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A LINGUAGEM 7 oatinntonden a maneoisa. A escultura era uma cépia do modelo; a fér- mula ritual uma reprodugao da realidade, capaz de re- engendré-la. Falar era re-criar 0 objeto aludido. A pro- ntincia exata das palavras mdgicas era uma das primei- ras condigées para sua eficécia. A necessidade de preser- var a linguagem sagrada explica o nascimento da gra- mitica, na India védica, Porémpao=cabordos™séeulosnos homens perceberam que entre as coisas e seus nomes abria-sesumeabismo. As ciéncias da linguagem conquis- taram sua autonomia tao logo cessou a crenga na iden- tidade entre o objeto e seu signo. A primeira tarefa do pensaménto consistiu em fixar um significado preciso e tinico para os yocdbulos; e a graméatica se converteu no primeiro degrau da légica. Massas=palavras=sao=rebeldes : li A hist6ria do homem poderia se reduzir a hist6ria das relagdes entre as palavras € © pensamento. Todomperio- guagem: De imediato se perde a fé na eficdcia do vocé- bulo: “Tive a beleza em meus joelhos e era amarga”, diz o poeta. A beleza ou a palavra? Ambas: a beleza nao € palpavel sem as palavras. Coisas e palavras san- gtam pela mesma ferida. Todas as sociedades passaram Por essas crises de suas bases que sdo sobretudo crises do sentido de certas palavras. Esquece-se com freqiién- cia que, como todas as outras criagdes humanas, os Im- i 7 pétios © os Estados estiio feitos de palavras: siio feitos yerbais. No livro XIII dos Anais, Tzu-Lu pergunta a Gonfiicio: “Se o Duque de Wei te chamasse para admi. nistrar seu pais, qual seria a tua primeira medida? © Mestre disse: A reforma da linguagem.” Nao sabemos por onde comeca o mal, se nas palavras ou nas coi ica . As coisas se apdiam em Seus nomes ¢ vice-versa. Nietzsche inicia sua critica dos valores enfrentando as palavras: 0 que querem realmen. te dizer virtude, verdade ou justia? Ao desvendar o sig- nificado de certas palavras sagradas e imutaveis — pre- cisamente aquelas sobre as quais repousava o edificio da metafisica ocidental —, minou os fundamentos dessa metafisica. Toda critica filosdfica se inicia com uma andlise da linguagem. © equivoco de toda filosofia depende de sua fatal Sujeigao as palavras. Quase todos os filésofos afirmam que os vocdbulos so instrumentos grosseiros, incapazes de apreender a realidade. Mas € Possivel uma filoso- fia sem palavras? 8 a se p O08 : explicados, ¢ nao hé outra maneira de explicagao senfio ‘@HAGEEEE. Imaginemos, porém, o impossivel: uma fi- losofia dona de uma linguagem simbélica ou mateméti- a sem referéncia as palavras. © homem e seus proble- mas — tema essencial de toda filosofia — nao teriam lu- gar nela. Pois o homem é insepardvel das palavras. Sem clas ele € inapreensivel. O homem é um ser de palavras. E ao inverso: toda filosofia que se serve de palavras est condenada & servidio da histéria, porque as palavras, tal somo os homens, nascem ¢ morrem. Assim, num extre- ‘mo, a realidade que as palavras no podem expressar; no oo outro, a realidade do homem que s6 pode se expressar com palavras, Portanto, devemos submeter a exame as pretensdes da ciéncia da linguagem. E em primeiro lu- gar seu postulado principal: a nogéo da linguagem como objeto. Se todo objeto 6, de alguma maneira, parte do sujeito cognoscente — limite fatal do saber ao mesmo tempo que tinica possibilidade de conhecer —, 0 que dizer da linguagem? As fronteiras entre objeto e sujeito mostram- se aqui pacticularmente indecisas. °EV0PSO PSR Toda aprendizagem principia com o ensinamento dos verdadeiros nomes das coisas e termina com a revelacao da palavra-chave que nos abriré as portas do saber. Ou com a confisso de ignorancia: o siléncio. Emaindarassim Na verdade, os es- pecialistas podem isolar o idioma © converté-lo em ob- jeto. Mas trata-se de um ser artificial arrancado de seu mundo original, jé que, diversamente do que ocorre com 05 outros