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no ecossistema digital
Caio Túlio Costa
Arte sobre foto de Marcos Santos
resumo abstract
se proteger contra fake news e conteúdo Foi em fevereiro de 2017 que o selo de
ofensivo. Três grandes medidas foram ado- verificação chegou à América Latina: Brasil,
tadas: 1) mudanças no ranqueamento de Argentina e México. No Brasil, o Google fez
buscas; 2) alterações nas ferramentas de parcerias com a Agência Lupa, Aos Fatos
feedback; e 3) mudanças nas práticas de e Agência Pública. Operação lançada em
transparência9. outubro de 2016 nos EUA, no Reino Unido,
A própria empresa explicou no seu blog na Alemanha e na França veio no rastro da
ter percebido que aproximadamente 0,25% do eleição de Donald Trump e, especialmente,
total de buscas diárias na ferramenta retorna- para ajudar a encontrar fake news nas elei-
vam “conteúdo ofensivo ou claramente enga- ções da França e da Inglaterra em 2017.
noso”. “Para ajudar a prevenir que conteúdos Usuários do Google Notícias passaram a
desse tipo se espalhem, melhoramos nossos ver, em algumas notícias buscadas, um selo
métodos de avaliação e atualizamos nosso específico chamado “Verificação de Fatos”.
algoritmo a fim de que traga conteúdos mais No Brasil, o selo tem sido inserido em repor-
confiáveis”, explicou o Google. tagens que aparecem na seção expandida
Para tanto, o Google atualizou as dire- dentro do site news.google.com.br, na busca
trizes de classificação da qualidade do con- por notícias dentro do próprio Google e tam-
teúdo mostrado nos resultados a partir do bém nos aplicativos do Google Notícias e
trabalho dos seus avaliadores. Clima para os sistemas iOS e Android. Mas
Em dezembro de 2016, a empresa já seu aparecimento é raro.
tinha sido alvo de críticas por exibir páginas Um ponto a mais, e relevante para a ques-
de grupos de supremacia branca entre os tão da preocupação em relação às notícias
primeiros resultados para pesquisas sobre falsas, é que elas se tornaram também uma
o Holocausto. questão para os investidores. Reportagem
Em relação à melhoria do feedback, foi do Financial Times informou, no final de
introduzido um novo mecanismo para que maio de 2017, que acionistas do Facebook e
o público pudesse denunciar conteúdos con- do Google querem que as duas empresas se
troversos. Desde então, os usuários podem dediquem ainda mais à contenção de notícias
informar esses problemas diretamente pela falsas. “Ambos preferem se ver como pla-
página de resultados de busca. Em vários taformas de tecnologia neutras, mas foram
países, o Google também fez parceria com transformados em plataformas de mídia – é
checadores de fatos, as agências indepen- por isso que estamos tão preocupados”, disse
dentes que praticam a checagem minuciosa Natasha Lamb, diretora do fundo de investi-
de fatos divulgados na mídia e que também mento Arjuna Capital, ao Financial Times10.
são parceiras do Facebook. A operação é A mesma reportagem menciona uma pes-
chamada de fact checking, em inglês. quisa sobre notícias falsas a qual dá conta de
que “apenas 16% das empresas de mídia pes-
nenhum direito autoral. Aliás, o tradicional digital. Foi quando lançou um produto que
conceito de direito autoral vem ruindo no lhes permite publicar notícias diretamente
ecossistema noticioso, mesmo e apesar da na plataforma, ficar com 100% da receita
luta de jornais e revistas em todo o mundo de publicidade vendida ali e ainda ganhar
com a implantação de paywalls e venda de 30% da receita veiculada naquele conteúdo
assinaturas digitais. pelo próprio Facebook. São os chamados
Sem capacidade de ganhar escala mundial instant articles.
– como conseguem os players digitais puros, Não dá para saber, ainda, o quanto a
produtos jamais imaginados pela ficção cien- mudança no news feed do Facebook, privi-
tífica –, ninguém vai conseguir competir em legiando conteúdo de amigos e familiares,
pé de igualdade com os gigantes digitais. vai abater de fato os conteúdos da mídia
Abraçá-los ou descartá-los? Como tirar pro- tradicional, mas há um esforço inegável
veito dessas plataformas? Em que medida das plataformas de alcance mundial em
elas ajudam? Essas são questões impostas preservar, de alguma forma, a produção
tanto à mídia tradicional, que se digitalizou, de conteúdo jornalístico de qualidade.
quanto à mídia nascida digital. Porém, esse esforço de forma alguma vai
O Google tem-se mostrado amigável em inibir, por si só, a criação de conteúdos
relação à mídia, seja tradicional, seja nascida falsos ou radicais – porque também há uma
digital. Vejam as iniciativas que vem tomando verdadeira indústria por trás disso, capaz
há tempos, desde o Zeitgeist (literalmente de se aproveitar da liberdade de publica-
“espírito do tempo”, uma maneira de saber o ção inerente ao meio digital. Haja vista o
que o mundo busca na internet) até o recente uso exponencial de fake news tanto nas
Newsgeist (“espírito das notícias”), quando eleições americanas quanto europeias nos
reúne pessoal da imprensa tradicional e aca- últimos anos.
dêmicos para debater problemas e soluções A despeito do avanço fantástico das fer-
para o ambiente digital. A empresa abriu os ramentas digitais, ou mesmo por conta delas,
braços para o mercado de conteúdo. Até que retornamos à era pré-Gutenberg e temos de
ponto tais iniciativas podem ser entendidas conviver com isso. Os produtores de conteúdo
como legítimas ou demagógicas vai depender que souberem ler esta realidade, adaptarem-
do que cada veículo ou instituição retira de -se à disrupção que enfrentam, não tiverem
sua participação – mas a iniciativa é séria. medo de canibalizar a si próprios e domi-
Desde 2015 o Facebook tenta conquis- narem as artimanhas do big data, estes sim,
tar a confiança de veículos de comunicação sobreviverão.