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Panorama Histórico das Questões

Sociais e Ambientais
Sumário

Panorama Histórico das Questões Sociais e


Ambientais
Objetivos ...................................................................... 03
Introdução..................................................................... 04
1. Evolução da Responsabilidade Socioambiental...... 05
1.1 Década de 1950................................................... 05
1.2 Década de 1960................................................... 07
1.3 Década de 1970................................................... 07
1.4 Década de 1980................................................... 08
1.5 Década de 1990................................................... 09
1.6 A partir de 2000.................................................. 10
2. Estado, Mercado e Sociedade............................... 11
3. A Globalização e o Estado Mínimo...................... 13
4. A Redemocratização Brasileira............................. 14
5. Mudanças no Mercado........................................ 15
Referências Bibliográficas............................................... 20

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Objetivos
Ao final desta unidade, você deve apresentar os seguintes
aprendizados:

• Identificar como as questões sociais e ambientais atraíram a


atenção da sociedade e do meio acadêmico;
• Reconhecer, em cada década, os principais fatos marcantes
para o desenvolvimento da gestão socioambiental;
• Compreender as particularidades do caso brasileiro na
evolução das questões sociais e ambientais;
• Entender as principais mudanças ocorridas no mercado que
favoreceram o surgimento da gestão socioambiental.

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Introdução
Nesta unidade de aprendizagem, estudaremos o panorama
histórico das questões sociais e ambientais. Os seres humanos,
principalmente por meio de suas atividades econômicas, sempre
provocaram algum tipo de mudança no ambiente. Esta interferência foi
muito ampliada ao longo da história da humanidade, sobretudo pelo
desenvolvimento da tecnologia, que permitiu uma utilização cada vez
maior dos recursos da natureza.

A partir do século XVIII, a Revolução Industrial introduziu um


novo padrão de relações entre o homem, a tecnologia e o meio ambiente.

Com a máquina a vapor e outras tecnologias surgidas neste


período, passou-se a transformar facilmente os recursos – então
abundantes na natureza, como o caso da energia –, ocorrendo uma
expansão sem precedentes na capacidade produtiva humana. No entanto
inicialmente, o desenvolvimento econômico não foi acompanhado, no
mesmo nível de desenvolvimento social, pois a maior parte da população
ficou excluída das riquezas geradas.

Por sua vez, a utilização sem precedentes dos recursos naturais,


com o objetivo de alimentar uma sociedade de consumo cada vez mais
voraz, trouxe grandes danos ao meio ambiente.

A percepção da sociedade a respeito destas questões evoluiu


por muitas décadas, até que fosse construída a noção de que os avanços
econômicos não poderiam andar separados do desenvolvimento social e
da preservação ambiental.

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1. Evolução da Responsabilidade
Socioambiental
Na sociedade contemporânea é comum observarmos o
surgimento e a transformação de determinados conceitos. Tal afirmação
aplica-se ao conceito de gestão social e gestão ambiental a partir dos
anos 1950. Até meados dos anos 1950, geralmente, as organizações
utilizavam os termos:

• Controle da poluição;
• Ações filantrópicas;
• Ações sociais.

Dos anos 1960 em diante, esses conceitos sofreram


algumas alterações. Segundo Tenório (2004), é comum na atualidade
observarmos no discurso das organizações e da sociedade civil os
seguintes termos:

• Responsabilidade social empresarial;


• Responsabilidade social corporativa;
• Ações e produtos ambientalmente corretos;
• Responsabilidade ambiental, entre outros.

Agora vamos conhecer alguns dos principais acontecimentos


ligados ao meio ambiente, da década de 1950 até os dias atuais.

1.1 Década de 1950

Iniciamos nossa retrospectiva citando Lemos (2013), que nos diz

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que as preocupações com a gestão social e a gestão ambiental moderna
tiveram início na década de 1950, a partir de dois acontecimentos
marcantes:

• O acidente na Baía de Minamata, no Japão, onde ocorreu


derramamento de uma grande quantidade de mercúrio no
mar. Esse fato resultou em um intenso debate sobre as
questões ambientais;
• Paralelamente ao desastre na Baía de Minamata, foi lançado o
livro Responsabilidade social dos homens de negócios, de Howard
R. Bowen, nos Estados Unidos em 1953, contribuindo para a
discussão do assunto no meio acadêmico.

