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XIII Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia

UFPE, Recife, 29 de maio a 30 de junho de 2007


GT28: Teoria Sociológica

Raquel Weiss/USP
kel_weiss@hotmail.com

A Teoria Moral de Émile Durkheim


o prefácio à segunda edição de sua Crítica da Razão Pura, discutindo as condições de
N possibilidade de que a metafísica, enquanto conhecimento da própria razão, pudesse
“encetar o caminho seguro da ciência”, Kant afirma o seguinte:
Até agora se supôs que todo nosso conhecimento tinha que se regular pelos objetos;
porém, todas as tentativas de mediante conceitos estabelecer algo a priori sobre os
mesmos, através do que nosso conhecimento poderia ser ampliado, fracassaram sob
essa pressuposição. Por isso tente-se ver uma vez se não progredimos melhor nas
tarefas da Metafísica admitindo que os objetos têm que se regular pelo nosso
conhecimento, o que assim já concorda melhor com a requerida possibilidade de um
conhecimento a priori dos mesmos que deve estabelecer algo sobre os objetos antes de
nos serem dados. O mesmo aconteceu com os primeiros pensamentos de Copérnico
que, depois das coisas não quererem andar muito bem com a explicação dos
movimentos celestes admitindo-se que todo o exército de astros girava em torno do
espectador, tentou ver se não seria mais bem-sucedido se deixasse o espectador
mover-se e, em contrapartida, os astros em repouso. [Kant, 1998, 38]

Neste trecho, Kant assemelha a revolução que pretende fazer na maneira de

conceber a razão humana àquela operada por Copérnico ao defender que não é o sol ou os

astros que giram em torno da terra, mas esta que se movimenta e gira em torno daqueles.

Tratou-se de uma revolução cosmológica cujas implicações são bem conhecidas. Da mesma

forma, ao propor que se conhecesse a razão humana antes de querer conhecer os objetos,

Kant propôs uma inversão de ponto de vista que possibilitou uma nova forma de entender a

relação entre sujeito e objeto, estabelecendo uma ruptura com a filosofia que o precedeu. A

idéia que gostaria de defender aqui é a de que a maneira como Émile Durkheim propôs

entender a moral também consistiu em uma espécie de “revolução copernicana”, na medida


em que defendeu outra maneira de entender a moral, que pressupôs um deslocamento de

sua origem e de seu fundamento.

Para o autor, a moral não seria algo oriundo da vontade divina, como no caso da

teologia, ou de qualquer forma de razão universal, constitutiva de cada ser humano, como

no caso de boa parte da filosofia. Ao contrário, a sociedade, entendida como conjunto das

interações e representações sociais elaboradas ao longo da história, é que seria sua

verdadeira origem, e na sociedade mesma que se deveriam encontrar as categorias

fundamentais inerentes a esse tipo de problema. Tratou-se, sobretudo, de propor uma

maneira “sociológica” de abordar a questão, que, a seu ver, deveria constituir uma ruptura

com a abordagem propriamente filosófica. Para sustentar tal interpretação, discuto a seguir

alguns dos aspectos mais importantes da teoria moral construída por Durkheim, procurando

destacar de que modo esta se diferencia das duas principais vertentes de filosofia moral na

França da época de Durkheim e com as quais debateu continuamente, quais sejam, o

kantismo e o utilitarismo.

Na verdade, trata-se de um tema discutido em minha dissertação de mestrado e que

faz parte de um trabalho, ainda em andamento, que tem por objetivo apreender os principais

elementos constitutivos da teoria moral de Émile Durkheim. Na dissertação, procurei

defender o argumento de que sua incursão por este terreno foi motivada pelo interesse em

fundar uma “Ciência da Moral” – leia-se uma “Sociologia da Moral -, que, segundo sua

concepção de ciência, deveria consistir em um empreendimento intelectual diverso da

Filosofia Moral, o que pressupunha lidar com o problema da “moral” de uma maneira

diferente, no âmbito de uma epistemologia indutivista que privilegia a análise empírica,

tomando a moral enquanto fato, fato social.


De modo geral, o principal argumento a ser defendido é o de que todas as diferenças

em relação a essas outras abordagens, e a própria “revolução copernicana” resultam do

seguinte:

1) Da pretensão de fazer uma “Ciência da moral”, que deveria ser algo

diferente de uma “Filosofia Moral” [divergência quanto aos objetivos e

quanto à própria metodologia]

2) Da proposição da sociedade como origem e fundamento da moral.

2. O Debate com a Filosofia Moral

Nem utilitarismo, nem kantismo. Na verdade, nenhuma dessas teorias, predominantes

na França do XIX, havia dado, na opinião de Durkheim, tratamento científico para o

problema moral. As afirmações equivocadas a respeito de sua origem, de seu fundamento e

de sua finalidade, bem como sobre as máximas concretas que deveriam orientar a conduta

seriam resultantes da adoção de um princípio epistemológico inadequado, incompatível

com uma abordagem científica do problema, ao menos segundo os cânones da ciência

predominantes à época.

Dedução. Era esse, pois, segundo Durkheim, o princípio epistemológico comum a toda

tradição filosófica que, por um caminho ou por outro, teria conduzido os diversos autores à

proposição de soluções teóricas inconsistentes com a realidade dos fatos. E, deve-se notar,

era propriamente a “realidade dos fatos” o único recorte que interessava a Durkheim.

Portanto, foi exatamente a rejeição ao dedutivismo que permitiu ao sociólogo atirar não em

dois, mas em vários coelhos com uma só cajadada e, assim, pôde preparar o terreno sobre o

qual construiu sua própria teoria, alicerçada sobre o princípio da indução. Em verdade, a
coadunação de todos os sistemas filosóficos em torno dessa variável epistemológica tratou-

se de procedimento corrente em seus escritos, desde seu artigo de 1887, La Science Positive

de la Morale en Allemagne, passando pela introdução a La Division du Travail Social, de

1893, até seu último escrito, a Introduction do livro que estava sendo gestado, La Morale,

redigida em 1917.

Nesse primeiro texto, deparamo-nos com referências explícitas a esse elemento comum

a toda Filosofia Moral por duas ou três vezes e, em todas elas, nota-se que Durkheim tem

como objetivo chamar a atenção para o fato de que mesmo aquelas doutrinas que, num

primeiro olhar, pareceriam apresentar maior afinidade com o indutivismo, em virtude de

suposto embasamento nos fatos, seriam, também elas, dedutivas. Isso ocorreria porque em

toda escola de Filosofia Moral havia em comum o procedimento de construir um sistema de

pensamento a partir de idéias simples e estabelecidas a priori, as quais renderiam todos os

frutos se fossem desenvolvidas logicamente. Enfim, é com certo tom de ironia que

Durkheim (2003, p. 107) procura apontar que, apesar das consideráveis diferenças

existentes entre seus sistemas, todos os moralistas estariam presos a um mesmo problema,

afinal:

Até agora, todas as escolas de moral praticaram o mesmo método: a dedução. A única
diferença entre a moral intuitiva e a moral dita indutiva é que a primeira toma uma
verdade a priori por princípio, e a segunda, um fato da experiência. Mas, tanto para uma
como para a outra, a ciência consiste em deduzir dessas premissas, uma vez postuladas, as
conseqüências que elas implicam. Uma parte da noção de utilidade, a outra de um conceito
de dever ou de bem, mas é tão evidente para uma como para outra que toda moral está
contida numa idéia simples e que é necessário apenas desenvolver essa idéia.

