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A aceleração do degelo global

José Eustáquio Diniz Alves


Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População,
Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE;
Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Os anos de 2016 e 2017 bateram todos os recordes de degelo global. Com o aquecimento da
temperatura, a tendência de perda do gelo nos polos e nos glaciares é bastante clara. A curva
apresentada no gráfico acima tem uma distribuição bimodal, pois o hemisfério Sul tem pico de
gelo em junho e julho e um pico de degelo em fevereiro e março. O máximo do gelo global
acontece entre os meses de outubro e novembro. Seguindo as curvas anuais (todas com este
mesmo tipo bimodal de distribuição), nota-se que elas mostram uma tendência de queda em
relação à média de 1981-2010, sendo que a redução do gelo foi especialmente acentuada nos
dois últimos anos.

Porém, chama a atenção que o padrão de queda na extensão de gelo, desde setembro de 2016,
não tem paralelo nos últimos 40 anos, quando se começou as medidas por satélite. A curva de
2016 sofreu uma queda abruta no último trimestre do ano (outubro a dezembro) e continuou
batendo recordes de baixa nos quatro primeiros meses de 2017.

O filme “Before the Flood” retrata como a civilização está gerando problemas crescentes no
Planeta e é um poderoso instrumento de conscientização dos problemas climáticos e da grave
crise ambiental por que passa a humanidade. A probabilidade de colapso ambiental tende a
aumentar enquanto o governo Donald Trump corta os gastos para a proteção do meio ambiente
e aumenta os gastos militares e os incentivos para a indústria fóssil. Incentivar o consumo
conspícuo e retirar os EUA do Acordo de Paris é reforçar a perspectiva de desastre.

Enquanto a governança global está sobre ameaça devido ao crescimento do nacionalismo e do


militarismo, o Acordo de Paris está sob ameaça e vai ficando difícil interromper o processo de
degelo nos polos, que bateram todos os recordes em 2016 e 2017, como mostra os gráficos
abaixo da National Snow & Ice Data Center (NSIDC).

Assim o aquecimento global continua sendo a maior ameaça civilizacional e o declínio do volume
global de gelo (incluindo Groenlândia e os glaciares) é uma realidade inquestionável e
extremamente grave, como mostra o gráfico abaixo.
O fato inescapável é que o aumento das emissões de gases de efeito estufa (a queima de
combustíveis fósseis, liberação de gás metano na pecuária e o degelo do permafrost, etc.) eleva
a temperatura da atmosfera e dos oceanos e aumenta o degelo global, acelerando a elevação
do nível dos oceanos. A Groenlândia tem o potencial de elevar os oceanos em, pelo menos, 6
metros e a Antártica em mais de 60 metros. O degelo total pode provocar a subida em mais de
70 metros. Mas apenas 3% de degelo global já seria suficiente para elevar as águas marinhas em
mais de 2 metros, nível capaz de provocar grandes danos. A cidade do Rio de Janeiro, por
exemplo, é uma das mais vulneráveis do Brasil e é a maior aglomeração urbana a ser atingida
pela elevação dos oceanos.

Há dois bilhões de pessoas que vivem a menos de dois metros do nível do mar no mundo. O
naufrágio das áreas costeiras vai, dentre outros efeitos, agravar o problema dos deslocados e
refugiados do clima. Muitas áreas agricultáveis nos deltas dos rios irão ficar imprestáveis para a
geração de comida, podendo gerar grande insegurança alimentar. A crise dos refugiados da
guerra da Síria ou do Iêmen vai parecer um acontecimento trivial perto da crise gerada pela
invasão das águas salgadas nas costas litorâneas de todo o mundo. Parece que o futuro será
menos doce e mais salgado.

Referências:
Leonardo DiCaprio. Before the Flood (Legendado em português), National Geography, 31 de out
de 2016 https://www.youtube.com/watch?v=aV9w_chyuf4
NSIDC – National Snow & Ice Data Center: https://nsidc.org/data/seaice_index/
ArctischePinguin https://sites.google.com/site/arctischepinguin/home/global-sea-ice

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