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2. A ESCOLA DE FRANKFURT Francisco Riidiger* Chama-se de Escola de Frankfurt ao coletivo de pensa- dores e cientistas sociais alemaes formado, sobretudo, por Theodor Adorno, Max Horkheimer, Erich Fromm e Herbert Marcuse. Devemos aos dois primeiros a criagao de um con- ceito que se tornou central para os estudos culturais e as ana- lises de midia: 0 conceito de industria cultural. Walter Ben- jamin e Siegfried Kracauer, embora situando-se na periferia daquele grupo, nao sao menos importantes, podendo ser con- tados, junto com os demais, entre os criadores da pesquisa critica em comunicagao. Considerado atualmente como herdeiro espiritual dos fundadores e principal expoente da chamada segunda gera- go da Escola, Jiirgen Habermas também é autor que deve ser lembrado neste contexto nao so por seu estudo, hoje clas- sico, sobre aesfera publica como por sua ambiciosa tentativa de criar uma teoria geral da ago comunicativa. Deixaremos de lado, no que segue, essa segunda fase de sua trajetoria de investigagao. Referindo-nos aos pioneiros, 0 primeiro ponto que devemos levar em conta, para bem en- tendé-los, é que nenhum deles pertenceu, de maneira autdc- tone, ao campo da comunicagao. Todos eles foram pensado- res independentes, cujos interesses se estendiam por diver- * Professor da PUCRS, 131 Francisco Rudiger sos campos do saber. Agrupando-os havia apenas o projeto filos6fico e politico de elaborar uma ampla teoria critica da sociedade. Os frankfurtianos trataram de um leque de assuntos que compreendia desde os processos civilizadores modernos e 0 destino do ser humano na era da técnica até a politica, a arte, a misica, a literatura e a vida cotidiana. Dentro desses temas e de forma original é que vieram a descobrir a crescente im- portancia dos fendmenos de midia e da cultura de mercado na formagao do modo de vida contemporaneo. Destarte é facil entender por que eles se negaram a acei- tar o principio de que os fendmenos de comunicagao consti- tuem objeto de ciéncia especializada ou podem ser estudados de maneira independente, defendido por muitos pesquisado- res da area. Segundo seu modo de ver, as comunicagées s6 adquirem sentido em relagao ao todo social, do qual sao an- tes de mais nada uma mediagao e, por isso, precisam ser es- tudadas 4 luz do processo histérico global da sociedade. Partindo das teses de Marx, Freud e Nietzsche, pensado- res que provocaram uma profunda mudanga em nossa ma- neira de ver o homem, a cultura e a sociedade, a principal ta- refa a que se dedicaram os frankfurtianos consistiu, essenci- almente, em recriar suas idéias de um modo que fosse capaz de esclarecer as novas realidades surgidas com 0 desenvolvi- mento do capitalismo no século XX. A colaboragio por eles dada 4 comunicagio, como suge- rido, surgiu neste contexto. 1. Dialética do Numinismo e indistria cultural Horkheimer e Adorno criaram o conceito de industria cultural e propuseram as linhas gerais de sua critica ao des- cortinarem o que chamaram, no titulo de sua obra principal, de Dialética do Iluminismo. Era 1944, a 2° Guerra estava em 132 Aescola de Fronkfurt curso. A revolucao social em que acreditavam fracassara em todas as partes, e em todas as partes ja nao havia mais a figu- ra do Estado liberal. Na Europa, a barbarie nazista ainda nao terminara, e 0 socialismo consumira-se no despotismo buro- cratico. Refugiados nos Estados Unidos, os pensadores do grupo puderam perceber porém que, nao obstante distintas, também nos regimes formalmente democraticos havia ten- déncias totalitarias. Nas sociedades capitalistas avangadas, defenderam, a populagao é mobilizada a se engajar nas tarefas necessarias 4 manutengao do sistema econdémico e social através do con- sumo estético massificados, articulado pela industria cultu- ral. As tendéncias a crise sistémica e desergao individual séo combatidas, entre outros meios, através da exploragao mer- cantil da cultura e dos processos de formagao da consciéncia. Assim sendo, acontece porém que seu contetdo libertador se vé freado e, ao invés do conhecimento emancipador em rela- go as varias formas de dominagao, as comunicagdes se veem acorrentadas 4 ordem social dominante. Visando entender melhor o ponto, convém explicar 0 que os autores da Escola entendiam por Dialética do Ilumi- nismo. Segundo eles, os tempos modernos criaram a idéia de que nao apenas somos seres livres e distintos como podemos construir uma sociedade capaz de permitir a todos uma vida justa e realizagao individual. Noutros termos, a modernidade concebeu um projeto coletivo cujo sentido original era liber- tar o homem das autoridades miticas e das opressGes sociais, ao postular sua capacidade de autodeterminagao. A historia do século passado mostrou porém que esse projeto era portador de contradi¢ées internas, carregava con- sigo varios problemas, que estao na base de muitos conflitos politicos, crises econdmicas, angustias coletivas e sofrimen- tos existenciais conhecidos desde entao pela humanidade. Isto é, 0 progresso econdémico, cientifico e tecnolégico nao pode ser separado da criacgao de novas sujeigées e, portanto, 133

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