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Comércio Exterior
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III
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CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte.
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ
A145c
Abreu, Marcelo de Paiva
Comércio exterior : interesses do Brasil / Marcelo de Paiva Abreu. -
Rio de Janeiro : Elsevier, 2007.
il.
Anexos
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-352-2361-3
Introdução
Este livro reúne ensaios sobre temas da política comercial brasileira: a abertura
de 1988 a 1993 e sua temporária reversão a partir de 1995; as frustradas nego-
ciações da Alca; a economia política da proteção e dos interesses exportadores
nos Estados Unidos e no Brasil; a diplomacia econômica multilateral do Brasil
no GATT e na OMC; e o leque de políticas industriais que, com base em histó-
rias de sucesso em outras economias, poderiam ser adotadas em países da Amé-
rica Latina, entre os quais o Brasil. Há alguma repetição de texto entre distin-
tos capítulos de modo que seja possível lê-los individualmente.
Versões preliminares dos Capítulos 1, 3 e 5 foram escritas entre 2003 e 2004,
durante licença sabática do autor no Banco Interamericano de Desenvolvimento,
em Washington. O autor agradece o empenho de Daniel Ribeiro de Oliveira
para viabilizar essa permanência. Não se pode dizer que os papers tenham sido
recebidos com grande entusiasmo pela administração do Banco, talvez em par-
te porque a visão então dominante em Washington fosse indevidamente otimis-
ta quanto às negociações da Alca, em parte porque o enfoque tenha sido consi-
derado excessivamente brasileiro.
O autor agradece aos colegas do Banco pelo convívio no biênio, especial-
mente os do Departamento de Integração e Programas Regionais: José Baião,
Alberto Barreix, Mariana Bijone, Rafael Cornejo, Maria de la Paz Covarrubias,
Robert Devlin, Antoni Estevadeordal, Paolo Giordano, Peter Kalil, Ernesto
López-Cordova, Josefina Monteagudo, Maurício Mesquita Moreira, Mariana
Sobral de Elia, Fernando Quevedo, Vito Tanzi, Luiz Villela, Ricardo Vera e
Masakasu Watanuki.
No primeiro capítulo, intitulado “Liberalização comercial e economia po-
lítica da proteção no Brasil, de 1987 a 2002”, há uma recapitulação dos fatos
relacionados à abertura comercial brasileira até 1993 e à sua reversão tempo-
rária a partir de 1995. Essa reversão é objeto de análise inspirada na literatu-
ra sobre a evolução da política comercial dos Estados Unidos a longo prazo.
Versão preliminar, em inglês, foi publicada com o título “Trade liberalization
and the political economy of protection in Brazil since 1987”, Working paper
8b, Intal, Buenos Aires, 2004. O autor agradece os comentários ou a ajuda de
VI Comércio Exterior
in Brazil and the US”, Texto para Discussão 493, Departamento de Economia da
PUC-Rio, janeiro de 2005, e também como Intal, Working Paper 12, Buenos
Aires, 2006. O autor agradece a ajuda com bases de dados de Ricardo Vera. Agra-
dece, também, comentários recebidos em apresentação na embaixada do Brasil
em Washington. Foram utilizadas informações disponíveis até meados de 2004.
