondego em 1962. Em S. Pedro da Cova, a semelhanga do que se observa noutras minas encerradas, procede-se, desde 1982, & ddesmontagem dos terrls oa escombreiras, ou seja, deps- sitos de produtos inertes que contém carvao que pode representar até 20%. Estima-se que existam cerca de 3 (@) - Minas do Pejio, S. Pedro da Cova e Cabo Mondego milhdes de toneladas acumuladas durante o longo perfodo de extracgo no subsolo, cuja exploragdo poderé realizar- se até ao final dos anos 90. © declinio da producto (eft: Quadro VID), aliado as mu- tagdes operadas no dmbito das fontes energéticas significa a forte dependéncia do exterior, apesar de o valor de con- sumo por habitante ser 0 mais baixo da Europa: 901 kz ep. por habitante, enquanto a média europeia atinge 1491 kg eputhab. (cfr. Quadro Vp. ‘As importagées de carvao erescem, embora a ritmo desigual, nos anos 80 (cfr Quadro Vi. Esta evoluglo, co- ‘mum aos paises ocidentais, € reforgada, no caso de Portu- al, pelo facto de até 1975 a ex-coldnia de Mogambique ter Sido a principal fornecedora de carvao para a Metrépo- le, a prego e qualidade competitivas. Com a década de 90 inicia-se 0 dectinio da importagao de carvio e consequen: te reforgo da aquisigao de petroleo que representa mais de 80% da fonte energética priméria (cfr Quadro II). 3. © TERRITORIO MINEIRO 3.1. Infraestruturas mineiras AA parte visivel da exploragdo subterrinea resume-se as cedificagies correspondentes aos acessos, aos pogos (eleva: 249 Caemas de Geografia, n° 17 ores), silos, produgdo de energia (minicentrais termocléc~ (ricas que queimam carves pobres extraidos da mina), lavarias, vestirios, refeitérios e outras infraestruturas de Ambito social (posto médico, centro recteativo e educativo do pessoal, escolas, cooperativas de consumo, ete.) € ser- vvigos administrativos. Salienta-se, ainda, a radicional cons- trugdo dos bairros opersrios a escassa distancia das minas. transporte do earvdo até aos mercados promoveu a ‘construgdo de vias de comunicagio adequados e valoriza- ‘so das potencialidades locais (cursos de agua). ‘A gua constitui um outro elemento a ter em conside- rraglo, quer se trate do excesso no interior da mina, quer fa escassez nas operagies necessirias na laboragao de st Poréim, 0 efeito mais marcante na paisagem é, indubi- tavelmente, a deteriorago das superficies correlativas 2 dimenso das jazidas mineiras e a0 volume da matéria- prima extraida: crateras correspondentes ao desmonte em supericie e as escombreiras (terrils), depOsitos de inertes fe carves pobres retirados das galerias subterraneas, dis- ondo-se em tomo da mina, cuja altura e niimero depen- de, naturalmente, do volume ¢ antiguidade da explorago. 32. Aglomerados mineiros A recente abertura, em 1988, das Minas Cupriferas Ne- ves Corvo (Alentejo) ilusra impacto local da exploraco mineira. Para construir as infraestruturas de superficie foram mobilizados cerca de 2000 operdrios recrutados entre 1 populacio local (60%) e deslocados. Acresce, ainda, a ‘opgio da empresa pela integragao dos mineiros (650 no inicio dos trabalhos) nos aglomerados jé existentes (Almodbvar e Castro Verde) abandonando-se a tradicional construgdo de bairros. Neste contexto, o ritmo destas ur- bes ¢fortemente abalado. O brusco aumento de populagio ¢ a excassa oferta do parque habitacional provocou a su- bida em flecha dos pregos e estimalou a oferta através da construgio de novas habitagBes e recuperagao das degra- dadas, Muliplicam-se, igualmente,infraestruturas de lazer, de ocupagio de tempos livres e do sector da alimentacio ¢ hotelaria (restaurantes e cafés) e