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Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)

Jornalismo

Fotojornalismo e Midiativismo: Análise sobre a cobertura da Greve Geral


de 28 de abril de 20171
Bruno Nogueira HALFELD2
Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG
Gleice Lisbôa MARQUES3
Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG

RESUMO
1 – Introdução
A existência de tantas imagens nos meios digitais faz com que nós tenhamos
que despender cada vez mais atenção para captarmos as mensagens que estão
sendo passada por meio das fotografias. De 1839 até hoje, quase duzentos anos após
a invenção da fotografia, “praticamente tudo foi fotografado, ou pelo menos assim
parece”.

Apesar de ter sido vista como item de luxo na sua origem, a fotografia se
difundiu de maneira estrondosa nas últimas décadas. Estudos realizados por uma das
maiores empresas digitais do mundo, o Google, apontam 1,2 bilhão de fotos são
postas todos os dias em sua plataforma. E boa parte deste número se deve a
presença, e porque não dizer, o protagonismo que os smartphones alcançaram na
vida das pessoas. Atualmente, é possível registrar desde desastres naturais a selfies
4despretensiosas em eventos e postá-las instantaneamente por meio das mídias
sociais, como o Facebook5 e o Instagram 6.

A autora Susan Sontag explica em seu livro “Sobre Fotografia” a respeito do


costume de se fotografar, discorrendo principalmente a respeito da época em que se

11
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora, como
requisito parcial para a conclusão do Curso de Graduação em Comunicação Social: Jornalismo
2
Graduando (a) do curso de Comunicação Social: Jornalismo Propaganda do Centro de Ensino
Superior de Juiz de Fora.
3
Professor (a) do curso de Comunicação Social: Jornalismo / Publicidade e Propaganda do Centro de
Ensino Superior de Juiz de Fora.
4 Selfie é uma fotografia, geralmente digital, que uma pessoa tira de si mesma.
5 Facebook é uma rede social lançada em 4 de fevereiro de 2004, operado e de propriedade

privada da Facebook Inc..


6 Instagram é uma rede social online de compartilhamento de fotos e vídeos entre seus usuários, que

permite aplicar filtros digitais e compartilhá-los em uma variedade de serviços de redes sociais.

3
era necessário o uso de equipamentos caros e que demandava conhecimento
profundo da ferramenta, por parte de quem iria utilizá-lo quem fosse operar a câmera
fotográfica. Por conta destes fatores, capturar imagens passou a ser um passatempo
dos mais ricos. Sontag ainda compara a atual relação da humanidade com a teoria da
“Caverna de Platão”. Para ela, nós permanecemos nós admirando com meras
imagens da realidade. A autora lembra que “ser educado por fotos não é o mesmo
que ser educado por imagens mais antigas, mais artesanais”

A chegada das câmeras digitais fez com que o preço para se tirar uma foto
caísse drasticamente, já que ela dispensa os filmes e por vezes o registro nem mesmo
é impresso, passando a habitar exclusivamente no âmbito digital. Consequentemente,
a popularização da fotografia trouxe novas interpretações do olhar e uma nova
maneira de registrar os momentos. Não é raro presenciamos acidentes de trânsito em
que fotojornalistas precisam driblar as centenas de câmeras que se levantam em meio
à multidão ávida por registrar e compartilhar aquele momento. Em seu texto “A obra
de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”, Walter Benjamin aborda a questão
da reprodução artística, que sempre esteve presente na história da humanidade. Para
o autor a criação artística humana pode sempre ser imitado de alguma forma por
outros indivíduos, é isso pode ser aplicado principalmente quando câmeras
profissionais disputam a mesma foto com smartphones. O mesmo tipo de ação
acompanha a raça humana desde os tempos mais primórdios, quando discípulos
imitavam a criação de seus respectivos mestres e posteriormente terceiros passaram
também a dominar a maneira de produzir e que passam a explorar os meios de
produção.

