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OFICINA DE POESIA - ALQUIMIA DA PALAVRA

Isabel Catarina
Zöllner1

Resumo
A Oficina de Poesia – Alquimia da Palavra é uma proposta de trabalho, na
disciplina de Língua Portuguesa e Literatura, para ser desenvolvida na
escola, nas séries finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. O seu
objetivo é através da poesia, como instrumento humanizador, despertar a
sensibilidade e a alteridade nos jovens que vivem numa sociedade
capitalista, marcada pelo individualismo, pela reificação do ser humano e
pelo fatalismo que os leva a pensar que não se pode fazer mais nada
neste mundo a não ser adaptar-se a ele.
A Oficina de Poesia – Alquimia da Palavra busca contribuir com a escola no
seu papel de formação, procurando sensibilizar os jovens em suas
relações consigo mesmo, com os outros seres humanos e com a natureza.

Palavras-chave: Poesia. Escola. Humanizar. Jovens.

Abstract
Oficina de Poesia – Alquimia da Palavra is a work, in Portuguese Language
and Literature, to be developed at school, in the final series in elementary
school and high school. Oficina de Poesia – Alquimia da Palavra entends to
humanize young people through poetry. Its goal is to raise awareness and
otherness in a capitalist society, marked by individualism, by the
reification of human beings and the fatalism that leads to believe that we
can not do anything else in this the world unless adapt to it. This work
1
Graduação em Letras: Português/Inglês – UFPR. Pós-Graduação: Pedagogia Religiosa
– PUC/PR e Violência Contra Criança e o Adolescente – USP. Trabalho final, Artigo
Científico, apresentado como resultado final das experiências desenvolvidas no
Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE/2007. Orientação: Profº Dr. Wilton
Fred Cardoso de Oliveira - UTFPR
wants to help young people to live better with themselves, with other
people and with nature.

Key Words: Poetry. School. To Humanize. Youth.

O século XXI se inicia marcado por profundas mudanças sociais,


políticas e econômicas. Fala-se no fim das certezas com o objetivo de
acabar com a esperança em valores universais como a libertação e a
emancipação humana. Princípios éticos, valores tradicionais, costumes e
ideais estão sendo deixados para trás. Uma indiferença generalizada e
profunda tem tomado conta de tudo. O passado e o futuro não importam
mais, é preciso apenas viver o presente da melhor maneira possível.
Promove-se um fatalismo que impõe a idéia de que não se pode
fazer mais nada nesta sociedade a não ser se adaptar a ela. Essa
sociedade capitalista, neoliberal que descarta a história e a esperança,
privilegia o capital sobre o trabalho e define de modo desigual o acesso
aos bens necessários à vida, valoriza mais o indivíduo que constrói sua
vida, seu bem-estar e o seu destino sozinho do que a comunidade dentro
da qual ele se encontra. Conforme Gilles Lipovetsky em A Era do Vazio
(LIPOVETSKY, 2005), o capitalismo atual se apropria da apatia e
individualismo e atinge uma nova fase na qual as relações de produção
são substituídas pelas relações de sedução. Esta nova fase se coloca com
valores hedonistas, permissivos, narcisistas, culto à libertação pessoal e
ao psicologismo. As pessoas querem viver o momento atual, se divertir e
se conservar jovens. Os antigos não são mais respeitados pela sua
sabedoria, seriedade, fragilidade, mas somente se permanecerem jovens
de espírito e de corpo.
Aliado ao capitalismo, o neoliberalismo se assenta em princípios de
desestatização, desregulamentação, desuniversalização e com isso tem

2
conseguido gerar desigualdades, desemprego, e sua funesta ideologia de
que não existem alternativas e que é preciso a adaptação de todos.
O cenário mundial, além de estar marcado por todo esse contexto,
caracteriza-se também pela era da globalização, esse processo de
integração da economia e do mercado, da rapidez e eficácia da
informação e da comunicação. As inovações se propagam entre países e
continentes, tornando possível o acesso fácil e rápido à informação e aos
bens. Com a ressalva de que para as classes menos favorecidas
economicamente, esse acesso não existe. Para a UNESCO

“a globalização representa hoje um novo desdobramento


do capitalismo caracterizado pela acumulada concentração
da riqueza, alimentada pelo crescimento econômico com
altos custos sociais, culturais e ambientais e pela
incrementação da ciência e tecnologia, que provocam
extrema rapidez na produção das áreas de computação e
produção científica mas que não amenizam a miséria, ao
contrário, acentuam-na.” (UNESCO -1997)

