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SÃO PAULO
2017
Disciplina: Religião e Literatura
Professor: Prof. Dr. Antonio Manzatto RA: 00190896
Alunos: ISIDORO DA SILVA LEITE Turma: 06602DPA
ISL 22-jun-17
termos, direto e convincente, e dando um tratamento dramático à realidade de
prostitutas, gigolôs e bandidos, poderiam servir à subversão. Após o ano de 1968, suas
peças eram sistematicamente censuradas. Nem mesmo Dois Perdidos Numa Noite Suja
e Navalha na Carne, que já haviam sido apresentadas em diversas regiões do país,
escaparam dessa sina e foram proibidas em todo o território nacional. Depois, Barrela e
Abajur Lilás também foram censuradas, assim permanecendo até 1980. Com todas as
suas peças proibidas pelo regime militar, Plínio quase desistiu da carreira de
dramaturgo. O interessante é observar que o teatro que ele fazia não era político
panfletário, de disputa entre pobres e ricos, mas desenvolvia, principalmente, questões
existenciais, embora não renunciasse às questões sociais. Essa perspectiva marginal era
função de sua vivência junto às camadas mais desfavorecidas da população no porto de
Santos. Dessa maneira, seus personagens não são os normalmente encontrados em
outras obras teatrais: eles são bandidos, ladrões, prostitutas, mendigos, enfim, marginais
e marginalizados de toda espécie. E ele levou tudo isso para o teatro!
Após o encerramento do regime militar, suas peças, finalmente, foram liberadas.
Nessa época, Plínio escreveu Jesus Homem e Madame Blavatsky, onde ele demonstra
seu lado espiritualista. Entre suas melhores obras estão: Barrela (1958), Dois Perdidos
Numa Noite Suja (1966), Navalha na Carne (1967), Quando as Máquinas Param
(1972), Madame Blavatsky (1985).
Plínio Marcos de Barros morreu em São Paulo, no dia 29 de novembro de 1999.
Para compor esta peça, Plínio se inspirou no conto O terror de Roma, do italiano
Alberto Moravia. São dois os personagens - Paco e Tonho - que dividem um quarto em
uma hospedaria barata e durante o dia trabalham no mercado, como carregadores. Toda
a trama se desenrola durante as noites, quando os dois voltam para seu quarto após um
dia de trabalho. Tonho é um pobre coitado interiorano que saiu de sua terra natal em
busca de melhores dias na cidade grande – neste caso, Santos, eu suponho – onde
pretende encontrar um trabalho capaz de lhe dar um pouco de dignidade. Seus pais estão
vivos e se preocupam com ele e com seu futuro. Já Paco é um mau caráter, metido a
malandro. Mas se sabe muito pouco sobre sua vida pregressa. A peça, então, é uma
sequência de diálogos – em linguagem crua, dura, refletindo fidedignamente a
empregada pelos habitantes do submundo retratado– entre esses dois marginalizados.
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Os dois, Tonho – imagina que algum dia poderá sair da miséria – e Paco – um
indivíduo maníaco, quase louco e de maldade explícita, sem perspectiva de saída da
miséria – mantém um relacionamento violento, que se demonstra num crescendo desde
o início da peça, evidenciando o lado animal deles.
Por outro lado, ambos depositam suas esperanças de sobrevivência fora do gueto
em objetos: um, num par de sapatos bons e o outro, numa flauta. Tonho vive se
lamuriando por não ter um par de sapatos decente e inveja o seu companheiro de quarto,
Paco. Este, por seu turno, provoca o outro, chamando-o de homossexual.
Em certo momento, Tonho, não conseguindo ver alternativa, incentiva e convida
Paco para efetuarem um assalto a casais de namorados no parque. Após a prática do
delito, na divisão das quinquilharias roubadas acontece uma séria desavença,
culminando com o assassinato de Paco, pelo companheiro Tonho.
3. CONTEXTO HISTÓRICO
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A era da alta tecnologia – tendo em vista o esforço das duas superpotências
mundiais em explorar o espaço sideral - estava em seus primórdios, pressagiando um
futuro digno de ficção.
Nesse meio ambiente, o homem – qualquer um, bem ou mal remunerado –
estava sendo “massacrado” pelo sistema. Alguns tinham alguma compensação, outros
nada tinham.
4. COMENTÁRIOS
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Ajudou nada. Ele deu o pisa porque queria que eu andasse
soprando flauta. Se não fosse isso, estava descalço até hoje. Você
acha que alguém dá alguma coisa de graça pra alguém? Só você
mesmo, que foi dar grana pro negrão.
(Pausa)
TONHO
Você deve ter levado uma vida desgraçada pra não acreditar
em ninguém. (os destaques são meus)
Enquanto Tonho se vitimiza, revelando não conseguir enxergar uma saída e, ao
mesmo tempo, implora por ajuda, Paco demonstra saber – e explicita isso - que essa
assistência não virá de fora, principalmente porque mostra um ressentimento enorme
por entender que nunca foi auxiliado por ninguém.
