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João Crisóstomo: Vida e Obra.

Publicado em 5 de dezembro de 2015

Robson Francisco das Chagas


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Robson Francisco das Chagas
Diretor do Instituto Teológico Monte das Oliveiras
João Crisóstomo, em grego Ιωάννης ο Χρυσόστομος,
Vida
Quanto a data de nascimento é divergente entre vários autores. Alguns datam o
ano de 349. Outros entre 345 e 348. Chegou-se ao ano de 309. Mas uma data
todos concordam, a do seu falecimento ocorrido em 14 de setembro de 407, na
cidade de Antioquia da Síria na Ásia Menor, atualmente Antakaya.
Filho de uma família cristã muito rica, considerada pela sociedade e pelo Estado.
Seu pai era comandante de tropas imperiais no oriente, um cargo que causou
sua morte cedo. Estudou filosofia e retórica e foi educado pelos maiores mestres
do seu tempo, tanto científicos quanto religiosos, não prejudicando sua
formação. O menino, desde pequeno, já demonstrava a vocação religiosa,
grande inteligência e dons especiais.
No ano de 370, depois de colaborar três anos com o bispo Melécio de Antioquia
e de ter recebido o batismo, foi ordenado leitor. Ainda jovem, sua mãe Antusa
morreu e ele decidiu então, mesmo com a oposição familiar, viver algum tempo
como ermitão, em companhia de um monge no deserto durante quatro anos.
Passou mais dois anos, retirado numa gruta sozinho, dedicando-se a uma vida
ascética, de oração, estudando as sagradas escrituras para então considerar-se
pronto.
Já conhecido pela sabedoria, prudência e pela oratória eloqüente, de volta à
cidade de Antioquia, recebeu o convite para se tornar diácono, dedicando cinco
anos à preparação do seu sacerdócio e aos caminhos de sua pregação.
Ao longo deste tempo continuou o estudo das escrituras sagradas e, quando
regressou a Antioquia foi ordenado Diácono por Melécio e Sacerdote pelo bispo
Flaviano em 386. Sendo encarregado por este como o principal pregador da
igreja da cidade, cargo que desempenhou até aos 48 anos de idade. Nesta
época foi eleito bispo de Constantinopla. Uma vez bispo, quis começar uma
restauração eclesiástica na qual - quiçá por falta de habilidade - a sua boa, e
decidida, vontade se deparou com os obstáculos existentes e com os muitos
interesses de alguns privilegiados. Pouco a pouco entrou em conflito com parte
do clero, e, pouco depois, com a imperatriz Eudoxia. Este período de 12 anos,
foi o mais fecundo da sua vida e nele proferiu as sua homilias mais conhecidas.
Sua cidade vivia a efervescência de uma revolta contra o Imperador Teodósio I.
O povo quebrava estátuas do imperador e de membros de sua família. Teodósio,
em troca, agia ferozmente contra tudo e contra todos. Membros do senado
estavam presos, famílias inteiras tinham fugido e o povo só encontrava consolo
nos discursos e pregações de João, chamado por eles de Crisóstomo, isto é :
"boca de ouro", apelido dado a João de Antioquia pelos bizantinos, três séculos
depois (Séc. VI). Tanto que foi o incumbido de dar à população a notícia do
perdão imperial.
Alguns anos se passaram e a fama do santo só crescia e, quando morreu o Bispo
de Constantinopla, João foi eleito para sucedê-lo. Desenvolveu um belo trabalho
pastoral, que torna patente seu ideal de fé; com evangelização rural; construção
de hospitais; execução de procissões antiarianas (arianismo:- doutrina, que
negava a igualdade substancial de Cristo e o Pai, proposto pelo monge
alexandrino Ário) sob a proteção da polícia imperial; discursos em que
recriminava e castigava os vícios e as friezas; severas advertências aos monges
indolentes e tantas outras pregações que suscitavam admiração ou ódio.
Constantinopla era a grande capital do Império Romano, que havia transferido o
centro da economia e cultura do mundo de então, para a Ásia Menor. Entretanto,
para João era apenas um local onde o clero estava mais preocupado com os
poderes e luxos terrenos que os espirituais. Ali reinavam a ambição, a avareza,
a política e a corrupção moral.
