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Análise Da Dimensão Argumentativa em Fotografias PDF
Análise Da Dimensão Argumentativa em Fotografias PDF
EID&A
Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação
ISSN 2237-6984
Editores
Eduardo Lopes Piris
Moisés Olímpio Ferreira
Editores
Eduardo Lopes Piris • Moisés Olímpio Ferreira
Comitê Científico
Ana Zandwais (UFRGS) • Anna Flora Brunelli (UNESP) • Carlos Piovezani (UFSCar) • Christian
Plantin (ICAR/CNRS) • Cristian Tileaga (U.Loughborough) • Eduardo Chagas Oliveira (UEFS) •
Emília Mendes Lopes (UFMG) • Eugenio Pagotti (UFS) • Fabiana Cristina Komesu (UNESP) • Galia
Yanoshevsky (U.Tel-Aviv) • Guylaine Martel (U. Laval) • Helena Nagamine Brandão (USP) • John
E. Richardson (U.Newcastle) • Lineide Salvador Mosca (USP) • Luciana Salazar Salgado (UFSCar) •
Luciano Novaes Vidon (UFES) • Manuel Alexandre Júnior (U.Lisboa) • Marc Angenot (U.MacGill) •
Maria Alejandra Vitale (UBA) • Marianne Doury (CNRS) • Marie-Anne Paveau (U.Paris XIII) •
Marisa Grigoletto (USP) • Ricardo Henrique Resende de Andrade (UFRB) • Rui Alexandre Grácio
(U.Nova de Lisboa) • Ruth Amossy (U.Tel-Aviv) • Ruth Wodak (U.Lancaster) • Sheila Vieira de
Camargo Grillo • Sírio Possenti (UNICAMP) • Sophie Moirand (U.Paris III) • Soraya Maria Romano
Pacifico (USP) • Valdemir Miotello (UFSCar) • Valdir Heitor Barzotto (USP) • Vânia Lúcia Menezes
Torga (UESC) • Viviane Cristina Vieira Sebba Ramalho (UnB) • Viviane de Melo Resende (UnB) •
Wander Emediato de Souza (UFMG) • William M. Keith (U.Wisconsin)
Tradutores
Inglês: Elaine Cristina Medeiros Frossard • Flávia Sílvia Machado • Kelly Cristina de Oliveira •
Laurenci Barros Esteves • Paulo Roberto Gonçalves Segundo
Francês: Carlos Albeto Magni • Flávia Sílvia Machado • Maria Helena Cruz Pistori • Moisés Olímpio
Ferreira • Silvana Gualdieri Quagliuolo Seabra
Espanhol: Cristina do Sacramento Cardôso de Freitas • Ludmila Scarano Coimbra
Revisores
Denise Gonzaga dos Santos Brito • Mirélia Ramos Bastos Marcelino • Moisés Olímpio Ferreira •
Roberto Santos de Carvalho
Capa e logotipo
Laurenci Barros Esteves
Diagramação
Eduardo Lopes Piris
Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação
i
Doutoranda em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Brasil.
Email: janabarcelos@hotmail.com.
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BARCELOS, Janaina. De que lado você está? Análise da dimensão argumentativa em fotografias jornalísticas da guerra do
Vietnã. EID&A - Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, Ilhéus, n.3, p. 82-92, nov. 2012.
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BARCELOS, Janaina. De que lado você está? Análise da dimensão argumentativa em fotografias jornalísticas da guerra do
Vietnã. EID&A - Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, Ilhéus, n.3, p. 82-92, nov. 2012.
Essa proposta busca suporte nas discussões olhar sobre o real, é possível reforçar valores e
de Christian Plantin (1996)1, segundo o qual orientar a reflexão.