É neste momento que as empresas começam a perceber que


não devem apenas gerar lucros com suas atividades, mas, também,
contribuir para o desenvolvimento social.

É importante percebermos que, desde a Revolução Industrial,


no início do século XIX, até o acidente na Baía de Minamata, o meio
ambiente era considerado apenas um lugar de descarte dos resíduos
industriais, sem nenhum critério de segurança ou preocupação com os
impactos negativos da produção das indústrias.

Ao longo do século XIX também chamaram a atenção as


condições desumanas que os operários nas fábricas foram submetidos,
incluindo crianças, com jornadas de até 16 horas de trabalho por dia,
sem quaisquer condições de saúde ou de segurança.

O consumo de matérias-primas e o processamento industrial


tinham como finalidade apenas oferecer um número cada vez maior de
bens de consumo para as pessoas.

O crescimento indiscriminado do consumo, atrelado ao


descarte igualmente pernicioso, resultou de modo geral em uma grande
degradação ambiental. Podemos perceber, então, que o consenso sobre
a ideia de que a natureza seria capaz de absorver tudo que o homem
lançava no meio ambiente começou a ser quebrado.

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Como você já deve ter notado, o caso do desastre de Minamata
deixou claro que as atividades produtivas de uma empresa podem gerar
muitos impactos negativos na sociedade e no meio ambiente.

1.2 Década de 1960

No ano de 1962, com o lançamento do livro Primavera


Silenciosa, de Rachel Carson, foi denunciado o desaparecimento dos
pássaros nos campos dos Estados Unidos, em razão do uso de pesticidas
na agricultura.

Além do livro de Carson, outra obra marcou a evolução da


gestão socioambiental. As empresas e a sociedade, de Joseph W. McGuire,
defendia a ideia de que as organizações não tinham apenas obrigações
legais e econômicas, mas também, obrigações morais e humanitárias
com a sociedade.

Nesta década, cresceu bastante a conscientização social e


política sobre as questões ambientais, por meio de uma grande reação
da sociedade civil. Surgiram os movimentos sociais que defendiam o
pacifismo, a igualdade racial e a igualdade de direitos entre homens e
mulheres, e que, ao mesmo tempo, criticavam duramente a degradação
da natureza.

Segundo Nascimento (2007), as organizações não


governamentais (ONGs) ambientalistas apareceram nesse período,
nos países desenvolvidos, lutando pela conservação da natureza e
questionando os efeitos da poluição industrial.

1.3 Década de 1970

Já nos anos 1970, a Organização das Nações Unidas (ONU)


realizou, em 1972, a Conferência de Estocolmo, na Suécia, envolvendo
representantes de diversos Estados para discutir a questão ambiental.
Nesta conferência foi elaborado um importante documento, o relatório
Os Limites do Crescimento (também conhecido como Relatório

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Meadows), afirmando que a acelerada industrialização e o crescimento
demográfico levariam ao esgotamento dos recursos naturais do planeta
em algumas décadas (Lemos, 2013).

Segundo o relatório, a Terra poderia entrar em colapso,


botando em risco a vida humana, sendo necessário conter os níveis de
crescimento econômico. A solução dos problemas, dentro deste ponto
de vista, seria adotar uma política mundial de contenção do crescimento
— chamada de “crescimento zero” — até que o equilíbrio do planeta
fosse restaurado.

As indústrias se tornam, a partir da confecção deste relatório,


o principal alvo das críticas dos movimentos ambientalistas. Os
mais radicais pediam o fechamento de fábricas. A crítica ao modelo
capitalista industrial parecia apontar para um conflito sem solução entre
o crescimento econômico e a preservação de recursos ambientais.

Os acidentes ambientais que continuavam a acontecer nesta


década agravaram ainda mais a situação: em 1976, o acidente em
uma indústria de pesticidas em Seveso, na Itália, lançou uma enorme
quantidade de dioxinas na atmosfera.