O quarto capítulo, “O Brasil no GATT e na OMC: história e perspectivas”,
trata da diplomacia econômica brasileira no GATT entre 1947 e 1994, e na OMC
desde 1995. Versão preliminar foi publicada como “O Brasil, o GATT e a OMC:
história e perspectivas” em Política Externa, vol. 9, n. 4, 2001. Existe versão ainda
anterior publicada, em inglês, como “Brazil, the GATT and the WTO”, Texto
para Discussão 392, Departamento de Economia da PUC-Rio, 1998. Essa versão
foi apresentada na conferência “Globalization, State Power and International
Institutions: Brazil in a new age of dependency?”, realizada no Centre for
Brazilian Studies do St Antony’s College, Universidade de Oxford, Reino Uni-
do, em 16 de março de 1999. O texto incorpora versões anteriores publicadas
como “O Brasil e o GATT, 1947-1990” em José Augusto G. de Albuquerque
(org.), Sessenta Anos de Política Externa 1930-1990, v. 2: Diplomacia para o desen-
volvimento. São Paulo: Cultura Editores Associados, 1996, e “O Brasil na Roda-
da Uruguai do GATT: 1982-1993” em Gelson Fonseca Júnior e Sergio Henrique
Nabuco de Castro (orgs.), Temas de Política Externa II, v. 1. São Paulo: IPRI/Paz
e Terra, 1994. O autor agradece a ajuda anônima de diplomatas brasileiros, bem
como a de funcionários do Banco Mundial e da Organização Mundial de Co-
mércio ao longo de muitos anos. Agradece também os comentários ou a ajuda
de Alice R. de P. Abreu, Renato Flôres Jr., Andrew Hurrell, Simone S. Lopes,
Eduardo Loyo e Rogério L.F. Werneck.
O quinto capítulo, “A escolha de ‘políticas industriais’ na América Latina”,
analisa a experiência internacional com relação a políticas industriais, com ên-
fase nas histórias de sucesso, e tenta extrair lições relevantes para a América Latina
com base nessas experiências. Versão preliminar, em inglês, foi publicada com
o título “Which ‘Industrial Policies’ are Meaningful for Latin America?”, Texto
para Discussão 493, Departamento de Economia da PUC-Rio, fevereiro de 2005,
e, também como Intal, Working Paper no.11, Buenos Aires, 2006. O autor agra-
dece a ajuda e os comentários de Alberto Barreix, de Luiz Villela e, especialmen-
te, de Maurício Mesquita Moreira.
A tradução dos ensaios originalmente escritos em inglês é de Fernanda
Rangel de Paiva Abreu, com copidesque de Fátima Barbosa.
1 Liberalização comercial
e economia política
da proteção no Brasil,
de 1987-2002
Restrições externas
Durante a Rodada de Tóquio, na década de 1970, os Estados Unidos da Amé-
rica adotaram, pela primeira vez, posição nas negociações multilaterais que
enfatizava a reciprocidade de concessões, em vez da aplicação universal da
cláusula da Nação Mais Favorecida (NMF). Isso explica as tentativas de intro-
duzir códigos específicos que limitariam a NMF a seus signatários, minando
claramente um dos pilares do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, usualmente
conhecido como General Agreement on Tariffs and Trade (GATT), que é a não-dis-
criminação entre partes contratantes. Outro desenvolvimento correlato foi a idéia
de “graduação” das economias em desenvolvimento mais avançadas, uma vez al-
cançado determinado patamar de produto interno bruto (PIB) per capita. Essa
idéia ganhou terreno como instrumento adotado pelos Estados Unidos para res-
tringir o que era considerado o papel de “caronas” por parte das economias em
desenvolvimento mais avançadas e pressionar para que fizessem concessões, es-
pecialmente com relação ao acesso a mercados.1
Após o final da década de 1970, a estratégia de negociação norte-americana
baseou-se na tentativa de tratar de forma seletiva produtos diferentes, em con-
traste com a aplicação universal de fórmulas para reduzir a proteção que havia
sido usada em algumas negociações no passado. Os Estados Unidos escolheram,
também, novos temas cuja inclusão no GATT, pensava-se, favoreceria os seus in-
teresses: serviços, aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados
ao comércio (TRIPs), medidas de investimento relacionadas ao comércio
(TRIMs), e até mesmo, pelo menos temporariamente, “bens de alta tecnologia”,
enquanto os assuntos não-resolvidos nos quais as economias em desenvolvimento
tinham interesse continuavam a ter baixa prioridade nas negociações.
