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ENQUADRAMENTO TEÓRICO l Género e Conhecimento

3.4.

Contributos para uma


utilização ainda mais inclusiva
da terminologia

A
s sugestões a seguir apresentadas • Se, por exemplo, o objetivo for descrever
têm como objetivo promover a um grupo de pessoas de ambos os sexos,
reflexão e a desconstrução de referi-las enquanto seres ou grupos separados,
eventuais estereotipias no discurso ou analisar estatísticas desagregadas
e nas práticas pedagógicas, muitas delas correspondentes, deverá falar-se de “sexo
usadas de forma não consciente ou intencional masculino” e de “sexo feminino” ou apenas
na abordagem de diferentes problemáticas, de “sexo” ou “sexos”, deixando claro que
quer nas componentes de formação geral do se trata de uma pertença a uma categoria
currículo do ensino secundário, quer nas diversas sexual determinada pela biologia. Falar, por
áreas de formação específica, consoante as exemplo, do “género dos sujeitos” ou das
escolhas vocacionais de alunos e alunas: diferenças entre os “géneros feminino e
masculino” está conceptualmente errado e
• Referindo-se o género a uma ordem social e contribui negativamente para a tomada de
não sendo sinónimo de pertenças biológicas, o consciência do que está realmente em causa.
termo deve ser usado apenas no singular. Isto Reforça-se aqui mais uma vez a ideia de que
clarifica a natureza socialmente construída do o termo género não deve aparecer no plural.
género e evita a permanência nos discursos
de visões essencialistas do ser humano. • Falando-se em mulheres e homens (em
Nascer de um sexo ou de outro não pressupõe vez de homem e mulher) respeitam-se as
maneiras de ser ou de estar específicas e não diferentes maneiras de ser e de estar em
deve prescrever auto e heteroavaliações. cada um dos sexos e evita-se a ideia da
existência de ‘modelos’ de masculinidade e
• Falar de género sem explicar que os de feminilidade, que se sabem pantanosos e
assuntos envolvidos têm a ver com a vida de penalizadores para uns e outras em diferentes
raparigas/mulheres e de rapazes/homens é áreas da vida. Há, pois, muitas formas
desaconselhável, pois o conceito banalizou-se de ser e de estar que são independentes
e a tradução direta de documentos oficiais do sexo biológico ou da sensação de
escritos noutras línguas levou a que se pertença a um determinado grupo.
instalasse uma certa confusão no uso da
terminologia, mesmo entre as pessoas que se • A diversidade de características individuais de
têm dedicado à investigação e à intervenção. homens e de mulheres autoriza a falar não só
Tendo isto em mente, talvez seja preferível de diferenças entre os grupos, mas também
falar em igualdade entre homens e mulheres de diferenças intragrupo, sendo que estas
do que falar em igualdade de género. últimas são maiores do que as primeiras: as

por: Cristina C. Vieira 0103


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GUIÃO DE EDUCAÇÃO conhecimento, Género e cidadania no Ensino Secundário

mulheres são muito diferentes visão estereotipada e Ver, a este propósito,


entre si, assim como o são discriminatória da vida o capítulo “Género e
os homens. Logo, aludir individual os faz aparecer Cidadania” deste Guião.
apenas a diferenças entre os como inevitavelmente
sexos escamoteia claramente correlacionados. Quer isto Para reforçar a importância do
a ideia de que uns e outras dizer, por exemplo, que o uso de uma linguagem inclusiva,
são, em muitos aspetos, conhecimento da categoria que obrigue a uma reescrita
semelhantes entre si, embora sexual biológica a que uma dos textos e ao consequente
socialmente tendam a formar dada pessoa pertence (se é questionamento de práticas
grupos heterogéneos. macho ou fêmea) nada nos discursivas instaladas e
informa, seja na vida adulta ou muitas vezes não debatidas,
• Os conceitos de sexo, antes, sobre a sua orientação transcreve-se aqui um excerto
género, identidade de sexual, o seu sentido de do Guia para uma Linguagem
género, papéis de género e pertença psicológico a um Promotora da Igualdade
orientação sexual (lista não grupo específico (homens ou entre Mulheres e Homens na
exaustiva)8 são completamente mulheres), ou ainda os seus Administração Pública, da autoria
independentes entre papéis enquanto membro de de Graça Abranches, e que foi
si e somente uma uma comunidade. publicado pela CIG em 20099:

“ A questão central de que nos ocuparemos será a eliminação do uso do masculino genérico
(o genérico androcêntrico ou, na designação cunhada por Maria Isabel Barreno, o falso
neutro (…) [em 1985], e a sua substituição por formas não discriminatórias que respeitem o
direito de homens e mulheres à representação linguística da sua identidade e impliquem o
reconhecimento de que nenhum dos dois sexos tem o exclusivo da representação geral da
humanidade ou da cidadania. Mais do que uma simples re-nomeação, uma substituição de
umas formas por outras formas, o que está em causa é uma redefinição do universo de utentes
– um universo composto por cidadãos e por cidadãs. ”
Graça Abranches, 2009: 13-14.

8 Ver o Glossário apresentado no final deste Guião.


9 Guia disponível em: https://www.cig.gov.pt/wp-content/uploads/2015/11/Guia_ling_mulhe_homens_Admin_Publica.pdf
(consultado a 10 de abril de 2015).

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