Mas será mesmo necessário reduzir o ritmo de crescimento


econômico para salvar o planeta? O que você pensa a respeito?

1.4 Década de 1980

A década de 1980 foi a que mais sofreu com acidentes


ambientais, desencadeando uma nova onda de reações por parte dos
movimentos ambientalistas. Os casos foram os seguintes:

• Exxon Valdez derrama óleo (Alasca – 1989);


• Acidente nuclear de Chernobyl (Ucrânia – 1986);
• Produtos tóxicos atingem o rio Reno (Suíça – 1986);
• Gases letais vazam em fábrica de agrotóxicos em Bhopal
(Índia – 1984).

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Em 1987 surge um importante relatório da ONU chamado
Nosso Futuro Comum (também conhecido como Relatório Brundtland),
estabelecendo o conceito de desenvolvimento sustentável:

“...aquele que atende às necessidades das gerações


presentes sem comprometer a possibilidade
de gerações futuras satisfazerem suas próprias
necessidades”.

O conceito de desenvolvimento sustentável, segundo Lemos


(2013), mostra duas coisas importantes:

a) O crescimento econômico e a proteção ambiental são


compatíveis entre si;
b) Devemos levar em conta as consequências de nossas
ações presentes para as gerações futuras.

Do ponto de vista acadêmico, foi também na década de 1980 que


ocorreram evoluções marcantes nos estudos sobre responsabilidade social.

Em 1984, Edward Freeman elaborou o conceito de


stakeholder, cuja definição é “qualquer grupo ou indivíduo que pode
afetar ou é afetado pelo alcance dos objetivos organizacionais”. Esse
conceito implica em admitir que toda organização se relaciona com
diversos grupos interessados em seus resultados – e não apenas com
seus donos ou acionistas. Temos, assim, os clientes, os empregados, os
fornecedores, o governo e a própria comunidade na qual a organização
está inserida, entre outros.

1.5 Década de 1990

Na década de 1990 também ocorreram vários acontecimentos


marcantes do ponto de vista ambiental e social. Em 1998 e 1999, a
gestão social e ambiental contou com algumas iniciativas que ajudaram
na institucionalização do seu conceito e da sua aplicabilidade nas
organizações. Segundo Lemos (2013), foram criados:

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Norma SA 8000 – norma internacional que consiste em as
avaliar condições de trabalho, incluindo os trabalhos infantil e
1997
forçado, além de saúde e segurança no trabalho, liberdade de
associação, discriminação, carga horária, entre outros.

Global Reporting Iniciative (GRI) – organização sem


1997 fins lucrativos, que promove a elaboração de relatórios de
sustentabilidade adotados por diversas organizações no mundo.

Instituto Ethos de Responsabilidade Social – consiste


em disseminar a prática da responsabilidade social entre as
1998 empresas. Hoje é uma referência internacional sobre o assunto,
estabelecendo indicadores que permitem medir o índice de
responsabilidade social das empresas.

Código de melhores práticas de governança corporativa pelo


Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) –
1999
apresenta recomendações de boas práticas de governança
corporativa para as empresas atuantes no Brasil.

Norma AA 1000 – padrão internacional de gestão da


1999
responsabilidade corporativa, com foco na contabilidade e auditoria.

1.6 A partir de 2000

Em 2007, o Painel Intergovernamental de Mudanças


Climáticas (IPCC), órgão da ONU, foi criado para produzir relatórios
científicos sobre mudanças climáticas. Tal painel divulgou um relatório
que marcou de modo definitivo as discussões sobre as questões
ambientais, afirmando que o aquecimento do clima global era evidente
em observações científicas, causado pela influência das atividades
humanas sobre o meio ambiente (Lemos, 2013).

O relatório alertava para a elevação da temperatura média do


planeta em 4°C até o fim do século XXI e para o potencial catastrófico
do fenômeno, provocando extinções em massa, elevação do nível dos
oceanos e devastação de áreas costeiras. Como resultado da crescente

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conscientização a respeito dos problemas sociais e ambientais, os
países precisaram descobrir maneiras de promover o crescimento de
suas economias, gerando bem-estar social e preservando o equilíbrio
ambiental, mas sem provocar danos para as gerações futuras.