todo discurso seria necessariamente
argumentativo, por constituir um resultado Cena, auditório e estereótipos
concreto do enunciado numa situação. E, como
todo enunciado, visa a agir sobre seu Para este estudo, recorreremos também à
destinatário, sobre seu sistema de pensamento, noção de cena genérica, de Dominique
levar o outro a crer, ver, fazer. Logo, exerce Maingueneau (2001), segundo a qual cada
algum grau de influência, mesmo que não gênero dispõe de roteiros prévios em que o
busque persuadir. A noção também se apoia no discurso se desenrola, determinando as regras
estudo mais amplo de Jean-Blaize Grize da troca comunicativa, os papéis dos
(1990)2, para quem argumentar é a atividade parceiros e a imagem de si e do outro que
que visa a intervir sobre a opinião, a atitude ou podem ser legitimados. Assim, trabalhamos
o comportamento de alguém. aqui com o fotojornalismo, gênero
jornalístico que compreende fotografias
Dessa forma, alguns discursos informativas, documentais ou ilustrativas para
comportariam uma dimensão argumentativa, a imprensa ou para outros projetos editoriais
não uma intenção consciente com o uso de relacionados à produção de informação de
estratégias para persuasão. No caso da atualidade, conforme proposta de Jorge Pedro
dimensão argumentativa, o foco estaria em Sousa (2004), que considera não apenas o
transmitir um ponto de vista, que não buscaria produto fotojornalístico, mas também sua
expressamente modificar a posição do finalidade e intenção. A foto, portanto, é
alocutário, mas que poderia, sim, orientar o realizada levando-se em conta tanto o
olhar e destacar determinado aspecto – objetivo de informar, quanto o de captar o
destaque este que se aproxima da noção de interesse do leitor, com base em um estatuto
éclairage, de Grize (2004). informativo, voltada a um destinatário ideal,
Diante de tais considerações, as fotografias com o qual se pretende estabelecer uma
a serem analisadas conteriam essa dimensão interação sustentada por um contrato de
argumentativa. Mas como identificá-la? Se há credibilidade próprio do jornalismo.
esse grau de argumentação quando existe uma Buscamos, ainda, o trabalho de Chaïm
tomada de posição, quando se exprime um Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca (1996),
ponto de vista, um meio de perceber o mundo, nomeadamente a discussão sobre a natureza do
é preciso verificar de que forma a imagem auditório visado. Sob essa perspectiva, o
expressa esse posicionamento. Qual o tema orador deve adaptar seu discurso ao auditório,
retratado? Ele é apresentado de modo a levar a considerando as crenças, os valores, as
algum posicionamento favorável ou contrário? opiniões daquele a quem se dirige, pois, para
A partir de quais recursos? Dessa forma, buscar adesão, é preciso que se parta de pontos
buscaremos observar como a dimensão de acordo entre os parceiros da troca
argumentativa submete de modo mais ou comunicativa, de esquemas de raciocínio
menos diretivo um tema de reflexão, no caso, a partilhados. A argumentação poderia, então,
Guerra do Vietnã. Afinal, ao partilhar um aumentar a intensidade da adesão a certos
valores reconhecidos pelo auditório; o discurso
possibilitaria ampliar ou ressaltar determinado
1
PLANTIN, Christian. L´Argumentation. Paris: Seuil, valor, contribuindo para uma tomada de
1996. posição.
2
GRIZE, Jean-Blaize. Logique et language. Paris:
Ophrys, 1990.
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Vietnã. EID&A - Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, Ilhéus, n.3, p. 82-92, nov. 2012.
O ponto-chave da discussão dos autores é operação que consiste em pensar o real por
que o auditório seria uma construção do meio de representações culturais preexistentes,
orador. Haveria, na verdade, uma espécie de de um esquema coletivo fixado. Isso porque o
jogo especular em que o orador cria uma estereótipo permite designar modos de
imagem do auditório, para que possa elaborar raciocínio próprios de um grupo e conteúdos
seu discurso de modo a atingir esse globais da doxa na qual se situa.
destinatário. Ao mesmo tempo, ele constrói Assim, um indivíduo ou grupo do qual um
uma imagem de si (ethos) a partir da imagem indivíduo faz parte são percebidos e avaliados
que pensa que o auditório dele tem. Essa em função de um modelo pré-construído. “O
construção se efetua de fato no texto, inscreve- orador adapta sua apresentação de si aos
se na materialidade da linguagem, em um esquemas coletivos que ele crê interiorizados e
processo de mediação das representações valorizados por seu público-alvo” (AMOSSY,
coletivas, do imaginário partilhado. E, para a 2008, p.126). Esse processo permitiria ao
imagem ser reconhecida, precisa estar ligada a orador imaginar o auditório ao qual se dirige –
representações em comum. adaptar-se a ele como propõe Perelman –,
Ao optarmos por esse caminho, torna-se ligando-o a uma categoria social, étnica,
fundamental considerar, na análise, a política etc. que o ajudaria a reconhecer as
observação das representações sociais ideias, crenças, evidências, preconceitos desse
engendradas pelas fotografias. Pelo processo indivíduo ou grupo, aspectos que precisa levar
de éclairage (GRIZE, 2004), que coloca em em conta para construir seu discurso.
