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Sao Paulo, 18 e 19 de outubro de 1999 SEIS CASOS DE TUNEIS URBANOS COM REVESTIMENTO EM CONCRETO 3 PROJETADO ARMADO COM FIBRAS DE ACO Prof. Alberto Henriques Teixeira, Consultor A. H. Teixeira Consultoria e Projetos SIC Ltda. RESUMO Este trabaiho apresenta um resumo da evolugdo do emprego de concreto projetado em obras subterrdneas até a utilizagdo do concreto projetado armado com fibras de ago. Sdo apresentadas as propriedades deste mate- vial e a sua utilizagdo em seis ineis urbanos executados em Sdo Paulo, E apresentada uma metodologia que estdé sendo empregada no controle de qualidade do concreto projetado armado com fibras de ago. 1. INTRODUGAO Na execugdo de tineis escavados em solo é fundamental para a estabilidade das paredes e da ab6bada que o tempo decorrido entre a escavacao ¢ a aplica- do do revestimento primério sejao me- nor possfvel. A técnica usual de colocagdo de cam- botas metalicas e/ou de telas soldadas requer um perfodo de tempo que pode prejudicar as condigdes de estabilidade do macigo envolvente & escavagio. ‘Com a introdugao da técnica de con- creto projetado armado com fibras de ago aquele perfodo de tempo pode ser reduzido drasticamente, uma vez que a aplicagiio do concreto projetado pode ser feita imediatamente apés a escava- ¢4o e permitindo ainda plena liberdade de serem estabelecidos comprimentos de passos de avanco varidveis em har- monia com as condigdes de estabilidade do macigo escavado. Esta vantagem nao ocorre na técnica do uso de cam- botas e no uso de tela soldada, quando © passo de avango fica predeterminado Por um espagamento fixado no projeto ou por um submiltiplo da largura do painel da tela. O emprego do conrreto projetado ar- mado com fibras de ago|permite um produto acabado mais homogéneo o} TURB 99 - 3° Simpésio sobre Tiineis Urbanos 147 que nao ocorre quando da utilizagao de cambotas ede tela soldada pois, em am- bos os casos, resulta o efeito de sombra que facilita no futuro a corrosdo do ago. Nas obras dos tiineis a serem relatados obteve-se, outrossim, uma grande redu- fo dos prazos de execugio. 2.0 CONCRETO PROJETADO Denomina-se argamassa projetada (“gu- nite”) e concreto projetado (“shotcrete”) quando esses materiais sdo transpor- tados e projetados pneumaticamente sob alta velocidade sobre uma superficie. Por volta de 1910 foi introduzida nos EUA a argamassa (cimento + areia + Agua) projetada, denominada de “guni- ta”, utilizada principalmente para a prote¢iio superficial de taludes em solo ‘ou rocha ¢ para revestimento de canais hidrdulicos. Por voltade 1950 iniciou-se ‘0 emprego de concreto projetado (ci- Mento + areia + agregado fino + 4gua). A técnica da argamassa projetada foi introduzida no Brasil, por volta de 1948, pelo Instituto de Pesquisas Tecnolégi- cas de Sao Paulo, para recuperagiio es- trutural, conforme descrito por Molinari (1948). Na mesma época a empresa Geotécnica S.A importou equipamento- de “cement gun-gunite” para execugiio de revestimento de canal com argamas- sa projetada. As primeiras aplicagdes de conereto projetado no Brasil ocorre- ram em 1970 na execugdo dos nineis da Rodovia dos Imigrantes. 