Surge então, o conceito de empresa sustentável, integrando


de forma clara as preocupações econômicas, sociais e ambientais.
Segundo Savitz (2007) “empresa sustentável é aquela que gera lucro
para os acionistas, ao mesmo tempo em que protege o meio ambiente e
melhora a vida das pessoas com quem mantém interações”.

Segundo Nascimento (2007), no século XXI os termos social


e ambiental aparecem unidos nos relatórios e nos demais estudos sobre
desenvolvimento sustentável. Esta união significa que os estudiosos
compreenderam que pensar no meio ambiente implica, necessariamente,
em tratar também da questão social.

Sendo assim, as empresas passam a lidar com o conceito de


responsabilidade socioambiental. Tal conceito representa uma forma
de conduzir os negócios, tornando a empresa parceira e corresponsável
pelo desenvolvimento social e pela preservação ambiental. Podemos
dizer que, para que uma empresa se torne responsável em termos
sociais e ambientais, ela precisa ouvir os anseios das partes interessadas
(stakeholders) – acionistas, funcionários, fornecedores, consumidores,
comunidade, governo e meio ambiente – e incorporá-los ao
planejamento de suas atividades.

2. Estado, Mercado e Sociedade


No âmbito da responsabilidade socioambiental, é importante
entender quais são os papéis do Estado, das empresas que atuam
no mercado e da própria sociedade. No século XIX, o processo de
industrialização provocou inúmeras alterações nas relações entre estes
agentes. Predominava, neste período, a concepção do liberalismo
econômico, segundo o qual o mercado devia ser um espaço em que as
empresas competiam de modo livre, com o mínimo de intervenção do
governo. Impostos, taxações, obrigações trabalhistas e outras formas de

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intervenção do governo nas relações de mercado não eram bem vistas
pela doutrina do liberalismo econômico (Ivo, 2001).

Entretanto, a partir do século XX, este cenário sofreu


mudanças, principalmente com a crise da bolsa de valores de Nova
York, em 1929 apontando a decadência da ordem liberal nos países
capitalistas. Além disso, em 1917, a União Soviética tornou-se um
país socialista, mostrando a possibilidade de um modelo alternativo de
organização da economia, bem diferente dos princípios liberais.

Nos países socialistas, a atuação do capital privado é limitada. As


empresas industriais e financeiras são propriedade pública e o governo detém
o planejamento e o controle da economia. O socialismo foi influenciado
pelas proposições de Karl Marx e Friedrich Engels elaboradas no século XIX.

Diante da crise do modelo liberal, os estados capitalistas


encontraram na teoria keynesiana o seu suporte. Contrariando as ideias
do livre mercado, o economista John Maynard Keynes defendia que
o Estado tinha um papel indispensável na economia (Ivo, 2001). De
acordo com essa teoria, caberia ao Estado intervir por meio de medidas
fiscais e de moeda para tentar contornar os efeitos negativos provocados
por ciclos econômicos. Tais efeitos negativos levavam as economias a
uma sucessão de crises, depressões, recuperação, boom e novamente
crises, depressões.

Deste modo, o Estado passou a assumir um papel proativo


como protagonista das relações de mercado. Neste contexto, a indústria
bélica foi um dos setores que mais cresceu e acelerou as economias dos
países industrializados.

A partir da Segunda Guerra Mundial, o mundo ficou


dividido em dois blocos: o socialista, liderado pela União Soviética; e
o capitalista, liderado pelos Estados Unidos. Diversos países da Europa
também se tornaram socialistas, como a Alemanha Oriental, a Hungria,
a Polônia e a Romênia, além da própria União Soviética. O modelo
socialista alcançou, também, alguns países da África, como Angola
e Moçambique. Na América Latina, a grande força socialista era
representada por Cuba; e na Ásia, pela China.