servigos pessoais diver- sos e de apoio & propria Mina ‘As autarquias envolvidas estimam que por cada posto de trabalho criado na Mina sejam criados 3 a 5 postos de trabalho indirecto. As contrapartidas, entretanto, colocam- -se no ambito do acréscimo de despeses: policiamento, :manutengio de infraestruturas basicas ¢ outros equipamen- t6s motivados pelo acréscimo de populagio. ‘A expansio da Mina forga a atracgo de mineiros a distincias crescentes. Recentemente, a contrataglo de tra- balhadores imigrados oriundos das ex-colnias, traduz a substituigio do mineiro por mlo-de-obra menos reivit dicatva ¢ salérios mais baixos. ‘No entanto, 0 escasso significado das exploragdes car- boniferas portuguesas nio gerou cidades mineiras residen- ciais, ao invés assemelhan-se a povoagbes efémeras, viven- 250 do ao sebor da fortuna da mina, Para alojar os mineiros ¢ familia, foram construidos, iicialmente, precios bairros, de casas em madeira com dimensies reduzidas (dotadas apenas com dois compartimentos, a fachada provida por uma porta ladeada por duas janelas) que foram sendo substtuidas por alvenaria, quando jé a exploragio da mina estava consolidada, Os mineiros deslocados da famili abrigavam-se na Casa da Malta, ‘Nao se observam exemplos semelhantes aos que ocor- reram com algumas cidades minciras. Sudbury (Canada) fundada em 1883, contava 2000 habitantes em finais do século XIX ¢ quase 50,000 habitantes em1960. Idéntica evolugao conheceram Broken Hill ¢ Hanborn (pequena aldeia do Ruhr em 1880, detinha 11,000 habitants, 15 anos mais tarde e 104.000 em 1910), © plano reticular, com as ruas cortando-se perpendicu- larmente, caracterizam a fase inicial destas cidades. Sali- enta-se, ainda, 0 facto de a extracgdo do carvao ter tido so- bre a inddstria um papel de arrastamento. A maioria das regides carboniferas dos paises industrializados tornam-se regides industriais: indistrias de base e de equipamento e actividades diversficadas, onde a hulha fornecia a energia (central térmica), combustivel e redutor (industria siderir- ica) e matéria-prima (indistria quimica. Desde 0 inicio do século XX 40% do carvao Westphalien cera destinado 3 indistria metatrgica, idéntica situagko se observa na regio de Valenciennes e em Donbass na Ucri- nia (regido de Donetsk) e indiistria quimica nos vales descendo em direcgio 20 Donetz S. Pedro da Cova (concelho de Gondomar) constituiu tum aglomerado mineiro que se desenvolveu em paralelo com a exploragéo da mina. No decurso do século XIX (1789-1890) a populago quase triplicou, passando de 548 habitantes para 2174, representando cerca de 7% da popu- lago do concelho. Porém, nos anos éureos das minas a ppopulagao quase quadriplicou (9812 hab. em 1960), en- ‘quanto no concelho o acréscimo se quedava pelos 175%. A populagio significava, agora, cerca de 12% do total con- celhio, Os saldos fisiolégicos elevados e a imigragao ca- racterizavam esta populagdo. O encerramento da mina s6 no se tradurin por declineo da populagio pelo facto de a cidade do Porto distar cerca de 10 km. No entanto, o centro empregador que até af era cons tituido pelas Minas, desloca-se para a cidade do Porto, No caso das Minas do Couto Mineiro do Pejto a extrac- «do em superficie ¢ abertura de pogos, em consequéncia da sucessiva progressio em direcso a0 rio Douro, foi acom- panhada da construgio de Bairros Operdrios: Pejio e Germunde e respectivas Casas da Malta (eft. Fig). 