objetos da ciéncia, as palavras ndo vivem fora de nds. Nés somos o seu mundo e elas 0 nosso. Para | = redes de pescar palavras so feitas de palavras. Nao pretendo com isso negar o val dos estudos lingiiisti- cos. Mas as descobertas da lin; fazer esquecer suas limitag6es: idadeni jeto, um organismo ou um sistema convencional de Hos que podemos aceitar ou rejeitar. O estudo da | guagem, nesse sentido, € uma das partes de uma cia total do homenf Afirmar que a linguagem seja propriedade exclusiva homem contradiz uma crenga milenar, Recordemos como se iniciam muitas fébulas: “Quando os anin 2 falavam..." Embora pareca estranho, essa crenca foi ressuscitada pela ciéncia do século passado. No entan- to, muitos afirmam que os sistemas de comunicagao ani- mal nao sio essencialmente diversos dos usados pelo ho- mem. Para alguns sébios, nao é uma metdfora descabida falar da linguagem dos pissaros. Com efeito, nas lingua- gens nimais surgem as duas caracteristicas distintas da fala: o significado — reduzido, € certo, ao nivel mais tar e rudimentar — e a comunicagao. O grito ani. mal se refere a alco, diz algo: possui significago. E esse significado é recolhido ©, por assim dizer, compreendi- > a aoe, Esses gritos inarticulados cons- istema de signos cot igni- ficacéo. Outra nfo é a funeSo des a a O primeiro reparo que se poderia opor a essa idéia ¢ a incompardvel complexidade da fala humana; o se- gundo, a auséncia de pensamento abstrato na linguagem animal, 2 Mais decisivo me parece o que Marshall Urban chama de fun- Gio tripartida dos vocdbulos: as palavras indicam ou designam, so nomes; também sdo respostas instintivas ou espontiineas a um estimulo material ou psiquico, como no caso das interjeicées e onomatopéias; e sao represen- tages: signos e simbolos. A significagao é indicati emotiva e representativa. Em cada expresso verbal apa- recem as trés fungdes, em niveis distintos e com dife- rente intensidade. Nao hé representagdo que nao conte- nha elementos indicativos e emotivos; e 0 mesmo se deve dizer da indicagdo e da emogdo. Ainda que se trate de elementos insepardveis, a fungao simbélica é o funda- mento das outras duas. Sem representacdo nao hé indi- cacao: os sons da palavra pdo sao signos sonoros do ob- jeto a que aludem; sem eles a fungao indicativa nao po- deria se realizar: a indicagio é simbélica. Do mesmo modo, o grito ndo é somente resposta instintiva a uma situagao particular, mas indicagao dessa situagdo por meio de uma representacao: palavra, voz. Em suma, “a esséncia da linguagem é a representacdo, Darstellung, de um elemento de experiéncia por meio de outro, a re- lagGo bipolar entre o signo ou o simbolo e a coisa sig- nificada ou simbolizada, e a consciéncia dessa relacao.”* Assim caracterizada a fala humana, Marshall Urban Pergunta aos especialistas se nos gritos animais apare- cem as trés fungdes. A maior parte dos entendidos afir- ma que “a escala fonética dos macacos é inteiramente 1. Wilbur Marshall Urban, Lenguaje y realidad, Lengua y Estudios Literarios, Fondo de Cultura Econdmica, Mexico, 1952. ‘subjetiva’ e pode expressar apenas emogdes, nunca de- signar ou descrever objet mo se pode dizer de seus gestos faciais ¢ demais expressdes corporais. E ver, dade que em alguns gritos animais hd débeis indicios de indicagdo, mas em nenhum caso se comprovou a exis. téncia da fungao simbstica ou representativa. Assim, pois, entre a linguagem animal e a humana hé uma ruptura, A linguagem humana é algo de radicalmente distinto da comunicagao animal. As diferencas entre ambas sfo de ordem qualitativa e nfo quantitativa. A linguagem é algo exclusivo do homem.