Benjamin aponta, na mesma publicação, para uma questão importante sobre a


autenticidade, o que torna um texto do meio do século passado perfeitamente atual,
principalmente porque nos deparamos com um cenário de grande difusão de imagens
e em alguns casos a autenticidade pode ficar em xeque. Benjamin lembra que a
fotografia tem o poder de através das lentes acentuar determinados aspectos do
objeto fotografado. Em outras palavras, a fotografia com sua capacidade ajustar o
ângulo de observação consegue ter acesso a detalhes que o olho humano não está

4
apto para ter “Ela pode, também, graças a procedimentos como a ampliação ou a
câmera lenta, fixar imagens que fogem inteiramente à ótica natural.”

A própria criação do fotojornalismo7 se deve ao avanço tecnológico, a


modalidade só se desenvolveu no início do século XX por meio das revistas ilustradas
que tiveram seu ápice na Alemanha nos anos 1930. Mas ao contrário do que
aconteceu no princípio, hoje a profissão está cada vez mais afetada pelos constantes
avanços da área de produção de imagens digitais.

Como participante ativo do cenário atual, o fotógrafo não sai ileso das
alterações que a evolução tecnológica traz. A criação das câmeras cada vez mais
leves e com capacidade de captar detalhes fazem com que o profissional precise estar
sempre conectado aos lançamentos que as grandes marcas fazem e que modificam
a maneira de produção e disseminação de imagens. O advento da internet e o
surgimento dos smartphones 8 impulsionam a circulação de imagens, principalmente
nas redes sociais. Seja de eventos sociais e pessoais, ou até mesmo em
acontecimentos maiores, como acidentes, guerras e catástrofes naturais, a figura do
“eu repórter” tem sido cada vez mais presente.

Recentemente o fotógrafo Sebastião Salgado declarou em entrevista


concedida a diversos meios de comunicação que a fotografia está com os dias
contados. Segundo o Salgado, nos próximos 30 anos ferramentas como o Instagram
substituiriam a fotografia e a partir daí o que passaria a ser gerado seriam imagens,
sem preocupação com a estética. O fotógrafo faz uma comparação entre as
fotografias feitas por nossos pais, que eram reveladas e ganhavam um valor
intrínseco, um contraponto quando observamos o que é produzido no
Instagram. principalmente por meio do midiativismo9, que mobiliza milhares
potenciais repórteres, que fotografam tanto com câmeras profissionais e até com seus
celulares.

No que tange ao fotojornalismo propriamente dito, o que podemos apontar


como maior expoente das mudanças é o surgimento do midiativismo produzido

7 Fotojornalismo é o gênero de jornalismo em que a fotografia é primordial na veiculação das notícias.


8 Um smartphone é um telemóvel que combina recursos de computadores pessoais, com
funcionalidades avançadas que podem ser estendidas por meio de programas aplicativos executados
pelo seu sistema operacional, chamados simplesmente aplicações.
9 é um movimento social de mídia independente que utiliza a internet para contrapor a narrativa dos

veículos ligados aos Conglomerados de mídia.

5
principalmente por coletivos de fotógrafos que usam tanto as câmeras DSLR quanto
celulares que contam com câmeras e lentes potentes o suficiente para a produção de
imagens que possam ser publicadas imediatamente. No caso particular do
midiativismo online, onde a velocidade do transporte de dados é o que mais importa
é a qualidade é muitas vezes deixada de lado em detrimento da informação em tempo
real. Este processo de dinamismo informacional, traz novamente Benjamin para o
debate.

Cada dia fica mais irresistível a necessidade de possuir o


objeto, de tão perto quanto possível, na imagem, ou antes, na sua
cópia, na sua reprodução. Cada dia fica mais nítido a diferença entre a
reprodução, como ela nos é oferecida pelas revistas ilustradas e pelas
atualidades cinematográficas, e a imagem. (BENJAMIN, 1955)

Coletivos como Jornalistas Livres e Mídia Ninja são os principais expoentes


deste movimento. No caso da Mídia Ninja, o movimento ganhou repercussão nacional
quando passou a cobrir os protestos contra o aumento da passagem de ônibus em
São Paulo, que evoluíram para as grandes manifestações de 2013 que foram
marcadas pela presença maciça de interessados em realizar a cobertura dos
acontecimentos de maneira independente. Ferramentas como o Facebook, Instagram
e Twitter 10são os principais meios de propagação das imagens produzidas.