148 Estudo de Casos Desde 1981, quando da introdugdo no Brasil do sistema de projeto e de execu- go de tineis conhecido por N.A.T.M (‘New Austrian Tunnelling Method”), 0 concreto projetado vem sendo largamen- te empregado na formagao do revesti- mento de estruturas de obras subterrd- neas, paralelamente as inovagdes intro- duzidas nos equipamentos de proje¢ao e na tecnologia dos materiais utilizados. A aplicagio do concreto projetado é feita por trés processos, a saber: a) Via timida, quando todos os materiais (cimento, areia, pedrisco, dgua e adi- tivos plastificantes) sfio pré-mistura- dos e transportados pneumaticamen- te até 0 bico de injegao, onde é acres- centado aditivo acelerador de pega. b) Via seca, quando a dgua € injetada sob pressiio junto ao bico de injegio. c) Via semi-timida, que € uma variante do processo de via seca, quando a gua é injetada alguns metros antes do bico injetor. Os processos apresentam vantagens ¢ desvantagens quando comparados en- tre si. Resumidamente, os principais t6- picos so os seguintes: a) Via dmida: £ mais dificil obter alta resisténcia pelo fato da relagio agua! cimento ser mais elevada para ob- tengo de maior fluidez no transporte da mistura, resultando um teor de Agua superior aquele necess4rio para hidratacdo do cimento. Outrossim, obtém-se um produto final mais ho- mogéneo, néo ocorrendo poeira du- rante a aplicagio. b) Via seca: Produz grande quantidade de poeira noambiente, porém obtém- se uma maior resisténcia do concreto projetado face a relago 4gua/cimento sér menor. Outrossim € obtido um produto final menos homogéneo. Mais pormenores sobre as vantagens e desvantagens inerentes aos processos “de aplicagao veja-se, por exemplo, Fi- gueiredo & Helene (1993), Silva(1997) ¢ ASCE (1995), onde sao discutidos os fatores que controlam a resisténciae a qualidade do produto final e os proce- dimentos empregados para redugiio das perdas por réflexio. Este tema é de grande importincia no caso de ttineis quando da aplicagao do concreto proje- tado na abébada o qual, se mal aplicado, pode alcangar perdas por reflexdo de 50% ou mais. Os tiltimos avangos tecnolégicos do concreto projetado sdo os produtos adicionados ao mesmo, a saber:- polf- meros, silica ativa € fibras (de ago, de vidro e materiais sintéticos), com a fina- lidade de aumento de resisténcia, me- thoria do comportamento tensio x de- formagiio e de seu desempenho. 3,0 CONCRETO PROJETADO ARMADO COM FIBRAS DE AGO (CPAF) O emprego de fibras de ago no con- creto projetado tem tido um grande TURB 99 « 3° Sis desenvolvimento desde 1960. tem por maior finalidade transformar o concreto, que € um material fridvel no trabalho 4. tragéio na flexfo (ruina brusca apés 0 infcio da fissuragao a qual ocorre a de- formagées de flexdo minimas), em um. material diictil capaz de suportar cargas. mesmo apés 0 inicio da fissuragéo. Em. outras palavras, a adigdo de fibras de aco outorga ao concreto a propriedade- de (@iiidage# que € a capacidade de absorgdo de energia de deformacio na flexdio pés-fissuragiio. Como uma segdo de concreto armado- convencional é extremamente hetero- génea (grande concentragdo pontual de barras de ago de elevada resisténcia 4 tragdo distribuidas numa massa de re- duzida resisténcia & tragdo), a substi- ‘tuigéo da armadura por fibras de aco conduz a segdes estruturais mais uni- formes, pois as fibras se distribuem homogeneamente na massa do concreto. ‘Na Figura | séo.comparados os diagra- mas carga x deflexfo obtidos em en- saios de placas confeccionadas com conereto simples, armadas com tela soldada e. com fibras de ago, conforme Morgan (1991). Nota-se que a defor- ™magio pés-fissuragao da placa armada com fibras é mais gradual do que quando armadacom tela soldada, a. qual ocorre em degraus. A tenacidade & tragdo na flexao do concreto armado com fibras € medida