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A divisão econômica mundial nestes blocos (capitalista e
socialista) provocou a crescente necessidade de aperfeiçoamento e
manutenção da competitividade do ponto de vista bélico. Ou seja, as
potências envolvidas diretamente no conflito investiram na indústria
de armamentos e suas economias passaram a ter um peso muito
significativo no comércio de armas. Esse evento ficou conhecido como
“Guerra Fria”.

Neste período, a ideologia da social-democracia ganhou força,


orientando as políticas de diversos governos na Europa. Esta ideologia
surgiu a partir da ideologia socialista, mas com uma diferença básica:
defendia que não era necessário fazer uma revolução para acabar com o
capitalismo, mas sim reformá-lo, de modo a reduzir as desigualdades
sociais por meio da proteção social ao trabalhador, e de investimentos
em programas sociais para redistribuir a riqueza.

O período da Guerra Fria durou pouco mais de quatro décadas


e, no final dos anos 1980, precisamente em 1989, a queda do Muro de
Berlim decretou seu fim.

Novamente, a partir do início da década de 1990, as relações


entre estado e mercado sofreram alterações. Dessa vez, o fenômeno
da globalização seria o principal elemento de transformação e de
reformulação do papel do Estado.

3. A Globalização e o Estado Mínimo


Segundo Castells (1999), uma economia global é capaz de
funcionar como uma unidade em tempo real, em escala planetária, com
base na nova infraestrutura propiciada pelas tecnologias da informação
e comunicação, e pela quebra das barreiras comerciais. Esta nova
característica da ordem global trouxe importantes consequências para as
relações entre estado, mercado e sociedade.

A partir dos anos 1990, os estados nacionais deixaram de


ter a responsabilidade de promover o desenvolvimento econômico
de idealizar e executar a proteção social, e de regular as questões

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econômicas. Segundo Ivo (2001), a partir deste momento, afirma-se
a ideia do “Estado Mínimo”, que perde certos poderes a partir das
mudanças nas relações entre estado, sociedade e mercado, como uma
série de responsabilidades públicas assumida pela sociedade civil,
organizada principalmente em ONGs que passam a atuar no combate
aos problemas sociais; serviços considerados básicos oferecidos pelo
estado, como educação e saúde, privatizados; e, crescente parceria entre
a esfera pública e a privada, de modo que o Estado volta a ficar limitado
à garantia de um ambiente político, legal e seguro para a atuação das
empresas privadas em nível global.

Já que o Estado perdeu seu protagonismo, as iniciativas do


setor privado para intervir ou minimizar a questão social tornaram-
se comuns. Por um lado, as empresas passaram a investir em projetos
sociais e, por outro, a sociedade civil se organizou por meio de ONGs
para dar conta de um conjunto de responsabilidades, antes dominadas
pelo Estado.

4. A Redemocratização Brasileira
No Brasil, ocorreu, nos anos 1980, a emergência de
novos atores sociais, dentre os quais se destacaram os movimentos
pela democracia. O país vivia na ditadura militar desde 1968 e
os movimentos políticos e sociais ganharam força nesta década,
reafirmando a democracia como um valor moral e abrindo novas
possibilidades de representação, por meio, por exemplo, das eleições
diretas, da liberdade sindical e de imprensa, e da maior transparência
nos assuntos legislativos. A retomada da democracia no Brasil significou
a oportunidade de uma maior atuação da sociedade civil na vida política
e social do país.

Segundo Anau (2003), o processo de redemocratização no


Brasil gerou grandes mudanças nos rumos da sua cultura política. Se
durante o regime autoritário a sociedade civil não tinha espaços de livre
expressão, agora, com a democracia, as cobranças da sociedade sobre
o Estado se ampliam, no sentido de que as iniciativas governamentais
respondam melhor aos seus anseios. A nova Constituição, promulgada

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em 1988, representou diversos aspectos do cenário político e social
brasileiro, dentre os quais se destacam a entrada do país na ordem
da globalização da economia, a adequação do Estado aos padrões do
neoliberalismo e reorganização do Estado em moldes mais flexíveis e
menos intervencionistas nos assuntos de mercado.