Neste contexto de globalização, capitalismo, neoliberalismo, a


escola pública se perde cada vez mais. Os jovens não se interessam, pois
a escola não parece fazer sentido diante deste mundo. Alain Finkielkraut,
em A derrota do pensamento, define a escola como
“a última exceção do self-
service generalizado. O equívoco que separa essa
instituição de seus usuários vem crescendo: a escola é
moderna, os alunos são pós-modernos; ela tem por objetivo
formar os espíritos, eles lhe opõem a atenção flutuante do
jovem telespectador; (...)
(FINKIELKRAUT,
1976,P.148)

Hoje o discurso do professor está banalizado, seu prestígio e


autoridade desapareceram. A escola também está tomada pela apatia,
pela falta de interesse. Os jovens não têm motivação, estão apenas
preocupados com a moda, em divertir-se, em distrair-se e também não

3
têm limites. Quando os pais são chamados à escola eles mesmos
reconhecem que não sabem educar seus filhos.
A escola está perdendo seu projeto de formação, contudo sua
incumbência continua ainda a de sensibilizar os jovens para com suas
relações consigo mesmos, com os outros seres humanos e com a
natureza. Por isso, é imprescindível que a escola se transforme num
ambiente, democrático, justo, respeitoso, solidário e que possa ajudar os
jovens a se constituírem como seres humanos, não apenas ensinando
conteúdos, mas também educando, envolvendo os jovens como um todo,
no seu aspecto racional, ético e estético. Diante desta realidade e dos
desafios apresentados em especial para a educação se torna urgente
recuperar o princípio da alteridade. A palavra alteridade, que possui o
prefixo alter (outro) do latim significa “colocar-se no lugar do outro na
relação interpessoal, com consideração, identificação e dialogar com o
outro. Alteridade é, portanto a capacidade de conviver com o diferente.
Significa que eu reconheço o outro em mim mesmo, como sujeito aos
mesmos direitos que eu, de iguais direitos para todos, o que gera também
deveres e responsabilidades.” 2

A escola precisa ensinar ou despertar a alteridade para que os


jovens possam eliminar de suas vidas a xenofobia, o racismo, os
preconceitos de gênero, de idades e de classes sociais e se tornem
realmente cidadãos conscientes do outro e do meio em que vivem.
É nesse contexto que A Oficina de Poesia – Alquimia da Palavra se
propõe a trabalhar a poesia como instrumento humanizador, que busca
despertar a capacidade de alteridade entre os jovens e dessa forma
recuperar a esperança num mundo melhor. As atividades desenvolvidas
para serem trabalhadas na oficina são destinadas a alunos de 8ª série e
Ensino Médio, podendo ser adaptadas para demais séries do Ensino
Fundamental.

2
SILVA, Maurício da. Alteridade e Cidadania. Disponível na internet em:
http://www.evirt.com.br/colunistas/mauricio08.htm

4
A função da arte
O objetivo de trabalhar a poesia despertando a capacidade de
alteridade entre os jovens nos leva primeiramente a pensar na função da
arte. A obra de arte desperta prazer, transmite conhecimento e aprimora
a sensibilidade, produzindo uma condição melhor do homem em relação a
si mesmo, ao próximo, ao mundo e à vida.
A arte de nossa época é a música, a novela, a história em
quadrinhos, o cinema. É produzida em massa para um público eclético e
visa ao amplo consumo. Esta arte trata apenas de temas convencionais
como amor, sexo, violência. Não faz questionamentos, repete o que a
sociedade exige, conseqüentemente ela acaba desempenhando uma
função ideológica, pois transfere para o povo conceitos eternos e
indiscutíveis das classes dominantes. Essa arte acaba por se tornar em
mercadoria, e assim ela se define como produto da sociedade capitalista,
na qual tudo se transforma em mercadoria.
Pedro Lyra, em seu livro, Utiludismo, a Socialidade da Arte, reflete
sobre a participação da arte no processo de transformação da sociedade.
Segundo ele

[...] deve ou não deve a arte participar (e não se quer que


ela resolva) no processo de transformação de uma
sociedade tão desfigurada como a nossa? A humanização
dessa sociedade não mereceria, por acaso, o “sacrifício”
temporário da arte, em colocar-se também ela, como arma
de combate, quando sabemos que o poder dessa arma
haveria de contribuir – e quanto contribuiria! – nesse
processo de humanização?[...}
(LYRA, 1976. p.50)

Nesse mesmo livro, Pedro Lyra, solicita uma educação estética da


humanidade, uma educação que mostre às crianças que o próximo não é
um concorrente, mas um companheiro. E sendo a arte, a mais perfeita
forma de socialização do ser humano, ela é convidada a realizar a re-
humanização (LYRA, 1976, P. 112).