* As hipéteses tendentes a explicar a génese e 0 desen- volvimento da linguagem como a passagem do simples Para o complexo — por exemplo, da interjeigao, do grito, da onomatopéia as expressdes indicativas e simbélicas — Parecem igualmente desprovidas de fundamento. As lin- Suas primitivas ostentam uma grande complexidade. Em uase todos os idiomas arcaicos existem palavras que Por si mesmas constituem frases e oracdes completas. estudo das linguagens primitivas confirma o que nos re- Yela a antropologia cultural: & medida que penetramos no passado nfo encontramos, como se pensava no século XIX, sociedades mais simples, mas sim donas de uma ite complexidade. A passagem do simples Para o complexo pode ser uma constante nas ciéncias na- turais, porém nfo o € nas da cultura. Se bem que a hi- PStese da origem animal da linguagem se estilhace ante © caréter irredutivel da significagao, tem a grande ori- Sinalidade de incluir a “linguagem no campo dos movi- + Hoje eu nfo afirmaria de modo categ6ric if enti mu ‘sina Tamang GStanent Bl rptrs oe Tle tae, smbas slo parte desse universs) dn cofnicasto, presscnice ‘por { Poctas sob a forma da analogia ‘universal, que a eibernctica det mentos expressivos.”" Amemde:talat ro NORE EETEE. Gestos © movimentos possuem significacio. F nela ex . Os homens falam com as maos € com o rosto. O grito atinge a significacéo representa- tiva ¢ indicativa ao se aliar a esses gestos e movimentos. Talvez a primeira linguagem humana tenha sido a pan- tomima imitativa e mégica. Regidos pelas leis do pen- samento analégico, os movimentos corporais imitam ¢ recriam objetos e situagées. Qualquer que seja a origem da fala, os especialistas Parecem concordar quanto a “natureza primariamente mitica de todas as palavras ¢ formas de linguagem...” A ciéncia moderna confirma de maneira impressionan- te a idéia de Herder e dos romanticos alemfes: “parece indubitavel que desde o princfpio a linguagem e 0 mito permanecem numa indubitavel correlacao... Ambos sao expressdes de uma tendéncia fundamental na formacdo de simbolos: 0 principio radicalmente metaf6rico que esté no intimo de toda fungdo de simboliza guagem e Ae séncia da linguagem é simbélica porque consiste em repre- sentar um elemento da realidade por outro, como ocorre com as metéforas. A ciéncia verifica uma cren¢a comum a todos os poetas de todos os tempos: Cada palavra ou grupo de palavras é uma metéfora. E, desse modo, é um instrumento mégico, isto é, algo susceptivel de transformar em outra coisa e de transmutar aquilo em que toca: a palavra pao, tocada pela palayra sol, se torna efetivamente um astro; ¢ 0 sol, por sua vez, se torna um alimento luminoso. ANP it O homem é ho- 1 Obra citada. 2 Obra citada, 4 mem grapas & linguagem, gragas & metifora original que © fez ser outro e o separou do mundo natural ‘erum ser que se eriou ao criar me Tinguagem: Pel en a A constante produgdo de imagens e de formas verbais rit- micas € uma prova do cardter simbolizante da fala, de Sua natureza poética. A linguagem tende espontaneamen. te a se cristalizar em metéforas. Diariamente as palayras chocam-se entre si e emitem chispas metélicas ou for- mam pares fosforescentes, ® Todos os dias afloram a super- ficie do idioma palavras e frases, minando ainda umida- de e silencio por entre suas frias escamas. No mesmo ins. fante outras desaparecem. De repente, o terreno baldio de um idioma fatigado se cobre de stibitas flores ver- bais. Criaturas luminosas habitam as espessuras da fala, Criaturas sobretudo vorazes. No seio da linguagem hé uma guerra civil sem quartel. Todos contra um. Um con- tra todos. Bnorme massa sempre em movimento, oncen drandosewenrCessar"EHHE UE! Nos labios das crian- $88, dos loucos, dos sdbios, dos idiotas, dos namorados ou dos solitdrios, brotam imagens, jogos de palavras, ex- PressOes surgidas do nada. Por um instante brilham ou lampejam. Depois se apagam. Feitas de matéria infla- mada, as palavras se incendeiam mal sio rocadas pela ‘'maginacao ou pela fantasia, Mas so incapazes de con- Servar seu fogo, : P . A distingao entre 0 poe- Ma © essas expresses poéticas — inventadas ontem ou "petidas ha mais de mil anos por um povo que con- “etva intacto seu