A Constituição de 1988 é chamada de “Constituição Cidadã”,


em razão da ampla gama de direitos nela estabelecidos. Podemos citar,
por exemplo, o fim da censura à imprensa, o direito à saúde e à educação
a todos os cidadãos, a proibição da tortura e da pena de morte, a
igualdade de direitos fundamentais entre homens e mulheres, a punição
ao racismo, a liberdade sindical, a proteção ao índio, entre outras.

Esta Constituição foi a primeira a tratar de forma direta sobre


o meio ambiente. Uma das formas de proteção do meio ambiente
previstas constitucionalmente é a ação popular, que permite que
qualquer cidadão ingresse com a referida ação, com o intuito de anular
qualquer ato lesivo ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e
cultural (Benjamim, 2008).

5. Mudanças no Mercado
No cenário internacional, como vimos, as relações de
mercado caracterizavam-se pelo neoliberalismo e pelo predomínio
do capital internacional. Neste cenário, segundo Castells (1999),
temos características importantes como: novos padrões de produção
pós-fordistas, expressando o predomínio do capital internacional;
flexibilização das relações de trabalho e aumento dos níveis de
desemprego; ampliação do poder das organizações internacionais,
afetando a soberania dos Estados Nacionais e a reforma do Estado
ocorrida na América Latina, a partir dos anos 1990, aproximando suas
economias do modelo neoliberal.

A ideologia neoliberal afirma o predomínio dos mercados


livres e é uma das bases mais importantes da globalização. Para a
ideologia neoliberal, o mercado é visto como principal recurso de
desenvolvimento e crescimento econômico, sendo prejudicial qualquer

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forma de intervenção estatal. Deste modo, ocorre a redução drástica
da regulamentação dos mercados e das barreiras comerciais entre os
Estados, permitindo o deslocamento do capital para os locais mais
rentáveis (Hobsbawn, 2009).

Com a abertura de mercados, as condições de negócios


tornaram-se mais instáveis. A concorrência entre as empresas se acirra e a
demanda por bens de consumo se torna mais diversificada, exigindo que
as empresas se adaptem mais rapidamente às mudanças e respondam às
exigências diferenciadas dos vários segmentos de mercado.

As grandes empresas transnacionais, que atuam na economia


global, são capazes não só de vender, como também de produzir em
diversos países. Deste modo, estabelecem contratos com fábricas
em países geralmente pobres ou em desenvolvimento, em busca
de vantagens como: mão de obra barata, profissionais qualificados,
vantagens fiscais (impostos reduzidos) e leis de proteção ambiental
menos rígidas (Castells, 1999).

Dentro deste modelo (chamado pós-fordista), utilizado pelas


empresas transnacionais, as etapas operacionais do processo produtivo
são deslocadas para as regiões de baixo salário do mundo, enquanto as
funções de natureza estratégica permanecem nas empresas sediadas nos
países avançados. Desta forma, é comum que o projeto de criação de
um produto seja definido em um país; as peças que o compõe sejam
fabricadas em outro; a montagem seja realizada em um terceiro país; e o
produto final seja vendido no mercado global.

Um dos fenômenos resultantes destas mudanças na economia


global, segundo Castells (1999), foi o aumento do desemprego, pois as
empresas tornaram-se capazes de produzir cada vez mais, empregando
uma porcentagem cada vez menor da força de trabalho, por conta
da redução de cargos hierárquicos (enxugamento da estrutura) e do
emprego de altas tecnologias que substituem o trabalho humano. Por
outro lado, boa parte dos empregos gerados é baseado em contratos
de trabalho flexíveis e precários, desprovidos de estabilidade e de
garantias sociais.

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Para termos mais claro o cenário de desigualdade econômica, a
chamada “elite do conhecimento”, que trabalha nos setores estratégicos
de grandes empresas, em tarefas criativas e com oportunidades de
crescimento, detém os empregos qualificados e bem remunerados.
Segundo o relatório sobre a riqueza mundial, publicado pelo centro de
pesquisas do Credit Suisse, em 2014, 1% da população mundial detém
mais de 48% da riqueza mundial. Considerando os 10% mais ricos, a
porcentagem sobe para 87% da riqueza mundial.