2 - Fundamentação da imagem

O processo fotográfico está inserido em nossa sociedade desde a invenção da


câmara clara, que servia para que os artistas pudessem pintar as imagens projetadas
por um pequeno orifício que reproduzia o que se passava diante da câmara.
Entretanto, esse processo era artesanal, segundo Lucia Santaella, existem três
paradigmas no mundo das imagens. Basicamente Santaella os classifica em:
Paradigma pré-fotográfico, paradigma fotográfico e paradigma pós fotográficos.
Inicialmente lançaremos luz sobre o pré-fotográfico, que na definição da autora,
são as imagens que dependem da condução do artista, ou seja, a habilidade manual

10Twitter é uma rede social e um servidor para microblogging, que permite aos usuários enviar e
receber atualizações pessoais de outros contatos, por meio do website do serviço, por SMS e por
softwares específicos de gerenciamento.

6
“de um indivíduo para plasmar o visível”. Neste universo são participantes as imagens
esculpidas em pedras, o desenho, pintura e até a gravura em pedras.
Santaella ainda afirma que as imagens artesanais têm uma característica
básica, que é a realidade métrica em que elas são produzidas. A confecção deste tipo
de obra necessita de um suporte, uma superfície, que sirva de receptáculo das
substâncias, na maior parte das vezes as tintas, que o agente produtor, neste caso o
artista, utiliza para nela deixar a marca de seu gesto por meio de um instrumento apto.
A autora ainda destaca a questão da autenticidade inserida no universo da
imagem artesanal:
O que resulta disso não é só uma imagem, mas um objeto único,
autêntico e, por isso mesmo, solene, carregado de certa sacralidade
fruto do privilégio da impressão primeira, originária, daquele instante
santo raro, no qual o pintor pousou seu olhar sobre o mundo, dando
forma a esse olhar num gesto irrepetível. (Lucia Santaella)

A velocidade para a produção das obras é uma característica marcante, isso


na verdade acaba diferenciando-as de do que é produzido atualmente pelos outros
dois paradigmas. Santaella é taxativa quando afirma que neste modelo acontece uma
fusão entre “o sujeito que cria, o objeto criado e a fonte da criação”.
Como consequência da produção artesanal, o armazenamento das obras faz
necessária com o uso de um suporte material único para cada peça. “A imagem pré-
fotográfica convida o receptor a um impossível contato imediato e sem mediações, ao
mesmo tempo que produz um afastamento”.
Santaella traz luz para o tema do paradigma fotográfico caracterizando-o como
a inauguração do uso de máquinas para a captura de imagens através de seus
aparelhos e principalmente por suas objetivas.
O advento da fotografia trouxe consigo um processo de produção que possui
uma didática própria. A dualidade também é sempre presente quando é tratado o
paradigma fotográfico.
O surgimento da fotografia não se dá de maneira espontânea, afinal de contas
ela é descendente direta da câmara obscura, que foi utilizada durante anos nos
trabalhos de diversos pintores, mas que com sua evolução, passou afastar destes
artistas a função de captura do que se passa no universo prático. A câmara obscura
não possuía apenas um meio de captura permanente das imagens por meio de
alguma superfície sensível à luz de um lado, e do outro o negativo que fosse possível
reproduzir a imagem originalmente capturada.