O sapato remete ao complexo pela luta pelo poder, mas também pode indicar o
genital feminino (já que acolhe, recobre o pé, que é reconhecido como um símbolo
fálico). E, não menos atrativo, pode simbolizar a liberdade: os escravos andavam
descalços e, assim que se viam livres, procuravam logo comprar um par de sapatos! E,
ainda, pode representar nosso contato com a realidade, já que é a parte do vestuário que
encosta no chão.
Dessa forma, estaria aberto o caminho para discutir sobre a liberdade (ou
libertação) do homem. Poder-se-ia, também, discutir sobre a subjacente
homossexualidade presente na relação entre os dois companheiros de padecimento e de
quarto. E, não menos importante, por que e para que o homem nasce? Para viver uma
vida sem sentido? Para sofrer, ser humilhado, para viver isolado?
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simples do caminho do crime, o desânimo, a crueldade. Enfim, desenvolve uma
temática com aspectos existenciais e sociais.
5. O SER HUMANO
a. Na Peça Teatral
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melhor definidos em termos positivos enquanto Paco aparenta desconhecer quem é seu
pai e – não necessariamente como consequência disso - seu padrão ético é,
praticamente, inexistente.
b. Nas Religiões
As religiões, como regra geral, entendem que o homem tem uma alma.
O hinduísmo acredita que essa alma (atman) é eterna, indestrutível e faz parte de
Brahma, o Ser Supremo, isto é, tem a mesma essência que o divino. A missão dos
homens nesta terra é alcançar a liberdade (moksha) para poderem voltar para Brahma.
Esta libertação é alcançada por meio do rompimento do ciclo de existências sucessivas
(samsara), que acontece quando o homem atinge o nirvana (estado de plenitude e de
conhecimento de si mesmo e do universo). Detalhando esse processo: o homem a cada
existência, através do conjunto das suas ações (karma), constrói a sua próxima
existência; enquanto não alcançar o nirvana ele permanece nessa “roda da vida”, ou
seja, após a morte retorna para uma nova existência.
Dessa forma, se entende que o que se passa nesta vida é consequência de ações e
omissões praticadas em existências anteriores, não cabendo, portanto qualquer
lamentação sobre isso já que nada poderá mudar. O progresso que deve ser feito é
interior, pouco importando o sucesso exterior1. Essa terrível e pessimista visão da
existência humana é amenizada pela salvação proposta pelas Upanishades2: o
conhecimento da verdadeira natureza do próprio eu.
1
No país mais hinduísta – a Índia-, em função de a sociedade ser dividida em castas (cada pessoa nasce na casta correspondente a
seu estado espiritual), os esforços próprios não levarão o homem a ter qualquer possibilidade de progresso e ascensão social. Dessa
maneira, os miseráveis e desfavorecidos ficam sem esperança de “melhorar de vida”.
Além disso, essa divisão em castas acarreta um grande problema relacionado à solidariedade: também não existe a possibilidade de
que os mais ricos possam ajudar aos mais pobres, por sofrerem intimidação de suas castas com ameaça de expulsão (equivalente à
exclusão da sociedade).
2
Coleção de 123 livros com comentários sobre os Vedas (base das escrituras sagradas do hinduísmo). Significa: ensinamento
esotérico, ensinamento oculto (OSHO, 2014).
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mesmo tendo sido criado muito karma negativo no passado, podem ser alteradas as
condições causais por meio de esforço pessoal, havendo a possibilidade de modificar,
ou até mesmo impedir, os efeitos desse karma passado.
De modo similar, os cristãos creem que o homem foi criado por Deus à sua
imagem e semelhança3, com uma alma imortal e tendo por missão seu aperfeiçoamento
e a promoção de todos os homens e do homem todo4.
6. O MAL
A questão do mal – sua existência, sua origem e sua essência – está presente há
algum tempo na mente do homem. Dentre os primeiros registros estão os relacionados
com a escola dos pitagóricos, filósofos pré-socráticos, reunidos em torno de Pitágoras.
Para eles, há no homem uma alma divina e há algo semelhante ao “pecado original” dos
3
Gn 1, 26-27
4
Papa PAULO VI, 1967
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cristãos. Assim, eles acreditavam que a alma vivia com os deuses, mas precisava expiar
seu pecado (mal cometido anteriormente) em um corpo físico. Quando este morre, a
alma se separa do corpo e vai se purificar no Hades para voltar, novamente, à Terra em
outro corpo. Dessa forma, as almas vão sendo purificadas enquanto permanecem nesse
ciclo de existências até estarem totalmente purificadas, quando, então, poderão usufruir
uma eterna vida divina. Pitágoras entendia que a purgação deveria ser realizada por
meio do saber.
Para Aristóteles o mal é a privação do bem e, no plano ético, ele o relaciona com
a ignorância. Desta maneira, o mal se reduz à mistura de imperfeição do universo e
limitação humana oriunda da ignorância e da vontade.
5
Teodiceia provém do grego θεός - theós, "Deus" e δίκη - díkē, "justiça", que significa, literalmente, "justiça de Deus". Teoria que
busca justificar a existência de Deus a partir da discussão do problema da existência do mal e de sua relação com a bondade de
Deus.