33. Actividades industriais induzidas AA Mina de Carvao do Cabo Mondego foi a que ori- 12 © Complexo Industrial mais importante, Apeser de, repetidamente, ter sido inundada pelas aguas do mar, a cexploragdo prossegue. As obras realizadas, no final do A dindmica da producdo carbonifera em Portugal: impactes sécio-econémicas e ambientais EI cranes hercncos E52] Orantos antehercnicos Fig. I —Terrtério das Minas de S, Pedro da Cova e do Pejio sée, XVIIL, sob a direceo do mineralogista M. José Bo- nifécio de’ Andrade revelam-se eficazes. Em 1809, ela vendia 12 milhoes de réis por ano, tendo-se instalado nas proximidades um forno de cal, uma fibrica de briquetes e outra de éeido sulfirico. Paralisadas durante as Invasies Francesas ¢ as lutas civis até 1833, recuperam a actividade em 1873, quando da cconstituigio da Companhia Mincira e Industrial do Cabo Mondego. Para além de extrair 0 carvio dedicava-se 20 fabrico de cal hidréulica, cal gorda, de vidros (garrafas e vidraga, cuja producao cessou no final do século XIX) @ produtos ceramicos e, ainda, explorava o caminho de ferro que ligava 0 Cabo Mondego ao cais da Figueira da Foz, 251 Cademos de Geografia, n° 17 Em 1917 tem lugar a formagio da Compania Indus- trial e Mineira de Portugal que adquire, em 1922, 0s bens da empresa exploradora das Minas e Indistrias do Cabo Mondego aps falenci Em 1923 o Relatorio da Actividade da Empresa, res- peitante a0 més de Fevereiro, revelava os seguintes valo- res: carvao explorado — 1331 ton.; carvao bruto preparado — 1481 ton. produgio de cal em bruto ~ 788,5 ton; pro- dugio de cimento natural ~ 24,8 ton/dia: produtos ccerimicos (telha € tijolo) — 100 000 pegasmés. Até 1928 a produgdo de carvo continua a eumentar atingindo 100 ton/dia, Eniretanto, em 1927, € avangada a proposta de instal so de uma central térmica (queimando carvio da mina) Com @ poténcia inicial de 4000 KW e capacidade para alimentar a Mina e indlstrias anexas e, ainda, abastecer a regiio num raio de 70 km. E neste dmbito que surge a hipétese de fornecimento de energia eléctrica a cidade de Coimbra, 0 que, no entanto, ndo se concretizou, Em 1932 de novo a faléncia atinge a Companhia pro- prietiria do Complexo Mineiro, assumindo a Companhia das Minas de Carvio de S. Pedro da Cova, em 1943, a posse dos bens. Posteriormente, em 1938 forma-se a Companhia de Carvaes e Cimento do Cabo Mondego que é responsivel por novo incremento da exploracio da Mina e inddstias anexas:fabricas de eimento, de chapa de vidro, garrafas e garrafdes (projecto indeferido pelo Ministério da Industria em 1950), ampliagao e remodelagao da fibrica de cal e Instalapdo, em 1949, da Central Diesel eléctrica de 1140 KVAe 500 Volts (a fim de ultrapassar os ineémodos pro vocados pelos frequentes cortes de energia da empresa formecedora, @ UEP). ‘Aeexpanslio do complexo minero-industrial agudizou 0 problema da deva, em conformiade com a escassez ea ma qualidade (fortemente cloretada), pois a sua concretizaco requeria 4000 m' de égua diaries. ‘Os anos que se seguem, durante a 2* Guerra Mundial, representam expansio da extracga0 do carvio. © mercado interno alarga-se, por dificuldade de importagto, a0 abas- tecimento dos carves queimacdios nas locomotivas. Pra além das indistrias referidas, desenvolvem-se, na proximidade, indistrias de conservas de peixe, de fundi- (80 de artigos em ferro destinados & construgio naval e de ‘maguinaria ligada & industria cerimica. A disponibilidade de matérias primas, energia e o im: portante porto maritimo (pesca e comercial) consttuiram factors decisivos de localizagto. Emi 1950 inaugura-se a fbrica de cimento (Fig. 2, com 4 capatidade de 100.000 ton/ano) e é concluido 0 Bairro perio para 36 familias ¢ aquartelamento (Casa da