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A HISTÓRIA DA UMBANDA (A Religião das Mutações Brasileiras)

PARTE 1 - O CABOCLO DAS 7 ENCRUZILHADAS


"Lá vem , lá vem , bem longe na estrada, lá vem, lá vem, o Caboclo das Sete
Encruzilhadas "
A Umbanda não é uma religião. É a Manifestação do Espírito (Entidade), nas palavras do
Caboclo de Zélio Fernandino de Moraes, para a caridade.
E em outras manifestações, para trabalhar em prol da sua comunidade.
Não existe uma codificação de Umbanda, assim como não existe uma bíblia de Umbanda,
não existe UMA Umbanda e sim Manifestações mediúnicas correlatas e parecidas em
diferentes casas, tradições, raízes e linhas de trabalho. A Pluralidade desta religião é
realmente fantástica. Vou entrar, à partir do capítulo 2 desta série, mais a fundo no
significado de tudo isso, mas antes é preciso esclarecer uma coisa.
A história do Caboclo das Sete Encruzilhadas é uma prova da constante mutação que
sofre a Umbanda.
Veremos porquê.
A Ilha de Marajó é o ponto central da foz do rio Amazonas no arquipélago do Marajó, no
Pará. É a maior ilha do Brasil e também a maior ilha fluvial marítima do mundo, palco da
mais famosa Pororoca do mundo, fenômeno de formação de ondas gigantescas no
encontro das águas. Há indícios de que dois anos antes da chegados nos Portugueses ao
Brasil a ilha foi visitada pelos Europeus. Porém, o cartógrafo e navegador Duarte Pacheco
Pereira afirmou, no Tratado de Tordesilhas, que pisava em território espanhol. Em suas
crônicas de viagem, Vicente Yañes Pinzon e Américo Vespúcio fazem referência à Ilha,
respectivamente, em 1499 e 1500, comentando a hostilidade dos índios Aruãs. A ilha era
habitada por diferentes tribos de índios, entre eles os Aruãs e os Caraíbas, que viviam em
guerra até os Caraíbas expulsarem definitivamente os Aruãs de lá. Os portugueses a
chamavam de Ilha dos Nheengaíbas por causa das diferentes línguas indígenas que se
falava por lá, e foi justamente uma das tribos que habitava o sul da ilha que inspirou o
nome atual Marajó. Os Marajoaras.
Segundo o dicionário Aurélio, Marajó significa “vento que sopra pela tarde sobre a baía do
Guajará”. Eles praticavam uma arte cerâmica e destes potes de cerâmica faziam urnas
funerárias para guardar os seus mortos, era tradição que não podia ser quebrada.
Acontece que essa tradição foi quebrada um dia.
Os piratas começaram a invadir a Ilha de Marajó. Piratas Europeus invadiam as tribos,
faziam barbaridades com as mulheres, e toda esquadra, na época, tinha um Capelão.
Certa vez houve uma Grande Caçada Marajó, os guerreiros e os jovens aprendizes saíram
para essa Grande Caçada, ficando nas aldeias apenas as mulheres e os velhos, como era
tradição dos Marajoaras. Os piratas chegaram na Ilha e invadiram as tribos dos
Marajoaras, chacinando os velhos e estuprando as mulheres, que também foram mortas.
O Capelão dos piratas realizou um rito funerário e foram espalhadas pela Ilha de Marajó
Sete Grandes Cruzes marcando sete conjuntos de covas. Isso destruiu a cultura
cerimonial das urnas funerárias.
Não morreram todos que estavam nas tribos, é claro, porém uma grande tristeza se
abateu e os guerreiros e jovens aprendizes se vingaram, muitos morreram nas lutas.
No fim dos conflitos os índios resolveram sair da ilha, fugiram, alegando medo de que
possíveis futuros ataques viessem a acontecer. Porem, entre todos os guerreiros, havia
um bravo índio que disse que não ia embora e que ficaria responsável por guardar os seus