Em oposição a tal procedimento, Durkheim sustenta que é somente mediante um

meticuloso estudo da realidade que se poderá chegar a uma idéia mais ou menos exata do
que é a moral, e quais são as causas e as funções de cada uma das regras existentes no seio

das inúmeras sociedades. Portanto, mais do que querer determinar logo de início um

sistema que dê conta de toda a realidade, a atitude demandada de todo aquele que intenta

seguir os cânones da ciência deveria ser inteiramente outra, qual seja, a de reconhecer que

“a este ponto do estudo não sabemos nada nem poderíamos saber nada. Ignoramos

totalmente o que é que faz do homem um ser moral, quais são as causas que suscitaram

estados de espírito diversos, idéias e sentimentos que constituem a moralidade”(1975b

[1920], p. 326). Além dessa divergência mais geral, considerou insuficientes as definições

de moral apresentadas pelas escolas com que debateu, pelo fato de que não teriam

apreendido a dualidade que a constitui, qual seja, a dimensão do dever e do bem. Isso teria

ocorrido porque teriam deixado escapar seu verdadeiro fundamento, a sociedade, único

passível de explicar empiricamente essa dupla característica inerente a toda e qualquer

regra moral.

2.1. O debate com o utilitarismo

Em relação ao utilitarismo, as críticas de Durkheim abrangem duas categorias. De

uma parte, ele rejeita que o fundamento da moral seja única e exclusivamente o interesse;

de outra, como conseqüência, alega que, por ter atribuído ao interesse o estatuto de força

motriz da moralidade, teria ignorado uma característica constitutiva desse fenômeno, qual

seja, seu caráter universalmente imperativo:

Além do mais, o prazer não pode ser o fundamento de uma lei obrigatória. Com efeito,
para que a lei seja obrigatória, é preciso que possa ser observada por todos e por aquilo
que todos possam reconhecê-la, quaisquer que sejam suas experiências e seu grau de
instrução. A lei moral não pode ser reservada a alguns homens; ela não é um favor
destinado a uma pequena aristocracia como acreditaram os antigos algumas vezes; não
é um luxo, algo supérfluo que se pode viver sem: ela é necessária. É preciso, portanto,
que todos os homens possam perceber a lei moral em um só lance de olhar (...) Mas se a
lei moral é fundada sobre o interesse, ela poderia satisfazer essa condição?
Evidentemente não. Nada é tão difícil como reconhecer nosso verdadeiro interesse; é
preciso para isso uma longa experiência, e os resultados obtidos ainda não estariam de
acordo. A lei moral fundada sobre o interesse não pode, pois, ser obrigatória, portanto,
ela não satisfaz a duas condições obrigatórias da lei moral. (Durkheim, 2004: 109)

Em seus escritos posteriores, a contenda é retomada em outro nível, quando o autor

procurou se opor à tese de que seria normativamente possível erguer uma moral coletiva

com base em uma ética do auto-interesse ou, segundo seus termos, do egoísmo. Para o autor,

o “egoísmo ético” – representado, sobretudo, por Hobbes e Spencer, mas, também, em parte,

por Bentham e James Mill – teria deduzido erroneamente que apenas a ação que tivesse

como conseqüência a promoção do interesse individual seria verdadeiramente útil e,

portanto, socialmente boa. Isso porque, segundo sua visão, mesmo que também existissem

no Homem impulsos egoístas, como seria possível afirmar que o egoísmo seria o princípio

motor da moralidade, se esta necessariamente demanda o altruísmo? Para Durkheim (2003:

72), tal coisa seria uma contradição, uma vez que “o altruísmo não vem do egoísmo, pois

nada deriva de seu contrário”.

No que se refere especificamente à crítica a Bentham e Mill, o autor avança um pouco

mais, questionando o próprio conceito de utilidade. Em primeiro lugar, tematiza as

complicações relativas à premissa do cálculo da utilidade e em segundo a impossibilidade de

que a noção de utilidade possa oferecer uma explicação coerente para a questão sobre a

finalidade da moralidade.

Ora, de acordo com a concepção de Durkheim, uma regra moral é uma regra de

conduta pré-estabelecida e que se manifesta imediatamente às consciências, sem que muitas

vezes o homem se dê conta disso ou questione longamente acerca do que deve fazer; em
cada circunstância, a regra moral deve impor-se com toda clareza, dispensando qualquer

mediação. Se, como querem os utilitaristas, a regra moral dependesse do cálculo, este

operaria como uma mediação entre a “regra em si” e a determinação da conduta, tornando

as coisas um pouco mais complicadas; seria preciso grande esforço mental para tal cálculo

e somente depois disso é que a consciência poderia então informar a vontade. Portanto, a

afirmação de que a promoção da utilidade seria o fim da ação moral resultaria em algo

bastante contestável, uma vez que a própria idéia do que é útil não consiste em

representação suficientemente clara nas consciências, contrariando uma das premissas

fundamentais da regras morais. Enfim, conforme afirma Durkheim (1975b [1893], p.265)

no seguinte trecho, a própria proposição da utilidade como algo obtido mediante cálculo já

seria um problema para que esta fosse aceita como finalidade ou mesmo como fundamento

da lei moral:

Sejam as práticas morais úteis ou não à sociedade, o que é certo é que geralmente não
é em vista desse fim que elas são estabelecidas; porque, para que a utilidade coletiva
seja a mola propulsora da evolução moral, seria preciso que, na maior parte dos casos,
ela pudesse ser objeto de uma representação assaz nítida para determinar a conduta.
Ora, esses cálculos utilitários, fossem eles exatos, são combinações de idéias muito
eruditas para agir com intensidade sobre a vontade; seus elementos são muito
numerosos e as relações que os unem, complexas.

Para além dessa observação crítica relativa aos problemas implicados na noção de

cálculo, insiste ainda sobre a definição mesma de “utilidade social”, com a intenção de

discutir em que medida tal noção pode ou não ser considerada como a finalidade última da

regra moral. Na interpretação do sociólogo, existiria um fato muito simples que sustentaria o

argumento de que a utilidade não pode ser a finalidade da moral, fato que se refere à
existência de coisas que são úteis a uma sociedade, mas que não são consideradas morais,

assim como há coisas morais que não são verdadeiramente úteis.