5
Antonio Candidos3, em A literatura e a formação do homem,
apresenta a função humanizadora da literatura e sua capacidade de
confirmar a humanidade do homem. Para ele a literatura exprime o
homem e atua sobre sua formação. Ele identifica três funções exercidas
pela literatura. A primeira função é a psicológica ligada à capacidade e
necessidade do homem de fantasiar. A segunda é a formadora que liga as
fantasias expressas pela literatura ao real. E a terceira função diz respeito
à identificação do leitor e de seu mundo representados na obra literária, é
a função social. Antônio Candido diz também que as camadas profundas
da nossa personalidade podem sofrer um bombardeio poderoso das obras
que lemos e que atuam de maneira que não podemos imaginar.
Para além dessas funções da literatura, a obra de arte para se
afirmar precisa encontrar ressonância na sensibilidade ou no
conhecimento do homem. Pedro Lyra, em seu livro, já citado, Utiludismo:
A socialidade da Arte, afirma que:
Isso se vê claramente nesta confissão de um leitor de
George Simenon: “O senhor é uma pessoa que me
compreende. Encontrei-me tantas vezes em suas novelas!”
Não há dúvida: esta obra despertou um prazer e/ou
transmitiu um conhecimento, a partir da comunicação
estabelecida com este leitor, através do meio próprio da
arte em questão (língua e livro, no exemplo), produzindo
uma melhoria na colocação deste homem diante de si
mesmo e do próximo, do mundo e da vida. (LYRA,1976, p.
34 e 35)

É justamente neste contexto “pós-moderno” em que a tecnologia de


comunicação e informação transita num mundo individualista,
demagógico, violento, que valoriza o mercado das imagens, é que a
literatura, e de modo mais específico, a poesia precisa assumir sua função
de humanizar. Ler poesia nos ensina a olhar além do que se vê. A poesia
amplia os limites da experiência humana. O poeta que está atento às
coisas de seu tempo, intervém na realidade, e usando a palavra ele nos
passa uma visão sobre o mundo que nos cerca e nos faz pensar no que é
3
Vide: CANDIDO, A. A literatura e a formação do homem , Ciência e Cultura, 1972.

6
viver neste lugar e nesta hora. Fernando Pessoa, o eterno poeta, em O
pensamento vivo de Fernando Pessoa, faz uma interessante reflexão
sobre a finalidade da arte:
A finalidade da arte não é agradar. O prazer é um meio e
não um fim. A finalidade da arte é elevar. O fim da arte
inferior é agradar, o fim da arte média é elevar e o fim da
arte superior é libertar, mas para libertar tem também que
agradar e elevar tanto quanto possa ser [...].
( FONSECA e BRUNO, 1986 p.87)

Da mesma forma, acreditando na força que a poesia tem de


humanizar, Alfredo Bosi, em O ser e o tempo da poesia, ao analisar as
relações do poema com os tempos da sociedade, afirma que
a poesia aparece, ao longo da obra, não como um objeto
fabricado pelas combinações da langue, seu suporte, ou
por uma onipotente máquina ideológica, mas como um
processo singular e inventivo de significação que em vez
de ópio de literatos alienados, almejava e às vezes
consegue ser “a alma de um mundo sem alma”. (BOSI,
2000)

Os jovens não gostam de ler e quando lêem estão acostumados a


textos objetivos, de jornais, revistas, livros didáticos, internet, mangás e
ao se depararem com textos subjetivos, com imagens, idéias que não são
didáticas sentem muita dificuldade. Por isso, trabalhar a leitura e escrita
de poemas na escola é um grande desafio. A opção por desenvolver este
trabalho através de oficina se dá devido à possibilidade de se criar um
ambiente diferente do dia-a-dia, um ambiente mais integrado, mágico,
harmonioso, propício à criatividade, diferente da sala de aula tradicional.
A oficina é um lugar em que acontecem transformações. Nela se exerce
um ofício e trabalham os aprendizes de um ofício ou arte. Um ambiente
destinado ao ensino e aprendizagem. Na oficina de poesia, o jovem verá o
poema em sua interioridade, como é feito e como funciona;
diferentemente do que acontece na aula tradicional de literatura. Nesta
costuma- se ver a poesia de fora: as grandes obras poéticas, as diferentes
tendências literárias e o contexto histórico.