saber tradicional — radica-se no se- guinte: © poema ¢ uma tentativa de transcender 0 tdi Mapes CAPTebeOCs POLLICas, BO ConttatiV,-vivemonD m SalinGnSidnOutestihiadondonvaivémndas A fala, a linguagem social, concentra-se no poema, arti- cula-se ¢ levanta-se. Oupoemanéulinguagemmerguidam™ Assim como ninguém mais sustenta que o povo seja © autor das epopéias homéricas, tampouco ninguém pode defender a idéia do poema como uma secrecao natural da linguagem, Lautréamont quis dizer outra coisa quan- do profetizou que um dia a poesia seria feita por todos. Nada mais deslumbrante que esse programa. Mas, como corre com toda profecia revolucionéria, o advento desse estado futuro de poesia total supde um regresso ao tem- po original. Nesse caso, Ou seja: voltar & identidade entre a coisa e 0 nome. A distincia entre a palavra e 0 objeto — que & precisa- mente o que obriga cada palavra a se converter em me- téfora daquilo que designa — € conseqiiéncia de outra: mal o homem adquiriu consciéneia de si, separou-se do mundo natural e construiu outro no interior de si mesmo. A palavra nao é idéntica & realidade que nomeia porque entre © homem e as coisas — e, mais profundamente, en- tre o homem e seu ser — se interpée a consciéncia de si mesmo. A palavra é uma ponte através da qual o ho- mem tenta superar a distincia que o separa da realida- de exterior. Mas essa distancia faz parte da natureza hu- mana. Para dissolvé-la, o homem deve renunciar a sua humanidade, seja regressando ao mundo natural, seja transcendendo as limitagdes que sio impostas por sua condi¢ao, Ambas as tentagGes, latentes ao longo de toda a histéria, apresentam-se agora com maior exclusividade a0 homem moderno, Daf a poesia contempordnea se mo- “a vimentar entre dois polos: de um lado, ela é uma pro- funda afirmagao dos valores magi de outro, uma yo- casio revoluciondria, As duas diregdes expressam a re. belifio do homem contra sua prépria condicio, Assim, “mudaro homem’” quer dizer renunciar a s¢-lo: enterrar, Se Para sempre na inocéncia animal ou libertar-se do Peso da histéria, Para conseguir o segundo é necessdrio transtornar os termos da yelha relagio, de modo que nio seja a existéncia histérica que determine a conscién- la, mas o inverso. A tentativa revoluciondria se apre- Senta como uma recuperagio da consciéncia alienada e, da mesma forma, como a Conquista que essa conscién- cla recuperada faz do mundo histérico e da natureza. Senhora das leis histéricas e sociai » @ consciéncia deter- minaria a existéncia. A espécie teria dado, entéo, seu Segundo salto mortal. Gragas ao primeiro, abandonou o mundo natural, deixou de ser animal e se pés de pé: con- ‘emplou a natureza e se contemplou. Ao dar o segundo, Weressaria & unidade original, mas sem perder a cons. ciéncia, e sim fazendo desta © fundamento real da natu- reza. Embora no seja essa a tinica tentativa do homem Para recuperar a unidade perdida de consciéncia e exis- tEncia (magia, mistica, religido ¢ filosofia tém proposto © propdem outras vias), seu mérito reside em que se tra- ta de um caminho aberto a todos os homens e que se ‘puta como o fim ou o sentido da histéria. Aqui seria iieneiot Enfim, qualquer que seja nossa opinifo sobre ssa idéia, € evidente que a fusio — ou melhor, a reu- da palavra ¢ da coisa, do nome e do nomeado, exige prévia reconciliagio do homem consigo mesmo e com 0 mundo. Enquanto nfo se opera essa mudanga, 0 poema continuara sendo um dos poucos recursos do ho- mem para ir mais além de si mesmo, ao encontro do que 6 profundo ¢ original. Portanto, nio € possivel confun- dir 0 britho faiscante do poético com as empresas mais temerdrias ¢ decisivas da poesia. | ai i Sim, a lingua- & poesia e cada palavra esconde uma certa carga eect eaplodicsita top> se toca na mola seereta; a forca criadora da palavra reside, porém, no homem que a pronuncia. O homem pée em marcha a lin- guagem. A nocao de um criador, necessario