Como conclusão, o sociólogo (Durkheim, 1975 [1893]: 266) defendeu que a idéia de

utilidade não contém em si nada que possa justificá-la como fator de criação da moral,

tampouco como finalidade à qual tende toda a ação moral, afinal, “é bem certo que os

mandamentos da moral, mesmo que pouco complexos, não têm primitivamente por fim o

interesse da sociedade”. Na verdade, o único papel que a utilidade poderia desempenhar em

relação às regras morais seria o de realizar certa “triagem”, eliminando progressivamente

aquelas que fossem nocivas à sociedade; no entanto, a utilidade jamais é o fator de criação

de uma regra moral.

II. A CRÍTICA DE DURKHEIM AO KANTISMO

Ao lado do utilitarismo, a teoria moral de Kant foi o principal alvo de Durkheim em

seu debate com a Filosofia, sendo que as referências a ele são ainda mais freqüentes e mais

complexas. Ou seja, enquanto as referências ao utilitarismo são mais simples, diretas e

concentradas em algumas obras específicas, os argumentos que dizem respeito à obra

kantiana encontram-se espalhados por todos os seus escritos sobre a moral, muitas vezes

aparecem de forma indireta e, em certas ocasiões, Durkheim utiliza-se de um raciocínio um

tanto sinuoso para estabelecer qual seu ponto de vista em relação à teoria do filósofo

alemão.

Essas características podem ser explicadas, em primeiro lugar, pela complexidade

inerente aos próprios escritos de Kant, inseridos no âmbito de um sistema, que exigem maior

cuidado para serem devidamente entendidos. Quanto à maior atenção dedicada a esse autor,

é possível explicá-la não apenas pelo fato de que o kantismo ter se tornado o mais influente
pensamento nos séculos XVIII e XIX, inclusive na França, mas também porque muitas de

suas idéias estão presentes de maneira marcante na teoria sociológica do próprio Durkheim,

especialmente em virtude do perfil de sua formação na École Normale. O apreço pela

filosofia de Kant deveu-se especialmente ao fato de que o sociólogo considerava importante

o empreendimento kantiano de tentar fundamentar a possibilidade de um conhecimento

inteiramente calcado na razão e, sobretudo, de uma moral racional, o que o levou a afirmar

que, dentre todas as filosofias produzidas pela Alemanha, o kantismo era a única suscetível

de conciliação com os interesses e exigências da ciência, desde que fosse considerada

corretamente (Cf. Durkheim: 1975b[1893], p. 279).

Mais especificamente, para ele, o “calcanhar de Aquiles” da filosofia prática de Kant

residiria no fato de que este procurou fundamentar a moral em um princípio inteiramente a

priori, o que o teria afastado definitivamente do campo da ciência. Ora, é possível perceber

aqui que o ponto fulcral da divergência entre esses dois pensadores se refere antes de tudo à

própria concepção acerca de qual é o conhecimento possível e verdadeiro. Para o sociólogo,

apenas os fatos podem ser conhecidos e é apenas com isso que a ciência deve preocupar-se,

dado que não considera real a possibilidade de qualquer conhecimento a priori, isto é,

anterior à própria experiência. Quanto a esse ponto, afirmou que

É possível que exista uma moral eterna, inscrita em qualquer espírito transcendente,
ou imanente às coisas e com relação à qual as morais históricas não são mais do que
aproximações sucessivas: trata-se de uma hipótese metafísica que não vamos discutir.
Mas, em todo caso, esta moral é relativa a certo estágio da humanidade e, dado que
esse estágio ainda não se realizou, não apenas não seria obrigatório para as
consciências sãs, mas ainda deve ser nosso dever combatê-la (Durkheim: 1975b
[1893], p. 273).
Na verdade, aqui nos deparamos com uma divergência que se refere ao próprio

fundamento atribuído à moral. Quanto a isso, o argumento que defendo é precisamente o de

que, no que tange o problema da moralidade, todos os pontos de tensão entre esses dois

autores são uma conseqüência necessária da substituição da idéia kantiana de Razão prática

pela idéia durkheimiana de sociedade como sendo o fundamento real da moralidade. De

maneira mais específica, é possível identificar os efeitos dessa inversão em aspectos

bastante determinados, como aqueles relativos aos significados dos conceitos de dever e de

autonomia, bem como no que se refere aos elementos constitutivos da moral e à sua

finalidade.

Um primeiro problema seria relativo à aplicação da máxima formal para a dedução

de regras particulares, isto é, concretas, o que consistiria na primeira evidência da falha da

teoria moral de Kant. De acordo com a tese de Durkheim, a moral não pode ser apenas a

aplicação de uma lei geral; na verdade, trata-se de um conjunto de regras muito específicas

que determinam a conduta nas diversas situações e a proposição de uma máxima geral,

como a formulação do imperativo categórico, não resistiria à verificação empírica. Isso se

justificaria em função da tese de que a moral é um dever porque é um “imperativo social”:

é a sociedade que ordena ao indivíduo agir de tal ou qual maneira. Considerando, pois, que

a obrigatoriedade da moral se refere ao fato de que esta outra coisa não é senão um

imperativo social, qual seria, então o verdadeiro fim da ação moralmente orientada? Para

ele, a ação moral é aquela que se volta para um fim que transcende os indivíduos, que seja

qualitativamente superior a eles. Vejamos como procura resolver a questão, ao afirmar o

seguinte:

Se não podemos estar vinculados pelo dever senão a sujeitos conscientes, depois que
tivermos eliminado todo sujeito individual, não resta outra finalidade à atividade
moral que o sujeito sui generis, formado por uma pluralidade de sujeitos individuais.
Chegamos, pois, a esta conclusão: se existe uma moral, um sistema de deveres e
obrigações, é preciso que a sociedade seja uma pessoa qualitativamente diferente das
pessoas individuais que compreende e de cuja síntese é o resultado (Durkheim: 1994,
p. 80)

Além de divergir quanto à finalidade do dever moral, o sociólogo aponta outros

problemas inerentes à concepção kantiana de dever. Na verdade, sustenta que haveria uma

insuficiência na própria explicação de Kant para o caráter obrigatório da moral, por tratar-

se de explicação que não encontra respaldo nos fatos. Conforme é possível perceber no

trecho a seguir, embora tenha atribuído a Kant o mérito de ter percebido a moral enquanto

um dever, Durkheim entende que ele falhou em explicar a origem desse caráter obrigatório.

De acordo com a leitura do sociólogo, a fonte do equívoco é a concepção errônea acerca da

natureza humana e mesmo sobre a própria origem da moralidade, uma vez que Kant teria

restringido a moral ao plano da pura racionalidade:

A hipótese kantiana segundo a qual o sentimento de obrigação seria devido à


heterogeneidade radical da razão e da sensibilidade, é dificilmente conciliável com o
fato de que os fins morais são, por um de seus aspectos, objetos de desejo. Se, em certa
medida, a sensibilidade tende ao mesmo fim que a razão, ela não se humilha
submetendo-se a esta última. (Durkheim: 1994, p. 71)

Para Durkheim (1975b[1908], p. 309), o dever não é o único móbil da vontade, como

sugeriu Kant, mas defende que “a autoridade imperativa é necessária, mas, apóia-se sobre

um desejo”; portanto, essas duas dimensões são necessárias para que aconteça a ação

moral, e é isso que ocorre na realidade, pois, “os dois móbeis, dever e bem, penetram-se um

no outro e se encontram em proporções diversas no ato moral”.