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O título escolhido para o trabalho Oficina de Poesia – Alquimia da
Palavra tem por intenção resgatar o significado da alquimia que está em
consonância com a poesia, quando pensamos na sua função de lidar com
o simbólico, por ser uma metáfora ao trabalho espiritual, à libertação da
alma de seu aprisionamento da matéria, à transformação de si próprio de
um estado inferior para um estado superior, mais humanizado.
“Alquimia é uma tradição antiga que combina elementos de
química, física, astrologia, arte, metalurgia, medicina, misticismo e
religião. Existem alguns objetivos principais na sua prática: a
transmutação dos metais inferiores em ouro, a obtenção do Elixir da
Longa Vida, um remédio que curaria todas as doenças e daria vida eterna
àqueles que o ingerisse. Obter a Pedra Filosofal, uma substância mítica
que amplia os poderes do alquimista, e finalmente criar vida humana
artificial.”4Como ciência oculta, a alquimia revestia-se de um aspecto
desconhecido, oculto, místico e mítico. Seus textos estavam mais
interessados em esconder do que revelar. Hoje num mundo tomado pelo
culto ao dinheiro, à aparência, a alquimia é uma arte filosófica, na qual o
homem busca a si próprio ao seu íntimo e vê o universo de uma outra
forma, encontrando nele seu aspecto espiritual e superior.
Somente a capacidade imaginativa e lírica do poeta pode
transformar a palavra literal em metafórica. Não seria este um
procedimento alquímico? Desta forma, a Oficina de Poesia – Alquimia da
Palavra - propõe um processo de torcer, reinventar, diferenciar, manusear,
desconstruir, buscar a intimidade com as palavras para que a linguagem
expresse os sentimentos mais profundos, expanda a imaginação,
sensibilize, desenvolva o princípio da alteridade, ou seja, humanize o
leitor.
Os autores escolhidos para serem trabalhados na oficina de poesia
são poetas da língua portuguesa que podem ser lidos com os olhos de
hoje e que outros os lerão com os olhos de amanhã, isto é, aqueles que se
4
Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Alquimia

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eternizaram e se universalizaram, além de poetas paranaenses cânones
da nossa literatura local, como também novos poetas que surgem e que
podem contribuir através de sua poesia para a humanização dos nossos
jovens. Aqui nomeamos alguns: Fernando Pessoa, Bocage, Luís Vaz de
Camões, Agostinho Neto, Alda Espírito Santo, Hilda Hilst, Florbela
Espanca, Manuel Bandeira, Mario de Andrade, Carlos Drummond de
Andrade, João Cabral de Mello Neto, Thiago de Mello, Ferreira Gullar, Mario
Quintana, Cecília Meireles, Adélia Prado, Cora Coralina, Patativa do Assaré,
Augusto dos Anjos, Cassiano Ricardo, e os paranaenses Paulo Leminski,
Helena Kolody, Alice Ruiz e Dalton Gandin.
As propostas de trabalho para a Oficina de Poesia – Alquimia da
Palavra estão reunidas no Caderno Pedagógico – Estudos Literários,
material pedagógico, PDE 2007, no último capítulo. O material contém 90
poesias separadas em nove temas: auto-retrato, social, morte,
metapoesia, mulher, vida, esperança, liberdade e a última parte é
destinada a uma oficina específica de Hai-Kai. O caderno apresenta
sugestões de atividades para a oficina sobre os temas auto-retrato e
social. Os modelos são possibilidades que podem ser melhoradas e
adaptadas a níveis de ensino diversos. A oficina de Hai-Kai foi integrada
ao caderno já que há grande interesse de crianças, jovens e adultos nessa
poesia mínima. Além disso, quem entende e participa do Hai-Kai
desenvolve sua concentração, escrita, comunicação, relacionamentos,
intuição, autoconhecimento, meditação, expressão e gosto estético. São
sugeridas algumas atividades para se desenvolver na oficina e cinqüenta
e oito Hai- Kais de poetas paranaenses.
Com o tema auto-retrato, que é primeiro do caderno, foram
escolhidos os seguintes poemas: Retrato de Cecília Meireles, O Auto-
Retrato de Mário Quintana, Soneto de Bocage, Auto-Retrato de Manuel
Bandeira, um pequeno poema de Alice Ruiz, Traduzir-se de Ferreira Gullar,
Soneto de Hilda Hilst, Ópera Fantasma de Paulo Leminski, Eu Sou
Trezentos de Mario de Andrade e um pequeno poema de Helena Kolody.

