Na Bahia […] começou nossa viagem desastrosa, que durou até nossa
chegada em Brejinho. Uma hora depois de Cachoeira ficamos encalhados e
continuamos a nossa viagem com canoas. No dia seguinte, seguimos viagem com 7 carros e chegamos às 2 da manhã em Machado Corteta, com 9 horas de atraso. Conseguimos uma mula no dia seguinte […] e viajamos no dia 15.03. Chegamos em Brejinho no dia 2 de abril, após fazermos uma viagem de mula que durou 19 dias. No penúltimo dia matamos uma cascavel de dois metros de comprimento e da grossura de um braço. Em uma outra oportunidade, vamos arrancar a pele de vários tipos de cobras e irei enviar para vocês. Caso contrário, enviarei algumas coleções que são sempre de interesse, já que agora podemos enviar mais barato com o transporte das pedras. Por um lado, vamos encontrar algum entretimento nele e, por outro lado, eles terão um valor do estrangeiro e, mais tarde, para mim, um valor de memória. As grandes pedras dão pouco lucro. Não precisamos comprar muito no momento, pois com as pequenas pedras os lucros são 5-10 vezes maiores, são fáceis de encontrar e conseguimos enviar no mínimo 100 no primeiro mês... é um lucro bonito e fácil. No momento não podemos trabalhar, pois temos muita coisa para resolver, vamos começar a trabalhar daqui a um mês e meio. Finalmente temos uma remessa pronta. Devemos enviar amanhã. São pedras medias de 200 quilates, que estimamos em 6000 Marcos. Veremos o que elas vão trazer. A venda será concluída apenas no começo de agosto. Bem provável iremos fazer uma viagem, para encontrar outros tipos de pedras preciosas de diversas cores, que provavelmente levará 15 dias […]vou escrever para vocês, dos diversos lugares que iremos passar. Se tiverem um bom mapa, vão conseguir ver. Vamos viajar sentido Diamantina e provavelmente vamos passar por Almas, Condeúba, Lençóis de Rio Verde e Grão Mogol. A viagem passa por uma chapada, onde há pouca ou nenhuma febre durante esta época do ano. Nestes locais dizem ter, Granada Almandina, turmalina, água-marinha, quartzo citrino, topázio, safira (somente para fins técnicos), cristal de rocha e diamantes. Te peço um favor do interior do Brasil, preciso de um conselho medico para tratar algumas doenças locais. Estou bastante confiante de que vai atender o meu favor, pelo fato de ser seu amigo e você ser amigo da minha família. Tem um médico na cidade de onde estou mandando esta carta, porem moramos 6 horas afastado. Meu companheiro de viagem é aquele homem que te apresentei antes da nossa viagem. Não conseguimos confiar nos médicos brasileiros. Se você ver os valores cobrados pelos médicos, você ira entender, que só vamos pedir ajuda em caso extremo. Esses são os valores das consultas medicas: - No consultório do médico: 20 Frs. - Uma visita fora, que leva até um dia: 50 Frs. - Vale transporte 10 Frs alojamento 100 Frs. Uma cirurgia é paga por fora com um valor supervalorizado. Doenças provocadas por vermes, são as que mais atacam. Sempre somos atacados por Bicho-de-pé, quando viajamos ou entramos na floresta. No nosso caso, essas picadas se inflamam fortemente (raramente em pessoas nativas) e geram uma coceira insuportável. Recentemente, em uma viagem no interior, esses insetos nos incomodaram tanto que nossos pés e pernas estavam cheias de pequenas e dolorosas feridas. No meu amigo, várias dessas feridas se espalharam pelo corpo, do tamanho e dimensão de um Franco suíço. Lavamos as feridas duas vezes ao dia com fenol e tampamos com esparadrapo (Speick Balsam e Borsalbe, marca Holandesa). Para feridas maiores, usamos iodo. Além disso, tomamos (Purge). As feridas cicatrizam muito rápido neste procedimento. Os lugares curados coçam muito, principalmente nos pés. O bicho-do-pé coloca seus ovos principalmente entre os dedos do pé ou em baixo das unhas. É preciso retirar o bicho-do-pé com um corte quando começa a doer ou coçar. O local que se pega o bicho-do-pé na maioria das vezes se inflama. Quando se pega entre os dedos isso leva a uma coceira tão grande que o local começa a despelar e sair um liquido avermelhado. A consequência dessa inflamação, leva o aumento dos gânglios linfáticos, (...), Inchaço e dor. Essa inflamação é bem comum nos nativos. Fico um pouco mais preocupado pois tive ulcera em um estado bastante avançado, foi retirado ano passado porem é muito desconfortável porque deixou grandes cicatrizes. Agora quero fazer algumas perguntas sobre o assunto que escrevi: 1. O procedimento que estamos fazendo para curar as feridas esta correta? Se não o que devemos fazer? 