Outro aspecto da teoria kantiana analisado criticamente por Durkheim concerne à

possibilidade de conciliar logicamente o caráter inevitavelmente obrigatório da moral com

a exigência racional de autonomia, que deveria ser considerada como o elemento central da

moralidade. Na verdade, essa foi uma questão levantada por Kant e que Durkheim

considerou realmente essencial, procurando resolvê-la de uma maneira diferente. No livro

“Educação Moral”, as últimas páginas do sétimo capítulo e as primeiras do oitavo capítulo

são dedicadas à exposição do problema, em que procura apresentar uma síntese da solução

kantiana e, ao mesmo tempo, criticá-la.

Durkheim1 refere-se exatamente a essa questão e aponta que, logo de início, a

solução kantiana padeceria de um problema lógico. Se fosse aceito seu argumento de que é

a heterogeneidade entre razão e sensibilidade o fator explicativo do caráter obrigatório da

moral, tal caráter não poderia ser uma característica constitutiva da própria regra, mas seria

explicado pela natureza do homem. No entanto, Durkheim (2001, p. 171171) diverge dessa

explicação, sustentando que “tal hipótese seria completamente arbitrária”, afinal, “tudo

prova, pelo contrário, que a própria lei moral se encontra investida de uma autoridade que

infunde respeito à própria razão. Nós sentimos que ela domina não só a nossa sensibilidade,

mas toda a nossa natureza, até nossa natureza racional”.

Portanto, a explicação kantiana para conciliar obrigatoriedade e autonomia não

poderia ser considerada legítima, uma vez que não teria levaria em conta que o caráter

1
Nas aulas sobre a educação moral, Durkheim (2001,p. 170) resumiu da seguinte maneira a explicação
kantiana acerca da relação entre obrigação e autonomia : “Eis como Kant julga resolver esta antinomia. Por si
mesma, diz Kant, a vontade é autônoma. Se a vontade não se submetesse à ação da sensibilidade, se ela fosse
constiuída de forma a conformar-se unicamente com os preceitos da simples razão, ela elevar-se-ia ao dever
espontaneamente, pelo simples impulso da sua natureza. Para um ser puramente racional, a lei perderia seu
caráter obrigatório, o seu aspecto coercitivo; a autonomia seria completa. Na realidade, porém, nós não somos
puras razões; possuímos uma sensibilidade que tem sua natureza própria e que é refractária às ordens da
razão. Enquanto que a razão abrange o geral, o impessoal, a sensibilidade, pelo contrário, tem uma afinidade
com o que é particular e individual”.
imperativo advém da própria regra moral, independentemente de qual seja a constituição da

nossa natureza. Além disso, segundo Durkheim, esse mesmo caráter imperativo se

estenderia também à nossa dimensão racional, o que nos leva à conclusão de que mesmo

que a sensibilidade pudesse ser eliminada por completo, a moral não perderia seu caráter

impositivo. Certamente, é preciso considerar que a razão tal qual concebida na teoria

durkheimiana é muito diferente daquela presente no sistema kantiano, mas isso seria uma

questão para outro texto.

Enfim, a atenção dedicada ao estudo crítico dessas duas vertentes pode ser explicada

não apenas pelo fato de que eram os sistemas filosóficos mais conhecidos na França

daquele período2, mas também porque podiam ser considerados como o ponto culminante

de duas grandes idéias sobre a moral que, de um lado, definiam-na apenas como um bem e,

de outro, tão somente como um dever. Por isso, quando Durkheim debate com os autores

dessas escolas, seus argumentos podem ser generalizados a quase toda tradição filosófica,

conferindo sustentação e legitimidade para a edificação de uma nova forma de lidar com

esse tema, no âmbito da Sociologia.

3. A Proposição de Uma Nova Teoria Moral

O ponto de partida da formulação de uma nova teoria moral deve ser buscado na

própria concepção quanto ao que Durkheim considerava o conhecimento “verdadeiro”

sobre a moral, qual seja, aquele que depende da observação constante e contínua da

realidade, uma vez que o que é moral para uma sociedade é algo que já está dado. Enfim, o

que está aqui pressuposto é a tese fundamental de que, aos olhos da ciência, importa o que a

2
Conforme a constatação de Durkheim (2003a, p. 11), “na França só se conhecem dois tipos de moral: a dos
espiritualistas e kantianos, e a dos utilitaristas”.
moral é, não o que dever ser. Com relação a isso encontramos argumento bastante explícito

no texto redigido em 1917, em uma formulação reveladora da distância que separa

Durkheim dos filósofos com quem debateu. No trecho transcrito mais abaixo, é possível

notar que o autor percebe como traço comum dos moralistas o procedimento que toma

como ponto de partida uma intuição, continente de toda a verdade sobre a moral, que basta

que seja cuidadosamente desenvolvida para que seja criado todo um sistema de verdades a

esse respeito:

Sem dúvida, sabe-se muito bem que os filósofos divergem a respeito do modo como a
moral deve ser formulada e traduzida em conceitos: disso decorrem os debates que
duram desde quando a filosofia é aplicada às coisas morais. Entretanto, malgrado
essas divergências, estima-se que a moral esteja contida em uma visão muito simples,
repousa sobre uma noção elementar que não supõe qualquer pesquisa laboriosa,
metódica, científica, que não poderia ser ocasião de verdadeiras descobertas (...). Mas,
com que direito atribuem à vida moral essa situação privilegiada no conjunto do real?
Para a ciência, não existe realidade que seja imediatamente evidente por ela mesma
(Durkheim: 1975b [1920], p. 321)

Ainda com relação a esse mesmo texto, é digno de nota tratar-se do último escrito

de Durkheim que, segundo Mauss (1975, p. 313), “ele havia iniciado – em um último ato

de energia e de espírito de dever – mesmo sabendo que não chegaria a concluí-lo”. E foi

exatamente na parte em que Durkheim chegou a finalizar a redação, qual seja, a

introdução ao livro, que o autor tratou de maneira mais detida das teorias morais

existentes e da crítica a essas. Na verdade, o sociólogo tinha a clara convicção de que a

proposição de sua própria teoria moral demandaria, antes de qualquer outra coisa, a

crítica às teorias morais, uma vez que, no próprio índice dos assuntos que deveriam ser

abordados em seu livro, tal crítica figurava exatamente como a primeira etapa a ser

percorrida.
De fato, ainda nas primeiras páginas desse texto, é possível encontrar uma passagem

em que Durkheim resume toda sua crítica a Filosofia Moral em geral. Trata-se de uma

síntese completa, cuja formulação deve ser lida como a expressão de sua concepção mais

madura a esse respeito, resultado não apenas de anos de reflexão sobre as implicações do

procedimento filosófico, mas especialmente de um aprofundamento de sua própria teoria e

de sua visão sobre os limites e possibilidades da ciência e sobre a natureza social da

moralidade. Vejamos, pois, em excerto um tanto longo, se bem que fundamental, como é

possível resumir o pensamento de Durkheim sobre o procedimento dos filósofos da moral,

em contraposição ao qual propôs a criação de uma Ciência da Moral:

Eis como, até o presente, procederam os moralistas, de qualquer escola que tenham
pertencido. Eles colocam em princípio que o sistema completo das regras morais está
contido em uma noção cardeal do qual tal sistema não é senão o desenvolvimento. Eles
se esforçam por atingir tal noção e, uma vez que acreditam tê-la encontrado, não resta
mais que deduzir os preceitos que ela implica, para obter a moral ideal e perfeita.
Pouco importa que esta moral concorde com o que os homens praticam efetivamente,
ou se a contradiz: a ele compete reger os costumes, de fazer a lei. Ele não deve
preocupar-se com a ética tal qual ela é, mas com a ética tal qual ela deve ser. Mas tal
noção fundamental, como obtê-la?(...) Com muita freqüência, é à psicologia que o
moralista interroga sobre essa noção inicial. Admite-se como uma evidência que a
moral enquanto regra suprema da conduta deve encontrar-se naturalmente
compreendida na idéia que se faz da natureza humana de que deve ser deduzida. Se é
sabido o que é o homem, sabe-se, ipso facto como ele deve comportar-se nas principais
circunstâncias da vida, e não é isso o que constitui a moral? Ela aparece como a
simples aplicação das leis que a psicologia crê haver estabelecido. Mas, inicialmente,
essa concepção de moral como psicologia aplicada desconhece uma das características
distintivas da moral. (...) A moral consiste, antes de tudo, em estabelecer fins; ela dita
ao homem os objetivos que ele tende a perseguir e, por isso, ela distingue-se das
ciências aplicadas propriamente ditas. Por outro lado, como os fins morais poderiam
ser deduzidos da psicologia? O homem que a psicologia estuda é o homem de todos os
tempos e de todos os países, sempre e em todo lugar idêntico a si mesmo. As leis
psicológicas são invariáveis, assim como as leis do mundo físico. O ideal moral,
contudo, varia conforme as épocas e os lugares. (Durkheim: 1975b [1920], p. 322-23)
Em oposição a tal procedimento, o autor propõe que somente mediante meticuloso

estudo da realidade que se poderá chegar a uma idéia mais ou menos exata do que é a

moral, e quais são as causas e as funções de cada uma das regras existentes no seio das

inúmeras sociedades. Portanto, mais do que querer determinar logo de início um sistema

que dê conta de toda a realidade, a atitude demandada de todo aquele que intenta seguir os

cânones da ciência, deve ser inteiramente outra, qual seja, a de reconhecer que “a este ponto

do estudo não sabemos nada nem poderíamos saber nada. Ignoramos totalmente o que é

que faz do homem um ser moral, quais são as causas que suscitaram estados de espírito

diversos, idéias e sentimentos que constituem a moralidade” (1975b [1920], p. 326).

Mas, afinal, porque Durkheim defendia de forma tão veemente que apenas os fatos,

e não as idéias sobre os fatos ou sobre o dever ser, devem ser o objeto da investigação

científica? Porque, em sua opinião, a moral é uma complexa teia de regras, irredutíveis a

idéias gerais; isto é, os preceitos gerais não têm a força suficiente para determinar a conduta

humana em cada circunstância particular. Na verdade, o que a realidade evidencia é que o

homem sabe muito bem como agir em cada uma das situações normais do cotidiano. Isso

ocorre porque a moral possui regras muito diversas e específicas que ordenam ao homem

nas diferentes esferas de sua vida, com relação às quais qualquer princípio geral não seria

mais do que uma expressão esquemática. Foi partindo dessas premissas epistemológicas

que Durkheim teve de reformular a própria maneira de entender a moral, impulsionado a

construção de um novo modelo teórico que resultou na “revolução copernicana” no

conceito de moral.
Ora, se a ciência só poderia conhecer fatos e os fatos da sociologia eram os fatos

sociais, externos, e não idéias que se apresentavam ao puro pensar do investigador, seria

preciso que a moral tivesse tais características, para que pudesse ser objeto da sociologia.

Portanto, a seguir apresento as linhas gerais acerca do que está implicado no conceito de

moral, ou seja, “o que é a moral” na perspectiva durkheimiana, ressaltando como o autor

procurou elaborar explicações “sociológicas” para alguns temas clássicos da teoria moral,

explicações essas que pressupõem uma nova forma de entender a própria moral, de definir

sua gênese, seu fundamento e sua finalidade.

3.1. A “Letra” e o “Espírito”:


A Proposição da Moral Como Dever e Bem

Desde muito cedo, Durkheim mostrou-se convicto quanto ao duplo caráter da

moralidade; afinal, temos registros de que já nas aulas em Sens (1883-1884), o futuro

sociólogo deixava entrever sua insatisfação com as teorias morais vigentes, por considerar

que, enquanto algumas colocavam seu fundamento no puro interesse, eclipsando o fato de

que a moral é sempre um dever, outras, seguindo caminho inverso, sustentavam esse último

como único móbil da ação moral. Posteriormente, essa idéia tornou-se mais clara.

Referindo-se à dimensão do dever, o autor deixa claro que tal característica emana da

própria sociedade, ao afirmar que “a coerção moral exercida pela opinião pública não se

deixa tolher por obstáculo algum; sutil como o ar, ela penetra em todo lugar”. (Durkheim:

2003, p. 52) Portanto, é a própria opinião pública que exerce a coerção, afinal, é da própria

coletividade que emana o dever.


Na mesma página, o autor ensaia argumento que parece explicar também a dimensão

do bem, isto é, da desejabilidade, por seu caráter social, quando afirma que “se toda ordem

legal se apoiasse no medo, a sociedade não seria mais do que uma prisão, onde as pessoas

só agem quando vêem o chicote erguido. Para que a sociedade seja possível, é necessário

que existam em nós alguns sentimentos de despreendimento” (ibid., p. 52). Na verdade, são

esses “sentimentos de despreendimento” que, em textos posteriores, deverão explicar

porque não apenas respeitamos, mas também amamos a regra moral, dando conta de por

que igualmente o bem é um de seus elementos constitutivos.

Ainda em relação ao “dever”, cabe observar que é considerado como o primeiro e

mais evidente elemento da moralidade (Cf. Durkheim: 1994; 2001). Na verdade, em sua

própria definição de moral, Durkheim a caracteriza como um sistema de regras que

predeterminam a conduta. Essas regras aparecem ao indivíduo como um dever,

precisamente pelo fato de que não foi ele quem as criou; são regras que têm existência

própria e que se impõem à sua vontade, do exterior para o interior. Portanto, toda vez que

alguém age moralmente, comete certa violência contra si mesmo, isso é, contra seus

próprios impulsos.