ancestrais e aquelas sete cruzes que marcavam o local de seus enterros. Ele ficou só, o
último daquelas tribos, daquele povo, se tornando o responsável pelos ritos funerários que
seriam necessários para os seus ancestrais descansarem. Com os ritos realizados o índio
Encantou na natureza, se tornando o Guardião das Sete Cruzes Ilhadas.
Vamos falar mais da Ilha dos Marajós...
A Jurema Sagrada, da qual o Catimbó é uma ramificação mais católica do que o culto
original, é o resquício da religião dos índios de Nossa Terra. Uma religião que cultua os
Ancestrais nas árvores, em especial a Jurema.
Ela se divide em 12 Reinos e cada Reino está no plano astral espalhado pelo Brasil
(com exceção do Reino das Sete Covas de Salomão, que é bem mais antigo do que
tudo isso). E o Maior Reino Encantado da Jurema em extensão por abarcar uma maior
área no Brasil é o Reino das Águas Claras, ou popularmente conhecido como Reino do
Rio Verde. É o Reino das Águas (doces ou salgadas) do Brasil, Reino da Cabocla
conhecida como Rainha Aurora e do seu filho, O Príncipe das Águas Claras, ou
simplesmente Caboclo Rio Verde, que é um Pajé. O portal dimensional para este Reino
está na Ilha de Marajó. E é a ilha, no plano espiritual, o próprio castelo dos Príncipes e
Princesas das Águas Claras. Aqui nós encontramos Caboclo Lírico, O Boto, Caboclo
Velho, Velha Tapuia, Caboclo Cipó, Caboclo Caçador e Cobra Coral.
Quando o índio guerreiro ficou na ilha para guardar o túmulo de seus Ancestrais e as sete
cruzes ele realizou rituais fúnebres que o colocaram em contato com Rio Verde (Águas
Claras) e ele mesmo se Encantou nesse Reino. Se tornou uma Entidade, o Guardião das
Sete Cruzes Ilhadas é um Caboclo da Jurema Sagrada, do Reino das Águas Claras,
guardião dos portais na ilha, que levam ao Reino da Rainha Aurora.
Essa é a origem da Entidade. Com o tempo os cultos cariocas da Macumba na Pequena
África foram recebendo os imigrantes Nordestinos da Jurema e do Catimbó. Foi quando, e
só à partir daí, que os Caboclos foram inseridos no culto no contexto de hoje em dia, o
contexto católico cristão. E o Caboclo das Sete Cruzes Ilhadas foi sendo assimilado e seu
nome foi passando por transformações. Tais transformações se confundiam porque já
existia o culto da Kimbanda e um dos Reis da Kimbanda é o Rei das Sete Encruzilhadas,
que é uma outra coisa totalmente diferente do Guardião dos Portais místicos da Ilha de
Marajó.
Nesse ponto o povo cultua o Caboclo como Sete Encruzilhadas, também, juntando tudo
em um culto só, porque na época a Macumba Urbana era um caldeirão que se
preocupava, à partir da linguagem que era universalmente o Yorubá, unir todos os povos
de diferentes manifestações culturais em uma só identidade, nova e reafirmada. Porque
existia um senso de identificação que os povos abandonados pelas classes industriais
dominantes no Brasil queriam desenvolver.
E nesse contexto muita coisa foi reassimilada, nascendo assim um novo personagem, o
Caboclo das Sete Cruzes Ilhadas já não era mais visto nos terreiros da Pequena África,
agora se fazia presente nas manifestações apenas o Caboclo das Sete Encruzilhadas,
uma corruptela. Com o desenvolvimento desses estudos o leitor vai perceber que,
impressionantemente, muito que acontece hoje é fruto, em nossas religiões, sim de
corruptelas passadas de boca em boca, de geração em geração, inclusive o próprio nome
da Umbanda.
Falaremos a seguir de como o Caboclo foi transformado em um Padre Católico,
precisamente um jesuíta Gabriel Malagrida...