7
A etimologia da palavra fotografia (foto - Luz e grafia - desenhar) deixa claro
o seu funcionamento, ou seja, desenhar com a luz. Neste sentido, Santaela reforça
que repousa as técnicas óticas de formação de imagens, a partir da luz capturada por
estes meios e recebida pelo objeto sensível capaz de produzir a fotografia, seja ele o
filme, a placa de cristais de prata ou o sensor das câmeras mais modernas, ou seja,
no paradigma fotográfico, o suporte é baseado em fenômenos químicos ou
eletromagnéticos que estão preparados para a qualquer momento ser exposto à luz.
O resultado da captura analógica é o negativo, que paradoxalmente é formado
apenas por sombra, “rastro escuro à espera de luz que só será restituída na
revelação”. O próprio processo de revelação é categorizado por Santaella como “a
diferença, o hiato, a separação irredutível entre o real, reservatório infinito e
inesgotável de todas as coisas”.
Existe uma divisão clara no paradigma fotográfico, que fica entre o negativo e
as imagens impressas. O próprio negativo funciona como armazenamento, ao
contrário do que se pensa sobre a impressão propriamente dito. Em suma, a
passagem do paradigma pré-fotográfico o armazenamento deixa de ser único, já que
a reprodução se tornou possível com o advento do negativo, que é passível de ser
revelado a qualquer momento, além de ganhar durabilidade.
O que se plasma na pintura é o olhar de um sujeito. O que a foto
registra, por seu lado, é a complementaridade ou o conflito entre o olho
da câmara e o ponto de vista de um sujeito. O que se tem nas imagens
sintéticas, por outro lado, é um olhar de todos é de ninguém, pois a
simulação numérica exclui qualquer centro organizador, qualquer lugar
privilegiado do olhar, privilegiado do olhar, qualquer hierarquia espacial
e temporal. (SANTELLA)

Santaela defende que a o que é produzido pela fotografia é menos


representativo, na verdade, ela tem o poder da reprodução dos reflexos captados no
ambiente. Em outras palavras, essa imagem resultante de um enquadramento do real,
ou seja, um recorte, funciona como registro da relação sujeito x mundo.
Umas das consequências do paradigma fotográfico, é a sua função na relação
entre o real e a sua imagem, ou seja, o que ela registra do ambiente, o reflexo dele, a
luz que emana. “Sombra, resto, corte, neste tipo de imagem o índice reina soberano”.
A conexão entre a fotografia e a “era da comunicação de massas”, ou seja, a
função principal dela não é estar em porta-retratos pendurados em nossas prateleiras,
mas em jornais, revistas, outdoors e mais recentemente nos meios digitais. “Imagem
sobretudo profana, fragmento arrancado do corpo da natureza, a imagem fotográfica

8
oferece-se à observação, produzindo como primeiro efeito no receptor a aquiescência
do reconhecimento”.
Em suma, o paradigma fotográfico é caracterizado por Santaella como
“universo instantâneo, lapso e interrupção no fluxo do tempo”.
Com os recentes avanços tecnológicos, principalmente no que tange a
tecnologia da informação, chegamos ao terceiro paradigma, o pós-fotográfico ou
gerativo. Neste meio estão englobadas as imagens que são produzidas por meio de
uma matriz numérica, ou seja, algoritmos que são códigos que são interpretados por
computadores, que por sua vez, geram imagens por meio de seus monitores.
Enquanto no paradigma fotográfico a divisão é sempre diádico, o pós-
fotográfico se organiza de maneira triádica. As mudanças que a entrada da infografia11
no universo das imagens é objeto de estudo de diversos teóricos. O que podemos
afirmar é que a sua chegada deslocou o epicentro da imagem ótica, que vinha desde
os primórdios da câmara escura no Renascimento e a perspectiva monocular
desenvolvida entre os séculos XIX e XX.
Diferente das duas outras fases, agora a imagem não depende mais de um
suporte artesanal ou de um processo físico-químico, combinado com a mecânica das
câmeras fotográficas, a partir de agora o que vemos são imagens que combinam o
computador e uma tela de vídeo, sendo acompanhados por um sistema abstrato,
modelos, programas e cálculos.
Na nova ordem visual, na nova economia simbólica instaurada pela
infografia, o agente da produção não é mais um artista, que deixa na
superfície de um suporte a marca de sua subjetividade e de sua
habilidade, nem é um sujeito que age sobre o real, e que pode até
transmutá-lo através de uma máquina, mas se trata agora, antes de
tudo, de um programador cuja inteligência visual se realiza na interação
e complementaridade com os poderes da inteligência artificial.
(SANTAELLA)

A própria formação das imagens infográficas se dá de maneira diversa dos


outros dois paradigmas, no caso da infografia, ou seja, a imagem, só pode ser
visualizada por meio da tela do computador, já que a formação delas é feita por meio
de pequenos fragmentos, ou pontos elementares chamados de pixels. Esses
fragmentos formam a imagem com diferentes nuances de cores e se organizam por
meio de coordenadas determinadas pelo algoritmo do computador. Santaella define

11Infografia é o gênero jornalístico que utiliza recursos gráfico-visuais para apresentação sucinta e
atraente de determinadas informações.