Como verdadeiro pastor, tratava a todos com cordialidade, em particular nutria
uma ternura especial pela mulher e dedicava uma atenção particular ao
matrimônio e à familia e convidava os fiéis a participar na vida litúrgica, que fez
com esplêndida e atrativa com criatividade genial.
Como Bispo abandonou então os discursos e se dispôs a enfrentar a luta e, como
conseqüência, a perseguição.
Mas apesar de sua bondade se viu envolto em freqüentes intrigas políticas, por
suas contínuas relações com as autoridades e as instituições civis. Arrumou
inimigo tanto entre o clero quanto na corte.
Liderados pela imperatriz Eudoxia e por Teófilo de Alexandria reuniram o Sínodo
da Encina, perto de Calcedónia, onde, com acusações falsas, conseguiram tirar
João Crisóstomo do cargo, que foi condenado ao exílio e acabou por ser
desterrado para a Arménia em 404. Mas essa expulsão da cidade provocou
revolta tão intensa na população, que o Bispo foi trazido de volta para reassumir
seu cargo. Entretanto, dois meses depois, foi exilado pela segunda vez, para um
lugar mais distante, na extremidade oriental do Mar Negro. Neste, já com a saúde
muito debilitada, ele não resistiu e morreu.
Os seus restos mortais foram levados para Constantinopla em 438, e o
Imperador Teodósio II, filho de Eudoxia, pediu publicamente perdão em nome de
seus pais.
Obra
Os escritos teológicos de Crisóstomo é muito grande. Escreveu basicamente
sermões, alguns tratados e um número não desprezível de cartas.
Os aspectos doutrinários e polêmicos causavam grande impactos, como por
exemplo os escritos: “Sobre a natureza incompreensível de Deus”, “As
Catequeses baptismais” e “Homilias contra os judeus”.
Escreveu cerca de 90 cartas a respeito do Evangelho de Mateus e 34 cartas
sobre o Evangelho de João e a Epístola aos Hebreus e mais 55 discursos aobre
o livro de Atos dos Apóstolos, que foi considerado o único comentário completo
e mais abrangente deste livro da Bíblia deixado pela anitguidade cristã. No que
diz respeito aos tratados, devemos salientar: “Sobre o sacerdócio” que é
considerada a sua obra prima e que trata da espiritualidade sacerdotal, “Sobre a
vida monástica” e “Sobre a virgindade”. Escreveu cerca de 250 cartas no período
em que foi exilado.
Ao comentar o livro de Atos dos Apóstolos, Crisóstomo tenta criar um modelo de
sociedade baseado na Igreja Primitiva. É uma ‘utopia social’, a idéia de uma
cidade ideal, tentando dar uma alma e um rosto cristão à cidade. Em outras
palavras, Crisóstomo entendeu que não era suficiente dar esmolas, ajudar os
pobres, caso por caso; era necessário criar uma nova estrutura, um novo modelo
de sociedade baseado na visão do Novo Testamento. Por isso, podemos
considerá-lo um dos grandes pais da Doutrina Social da Igreja.
A maior de renúncia vista por Crisóstomo
A humanidade e a divindade de Jesus: “O Apóstolo diz, "Sendo de forma
(condição) divina." (Fil 2, 6) Se diz "de forma (condição)" como podeis sugerir,
vós, ó arianos, que Ele era uma energia? Mas não diz-nos a seguir que
"esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante
aos homens." (Fil 2, 7) "A forma de servo" é, porventura, a energia de um servo
ou a natureza de um servo? É evidente que é a natureza de um servo. Assim, a
"forma de Deus" indica que era de igual natureza do que Deus, que era Deus e
não uma energia.” Sobre a Carta aos Filipenses VI, in Flp 2, 5-8
João Crisóstomo tem uma importância impar enquanto exegeta na medida em
que ele é a norma teológica significativa da Escola de Antioquia. Não recusando
as leituras alegóricas e místicas dos textos da Biblia, defendia que as mesmas
só deveriam ser normativas quando os próprios autores das mesmas
sugerissem, directa ou indirectamente, este significado mais profundo que, não
obstante, ele reconhecia como sendo o mais autêntico.