no ensaio dos trés cutelos, que consiste em solicitar com uma carga concentra- sio sobre Tiineis Urbanos 149 da uma viga prismética simplesmente Segundo Vandewalle (1991) e ASCE apoiada conforme descrito no Anexo (1995) as fibras de ago quando adicio- I. Na Figura 2 apresenta-se umresulta- _nadas ao concreto projetado conferem do tipico do ensaio de tenacidade & ao mesmo as seguintes vantagens: trag4o na flexdo realizado em concreto armado com fibras de ago. ® aumento da ductibilidade e da tena- cidade (capacidade bd absorgaio de energi * aumento da resis- téncia a tragao na flexdo; === Concreto Simples © aumento da resis- téncia ao impacto € a fadiga; © reduz a propagaciio de fissuras (redugiio da fissuragdo no es- tado plastico). ro ine ace do comportamento ee Para os teores usuais concreto simples, concrete armado com tela soldadae Ye fibras de ago (40 a com fibras de aco, em placas - Morgan (1991) 50 kgf/m) emprega- dos no-concreto proje- oq 52581 RGM Spem #4 tado para revestimento de tineis 0 aumento | das resisténcias Acom- i600 ~ | pressdo axial ¢ a tra- | gio na flexdo é médico, g zo - no ultrapassando cer- : | | ca de 10%, A grande bie vantagem do emprego eT de fibras é dar ao con- 4.00 —|__+ creto uma resisténcia t continua no comporta- 0.00 i mento pés-fissuragio. 0.000 6500 1.000 1.500 2.000 2.500 Figura 2 - Resuliads lipico de eneaio de tenacidace- Com relagdo a durabi- viga 10cm x 10em x 40cm - concrato projetado armado —_—lidade do concreto o com fibras de aco - Alphageos (1991) uso de fibras é favoré- 150 Estudo de Casos vel pois, sendo as fibras de pequeno comprimento, de reduzida segdo trans- versal e estando distribuidas na se¢ao, © mecanismo da corrosio nao tem con- digdes de se propagar como pode ocor- rer ao longo das barras de ago de um concreto armado convencional. Neste caso, como a oxidagdo do ago é um fenémeno de elevada expansio volu- métrica, gera-se uma pressao interna que fratura 0 concreto de recobrimento da armadura, e tornando o processo agressivo auto-acelerante, No caso das fibras, devido a sua pequena drea da segdo transversal, essa pressdo de ex- pansio é minima, nao afetando a resis- téncia do concrete. Na Figura 3 sdo apresentadas algumas das formas e dimensdes das fibras em- pregadas no Brasil. As fibras utilizadas na armagiio do concrete projetado sio caracterizadas pelo pardimetro denomi- nado de fator de forma, que é a relagao entre o. comprimento da fibrae o diame- tro equivalente da segdo transversal. A ASTM (1990) recomenda que 0 ago empregado na fabricagao das fibras te- p<— LD b=30a50mm aor L=25a55 mm nha uma resisténcia A tragdo minima de 350 MPa. Além do fator de forma da resisténcia do ago, outros fatores importantes para © adequado desempenho do CPAF, sao a forma geométrica e a quantidade de fibras empregada. Quanto maiores fo- rem 0 fator de forma ¢ 0 teor de fibras maior sera a resisténcia 4 tragdo na flexdo, todavia ha um limite pratico do teor de fibras pois com o seu aumento maior sera a dificuldade de manuseio do concreto aplicado pneumaticamente. © concreto projetado armado com fi- bras de ago vem tendo ampla utilizagao na Engenharia Civil como, por exemplo, no revestimento de tineis, no reparo, recuperagéo ¢ reforgo de estruturas, pavimentos industriais, rodovidrios ¢ aeroportudrios de alta solicitago e on- de se exige elevada resisténcia a es- forgos dindmicos (onde a fadiga é um aspecto importante), em pegas de con- creto prémoldadas para diminuigao da fissuragdo, revestimento de canais