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Foram sugeridas atividades com os poemas de Cecília Meireles,
Mário Quintana e Bocage. A primeira sugestão é que o ambiente da sala-
de-aula seja modificado. A sala de aula deve se transformar numa oficina,
organizando mesas para trabalho coletivo, ambiente decorado, colorido,
fotos de poetas e poemas decorando as paredes, música, se for possível
uso de outros recursos como power-point, TV-Pen Drive, DVD, e outros. Em
seguida, o professor deve distribuir uma cópia do poema para cada aluno.
Solicitar que façam a leitura. Um aluno pode declamar o poema para a
turma. Depois de lido, o professor pergunta aos alunos o que eles
sentiram ao ler o poema. O professor anota no quadro os sentimentos que
surgirem e pergunta quais palavras do poema revelaram estes
sentimentos. O professor chama a atenção para os substantivos e
adjetivos que ressaltam as características físicas e emocionais e como são
as características emocionais que se sobressaem no poema e que
revelam a desesperança, a introspecção e o pessimismo.
Sugere-se que a vida, obra e características de Cecília Meireles
sejam apresentadas para o aluno, utilizando a TV Pen Drive ou outro
recurso.
Após apresentação da poetiza, o professor retorna ao poema e
solicita que os alunos, em pequenos grupos, reflitam e escrevam sobre as
seguintes questões: a) Qual o perfil da personagem/poeta? b) Será que
era a própria Cecília Meireles? c) Que idade teria? d)O que teria
acontecido em sua vida para ficar assim?
Na medida em que ouve as respostas dos alunos, o professor vai
construindo coletivamente uma análise mais profunda do poema,
considerando aspectos formais, vocabulário, categorias gramaticais,
sentido conotativo e denotativo, figuras de linguagem, ritmo, rimas, o
“eu-lírico”.
Para finalizar o professor pede que cada aluno pense numa palavra
que o defina, que fosse a mais importante de seu auto-retrato. As

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palavras escolhidas devem ser guardadas para que na seqüência das
atividades façam parte da composição do mural do auto-retrato da turma.
Dessa mesma forma, foram sugeridas atividades com outros poetas
e seus poemas. No final de cada uma delas os alunos deverão produzir
um texto, um desenho, um painel, um varal de poesia que serão expostos
na sala-de-aula, na escola, num sarau de declamação de poesia, no jornal
da escola ou do bairro. O importante é que o aluno descubra que a poesia
não é um bicho-de-sete-cabeças; pelo contrário, também pode dar prazer
à mente e ao espírito e nos ensinar mais sobre nós mesmos e as outras
pessoas.

Considerações Finais:
As atividades da Oficina de Poesia foram realizadas com turmas de
terceiro ano, do Ensino Médio, com turmas de 5ª a 8ª do ensino
fundamental. A Oficina também foi realizada com uma turma de
professores das escolas públicas do Estado do Paraná.
O trabalho desenvolvido com as turmas de terceiro ano revelou
resultados interessantes e diversos. Trabalhar a poesia como instrumento
humanizador, a fim de despertar a capacidade de alteridade entre os
jovens foi um objetivo bastante desafiador. Os jovens trazem preconceitos
que têm em relação à poesia. “ Não é coisa para homem, “A gente lê, lê e
não entende nada!”, “Pra que serve poesia?”, são alguns dos
questionamentos comuns na escola. A melhor forma de se responder a
esses questionamentos é, justamente, trabalhar a oficina na sala-de-
aula. À medida que os jovens vão lendo os poemas, desvendando
significados, conhecendo poetas, percebendo melodia, reconhecendo
sentimentos, vão se deixando tomar pela beleza, pela emoção”.
As atividades na oficina são quase todas desenvolvidas em
pequenos grupos. Os trabalhos finais da turma são apresentados todos
juntos. Portanto, o trabalho coletivo muito é valorizado, Conversar, aceitar