A sua cristologia, com uma clara finalidade ortodoxa que o leva a evitar
contendas, orbita sobre as afirmações inequívocas de que Jesus Cristo é
simultaneamente verdadeiramente Deus e verdadeiramente Homem numa
mesma pessoa. Acredita na, e defende a, presença real de Cristo na Eucaristia.
Para João a figura de Maria é, igualmente, de grande importância: ela é a
primeira dos que creram em Jesus e, assim, o deutero-modelo da vida cristã
(sendo o modelo primeiro, primigénito e generativo o próprio Jesus Cristo). A
atenção de João Crisóstomo para com os mais desfavorecidos é uma das suas
mais relevantes características, a ponto de ter sido ele a celebrizar a expressão
“o pobre é um ‘Alter Christus’”. Para ele, de fato, oferecer atenção e dedicação
a um pobre é dar ao próprio Cristo: Não há diferença alguma em dar ao Senhor
e dar ao pobre, pois Ele mesmo disse “quem dá a estes pequenos é a mim que
dá.” ("Sobre o Evangelho de Mateus", LXXXVIII, 2-3)
Ao comentar os Atos dos Apóstolos, propõe “o modelo da Igreja primitiva, como
modelo da sociedade, desenvolvendo uma "utopia social", a idéia de uma cidade
ideal, tratando de dar uma alma e um rosto cristão à cidade. Em outras palavras,
Crisóstomo entendeu que não era suficiente dar esmolas, ajudar aos pobres,
caso a caso, mas que era necessário criar uma estrutura, um novo modelo de
sociedade (...) baseada na visão do Novo Testamento. Por isso, podemos
considerá-lo um dos grandes pais da Doutrina Social da Igreja.”
A oposição com o judaísmo
Devido a um conjunto de sermões que escreveu sobre os cristãos e suas
necessidades delimitando o âmbito religioso da sua fé, face a um convívio social
intenso com a comunidade judaica, que João via como extremamente benéfica
e salutar, mas que a sua posteridade, ignorando este contexto. Por isto foi
considerado de anti-judeu e ficou também conhecido suas posições face àquela
que devia ser, em seu entendimento, a correta relação dos cristãos com as
comunidades judaicas. A transcrição desta parte do sermão ficou bem conhecida
e é transcrita em vários sites. Chegando a ser comparado com Hitler e suas
dietribes:
“Não vos deixem surpreender por eu ter chamado os Judeus de desastrosos.
Porque eles são mesmo desastrosos e miseráveis. Aqueles que rejeitaram tão
ferverosamente e recusaram as muitas boas coisas que o céu lhes colocou nas
mãos. Eles conheceram os profetas desde a infância e crucificaram aquele que
tinham profetizado. Aqueles que foram chamados a ser filhos desceram à raça
de cães.
Animais sem entendimento, quando gozam de manjares que enchem e
engordam, tornam-se mais difíceis e incontroláveis e não tolerarão uma canga
ou rédeas, ou a mão do condutor. E o mesmo com a nação dos Judeus: porque
eles se voltaram para o mal extremo, tornaram-se irrequietos e não aceitaram o
jugo de Cristo nem serem colhidos pela ceifa dos seus ensinamentos.
Tais animais que não pensam são próprios para o abate, porque eles não são
próprios para trabalhar. Os Judeus não têm experiência nisso: porque se
mostraram inúteis para o trabalho, eles tornaram-se apropriados para serem
mortos. Eu sei que muitas pessoas respeitam os Judeus e vêem a sua vida como
honorável. Eu exorto-vos por isso a colher esse preconceito depravado pelas
raízes. Já disse que a sinagoga não é melhor do que um teatro. Na verdade, a
sinagoga não é apenas um bordel e um teatro, mas também um antro de ladrões
e abrigo para selvagens. E não apenas para selvagens mas mesmo para
selvagens impuros.”