Malta) para 64 trabalhadores minciros e outras obras de carécter social ‘A produgio de carvao atinge na década 1941/50 a ‘médialano de 35.000 ton., chegando a produzir no méxi- ‘mo 52.500 ton. Na década seguinte continua a sumen- 252 tar fornecendo 60.000 ton/ano, com um méximo de 67.500 ton, No inicio da década de 50 empregava cerca de 1000 trabalhadores. ‘A exploragdo desta Mina termina abruptamente, em 1962, apés violento ineéndio que determinow o encesramen- to da mina. ‘Todavia, a rentabilidade da exploragao da mina era, frequentemente, pasta em causa pela fraca qualidade do ccarvio; apenas 30% do carvio extrafdo tinha valor comer- cial (carvao de I), 0s restantes 70% teriam de ser const ‘midos localmente, nas unidades industriais, entretanto, cconstruidas, A exploragio do carvio tomava-se demasiado cara ¢ dificil, em consequéncia das condigdes em que era efectua- do 0 escoamento das euas das galerias, a profundidade a ‘que se encontravam as galerias de extracedo, a pressio dos terten0s ¢ 08 riscos de inundacdo e desmoronamento das vertentes. Deslizamentos ocorridos em 24 de Fevereiro de 1941, sobre 0 Terreiro da Mina e a Escolha de Carvao, anrasaram as boces da Mina, destruiram as linhas Decauville (arris onde circulavam as vagonetas transportando arvao © margas), parte dos ediffcos construfdos no local ¢ os ruros de suporte, Entretanto, o declinio e encerramento da mina repercu- tiu-se no complexo industrial. Uma ap6s outra, as fabricas foram fechando, restando em actividade a falbrica de cal hidriulica. Esta fabrica, entre 1961/70, produziu uma média ‘de 59.000 ton/ano (100.100 ton em 1970, valor méximo). Por sua vez, a ampliagio da capacidade produtiva da Fabrica de Cimento foi embargada, em 1968, pela Camara Municipal da Figueira da Foz, culminando uma série de conflitos com as autarquias locais (Figueira da Foz € Quiaios) na sequéncia da disputa da posse dos baldios e pedreiras da Serra A retencio, por parte do Estado, de grande parte da érea orestada (encosta da Vela e Prazo de Santa Marinha) reduziu a propriedade da Companhia de Carvées e Cimen- tos do Cabo Mondego a norte da Pedra da Nau (cft. Fig. 2), onde se localizam as pedreiras, a uma estreita faixa de beira-mar com cerca de 300 metros de largura média e 2000 metros de extensdo (entre @ Pedra da Nau e 0 topo norte da Murtinheira). Acresce que a reactivaglo da indistria nesta frea esté hoje, absolutamente, fora de questio, por efeito do impac- to ambiental: poluigho e destruigio da falésia do Cabo ‘Mondego, com a abertura de crateras disformes impos- siveis de futuramente serem de novo integradas na paisa- gem (cfr. Fig. 2). Para além disto, as excclentes praias locais determina- ram 0 florescimento do turismo, ja nos finais do século XIX, Nos anos 1930 a praia da Figueira da For. era conhe~ cida como a Rainha das Praias portuguesas. ‘Actualmente, a economia desta rea reparte-se pelo turismo, actividade portuéria (exportagio de madeiras ~ paletes ~ € de pasta celuldsica para papel ~ 40% das mer- A dindmicu da produsdo carbonifera em Portugal: mpactes sécio-econéicos ¢ ambientais oopuoyy oes op oxautyy oIn0D ~ ZF 6L6T OvStpe ery = |_Lvor ovsipa 283 Cademnos de Geografia, n° 17 Ccadorias manuseadas) ¢ indistrias txtil(malhas), dos vie dros (fébrica da Fontela fundada em 1920), de pasta cceluldsica para papel (iniciada pela CELBI ~ Celulose da Beira Industrial a partir de 1967) e da fabricagao de papel, instaladas a sul da for do Mondego, consttuindo a nova zona industrial B~ A exploracio das Minas de 8. Pedro da Cova foi iniciada, regularmente, em 1804, sendo jé antiga a exirac- (¢80 de carvao, embora de modo intermitente. ApOs a pas- Sagem por diversos proprietérios, estas Minas vém a cons- tiicse em patrim6nio da Empresa de Carvio de S. Pedro da Cova a partir de 1912. A rede de galeries distibui-se ppor 5 pisos, separados por 50 metros, atingindo © poco principal 148 metros de profundidade. “A producio média, nos melhores anos, oscilou entre 250 ¢ 150 mil ton. (245.4 em 1945 e 143,2 em 1961), representando cerca de 30% da producto de Portugal Continental. 