9
“o pixel 12é controlável e modificável por estar ligado a matriz de valores numéricos”.
Isso nos leva a começar a refletir sobre a “perpétua metamorfose” que a imagem
passa a estar suscetível a sofrer, já que ele pode ser retrabalhado.
Apesar da iconicidade e da sensibilidade que as imagens infográficas têm, o
processo do qual elas resultam é abstrato em seu âmago. Santaella destaca três
pontos sobre a produção de infografias: o primeiro deles é o trabalho do programador,
que constrói o modelo de um objeto numa matriz de números, algoritmos ou
programas. Em segundo lugar vem a própria matriz numérica, que deve ser alterada
de acordo as configurações de cada algoritmo e em último lugar o computador, que
interpretará todos os pontos e os transforma em pontos visíveis. As leis da lógica são
facilmente aplicadas as imagens infográficas, enquanto as demais são mais ligadas a
materialidade.
Para infografia a aparência, nem mesmo o rastro de luz deixado pelos objetos,
mas o comportamento que eles podem adquirir, além de suas funcionalidades.
O que muda com o computador é a possibilidade de fazer
experiências que não se realizam no espaço e tempo reais sobre
objetos reais, mas sim por meio de cálculos, de procedimentos
formalizados e executados de maneira indefinidamente reiterável.
(SANTAELLA)

O armazenamento do que é produzido dentro deste paradigma difere


enormemente dos demais, já que ele se dá por meio das memórias dos computadores.
Por esse motivo, as produções pouco sofrem com as ações do tempo e do espaço.
As imagens sintéticas produzidas digitalmente dependem diretamente da
capacidade do programador e de sua habilidade de criar de ferramentas que
possibilitem a manipulação e visualização das imagens. Em resumo, o “programador
representa o pensamento lógico e experimental”.
O controle da imagem pós-fotográfica obrigou aos profissionais ligados a
informática a criar modos mais rápidos de respostas entre as informações do sistema
e o receptor.

3 - Fotografia digital

12 ponto luminoso do monitor que, juntamente com outros do mesmo tipo, forma as imagens na tela.

10
Em seu texto “A fotografia sob o impacto da eletrônica”, Arlindo Machado trata
das modificações que a recente entrada da fotografia digital, assim como os recursos
de armazenamento e processamentos digitais, tais como photoshop 13 têm modificado
o conceito tradicional de fotografia e o autor acredita que de agora em diante as
mudanças no universo fotográfico até mesmo a forma de se consumir imagens sofrerá
mudanças radicais.
A velocidade em que as mudanças acontecem neste momento é classificado
por Machado como “vertiginoso”, principalmente com o advento das telas eletrônicas
que nos rodeiam no nosso cotidiano. Seja em casa, no trabalho, nos locais de lazer a
mais recentemente na palma das nossas mãos. A imagem é normalmente “granulosa,
mosaicada, estilizada, translúcida e flamejante”, por conta destas características ela
estas imagens só podem ser remotamente associadas a homogeneidade da
fotografia.
Por conta destas mudanças, estamos nos adaptando cada vez mais rápido a
ver imagem que muitas vezes realmente foi produzida por meio de uma câmera
fotográfica, mas que fora alterada de tal forma, que não “guarda mais que pálidos
traços de seu registro original em película”. Isso não se restringe aos meios digitais,
mas veículos impressos como jornais e revistas tem trazido em suas páginas cada
vez mais exemplos disso.
Ao mesmo tempo que pode parecer apocalíptico o cenário que se apresenta, é
preciso aceitá-lo da maneira que é, já que a presença da fotografia eletrônica e “seria
um equívoco descomunal olhar para tudo isso como se estivéssemos diante de uma
catástrofe, como se as telas eletrônicas ao se multiplicarem ao nosso redor,
estivessem também anunciando a chegada do apocalipse”.
Machado aponta que a maior consequência da hegemonia eletrônica na
fotografia é a perda do valor do realismo que ela carrega desde sua origem. O cenário
agora cria uma certa desconfiança sobre o valor de realidade da imagem, já qualquer
imagem fotográfica pode ser altamente modificada.
É preciso deixar claro que a manipulação não é exclusividade da fotografia
digital. Desde os primórdios a fotografia já foi alvo de modificações “por motivos
publicitários, políticos e estéticos. O autor cita o exemplo da exposição “As Fotos Que
Falsificaram a História” que foi organizada em 1986 pelo jornalista Alain Jaubert em