Após a sua morte em 407, os seus oito sermãos acerca dos judeus circularam
por toda a Igreja e foram traduzidos, entre outras línguas, para latim, sírio e
russo.
Não se pode, contudo, classificar essas posições como meramente "anti-
semitas". Obviamente João Crisóstomo não pode ser encarado como estrito
amigo dos judeus - embora tivesse amigos entre as comunidades judaicas -,
mas, no outro extremo, não pode ser também classificado como um mero anti-
semita, como se um fosse um nazi. Os seus textos devem ser entendidos dentro
do universo em que foram inscritos.
A intenção não era a de propor represália políticas ou sociais contra os judeus:
o ponto de vista era meramente teológico, baseado no fato de que alguns judeus
terem participado na morte de Jesus Cristo de modo pró-ativo. Igualmente, ao
acreditar que o cristianismo era a única verdadeira religião - numa posição que,
embora maioritária, outros teólogos cristãos, de sempre, foram mitigando ao
admitirem que todas as religiões tinham sementes de verdade -, o facto de os
judeus praticarem uma religião diversa, apesar de Cristo ter proclamado que
tinha vindo até eles para o seu bem - o próprio Cristo era judeu -, tornavam-se,
do seu ponto de vista teológico, reprováveis.
Conclusão
João Crisóstomo foi um poderoso pregador da Palavra de Deus, foi
estadista e expositor muito competente da Bíblia.
Considerado um dos “pais da igreja” e muito dos seus escritos ainda são
utilizados na liturgia das igrejas orientais durante boa parte do ano.
Mas também foi considerado anti-semita. Consta que em 387 d.C. teve início a
maior campanha de instigação cristã contra os judeus de que se tem notícia na
Antiguidade – sendo por ele patrocinada, a partir de Antioquia (Síria). Ele disse,
por exemplo, que a sinagoga era “lugar de blasfêmia, asilo do diabo e castelo de
Satanás.”[1]
A origem do desprezo generalizado pelos judeus reside em sua absoluta
inferioridade em todos as áreas intelectuais... Trata-se de uma raça inferior e
degenerada. É tarefa dos povos nórdicos "arianos" exterminar raças parasitárias
desse tipo, assim como costumamos exterminar cobras e outros predadores.
Por esse modo de pensar foi comparado a Adolf Hitler que no período de 1933-
1945 desejava “limpar” o povo alemão de toda a raça inferior, principalmente os
judeus, que era considerada a “escória do povo”.[2]
Desde o dia 1 de maio de 1626 o seu corpo repousa na Basílica de São Pedro
e, em 27 de novembro de 2004, o Papa João Paulo II doou parte das suas
relíquias ao Patriarca Ecumênico Bartolomeu I.
Referências bibliográficas
CESAREA, Eusébio. A história eclesiástica. Rio de Janeiro: CPAD, 2005.
HURLBUT, Jessé Lyman. História da Igreja Cristã. Trad: João Batista. Ed.
Revista e Atualizada, São Paulo: Vida, 2007.
http://www.portalangels.com/santo_do_dia/13setembro.htm, acessado em 16 de
junho de 2008.
http://www.paulus.com.br/lojavirtual/secoes/detalhamento.php?id=2333&cat_pr
oduto=produtos_livros&produto_dir=livros&id_cat=6&produto=Livros&categoria
=Teologia, acessado em 16 de junho de 2008.
http://www.eclesiales.org/portugues/noticia.php?id=001264, acessado em 16 de
junho de 2008.
http://www.religiaocatolica.com.br/santosdodia_setembro.asp, acessado em 16
de junho de 2008.
http://www.zenit.org/article-16675?l=portuguese, acessado em 16 de junho de
2008.
http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A3o_Jo%C3%A3o_Cris%C3%B3stomo,
acessado em 16 de junho de 2008.
http://blogdasabedoria.blogspot.com/2005/09/o-boca-de-ouro.html, acessado
em 17 de junho de 2008.
http://www.chamada.com.br/mensagens/index.php?id=426, acessado em 17 de
junho de 2008.
[1] http://www.chamada.com.br/mensagens/index.php?id=426
[2] http://www.chamada.com.br/mensagens/index.php?id=426

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