evidência certos aspectos, oculta outros ou O locutor, portanto, adota uma imagem
propõe novos, o discurso pode levar o simplificada que ele esquematiza levando em
auditório a modificar, enfraquecer, fortalecer conta as metas e os desejos da troca. Essa
diversas representações que reconhece, de imagem remete tanto à do grupo de que o
acordo com sua própria interpretação e com a auditório participa quanto à imagem prévia
intenção do discurso. que circula na opinião pública ou na
As discussões sobre o conceito de comunidade de que fazem parte os parceiros
representação social se fazem presentes na da interação. No entanto, a adesão ao
obra de Amossy (2009). Ela encontra em Grize argumento – ou à dimensão argumentativa de
uma noção próxima daquela adotada pela dado discurso – dependerá da reconstrução
psicologia social, de representação social ou feita pelo auditório. Afinal, o estereótipo
estereótipo como imagem coletiva cristalizada emerge, como pontua Amossy (2008), de um
que pode atribuir um conjunto de predicados a processo de deciframento. O alocutário fará
um tema; um saber difuso que revela uma suas próprias formulações que, por sua vez,
opinião partilhada. A autora denomina o reportar-lhe-ão a um modelo cultural
estereótipo como representação ou imagem preexistente. A apreensão do estereótipo pode
coletiva simplificada e fixada de seres e coisas se dar tanto pelo modo de dizer quanto pelo
que herdamos de nossa cultura e que tema.
influencia nossas atitudes e comportamentos. A autora comunga de uma perspectiva
Seria o lugar-comum que constitui um aspecto retórica, retomada e repensada por Perelman e
particular à medida que designa uma Olbrecht-Tyteca (1996), que trata os lugares-
representação social sobre cujo prisma os comuns como espaço de opiniões partilhadas e
parceiros de uma troca comunicativa percebem crenças coletivas no qual o discurso se insere.
os integrantes de um grupo. Nesse âmbito, ela Seria tudo aquilo que é percebido como já
destaca a importância da estereotipagem como conhecido, já dito, familiar e partilhado. Logo,
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Corpo de
Kyoichi
vietcongue United Press
1966 Sawada
arrastado por International
(Japão)
tanque
Rosto de
comandante Co
norte- Rentmeest
1967 Life
americano er
dentro de (Holanda)
tanque
Execução de
The Eddie
vietcongue à
1968 Associated Adams
queima- Figura 1 – Fotografia de Malcolm W. Browne
Press (EUA)
roupa
Menina A imagem de 1965 (Figura 2) exibe mãe
The
vítima de Nick Ut com quatro filhos atravessando um rio com
1972 Associated
ataque de
Press
(EUA) dificuldade, para escapar dos bombardeios
napalm norte-americanos. A expressão facial da
mulher é de esforço. A criança que aparece no
Por dentro do conflito campo inferior esquerdo parece estender a
mão. Seu olhar e o do menino que se localiza
Descreveremos sucintamente cada foto atrás se direcionam para quem olha a
para, em seguida, procedermos à análise. fotografia. A criança do meio chora, alheia ao
Incluiremos dados sobre o contexto, por ato fotográfico. A imagem remete ao tema
partimos da abordagem de que texto e família e socorro. Esse foi o ano da entrada
contexto não podem estar dissociados. A oficial dos EUA na Guerra do Vietnã, apesar
fotografia de 1963 (Figura 1)3 mostra um de já estarem envolvidos no conflito, por meio
monge budista, após atear fogo em si, em de negociações políticas e do envio de
protesto contra a perseguição religiosa do conselheiros militares:
governo sul-vietnamita durante a guerra. O
monge foi considerado um Bodhisattva4, pois,
mesmo tendo sido queimado e recremado, seu
coração permaneceu intacto, o que aumentou o
impacto de sua morte no mundo,
transformando-o em mártir. Apesar de ser um
contexto de guerra, os temas explícitos são
morte, religião e sacrifício:
3
As fotos estão disponíveis na página da organização Figura 2 – Fotografia de Kyoichi Sawada
World Press Photo na internet, em
http://www.archive.worldpressphoto.org/years.