A explicação para a obrigatoriedade da moral, isso é, para essa ascendência

inconteste que exerce sobre o indivíduo, deveria ser buscada na própria noção de

“autoridade”, genericamente definida como “o caráter que atribuímos a um ser, não importa

se real ou ideal, que concebemos como constituindo uma potência superior àquela que

possuímos” (Durkheeim:1994, 85). Portanto, isso equivale a dizer que o indivíduo obedece

porque tem a percepção, mesmo que inconsciente, de que existe algo por trás da regra, algo

de que a regra é tão somente a expressão mais exterior. Afinal, que “algo” é esse? É a
sociedade, sujeito sui generis dotado de uma “consciência própria”, que é a depositária de

todos os bens morais e intelectuais produzidos pelo homem ao longo de sua história. Por

isso mesmo, o homem percebe-a como potência que o transcende infinitamente e o respeito

que nutre pela regra, o cumprimento imediato de suas prescrições não é mais do que uma

extensão do sentimento de temor e respeito que nutre por ela.

Por outro lado, é exatamente por tratar-se de uma “potência moral e intelectual” que

a própria sociedade justifica que a moral seja também um “bem”. Assim, resolve a questão

afirmando que a moral é um bem porque a própria sociedade é um bem, porque sem ela, o

indivíduo não transcenderia o estatuto de mera animalidade; portanto, o homem deseja a

regra, pode até mesmo amá-la, porque é a própria condição para qualquer outro bem que

possa desejar. Vista sob esse prisma, a moral é revelada também em seu conteúdo, não

apenas em sua forma. Esse “conteúdo” refere-se não apenas à ação concreta e determinada

que a moral prescreve, mas à realidade que a sustenta, isso é, a sociedade mesma, com as

inúmeras redes de interações sociais, das quais todos fazem parte, em alguma medida, e às

quais estamos ligados não apenas intelectualmente, mas também afetivamente.

Enfim, uma compreensão adequada da estrutura moral e de sua ação concreta na

determinação da vontade e, portanto, de sua efetividade como instância reguladora da ação,

supõe a apreensão de sua “letra” - isto é, de sua forma, de seu signo mais exterior, que é seu

caráter coercitivo, e nos remete à definição da moral enquanto dever - e também de seu

“espírito” - ou seja, aquilo que verdadeiramente a anima, os sentimentos coletivos, o

vínculo estabelecido no seio de um grupo e a ligação de cada indivíduo com esse grupo.

Com relação a isso, vale a pena trazer ao texto as seguintes palavras do autor (2002a, p. 40):

Portanto, é equivocar-se singularmente sobre sua natureza vê-la apenas de fora,


perceber apenas a sua letra. Assim considerada, ela pode de fato aparecer como uma
instrução simplesmente constrangedora, que impede os indivíduos de fazer o que
querem, e isso num interesse que não é o deles: conseqüentemente, é muito natural que
se tente derrubar esse constrangimento ou reduzi-lo ao mínimo. Mas sob a letra há o
espírito que o anima; há os laços de todo tipo que ligam o indivíduo ao grupo de que
ele faz parte e a tudo o que interessa ao grupo; há todos os sentimentos sociais, todas
as aspirações coletivas, as tradições a que se têm apego e respeito, que dão um sentido
e uma vida à regra, que anima a maneira pela qual ela é aplicada aos indivíduos.

No âmbito de uma moral laica, além dessas duas características, deveria existir

ainda o elemento de racionalidade, garantidor do que chamou de “espírito de autonomia”,

de modo que seu fundamento possa ser passível de explicação racional e suas regras

possam ser questionadas, aceitas, ou ainda, refutadas. Durkheim defendeu com ardor a

institucionalização desse tipo de moralidade que, segundo acreditava, deveria ser ensinada

na escola pública (Cf. 1992, 1995, 2001)3. De acordo com sua percepção, isso traria grande

vantagem em relação à moral religiosa, porque tornaria possível uma maior autonomia,

sem que houvesse prejuízo das outras características inerentes à moralidade. Mas, afinal, o

que levou o autor a atribuir tais características à sociedade? Porque tinha tanta convicção

de que é a sociedade a verdadeira origem e fundamento da moralidade?

3.2. A Sociedade como Origem e Fundamento da Moralidade

A resposta a tais indagações pressupõe que se faça algumas considerações sobre o

que, afinal de contas, o autor entende por “sociedade” ou, ao menos, entender quais

características que o autor lhe atribui e que seriam capazes de explicar aquilo que

constatara ser traços inerentes a todo fato moral. Uma definição mais complexa e

desenvolvida do que é a sociedade foi sendo colmada aos poucos, especialmente em

3
Os inúmeros argumentos de Durkheim em favor de uma educação moral laica podem ser considerados como
uma parte propriamente normativa de sua obra. Trata-se, contudo, de um projeto normativo, mas não
idealista, que procurava realizar o encontro entre ciência e prática, nos moldes concebidos pelo autor.
virtude de seus estudos que tinham como objetivo apreender as origens da vida religiosa.

Durante esse percurso, ao notar a origem inequivocadamente social de todos os

sentimentos e representações religiosos, pôde perceber de forma mais acurada algumas das

características mais essenciais da própria sociedade.

Por esse motivo, quase todos os seus escritos sobre a moral datados desse período,

especialmente aqueles entre 1906 e 1913, tiveram como tônica, em primeiro lugar, a

referência à histórica ligação entre moral e religião, de modo a explicar sua origem

comum, e, em segundo lugar, a alusão à noção de sagrado, que seria o cerne da explicação

para os sentimentos de amor e temor inspirados pela sociedade, e que estariam na base da

formação de todo fato moral. Essa lógica argumentativa está presente no texto já

comentado, Détermination du Fait Morale (1975b [1893]), entre outros; contudo, o texto

em que o autor faz uso desse recurso explicativo de maneira mais clara é na conferência

aos alunos da École Normale de Auteuil, no ano letivo de 1908-1909 (Durkheim: 1992).

Nessa ocasião, o sociólogo construiu sua argumentação de maneira dialética, apresentando

como postulado o fato de que a moral é um sistema de regras sancionadas (cuja

desobediência implica uma punição pré-estabelecida) e que despertam em nós um respeito

incomensurável. Fiel a sua teoria, afirma logo em seguida que, para que possa ser

cumprido um dever desse tipo, seria necessário que os atos exigidos não nos pareçam

totalmente estranhos, isso é, a regra deve exigir uma ação que, em alguma medida,

possamos desejar fazer, porque a consideramos correta, ou até mesmo, boa. O que o

autoriza a afirmar essas características a respeito da moral é, segundo Durkheim, o fato de

que a própria opinião pública a percebe dessa maneira.


Portanto, mesmo em seu caráter imperativo, quando nos ordena a ação, a regra

moral não pode abrir mão de sua outra face, isso é, não pode deixar de ser desejada, afinal,

“se a moral nada mais fosse, é provável que os homens não poderiam praticá-la” (1992, p.