Historia do culto brasileiro

Por volta de 1907[16] /1908 (15 de novembro de 1908)[17] , as fontes divergem quanto a
data precisa, um jovem chamado Zélio Fernandino de Morais, prestes a ingressar
naMarinha, passou a apresentar comportamento estranho que a família chamou de
"ataques". O jovem tinha a postura de um velho dizendo coisas incompreensíveis, em
outros momentos se comportava como um felino.[18] Após ter sido examinado por um
médico, este aconselhou a família a levá-lo a um padre, mas Zélio foi levado à um centro
espírita. Assim, no dia 15 de novembro, Zélio foi convidado a se sentar à mesa da sessão
na Federação Espírita de Niterói,[19] [20] presidida na época por José de Souza[21] .

Incorporou um espírito, se levantou durante a sessão e foi até o jardim para buscar uma
flor e colocá-la no centro da mesa, contrariando a regra de não poder abandonar a mesa
uma vez iniciada a sessão. Em seguida, Zélio incorporou espíritos que se apresentavam
como negros escravos e índios. O diretor dos trabalhos alertou os espíritos sobre seu
atraso espiritual, convidando-os a sair da sessão quando uma força tomou conta de Zélio e
disse:[22]

Por que repelem a presença desses espíritos, se nem sequer


se dignaram a ouvir suas mensagens? Será por causa de suas
— Caboclo das Sete
origens sociais e da cor?
Encruzilhadas

Ao ser indagado por um medium ele respondeu:[23]


Se querem um nome, que seja este: sou o Caboclo das Sete
Encruzilhadas, porque para mim não haverá caminhos fechados. O
que você vê em mim são restos de uma existência anterior. Fui
padre e o meu nome era Gabriel Malagrida.[24] Acusado
de bruxaria, fui sacrificado na fogueira da Inquisiçãoem Lisboa, no — Caboclo das
ano de 1761. Mas em minha última existência física, Deus Sete

concedeu-me o privilégio de nascer como Caboclo brasileiro. Encruzilhadas

A respeito de sua missão, assim anunciou:[25] [26]

Se julgam atrasados esses espíritos dos negros e dos índios, devo


dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho para dar início a
um culto em que esses negros e esses índios poderão dar a sua
mensagem e assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes
confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a
igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e
desencarnados. E se querem o meu nome, que seja este: Caboclo — Caboclo das
das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminho fechado para Sete

mim. Encruzilhadas

No dia seguinte, na residência da família de Zélio, na rua Floriano Peixoto, no. 30, em
Neves. Reuniu-se os membros da Federação Espírita, visando comprovar a veracidade do
que havia sido declarado[27] pelo jovem. Novamente incorporou o Caboclo das Sete
Encruzilhadas, que declarou que os velhos espíritos de negros escravos e índios de nossa
terra poderiam trabalhar em auxílio do seus irmãos encarnados, não importando a cor,
raça ou posição social.[28] Assim, neste dia fundou o primeiro terreiro de umbanda
chamado de Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade.[29]

O espírito estabeleceu normas como a prática de caridade, cuja base se fundamentaria no


Evangelho de Cristo e seu nome "Allabanda",[30] substituído por "Aumbanda", e
posteriormente se popularizando como "Umbanda".[27]

No ano de 1918, fundaram-se sete tendas para a propagação da Umbanda: Tenda Espírita
Nossa Senhora da Guia, Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, Tenda Espírita
Santa Bárbara, Tenda Espírita São Pedro, Tenda Espírita Oxalá, Tenda Espírita São Jorge
e Tenda Espírita São Gerônimo. Até a morte de Zélio em 1975, mais de 10.000 templos
foram fundados além destes iniciais.[31]

Em 1939 com o objetivo de acabar com polêmicas e na tentativa de uma unificação foi
criada a União Espírita de Umbanda do Brasil.[32] A partir desse momento, somente as
práticas que seguiam os fundamentos propostos pelo Caboclo Sete Encruzilhadas
passaram a ser consideradas como umbandistas.[33]
Em 1940, o escritor Woodrow Wilson da Matta e Silva apresentou a Umbanda como
ciência e filosofia, criando então a Escola Iniciática da Corrente Astral do Aumbhandan, a
"Umbanda Esotérica" na Tenda Umbandista Oriental, em Itacuruçá, no Rio de Janeiro.[34]

Mesmo após as tentativas de unificação, nas décadas de 40, 50 e 60 ainda existiam


inúmeros terreiros no Rio de Janeiro não vinculados à União Espírita de Umbanda do
Brasil principalmente por discordarem das normativas propostas pela federação e por
serem consideradas "atividades isoladas". Esses terreiros realizavam práticas ritualistas
sob a denominação de Umbanda, por exemplo a Tenda Espírita Fé, Esperança e Caridade
e Pai Luiz D'Ângelo, praticante do segmento Umbanda de Almas e Angola.[35]

Em 1941 a UEUB organizou sua primeira conferência, o I Congresso Brasileiro de


Espiritismo de Umbanda[36] como forma de tentar definir e codificar a Umbanda como
como uma religião por seu direito e como uma religião que une todas as religiões, raças e
nacionalidades. A conferência também promoveu uma dissociação das tradições afro-
brasileira.[37] Os participantes concordaram em fazer uso das obras de Allan Kardec como
fundação doutrinária da Umbanda, enquanto se dissociando das outras tradições
religiosas afro-brasileiras.[38] Ainda assim, os espíritos fundadores da Umbanda, os
Caboclos e os Preto Velhos ainda foram mantidos como como espíritos altamente
evoluídos.