6
Ou Deus quer tirar o mal do mundo, mas não pode; ou pode, mas não o quer tirar; ou não pode nem quer; ou pode e quer. Se quer e
não pode, é impotente; se pode e não quer, não nos ama; se não quer nem pode, não é o Deus bom e, além disso, é impotente; se
pode e quer – e isto é o mais seguro -, então de onde vem o mal real e por que não o elimina?
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desorientação da liberdade humana como produtora do mal. Ele chega a entender que
Deus - o ser onipotente, onisciente, onipresente - havia criado a matéria, e esta havia se
corrompido. Ele ilustra sua tese de que o homem é naturalmente mal, descrevendo uma
situação em que um homem furta peras e demonstrando que isso só ocorreu por simples
astúcia, já que nada havia nas frutas que pudessem justificar tal ato.
Para Agostinho o bem é o único princípio existente, sendo que sua suprema
perfeição está em Deus, o Sumo Bem.
Já para outro filósofo cristão, São Tomás de Aquino, o mal seria apenas e tão
somente a ausência do bem, ou seja, ausência de Deus. Immanuel Kant considera que a
natureza do ser humano tem uma propensão para o mal, apesar de ter uma tendência
original para o bem. Hannah Arendt redefine a tese do mal radical
kantiano, politizando-o. Ela se preocupa com o mal quando este atinge grupos sociais
ou o próprio Estado e, segundo ela, o mal não é uma categoria ontológica, não
é natureza, nem metafísica. O mal é político e histórico: é produzido por homens e se
manifesta apenas onde o sistema oprime.
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O mal pode ser encarado como problema filosófico ou como problema religioso.
Na filosofia se costuma apresentá-lo como mal metafísico, mal físico, mal moral. A
religião por outro lado, e sem negar a razão, também se envolve com questões
existenciais, buscando atingir outros campos. Na revelação bíblica, a polêmica sobre o
tema do mal envolve a questão soteriológica, a despeito da improvável coexistência do
Deus bíblico com o mal. Entre a filosofia e a religião está a teodiceia com sua dupla
função: conciliar a existência de Deus com a do mal e defender a existência de Deus
contra aqueles que a consideram em contradição com a existência do mal.
De fato, o mal é cometido, mas também é sofrido, sentido. Ainda que o ser
humano não esteja na origem do mal, a verdade é que é quem o pratica; o mal se
manifesta nos seus atos existenciais e, por isso mesmo, o mal é obra da sua liberdade;
confessá-lo implica assumir-se como sujeito ou como objeto do mal; consequentemente,
a confissão do mal é um pressuposto fundamental da consciência da liberdade.
(TAVARES, 2006)
Portanto, o mal não existe, nem preexiste, pelo menos por si só. Sua existência
está ligada a ação do homem enquanto ser livre que, na sua liberdade, se afasta do bem,
conforme Agostinho ou age de maneira eticamente corrompida, conforme Ricoeur,
gerando o mal.
Por definição, "bem" e "mal" são absolutos porque qualquer enunciado moral é
válido, independentemente de quem o faz, e independentemente de qualquer objeto ao
7
PUENTE, 1997, pp. 68 - 72
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qual o enunciado se refira. A justiça, o direito, a moral, o bem, são valores absolutos, os
quais deveriam reger a vida de qualquer ser humano.
7. CONCLUSÃO
Como bem se pode observar, não existe consenso – nem entre os filósofos, nem
entre os teólogos e nem entre as religiões - se o bem ou o mal são intrínsecos à natureza
humana. Há argumentos consistentes para suportar as duas hipóteses.
Cabe aqui uma rápida referência a dois experimentos conduzidos por psicólogos:
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8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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QUEIRUGA, Andrés Torres. Repensar o mal. 1a ed. REPENSAR. São Paulo:
Paulinas, 2011.
RAMPAZZO, Lino. Antropologia: religiões e valores cristãos. 1a ed. ESTUDOS
ANTROPOLÓGICOS. São Paulo: Paulus, 2014.
RAVERI, Massimo. Índia e Extremo Oriente. 1a ed. Vol. 3. HISTÓRIA DAS
RELIGIÕES. São Paulo: Hedra, 2005.
SCARPI, Paolo. Politeísmos: As religiões do mundo antigo. 1a ed. Vol. 1. HISTÓRIA
DAS RELIGIÕES. São Paulo: Hedra, 2004.
SCHOCHET, Jacob Immanuel. A tradição mística. 1a ed. São Paulo: Maayanot, 2012.
TAVARES, Manuel. Fundamentos metodológicos do pensamento antropológico e
ético de Paul Ricoeur: o problema do mal. Memorandum. Belo Horizonte: UFMG,
2006. p. 136-146. Disponível em:
http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/a10/tavares01.pdf. Acesso em 10/jun/2017.
USARSKI, Frank. O budismo e as outras. 3a ed.; 3a reimpressão. São Paulo: Ideias &
Letras, 2014.
ZILLES, Urbano. Antropologia Teológica. 1a ed. ESTUDOS ANTROPOLÓGICOS.
São Paulo: Paulus, 2011.
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