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ou não o que o pensamento do colega, escrever junto, são exercícios de
tolerância, de companheirismo, aceitação do outro.
A Oficina de Hai-Kais teve a participação do poeta e professor
Dalton Gandin que contribuiu de forma especial fazendo o debate sobre o
processo de inspiração e construção do poema, sobre a importância da
poesia na vida. Os jovens participaram ativamente fazendo diversas
perguntas, querendo saber mais sobre seus poemas, sua vida. Conhecer
um poeta foi uma experiência bastante interessante para muitos, desfez
um pouco dos preconceitos de que fazer poesia é para os imortais.
No trabalho com Oficina de Hai-Kais, foi apresentada também de
forma especial a vida e obra da paranaense Helena Kolody. O alunos
assistiram ao filme Helena de Curitiba que em algumas partes mostrava
Helena Kolody já bem idosa, no final de sua vida, declamando seus
poemas. A imagem do idoso causou desconforto entre os jovens,
provocando comentários que revelavam muito preconceito. A leitura de
seus hai-kais e a transformação dos mesmos em imagens foi fundamental
para que se refletisse sobre a velhice, sobre a sabedoria e a experiência
do idoso e de sua participação na sociedade.
A realização da Oficina de Hai-Kais foi muito positiva, pois além de
trazer um poeta para a sala-de-aula apresentou poetas paranaenses
como Paulo Leminski e Alice Ruiz que surpreenderam os jovens com sua
irreverência. Muitos se identificaram com sua posições questionadoras e
ousadas diante da vida.
O tema social, no qual se trabalhou com os poemas A Flor e Náusea
de Carlos Drummond de Andrade, O Bicho de Manuel Bandeira e
Pirâmide do Poder de Dalton Luiz Gandin, foi também importante para se
chegar a uma conclusão quanto à capacidade da poesia humanizar os
jovens.
A visão fatalista dos jovens é muito forte. Há uma naturalização da
sociedade. A vida é assim, sempre foi assim e não tem como mudar. E
contra esta ideologia trabalhar com poemas é uma boa arma. Para esses

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poetas sua função vai além de cumprir uma tarefa literária, mas também
questionar a realidade e profetizar mudanças.
Há uma possibilidade de mudança para a sociedade capitalista e
desumana que se apresenta no poema de Drummond, a flor que nasceu
no asfalto indica o desabrochar de uma nova realidade, tão esperada pelo
poeta.
O poema de Manuel Bandeira, O Bicho, repleto de melancolia e
crítica, remete ao gravíssimo problema da fome, também tantas vezes
justificada como um fenômeno natural e inevitável. Uma das atividades
realizadas neste tema é a leitura de alguns textos de Josué de Castro
sobre as causas e conseqüências da fome.
O terceiro poema trabalhado é Pirâmide do Poder, de Dalton Luiz
Gandin. Esse poema pertence à categoria da poesia concreta. O poema é
objeto e imagem e contém estruturas próprias e visuais, com formas de
geometrização, muito diferente da poesia tradicional. O poema nos
remete a sociedade dividida em classes sociais, à extrema desigualdade
social.
O trabalho na oficina com esses três poemas tinham como objetivo
levar ao discente o conhecimento de como o poema é feito, possibilitar
uma análise para além do senso comum e despertar sua consciência para
além de si mesmo.
Nem todos alunos se sensibilizam com o tema social, alguns estão
tão apáticos que se negam a fazer as atividades ou as fazem de qualquer
jeito, sem compromisso algum. Essa dificuldade se contrapõe ao projeto
da escola pública que pretende formar cidadãos críticos e conscientes.
O trabalho com o tema auto-retrato foi mais fácil de ser realizado.
Segundo relato de docentes que aplicaram a oficina em turmas de 5ª e 6ª
série, os alunos participaram com bastante entusiasmo, produziram
textos, imagens, painéis. Para os adolescentes dessas séries, falar de si
mesmos não parece ser tão difícil. Eles também demonstraram ter menos

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preconceitos com a poesia e apresentam-se mais motivados que os
jovens das séries finais.
Enfim, vivemos um tempo de alienação, de crise de identidade, de
desconstrução da cultura, de manipulação da mídia, que contribui para
que nossos jovens sejam indiferentes, excessivamente individualistas,
não se preocupem com o futuro ou passado e, por isso, o trabalho com a
poesia na escola se torna ainda mais importante em virtude de despertar
o princípio da alteridade e humanizar. Mesmo enfrentando dificuldades
como a falta de interesse e envolvimento da direção e da equipe
pedagógica da escola, com certa resistência, por parte dos jovens,
percebeu-se que a poesia tem como formar o educando e torná-lo
solidário com seus pares. Não foi possível medir o quanto a Oficina de
Poesia – Alquimia da Palavra humanizou, mas é certo que se o trabalho
com a poesia for levado adiante, em outras etapas da vida escolar desses
jovens, poderá contribuir ainda mais para sua formação humana.

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