Em termos gerais, os participantes do Congresso se esforçaram em legitimar a Umbanda


como uma religião altamente evoluída, por exemplo, afirmando que a Umbanda já existia
como uma religião organizada há bilhões de anos estando então a frente de todas as
outras religiões. Como parte desses esforços em definir a Umbanda como uma religião
original e altamente evoluída, os participantes procuraram remover suas raízes africanas e
afro-brasileiras, a origem da Umbanda foi rastreada até o Oriente, de onde disse ter se
espalhado para Lemuria[39] e subsequentemente para a África.

No continente africano, a Umbanda se degenerou em fetichismo[38] e nessa forma foi


trazida ao Brasil pelos escravos.[40] A influência africana na Umbanda não foi de todo
rejeitada mas causada por uma corrupção da tradição religiosa original, como uma fase de
retrocesso em sua evolução; a Umbanda foi exposta ao barbarismo na forma de costumes
vulgares e praticada por pessoas com "costumes rudes e defeitos psicológicos e
étnicos"[41] Outra forma de lidar com o caráter africano da Umbanda foi exposto na
compreensão que se originou na África porém na África Oriental (Egito), sendo então da
parte mais "civilizada" do continente.[42]

Um dos objetivos da conferência foi então rastrear as raízes "genuínas" da Umbanda até o
Oriente; a invenção das raízes orientais juntamente com a rejeição das africanas,foi
refletida na definição do termo "umbanda", que é de outro modo geralmente acreditado ser
derivada do idioma Banto. Declarou-se que "umbanda" vinha das palavras
dosânscrito aum e bhanda, termos que foram traduzidos como "o limite no ilimitado",
"Princípio divino, luz radiante, a fonte da vida eterna, evolução constante".[43] [44] A partir da
década de 1950, os setores mais humildes da população umbandista composta por negros
e mulatos começaram a contestar o distanciamento da Umbanda das práticas africanas, a
"umbanda branca" se opunha à tendência de recuperar os valores africanos presentes na
religiosidade popular.

A partir da década de 1950, os setores mais humildes da população umbandista composta


por negros e mulatos começaram a contestar o distanciamento da Umbanda das práticas
africanas, a "umbanda branca" se opunha à tendência de recuperar os valores africanos
presentes na religiosidade popular.[45]

O segundo congresso ocorreu em 1961 evidenciando o crescimento da religião que teve


sua imagem reconstruída pela imprensa, milhares de devotos compareceram
aoMaracanãzinho com representantes de vários estados e a presença de políticos
municipais e estaduais.[46] O jornal O Estado de S. Paulo noticiou a realização do
congresso no Rio de Janeiro afirmando que a "preocupação central do Congresso parece
ser a elaboração de um código que orientará a feitura de uma Carta Sinódica da
Umbanda". No mesmo ano, o jornal Diário de S. Paulo publicou uma grande reportagem
com o título "Saravá meu Pai Xangô, Saravá Mamãe Oxum", onde o jornalista descreve
uma "sessão assistida pelos repórteres a convite do deputado gaúcho Moab Caldas".[47]

No terceiro congresso realizado em 1973[48] a Umbanda afirmou-se em definitivo como


uma religião expressiva no campo das atividades assistenciais, além dos centros onde
ocorriam as atividades espirituais, a religião contava com escolas, creches, ambulatórios
etc articuladas em torno da missão de promover a caridade e a ajuda.[49]

Na década de 80, a Umbanda teve seu auge ao ser declarada como religião de muitas
personalidades como os cantores Clara Nunes, Dorival Caymmi, Vinícius de
Moraes,Baden Powell, Bezerra da Silva, Raul Seixas, Martinho da Vila entre outros.[50]

Na década de 90 a Umbanda e outras religiões de matizes africanas foram alvo do


crescente neopentecostalismo brasileiro. Nessa época também fundou-se a Faculdade de
Teologia Umbandista, mantida pela Ordem Iniciática do Cruzeiro Divino[51] fundada por
Rigas Neto na Água Funda, São Paulo.[52]

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