614). Mas a recíproca também é verdadeira, ou seja, também não é possível que uma ação

moral seja apenas desejada, sem que o sentimento de dever seja imiscuído nessa relação

entre regra, vontade e ação. A razão para isso é que os fins morais não são da mesma

espécie que os demais fins que perseguimos em nossa vida pessoal; não fomos nós que os

estabelecemos e, no mais das vezes, mesmo um raciocínio mais imediato é insuficiente

para explicá-los. Propriamente por isso, para estar de acordo com aqueles preceitos que

consideramos moralmente bons, é preciso certo sacrifício. Afinal, seria facilmente

constatável o fato de que “em certa medida e de alguma maneira, nós fazemos violência

contra algo quando realizamos um ato moral”, porque “sim, seguimos nossos desejos, mas

também abdicamos de outros, nós violentamos nossa natureza em certa medida e de

alguma maneira, nós fazemos violência contra algo quando realizamos um ato moral”,

porque “sim, seguimos nossos desejos, mas também abdicamos de outros, nós violentamos

nossa natureza” (Durkheim: 1992, p. 615).

Enfim, qualquer que seja o sentimento predominante, a moral jamais é destituída

dessa duplicidade aparentemente contraditória. Em todos os casos, ela é algo que nos

transcende, uma vez que, quer a representemos como sistema de regras que nos comandam,

quer a percebamos como um ideal que se deseja, ela sempre aparece como realidade

vinculada a um mundo que nos é estranho, um mundo que nos toca, é verdade, mas um

mundo que nos ultrapassa infinitamente” (Durkheim: 1992, p. 616). Dada a exigência

humana de encontrar resposta, de atribuir um motivo – real ou não - para sua ação, é
preciso, pois, que o homem represente de alguma forma essa “entidade”, da qual faz parte,

que está nele, mas que o transcende. A esse ponto da discussão, Durkheim introduz uma

referência à religião, cujos símbolos foram o invólucro sob o qual as idéias morais se

apresentaram ao homem ao longo da história.

Na verdade, sua eficácia como doutrina legitimadora da ordem moral estabelecida

foi devida, sobretudo, ao fato de que ela ofereceu uma figura que podia encarnar essa

potência intangível e, assim, fornecer respostas a todas as questões envolvidas no

cumprimento da regra moral: a força divina, Deus. É mesmo notório que, no âmbito da

religião, especialmente das religiões monoteístas, a moral, tenha sido apresentada como

algo sagrado, que é preciso obedecer e amar por ser expressão da vontade de Deus. Trata-

se de uma potência investida da autoridade necessária para legislar, e a majestade com que

é representado é transferida para a própria lei, enquanto prolongamento de seu ser. Por

outro lado, diz a religião, Deus é também a potência que nos criou – à sua imagem e

semelhança - e por isso criou conosco laços de paternidade, de amizade mesmo; trata-se de

uma força com a qual podemos contar. Assim, a existência de Deus explicaria a regra

moral em sua obrigatoriedade e em sua desejabilidade, uma vez que a relação que se tem

com a regra não é mais que o reflexo da relação que se tem com a própria divindade.

Sem avançar em demasia nesse tipo de consideração, é necessário ressaltar que,

para Durkheim, o que realmente importa com relação à idéia de Deus é o caráter sagrado

que lhe atribuímos. Afinal, por definição, ele entende o sagrado como a propriedade de

uma coisa que faz dela algo proibido, a que não se ousa violar, e ao mesmo tempo bom,

amado desejado (Cf. Durkheim: 1992, p. 617; 1994, p. 59, 76-77; 1975b[1909b], p. 359 e,

especialmente, 2002b, p. 11-26, 123-138, 209-211). Mas, considerando a inexistência de


Deus, tal como exigem os pressupostos do racionalismo, devemos aceitar que a origem da

moral não seja sagrada e, portanto, nada motive a amar e a respeitar as regras? Segundo

Durkheim, não é isso o que ocorre, justamente porque o caráter sagrado atribuído a Deus

ou a qualquer divindade é, na verdade, a expressão da sacralidade imanente à própria

sociedade.

Para exprimir aquilo que entende por sociedade e, especialmente, o valor que atribui

a ela, apresenta-a como parte de nós mesmos, porque, de acordo com sua concepção, “ela

não está inteiramente fora de nós: ela está também em nós. Ela não é verdadeiramente real

e viva a não ser nas consciências particulares. Ela está em nós e fora de nós. Ela é a melhor

parte de nós mesmos. Tudo aquilo que em nós existe de verdadeiramente humano no vêm

da sociedade, tudo o que constitui nossa consciência enquanto homens nos vêm dela”

(Durkheim: 1992, p. 619).

Enfim, partindo das idéias de dever e de bem, da magnitude da moral, de sua

natureza, de sua origem que transcende os indivíduos, Durkheim realizou uma referência à

ligação entre moral e religião, procurando apontar como esta ofereceu um fundamento que

explicava todas aquelas características: Deus. Com essa alusão, preparou o terreno para

apresentar as coisas morais como bens que possuem a mesma sacralidade das coisas da

religião, embora a origem da moral, sociologicamente considerada, não seja Deus, mas, a

Sociedade. Ao comentar essa analogia entre Deus e a Sociedade, Gautherin (1992, p. 634)

percebeu que Durkheim ofereceu resposta consistente para o problema de como

fundamentar de maneira lógica e factual o fundamento da moralidade, de forma que esta

pudesse ser objeto de investigação científica, e não apenas de especulações teológicas ou

filosóficas:
Em primeiro lugar, pela analogia entre a sociedade e Deus, ele interrompe a regressão indefinida
ao fundamento da moralidade que ocupou os moralistas e pedagogos de seu tempo. Ademais, ao
postular que a sociedade é sagrada assim como Deus, Durkheim reatou os laços entre os dois
mundos que se dedicou a separar: um mundo de interesses individuais, do cálculo racional, das
equivalências e das justas proporções, de uma parte, e, de outra parte, um mundo do ideal
coletivo, da emoção e do amor acima de toda equivalência, fora de toda proporção.

Quer dizer então, que, para Durkheim, não haveria diferença alguma entre Deus e a

Sociedade, no entendimento e na explicação das coisas morais? Na verdade, para o autor,

as coisas não se passam dessa maneira. Embora a figura de Deus possa oferecer uma

explicação para as duas características essenciais da moralidade, um sistema de regras

assim fundamentado, tal como ocorre na moral religiosa, não pode ser submetido à

avaliação crítica. No âmbito de uma moral laica, ao contrário, a reflexão deve tornar-se

parte constitutiva da moralidade, de modo que seu fundamento possa ser passível de

explicação racional e suas regras possam ser questionadas, aceitas, ou ainda, refutadas.