13Adobe Photoshop é um software caracterizado como editor de imagens bidimensionais do tipo


raster desenvolvido pela Adobe Systems.

11
Paris, e que trouxe quase uma centena de fotos de figuras históricas como Fidel
Castro, Lênin, Trotsky e Pinochet.
Uma das hipóteses levantadas pelo autor é que a realidade refletida pelas
fotografias seja tão inválida que com o tempo até nossos documentos não terão mais
que carregá-las.

4 - O que é midiativismo?

Para responder o questionamento que abre este capítulo é preciso definir


alguns conceitos sobre mídia tradicional e mídias alternativas, a partir dessas
caracterizações é que poderemos partir para um estudo aprofundado sobre questões
ligadas diretamente ao midiativismo.
Quando analisamos nossa sociedade atual, nos deparamos com um cenário
de pessoas conectadas por meio da internet. Segundo Júlio Valentim, “A sociedade
contemporânea parece possuir uma certa ‘obsessão’ pela mobilidade. Prova disso é
a reconfiguração pela qual passam os espaços urbanos”, e como o jornalismo não se
organiza de forma autônoma as alterações da sociedade, a maneira com que as
pessoas passaram a consumir, e mais recentemente, a gerar conteúdos também foi
alterada.
Foi possível observar um aumento no número de portais eletrônicos e páginas
nas redes sociais especializados em mídia ativismo nos últimos anos. No Brasil, mais
precisamente em 2013 quando protestos contra o aumento da passagem de ônibus
em São Paulo desencadeou uma série de manifestações populares em todo o país
contra a realização da Copa do Mundo FIFA 2014.
Além de gritar contra a realização do mundial de futebol, em muitos lugares
veículos tradicionais de mídia foram hostilizados e tiveram sua capacidade de
cobertura reduzida. A partir deste ponto, os midiativistas ganham espaço e por meio

12
de serviços de streaming 14como a twittcam15, periscope 16 e fotos postadas por meio
das redes sociais. Júlio Valentim explica isso no trecho:

O advento das tecnologias móveis permite a articulação do espaço


físico com o espaço virtual, e faz com que pessoas, veículos, objetos e
lugares possam ser localizados e conectados sem-fio, entre si e a
qualquer parte do mundo, através do ciberespaço. (Thiago D’angelo
Ribeiro Almeida)

Além da cobertura, o facebook foi uma importante ferramenta para os


midiativistas, que usavam as redes sociais para “agendamento, espalhamento de
orientações e registros, além de fornecer espaço para reflexões sobre os eventos”.
Os megafones foram substituídos pelas redes, o que aproximou os movimentos
populares brasileiros dos que aconteceram ao redor do mundo no mesmo período.
como as ações na Tunísia, Egito e Islândia.
Almeida define estes portais como micromídia, em detrimento de sua
capacidade técnica e de alcance e “possui raio de abrangência limitado, e mesmo que
utilize a internet, geralmente tem restrições técnicas que limitam sua produção e
transmissão e se encontra à margem do ecossistema midiático”. Isso as difere da
Macromidia, que em suma atuam no mercado como uma grande empresa, com
“rotinas, estéticas, linhas editoriais específicas, além de estrutura técnica e
tecnológica robusta. Alguns exemplos são grandes empresas do porte da Rede Globo,
Folha de São Paulo, Time Warner, Disney, Google, entre outras.” (ALMEIDA 2015).
Vamos nos debruçar sobre a questão das micromidias, que na maioria dos
casos se destacam por meio de portais online e páginas nas redes sociais como é o
caso da Mídia Ninja, que em 07/11/2017 contava com 1.635.622 de seguidores em
sua página oficial no facebook, e os Jornalistas Livres, que na mesma data possuía
895.401.