Como o Brasil se insere neste contexto? O país, que durante


várias décadas caracterizou-se por uma economia fechada pela prática
do protecionismo, ingressou de forma acelerada na flexibilização de seus
mercados, a partir da década de 1990. Os resultados mostraram que
nem todos foram ganhadores neste processo.

Enquanto algumas empresas tiveram condições de aproveitar


as oportunidades trazidas com a expansão das relações comerciais,
outras ficaram expostas aos problemas trazidos pelo acirramento da
competição e quebraram. Até o início da década de 2000, os problemas
sociais se agravaram e a desigualdade atingiu seu ponto máximo.

Você deve estar percebendo que tantas mudanças


impulsionaram as empresas a assumirem mais sua responsabilidade
diante de problemas sociais. Veja como o Conselho Federal de
Administração (CFA) destaca a responsabilidade social das empresas:

Responsabilidade social empresarial são ações das empresas


que beneficiam a sociedade. São causas sociais relevantes para
as comunidades, contribuindo com a política social. É uma
forma de gestão que pretende diminuir os impactos negativos
no meio ambiente e comunidades, preservando recursos
ambientais e culturais, respeitando a diversidade e reduzindo
a desigualdade social. São as corporações se conscientizando
do seu papel no desenvolvimento na comunidade em que
está inserida, criando programas que levam em consideração
a natureza, economia, educação, saúde, atividades locais,
transportes. Fonte: Disponível em http://www.cfa.org.br/
acoes-cfa/artigos/usuarios/responsabilidade-social-empresarial

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Para o Estado e para as empresas, isso tudo representa grandes
vantagens. Para os empresários, a adequação das normas e regras da
responsabilidade social denota ganhos monetários (com a isenção de
impostos) e melhor estratégia de marketing (marketing verde).

Para o Estado, tais iniciativas são fundamentais justamente


porque ocorrem intervenções em áreas que, antes, estavam sob a sua
responsabilidade.

De acordo com essa nova dimensão, a iniciativa privada passou


a ter maior importância nas formulações de políticas, não apenas de
mercados, mas também, de ordem social. O empresariado passou a
participar da dinâmica de formulação de políticas de diversas formas:

a) No investimento em candidaturas de representantes da


classe empresarial para ocupar cadeiras nos legislativos
municipal, estadual e federal;
b) Na formulação de grupos de pressão que possam
intervir mais diretamente nos assuntos de seu interesse no
legislativo e no executivo;
c) Nas parcerias entre os poderes público e privado,
especialmente na construção de projetos políticos para
determinadas localidades.

Essa última estratégia pode ser percebida na formulação do


Planejamento Estratégico das Cidades, cuja intervenção empresarial
é latente.

A cidade do Rio de Janeiro, nos anos 1990, teve o seu


primeiro planejamento estratégico liderado pelo poder municipal e a
elite empresarial.

Além da participação nos assuntos políticos de reforma do


Estado e as questões de mercado, as organizações privadas de diversos
ramos se movimentaram rapidamente para se adequar às leis, normas e
padrões do ponto de vista da responsabilidade social.

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Até meados dos anos 1980, a ideia de responsabilidade social,
uma vez que não havia obrigatoriedade por parte do Estado, era
assimilada pelo empresariado de acordo com suas próprias aspirações.
Entretanto, a dificuldade do Estado em manter a ordem social e
econômica transformou em elemento básico de competitividade, a
inserção das organizações na dinâmica da responsabilidade social.

A questão ambiental também representou uma das


grandes motivações para a criação de selos e novas estratégias de
competitividade. No limiar do século XXI, a palavra de ordem é a
questão da sustentabilidade, ou seja, o crescimento econômico com o
máximo possível de preservação do meio ambiente.

Esta nova concepção destaca, portanto, a relação equilibrada


com o ambiente em sua totalidade, considerando que todos os seus
elementos afetam e são afetados reciprocamente pela ação humana.

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