antecedentc Tudo depende do jue se entende por vontade. Primeiramente devemos pais a concepgdo estatica das chamadas faculda- des, assim como abandonamos a idéia de uma alma a parte. Nao podemos falar de faculdades psiquicas — me- méria, yontade, etc. — como se fossem entidades sepa- radas ¢ independentes. . Em cada uma oe suas manifestacdes a psique se expressa de modo total. Em cada fungio esto presentes todas as outras. A actet em estados de absoluta receptividade nao imp! oA abolicdo do querer, O testemunho de San Juan de Cruz — “nada desejando” — adquire ee lor psicolégico: o proprio nada se torna at r do aa Nirvana oferece a mesma combinagiio de 45 passividade ativa, de movimento que & repouso, Os es tados de passividade — desde a experi¢ncia do vari, interior até a oposta de congestio do ser —_ exigem o exercicio de uma vontade decidida a romper a duchy dade entre objeto e sujeito. O perfeito iogue ¢ aquele que, imével, sentado em postura apropriada, “fitendo com olhar impassivel a ponta de seu natiz”, 6 tio senhor de Si que se esquece de si mesmo. Todos sabemos até que ponto é dificil rogar as mar- gens da distracdo. Essa experiéncia se confronta com as tendéncias de nossa civilizagao, que Propde como arqué. tipos humanos 0 abstraido, o retraido e até o contraido, ‘Um homem que se distrai nega 0 mundo moderno. Ao faz8-lo, joga o todo pelo todo, Intelectualmente, sua de- cisfo nfo € diferente da do suicida por sede de conhecer © que hi do outro lado da vida. O distraido se pergun- ta: da vigilia e da raza0? A dis- tracdo quer dizer: atracio pelo reverso deste mundo. A Vontade nfo desaparece; simplesmente, muda de dire- sa — em lugar de servir aos poderes analiticos, os im. Pede de que confisquem, para seus prdprios fins, a ener- Bia psiquica. A pobreza de nosso vocabulério psicolégi- ©0 € filos6fico nessa matéria contrasta com a riqueza das expressOes e imagens poéticas. Recordemos a “miisica calada” de San Juan ou o “vazio é plenitude” de Lao. SE. Os estados passives nfo so nada mais que expe- Tiéncias do sil€ncio, e o vazio nada mais é que momentos tives e plenos: do niicleo do ser jorra uma profu. imagens. “Meu coragao esté brotando flores na da noite”, diz 0 poema asteca, A paralisia vo- ataca apenas uma parte da psique. A passivi- ‘uma zona provoca a atividade de outra e torna a vit6ria da imaginacao ante as tendéncias ana- » discursivas ou racionalistas. Em nenhum caso de- By é He *T de criadora, Sem ela, as portas da iden- rece nite oon a lidade permanecem inexoravelmente tificagéio com a real fechadas. sentaizamentosdas=palayras. O poeta arranca-as de suas i ituais: do mundo in- Ses ¢ misteres habituais: separados do mundc eit da fala, os vocabulos se tornam tinicos, como acabassem de nascer. O segundo ato € o regresso da Aen: © poema se converte em objeto de participagao. i 0 poe- . spepisinion a € uma criagao original e nica, mas também ¢ leitura sores — participagao. O poeta o cria; 0 povo, a0 recité-lo, recria-o. m . Alternando-se de uma maneira que nao é inexato chamar de cfclica, sua rotagdo engendra a chispa — a poesia. 2 ) As duas operagses — separacdo © regresso — exi- gem que © poema se susiente numa linguagem comum. Nao € uma fala popular ou coloquial, como se pretende agora, mas sim a lingua de uma comunidade — cidade, nagao, classe, grupo ou scita. Os poemas homéricos fo- ram “‘compostos num dialeto literdrio e artificial que nunca foi propriamente falado” (Alfonso Reyes). Os grandes textos da literatura sdnscrita pertencem a €po- cas em que essa lingua deixara de ser falada, exceto por Btupos reduzidos. No teatro de Kalidasa os personagens nobres falam sinscrito; ou plebeus, prdcrito, Contudo, Popular ou minoritéria, a linguagem que sustenta o poe. ta possui duas caracteristicas: € viva e comum. Isto & uusada por um grupo de homens para comunicar e per. 47

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