hi- drdulicos, revestimento e estabilizagao- 46 | 46 10.2 16] 158 Estudo de Casos FIGUEIREDO, A. & HELENE, P. (1993)-Concreto Projetado:- O con- trole do Processo de Projegao - Bo- letim Técnico da Escola Politécnica da USP - BT/PCC/92. J.S.C.E (1984)- The Japan Society of Civil Engineers - Method of Test for Flexural Sthength and Flexural Tough- ness of Steel Reinforced Concrete - SF4 LPC LATINA (1997) - Relatério RGM- 01-II- Acompanhamento Técnico de Execugfo das Obras da Adutora ‘Guarati-Lapa. MOLINARI, G (1948)- Restauracdode ‘Concreto pelo Processo“Cement-gun” - Revista Engenharia n° 66- Fev. 1948 MORGAN, D.R. (1991)- Steel Fiber Re- inforced Shotcrete for Support of Un- derground Openings in Canada - Con- crete International - November 1991. SHEIKAN ANCORJET (1994) - Steel Jet Fibras Metdlicas para Reforgo de Conereto ¢ Concreto Projetado Tipo I ASTM A 820 SILVA, P-F.A (1997) - Conereto Pro- jetado para Tuneis - Editora Pini. VANDEWALLE, M. (1991) - Tunnel- ling the World - Dramix - N.Y. Bekaert S.A. ANEXO I CONTROLE DA QUALIDADE DO CONCRETO PROJETADO AR. MADO COM FIBRAS DE AGO 1 -Moldagem, nocanteiro de obras, de placas de dimensées 60 cm x 60 cm, NJ com bordas inclinadas de 45°, e 10cm de espessura. 2- Corte, no laboratério, de corpos de prova:- a) de forma cilfndrica, difimetro de 7,5 me 10 cm de altura 'b) de vigas prismiticas, segao transversal de 10 cm x 10 em, ¢ ccomprimento de 40 cm. 3 - Ensaios dos corpos de prova:- a) Ensaio & compressao axial para determinacao da resisténcia 4 com- pressao simples (ou axial) fej a 1,7, 15 e 28 dias da data de moldagem. b) Ensaio de tenacidade (ou ensaio dos trés cutelos, com cargas contro- ladas apés a fissuragi0, ¢ medidas da deflexio da viga prismitica). Vide Figura 12. A ruptura da viga ocorre na segdo central do c-p. onde 0 mo- mento fletor é maximo e constante e a fora cortante é nula. Convenciona- se chamar de resisténcia a tracio na flexfioo valor datensdo maxima apli- cando-se a férmula da flexao simples normal:- M L-a 1_ FL =2=F. eee f=y 7 woe onde, habitualmente:- 1 a= Lb 1= 30cm b=R=10cm 2 Na Figura 13 apresenta-se um diagra- ma forga x deflexdo caracteristico ob- TURB 99 - impdsio sobre Tiineis Urbanos 159 Deflexlo & (enn) Figura 12 - Esquema do ensaio de tenacidade (Trés cutelos) tido pela execugao de ensaios. A drea Tb delimitada pelo diagrama forga x deflexdio mede a energia absor- vida pelo concreto quando ele se de- forma. Estabelecendo-se uma deflexao. padrao (d,), resulta uma carga média (F,) ao longo do ensaio de tenacidade, até essa flexio, de modo que:- To = Fei 3 Costuma-se nomear T, de tenacidade do concreto armado com fibras de ago. A norma japonesa SF.4 (The Japan Society of Civil Engineers - JSCE - SF4 - 1984), que vem sendo seguida em nosso meio técnica, estabelece que, sendo L = 30cm, L 61=— =2, 15907" 4 - Determinagdes (conforme o dia- grama forga x deflexao da Figura 13):- 160 Estudo de Casos Figura 13 - Diagrama forga x deflexdo obtide no ensaio de tenacidade a) Resisténcia 4 tragio na flexdo cor- respondente a abertura da 1° fissura, Fol fo= 5 one b) Resisténcia maxima (ou tiltima) & trago na flexdo, ou médulo de rutura. pe ‘ bh? Habitualmente nos ensaios tem-se F,=F, c) Determinagao da tenacidade T, (Grea do diagrama carga x deflexio até a deflexdo de 2 mm) d) Resisténcia equivalente a tragiio na flex4o (ou fator de tenacidade), ou tensio de deflexdo equivalente (ou convencional) Fel. Th L hess 7 bh? 61 bh?

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