2. Além do (PURGE) é bom passar Iodeto de potássio? 3. Como prevenir o inchaço das glândulas? 4. Como curar inflamação na virilha? 5. Para matar o bicho-do-pé é aconselhável usar mercúrio? ( ex. a famosa REUTER SALBE) A Utilização do mercúrio no clima daqui tem suas consequências. No início, acreditávamos que as pequenas feridas eram sarna, pois aparecem com frequência aqui. Mas não é o caso. Seria ótimo encontrar um remédio para isso. Lembro que já usei enxofre para combater essas feridas. Meu amigo estava com medo de que as grandes feridas em sua perna, fossem infecção por sífilis. Não acredito que seja. Mesmo assim, gostaria de lhe perguntar: a sífilis é contagiosa, através do contato direto sem ter relação sexual? As pessoas aqui são moralmente desmoralizadas. Doenças sexualmente transmissível são muito comuns aqui, especialmente (bouba), um tipo de sífilis, que se manifesta com grandes feridas e aparecem primeiro nos órgãos genitais, mas também em outras partes do corpo. As pessoas aqui não se preocupam com isso. Não sentem vergonha, eles também se casam sem qualquer consideração por esta doença. O resultado é que muitas crianças nascem doentes e as mulheres ficam com vergonha e perdem sua honra. Ao lavar os pés, na viagem, pisamos no mesmo chão da cabana de madeira que os habitantes da casa e outros viajantes. Os pés também são secos, em um pano que muitos outros usam. Tem alguma chance de se infectar dessa forma? Existe algum preservativo? Como se curar se for infectado? Por conta da altitude onde vivemos, os moradores são mais saudáveis. Não há doenças epidêmicas. No entanto, perto dos rios a malária é muito comum. Evitamos essas áreas durante o período febril, tomando arsênico (1%) como preservativo e, em alguns casos, sulfato de quinina. Não bebemos bebida alcoólicas, ao invés disso, bebemos muito café e chá. Nossa principal refeição é carne seca, muitas frutas, feijão tropeiro, arroz e mandioca. Sofremos muito com insônia, por conta das muriçocas. Se você conhecer algum remédio, poderia passar a receita para o meu pai que ele envia para mim. Passe para ele também o valor da consulta. Algum tempo antes da sua última viagem, você disse que poderia chegar uma carta no dia 20 de outubro de Buenos Aires. Já se passou um mês e não recebi nenhuma noticia sua! Já que não chegou nenhuma carta do Rio de Janeiro, gostaria de receber noticias sua de Buenos Aires. Por mais que as suas cartas de La Rochelle e Lisboa nos tenham agradado, também estamos chateados pela longa ausência de uma carta. Por favor, escreva-nos sobre a sua mãe que esta doente, sobre o seu pai, sobre os seus irmãos e todos ligados a você. Para o irmão Robert, mandamos fazer uma lápide na Bahia feita pelo Sr. Brandmüller. Ainda não sei se a pedra chegou sem danos em Brejinho; um transporte de mula durante três semanas é um pouco arriscado pelo fato da pedra ser muito pesada. Estou muito preocupado porque recebi nenhuma informação de Brejinho sobre o transporte da pedra. A história se tornou cara e seria lamentável se o verdadeiro intuito não fosse alcançado, quando H. Petry voltou, não sobrou nada do que pertencia a Robert. Petry foi o primeiro europeu a chegar após a morte de Robert e isso depois de 7 meses. De qualquer forma, o dinheiro havia sido investido na instalação médica. Não recebemos nenhuma notificação do estado até o momento; com isso pode-se imaginar como funcionam as leis brasileiras.