0 consumo da producto era praticamente local. A ci- dade do Porto constituiu 0 principal mercado até & década de 1960, tendo sido, inclusivamente, construfdo um tele- feérico (uma extensio de 9100 m) com a capacidade de 33 tonfhora, substituindo o transporte por carr eléctricos. Os sectores doméstico, industrial, produgao de energia eléctrica caminhos de ferro consumiam cerca de 50% da produ- Gao, A restante (entre 50 a 80 mil ton/ano) era queimada ‘na Central Termoeléctrica da Tapada do Outeiro integrada na EDP (Electricidade de Portugal) construfda na margem do Douro (eft. Fig. 1). Apés 0 encerramento das Minas de S. Pedro da Cova a Central passou a scr alimentada, exclusivamente, pelos carvées pobres do Pejao transportados por teleferico, No que conceme as Minas do Pejdo & reconhecida actividad, a partir de 1859, Entretanto, ficam a integrar 2 Empresa Carbonifera do Douro, desde 14 de Agosto de 1917 (data da criagio desta Empresa). O Couto Mineiro do Pejio detinha uma superficie de 505,3 ha, em 1920, ¢ fextensio de cerca de 10 km. A exploragto foi feite @ céu aberto até 1934, altura em que atingiu o limite de viabi- Tidade econémica, passando 20 desmonte subterrne ‘A produdo foi aumentando até aos anos 1970 e, até a0 cencerramento, provinha essencialmente do Pogo de Ger- ‘unde (89,3), onde a exploragao alcangou a profundidade de 400m. As iltimas prospecgdes apontavam para reser- vvas de cerca de 3 milhGes de ton. nos pisos em exploragio (7°. %) € mais I milhio nos pisos abaixo. Por contrato, celebrado entre a ECD (Empresa Carbo- nifera do Douro SA) e a EDP em 1983, a empresa ficou obrigada a adquirir anvalmente, durante 10 anos, 200 mil ton. de carvao & ECD (cerca de 90% da produgio). Valor que aumentaria de acordo com 0 aumento de exploragéo da mina, No entanto, isto no veio a acontecer. A EDP rmanteve a aguisigdo de 200 mil tonJano ApGs 0 encerramento das Minas do Pej, esta Central passa a queimar, exclusivamente, fuel-ol ‘A Situagio de pré-aléncia, entretanto observada, levou 8 imtervengao do Estado, através do IPE (Instituto de Par- 254 ticipagdes do Estado) em 1978 e, posteriormente, pela Ferrominas E.P. (Empresa Publica) em 1984. Apesar dos investimentos realizados com o objectivo do saneamento econdmico, abertura de um novo Pogo e beneficiaglo téc~ nica das instalag6es, ndo foi possivel superar a crise. ‘Na eminéncia do encerramento da Mina e com 0 objec- tivo de encontrar alternativas para 0 consumo do earvlo, a ECD, entre 1990 e 1991, desenvolveu um projecto de aplicabilidade dos xistos earbonosos na indiistria da cerd- mica de construgio (barro vermelho), em colaboragao com ‘0 Centro Tecnol6gico da Cerimica ¢ do Video (Coimbra) com a participacdo financeira do PEDIP ~ Programa 3, Sub-Programa 3-1, Sub-Capitulo 1. ‘Todavia, nio estava inclufdo, no objectivo do Plano Energético de Portugal, o alargamento da exploragio, ten- do em conta que 0 carvio é de m& qualidade (o teor de cinzas ronda os 45%) ¢ os custos de produgto muito ele- vvados, 4. POLITICAS DE REESTRUTURAGAO 0 trabalho na Mina exigiu sempre numerosa mio-de- -obra e concentrada num espago restrito, No século XIX e prinefpios do século XX, as minas atrairam multiddes das regides rurais vizinhas e até distin- consideraveis. Por exemplo, no Ruhr e Silésia em 1900 contavam-se 400.000 minciros ¢ em 1914 (inicio da 1" Grande Guerra) somavam 689,000, o Reino Unido empre~ gava 1.100.000 mineiros ¢ 05 Estados Unidos 750.000. Entretanto, 0 progresso tecnol6gico (mecanizago) conju- gad com 0 dectinio, concorrem para a reducio general zada dos efectivos. 