4
A imagem de 1966 (Figura 3) apresenta
Bodhisattva, no budismo, significa ser de sabedoria tanque americano arrastando corpo queimado
elevada, que segue uma prática espiritual que visa a
remover obstáculos e beneficiar os demais seres.
de soldado vietcongue. Apesar da aparente
Também quer dizer as forças de pureza da mente. equidade na composição, a luz do sol está
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personagens em posição de vítimas da guerra, Fica claro que, para observar e identificar
impotentes diante das tragédias e do destino. essa dimensão argumentativa, foi preciso
Nenhuma das vítimas é norte-americana. buscar apoio nas seis abordagens apontadas
por Amossy (2009): linguageira,
Por terem sido captadas no instante em que
comunicativa, dialógica e interacional,
ocorreram, as imagens tendem a provocar
genérica, estilística e textual. Pudemos
maior identificação com o espectador, que se
observar de que modo os recursos da
sente próximo do evento retratado, cuja
linguagem fotográfica, como angulação e
atualidade carrega um forte efeito de realidade.
composição, contribuem para direcionar o
Além disso, as fotos exibem situações que
favorecem o engendramento de efeitos olhar, portanto o posicionamento. Escolhas
como o close não são por acaso. Esse
patêmicos, por seu componente trágico,
associado ao efeito de comoção do espectador enquadramento promove proximidade e
identificação. A angulação de baixo para cima
e reforçado pela remissão a representações
potentes, como o mártir, o herói, a mãe valoriza o personagem, ao contrário daquela
de cima para baixo. Há uma série de opções de
valorosa, a vítima, a criança inocente,
linguagem e estilo que busca, seja consciente
arquétipos que são usados de forma mais ou
ou inconscientemente, atingir o destinatário e
menos consciente, pelo locutor, a partir da
construção que faz de seu auditório. agir sobre ele. Percebemos como o gênero
Interessante observar que o apelo emocional e sinaliza para essas escolhas, pois o
a explicitação dos horrores da guerra fotojornalismo é portador de uma série de
aumentam quando o contexto muda de apoio condições de produção e recepção construídas
para crítica e combate à participação dos EUA sociocultural e historicamente, que direciona o
no conflito, o que pode ser verificado nas fotos modo de se fazer uma foto.
de 1968 e 1972. Portanto, o discurso se adapta Assim, a partir da análise de uma
à situação de comunicação e ao auditório, materialidade linguageira – as fotografias –,
conforme as alterações que ocorrem no âmbito situada em um gênero específico e numa
social, histórico e cultural. perspectiva de troca comunicacional e
Percebemos que as fotos trazem dialógica, podemos perceber a presença de
uma dimensão argumentativa nas imagens
posicionamentos de forma mais ou menos
implícita ou explícita, não necessariamente analisadas pelo viés das representações sociais
evocadas que, ao serem partilhadas, podem
sobre a Guerra do Vietnã, dependendo do tipo
de representação social que evoca, conduzir a determinadas percepções acerca
daquele acontecimento.
caracterizando sua dimensão argumentativa.
De qualquer forma, todas orientam a maneira A partir de uma perspectiva como essa, que
de ver, a partir da escolha do tema fotografado, considera vários aspectos do discurso e sua
da composição, da angulação, entre outros ligação com o social, podemos chegar a
elementos que marcam a construção do texto e análises mais ricas e que nos permitem
do discurso. No entanto, a compreensão do compreender a argumentação no discurso no
universo e a identificação dos posicionamentos plano da troca. Com o exemplo que
dependerão dos sistemas de pensamento e dos trouxemos, percebemos que a dimensão
saberes do espectador. Afinal, os efeitos que argumentativa apontou funcionamentos
podem ser gerados por essas imagens estão discursivos que podem orientar o olhar e
ligados aos estados de crenças de dado grupo conduzir a opiniões.
social.
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Referências
AMOSSY, Ruth. L'argumentation dans le
discours. Paris: Armand Colin, 2009.
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