14 Streaming é uma forma de transmissão de som e imagem (áudio e vídeo) através de uma rede
qualquer de computadores sem a necessidade de efetuar downloads do que está se vendo e/ou
ouvindo, pois neste método a máquina recebe as informações ao mesmo tempo em que as repassa
ao usuário.
15 Twitcam é um serviço vinculado ao Twitter, microblogging e serviço de mídia social, que permite

aos seus usuários enviarem vídeos ao vivo através de uma câmera conectada ao seu computador.
Funciona como se fosse um programa de televisão ao vivo, onde as pessoas participam "twittando"
sobre o serviço.
16 Periscope é um aplicativo de streaming de vídeo ao vivo para iOS e Android desenvolvido por

Kayvon Beykpour e Joe Bernstein

13
Em uma primeira análise, o número de pessoas propensas a serem alcançadas
pelas publicações realizadas por elas parece expressivo, mas quando analisamos os
números divulgados pelo IBGE em 2015 que demonstram que 97,1% dos lares
brasileiros possuem pelo menos um aparelho televisor. A mesma pesquisa apontou
que em apenas 57% dos brasileiros tinham acesso a internet em 2016. Isso demonstra
a hegemonia que os veículos tradicionais ainda têm no cenário midiático nacional.
O autor John D. H.Downing, classifica a internet como uma “esfera pública
global que tem por características a liberdade e a anarquia, já que se vê livre dos
mecanismos opressores dos quais a grande mídia faz parte. Desta maneira, podemos
afirmar que de uma maneira geral o midiativismo online se posiciona em sintonia com
a definição do autor, já que ele se apropria do espaço público, seja ele virtual ou físico.
É o caso das grandes manifestações que aconteceram no país desde 2013.
centenas de milhares de pessoas insatisfeitas com as mais diversas pautas se unem
por meio destes canais, que demonstram capacidade de unir pessoas e fomentar a
discussão de ideias, além da publicação de conteúdos multimídia, incluindo o
fotográfico, que é produzido de maneira colaborativa. “Através da internet e das redes
sociais, estas mídias garantem uma distribuição massiva que tende a ultrapassar as
redes de ativistas e, por vezes, se colocar no grande circuito informacional por meio
de suas funções pós-massivas.” (Thiago D’angelo Ribeiro Almeida)

5 – Cobertura da Greve Geral de 28 de abril

Analisamos agora a forma com que se comportaram duas páginas do facebook


que cumprem o papel anteriormente definido de cobertura e divulgação de atos
ligados a movimentos sociais. Destacamos a Mídia Ninja e o Jornalistas Livres.
A Mídia Ninja foi fundada em 2013 em meio a efervescência dos protestos
contra o aumento das passagens de ônibus em São Paulo e posteriormente contra a
realização da Copa das Confederações e Copa do Mundo no Brasil, competições que
à época estavam marcadas para serem realizadas respectivamente em junho de 2013
e junho de 2014. Desde o início, a cobertura se deu pela internet, com o uso de
ferramentas de transmissão de vídeos online e a publicação de fotografias. No
facebook, a Mídia Ninja se define assim em 12/11/2017:

14
Somos a Mídia NINJA (Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação).
Uma rede de comunicadores que produzem e distribuem informação
em movimento, agindo e comunicando. Apostamos na lógica
colaborativa de criação e compartilhamento de conteúdos,
característica da sociedade em rede, para realizar reportagens,
documentários e investigações no Brasil e no mundo. Nossa pauta está
onde a luta social e a articulação das transformações culturais,
políticas, econômicas e ambientais se expressa.
(https://www.facebook.com/pg/MidiaNINJA/about/ acesso em
12/11/2017)