4.1, Intervengao do Estado cendrio, generalizado, do desemprego mineito na Europa Ocidental tem imposto a aplicagdo de esquemas de apoio no Ambito dos Governos nacionais e suportados, parcialmente, por Programas Cornunitarios Em causa estio 0 impactos sociais e econdmicos diree- {os ¢ inditectos, pelo efeito de arrastamento da crise a outros sectores, Em Portugal a perspectiva de faléncia da empresa con- cessionfria da nica Mina em actividade (Pejo) conduz & intervengio do Estado, tornando-se empresa de capitais piblicos. Na Empresa ECD o principal accionista 6, actual- mente, a Empresa de Desenvolvimento Mineiro (EDM) EP. Deste modo, os resultados econ6micos deficitérios da ‘Mina tém sido cobertos pelo Orgamento do Estado, depois de autorizagao da CECA (Comunidade Europeia do Car- vvao e do Ago). ‘Todavia, néo s6 0 erécio piblico nao suporta a manu- tengao fieticia de empregos em sectores de actividade no rentaveis, como inclusivé, esta situagdo, ndo consenténea A dinamica da produgao carbonifera em Poragal:impactes sécio-econdmicos ¢ anbientas ‘com as préprias regras comunitirias. Os despedimentos surgem naturalmente. Entretanto, na Alemanha, com o declinio da regito carbontfera Bacia do Ruhr) onde diversas minas tém sido encerradas, 0 emprego cafu de 600 mil postos de trabalho para 80 mil ‘Ox mineiros tomam posigHo manifestando o seu protes- to e procurando chamar a atenglo para 0 problema. Em resposta 0 Governo decidiu, no mbito da reestruturag20 do sector, as seguintes medidas: ~ até 1995 a produgto sofre uma quebra de 20%; de 77 millhées de ton,ano passa para 55 milhdes, devendo atin- gir 05 50 milhées no ano 2000; — aos miniros que aceite a reforma antecipada (idade superior a 50 anos ¢ 20 anos de trabalho na mina) sfo concedidos subsidios; = cursos de recielagem profissional para os mineiros desempregados. ‘As minas altamente deficitérias, com custos elevados de exploragio, t8m sido mantidas & eusta de subsfdios do Estado. O carvao alemio custa 285 marcosfton., enguanto © carvao importado 86,5 marcos (Expresso, 10.Dez.94). Com a fusio das duas Alemanha, 0 problema mais se aagravou, pois, quer as minas, quer as centras termo-eléc- tricas do Leste sio antiquadas c altamente poluentes, im- pondo intervengio c substtugio de tecnologias ‘Quase no termo da CECA, que decorreri em 2002, esta corganizag0 continua no centro das tenses socias. ‘Acrise no sector siderirgico, que decorre entre 1974/ 187, vonsidera-se ultrapassada. A produgio comunitéria havia bainado de 156 para 113 milhes de tonelada e eli- minados mais de 400 mil postos de wabalho. A partir de 1987, a procura retomou ligeio acréscimo e em 1989 a produgio de ago bruto atingiu 140 milhdes de toneladas. AAs tendéncias revelam acréscimo de 1 a 3% anuais, No carvio a crise persiste. Os trabalhadores das minas de carvo que, durante 05 anos 50 ¢ 60 foram os mais atin- ggidos pelas medidas de adaptagio ¢ reestruturagio do ‘Tratado CECA continuam a ser penalizados ‘Os protestos dos mineiros foram surgindo ao ritmo do

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