É necessário ressalvar que, embora possa vir a se tornar um elemento constitutivo

da moralidade, não quer dizer que se trate de uma condição necessária, isso é, sem a qual a

moralidade deixaria de existir. Trata-se de algo que só pode ter lugar em uma sociedade

política, dividida pelo trabalho, e que abre espaço para a racionalidade (Cf. Durkheim:

2001, 2002a). Nesse sentido, afasta-se de boa parte da Filosofia Moral, em que é comum a

tese de que a reflexão seria o primeiro e mais importante elemento da moralidade, ao qual

as demais características estariam subordinadas. Em um evento da Société Française de

Philosophie, cujo tema era “Débat sur La Rationalité de la Morale”, Durkheim discutiu

exatamente esse problema. Em um confronto com o filósofo Gustave Belot reiterou a tese

de que somente o dever e o bem são elementos intrínsecos e absolutamente necessários à

moralidade, enquanto a reflexão é apenas um elemento desejável, que só se torna possível


se houverem condições sociais e intelectuais favoráveis (Cf. Durkheim: 1975b[1908], p.

351).

Na verdade, a própria sociologia, na medida em que se debruça sobre as regras morais

como sobre um fato, e procura explicá-la, já contribui para revelar-lhe a verdadeira

natureza e, automaticamente, introduz nela o elemento reflexivo; não quer dizer, porém,

que, com isso, a reflexão irá transformar, como num passe de mágica, a moral de uma

sociedade, ou aos olhos de quem a segue. Essa é a moral aos olhos da sociologia. Mas, é

também a moral que Durkheim defendia que fosse ensinada nas escolas, enquanto a

considerava como a única acorde com as exigências de uma sociedade que se pretendia

erigir sobre princípios inteiramente racionais, e que, fascinada pelos avanços da ciência,

buscava explicações empíricas para todas as dimensões da realidade (Cf. Baubérot: 1990;

Bayet: 1926; Bellah: 1973; Botía & Guasp: 2000; Besnard: 1976).

Durkheim tomou como sua bandeira a institucionalização desse tipo de moralidade

que, segundo acreditava, deveria ser ensinada na escola pública (Cf. 1992, 1995, 2001). De

acordo com sua percepção, isso traria grande vantagem em relação à moral religiosa,

porque tornaria possível uma maior autonomia, sem que houvesse prejuízo das outras

características inerentes à moralidade. Mas, na teoria durkheimiana, assim como na de

inúmeros outros autores, autonomia não quer dizer a possibilidade agir de acordo com tudo

o que nos vem à cabeça; é uma liberdade de ação num sentido bastante específico (Cf.

Cohen: 1975; Harms: 1990; Lévy-Bruhl: 1971). Para o sociólogo, “querer livremente não é

querer o que é absurdo; pelo contrário, é querer o que é racional, (...) é querer agir em

conformidade com a natureza das coisas” (Durkheim: 2001, p. 176).

Essa é, pois, a idéia mais importante a ser considerada sobre a sua concepção de

autonomia da vontade: uma vontade autônoma é uma vontade racional, é o desejo do


possível, daquilo que a razão considera como sendo o bem. Dessa forma, assim como uma

ação autônoma com relação ao mundo físico supõe que se conheçam as leis desse mundo, a

autonomia possível, no que se refere à moral, é aquela que implica considerar a natureza da

moral, para que se possa aderir a ela de forma espontânea e consciente, ou contribuir para

que encontre sua normalidade, caso se reconheça que ela está contrariando sua própria

razão de ser. Esse é, segundo o autor, o único modo de nos tornarmos senhores de nós

mesmos, pois, dado que não é possível nos livrarmos das forças que agem sobre nós,

devemos cuidar de nos tornarmos conscientes dessas forças, e agir sobre elas na medida do

possível.

4. Considerações Finais

Essas são, portanto, as linhas gerais da teoria moral de Durkheim, que pressupõe 1)

certa concepção de como apreender a moral, no âmbito de um projeto científico alicerçado

sobre as premissas do indutivismo, 2) um redefinição do conceito de moral e 3) uma nova

fundamentação para propostas normativas, ou seja, uma fundamentação sociológica para a

ação moral que, no caso de Durkheim coincide com a defesa de uma moralidade racional a

ser institucionalizada mediante uma “educação moral laica”. Como procurei defender no

decorrer do texto, isso implicou um deslocamento no modo como a moral vinha sendo

abordada no âmbito da teologia e mesmo da filosofia, e que pode ser caracterizado como

uma espécie de “revolução copernicana” no conceito de moral, que pressupõe um novo

ponto de vista para entender o problema.

Contudo, talvez uma aproximação com a atuação de Galileu seja ainda mais

interessante e nos forneça uma idéia mais exata do modo com que Durkheim enfrentou os

desafios que se impuseram à demonstração e, sobretudo, à aceitação de sua teoria moral e

mesmo de sua sociologia. Na França daquele período, havia diferentes propostas de


“sociologia” em disputa, sem mencionar a própria filosofia, cujos representantes com

freqüência não viam com bons olhos esse tipo de projeto positivista.

Além das propostas de sociologia sustentadas por Gabriel Tarde, de um lado, e

Renée Worms, de outro, havia ainda uma corrente que ficou conhecida como “Sociologia

Católica”, de autores como Le Play, Henri de Tourville, Gaston Richard (Marjolin, 1937).

Considerando que a principal preocupação de Durkheim era construir uma moralidade

absolutamente independente de concepções metafísicas e religiosas, não é difícil imaginar

que o autor não fosse bem visto por esse grupo de intelectuais. No terreno da filosofia a

disputa foi ainda mais acirrada, tal como pode ser constatado nas atas de algumas

discussões em que Durkheim tomou parte na Société Française de Philosophie4 e nas

defesas de tese que participou5. Não foram poucas as objeções levantadas à tese de que

seria a sociedade a verdadeira origem da moralidade e de que só assim se poderia conhecê-

la.

Galileu, após ter sido obrigado pela Inquisição a afirmar que a terra não girava em

torno do sol, não deixou de acrescentar “no entanto, ela gira”. Essa frase que se tornou

célebre pode ser entendida como a síntese do dilema vivido por pensadores no momento em

que a própria convicção quanto à verdade de uma nova teoria é colocada sob a mira do rifle

das antigas teorias dominantes. É certo que nem todos tiveram a má sorte de enfrentar

adversários como os de Galileu; por outro lado, também é verdade que toda nova maneira

de olhar um dado fenômeno, de interpretar um conceito, exige mudanças mais ou menos

profundas de se encarar certa realidade, mudanças essas que não são aceitas de forma

4
As participações mais relevantes nas discussões da referida sociedade estão reunidas no livro Sociologia e
Filosofia, 2004.
5
Algumas das argüições de Durkheim, inclusive em defesas de Filosofia, foram publicadas na Coleção
Textes, organizada por Victor Karady, 1975.
passiva, exigindo daqueles que a propõem boa dose de coragem e de persistência. Também

Dukheim, àqueles que negavam a tese de que a moral é sempre uma construção social e por

isso não é eterna, absoluta e tampouco está inscrita em qualquer forma superior de razão,

teve que constantemente repetir “no entanto, é a sociedade sua origem”.

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