Já em março de 2015, o coletivo Jornalistas Livres iniciou suas atividades em


meio aos protestos que pediam o impeachment17 da então Presidenta Dilma Vana
Rousseff, que havia sido eleita em 2014 e tomou posse de seu segundo mandato em
2015 durante um período de forte retração da economia. Segundo o próprio portal de
Jornalistas Livres, a criação se deu por conta da “necessidade urgente de enfrentar a
escalada da narrativa de ódio, antidemocrática e de permanente desrespeito aos
direitos humanos e sociais, em grande parte apoiada pela mídia tradicional”, E desta
maneira eles se definem:
Jornalistas Livres somos uma rede de coletivos originada na
diversidade. Existimos em contraponto à falsa unidade de pensamento
e ação do jornalismo praticado pela mídia tradicional centralizada e
centralizadora. Pensamos com nossas próprias cabeças, cada um(a)
de nós com sua própria cabeça. Os valores que nos unem são o amor
apaixonado pela democracia e a defesa radical dos direitos humanos.
(https://jornalistaslivres.org/quem-somos/ acesso em 12/11/2017)

Definido o objeto de estudo, é preciso desvendar o que é a cobertura


colaborativa e como ela se desenvolve no cenário midiático atual, já que é a partir dela
que se dão a maior parte das coberturas realizadas pelos coletivos midiativistas. Em
suma podemos definir desta forma “a cobertura colaborativa tem sua genealogia
quando determinado acontecimento público é transformado em fato jornalístico pelo
trabalho de engajamento coletivo dos perfis nas redes sociais.” (MALINI & ANTOUN,
2013, p. 247)
A forma com que estes dois veículos se financiam também se assemelha, já
que ambos dependem de doações que são realizadas por internautas que acessam
seus respectivos portais e decidem colaborar o financeiramente com a estrutura.

17
Impeachment: processo instaurado com base em denúncia de crime de responsabilidade contra
alta autoridade do poder executivo (p.ex., presidente da República, governadores, prefeitos) ou do
poder judiciário (p.ex., ministros do S.T.F.), cuja sentença é da alçada do poder legislativo.

15
Em 28 de abril de 2017, as centrais sindicais apoiadas por siglas partidárias de
esquerda, organizaram a chamada “Greve Geral”, que paralisou as atividades em
repartições públicas e empresas privadas para protestar contra a reforma trabalhista,
uma série de mudanças na CLT18, que segundo estes movimentos piorariam a relação
de trabalho no país. A mudança, foi implementada pelo governo do então presidente
Michel Miguel Elias Temer Lulia, que tinha seu governo contestado, já que Temer era
Vice-presidente da República e assumiu a presidência após o processo de
impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff.

Em meio a este cenário, os dois veículos contaram com a colaboração de


fotógrafos de todo o país para a realização das coberturas das manifestações de rua,
como fica claro nas publicações que separamos abaixo:

ILUSTRAÇÃO 1:

Fonte:https://www.facebook.com/pg/MidiaNINJA/ (acesso em 12/11/2017)

18
CLT: Consolidação das Leis Trabalhistas criada ainda durante o governo Getúlio Vargas.

16
ILUSTRAÇÃO 2:

Fonte: https://www.facebook.com/pg/MidiaNINJA/ (acesso em 12/11/2017)

17
ILUSTRAÇÃO 3:

Fonte:https://www.facebook.com/pg/MidiaNINJA/ (acesso em 12/11/2017)

ILUSTRAÇÃO 4:

Fonte:https://jornalistaslivres.org/2017/04/usp-na-greve-geral-de-28-de-abril/ (Acesso em 12/11/2017

18
ILUSTRAÇÃO 5:

: https://jornalistaslivres.org/2017/04/a-gente-nao-aguenta-mais/ (acesso em 12/11/2017)

ILUSTRAÇÃO 6:

https://www.instagram.com/p/BTb1hiiBptd/?hl=pt-br&taken-by=jornalistaslivres (Acesso em
12/11/2017)

Além do fotojornalismo, assim como definimos no capítulo anterior, estas


mídias desempenham o papel de divulgação, organização e chamamento para os atos
realizados pelos movimentos sociais. Abaixo é possível verificar algumas situações
em que se aplica esta definição:

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ILUSTRAÇÃO 7:

Fonte: https://facebook.com/midianinja (acesso em 12/11/2017)

ILUSTRAÇÃO 7:

Fonte: https://www.facebook.com/jornalistaslivres/ (acesso em: 12/11/2017)

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