Era natural que o Brasil adotasse política de obstrução no GATT durante a
primeira metade dos anos 80. Afinal, a associação de crescimento rápido a uma
tarifa alta era arraigada em corações e mentes baseada no desempenho da eco-
nomia no longo prazo. À medida que a fragilidade causada pela adoção conti-
3
4 Comércio Exterior
nuada de tal estratégia econômica se tornava mais evidente, porém, era previsí-
vel que acabasse por se refletir em mudanças na política brasileira de comércio
exterior. A transição da posição de obstrução para a de demandeur era inexorável,
pois seria difícil conciliar a posição ativa de obstrucionista (footdragger) em re-
lação aos novos temas com a de demandeur em agricultura. Entre o início da Ro-
dada Uruguai em Punta del Este, em 1986, e a primeira reunião ministerial de-
pois do lançamento da Rodada Uruguai, em 1988, a posição brasileira mudou.
Gradativamente, a ênfase anterior em bloquear negociações sobre novos temas
foi substituída por papel mais ativo em relação à agricultura.
Tal reorientação rumo a políticas mais liberais foi, sobretudo, resultado da
reavaliação do protecionismo dentro do governo, sem vínculos mais profundos
com setores demandantes, quer entre os consumidores de bens de consumo ou
de insumos e bens de capital importados, quer entre exportadores em busca de
concessões para ampliar seu acesso a mercados. Também não houve qualquer
resistência significativa por parte dos setores adversamente afetados, quando a
liberalização comercial foi de fato iniciada, em 1988, ou intensificada, após 1990.
A reorientação da posição brasileira já ficara clara na reunião intermediária
da Rodada Uruguai em Montreal, em 1988, com a adoção de posição mais fle-
xível quanto a novos temas e mais comprometida em relação à liberalização agrí-
cola na qual o Brasil tinha interesse concreto como demandeur. Tanto direta,
como produtor agrícola eficiente, quanto indiretamente, uma vez que a
liberalização agrícola era considerada crucial pela Argentina, país que se torna-
ra prioridade para a política externa brasileira após meados da década de 1980.
A reunião do GATT em Bruxelas, em 1990, marcou a consolidação da transi-
ção brasileira para uma pauta positiva nas negociações, dado o seu papel signi-
ficativo na negociação de temas agrícolas.2
Não havia alternativas claras para a política adotada pelo Brasil. A perda de
credibilidade durante a década de 1980 e início dos anos 90, após prolongadas
dificuldades macroeconômicas que produziram inflação alta e persistente e bai-
xo crescimento, reduziu drasticamente os graus de liberdade para definir e
implementar políticas econômicas externas. Especialmente após a crise externa
que teve início em 1979-80, os temas financeiros tenderam a dominar a pauta
externa brasileira, embora as pressões de organizações financeiras internacionais,
em particular do Fundo Monetário Internacional (FMI), para que a liberalização
comercial fosse implementada tenham sido na verdade bastante comedidas, em
vista da situação da dívida externa. Os Estados Unidos concordaram até com o
adiamento da implementação do compromisso do Brasil de 1979 de desman-
telar seus subsídios à exportação, ilegais do ponto de vista do GATT, que tanto
atrito geraram por ocasião da implementação do código do GATT acordado na
Rodada Tóquio.
Capítulo 1 Liberalização comercial e economia política da proteção no Brasil, de 1987-2002 5
Restrições internas
O esgotamento da industrialização baseada no modelo de substituição de impor-
tações (ISI) como estímulo ao crescimento, devido à redução da penetração das
importações no mercado brasileiro, marcou o final dos anos 70.3 As taxas de cres-
cimento do PIB declinaram substancialmente após 1980. Primeiro, houve pro-
nunciada recessão em 1981-83, mas mesmo a longo prazo o desempenho foi
medíocre, já que os níveis de PIB per capita mal se mantiveram constantes du-
rante os 25 anos seguintes. A já modesta proporção das importações no consu-
mo continuou a declinar, em resposta à desvalorização cambial e aos controles
de importação do início da década de 1980. Em 1984, foi de 4,3% para impor-
tações agregadas de manufaturados (contra 6,8% em 1979) e nos setores mais
expostos à competição estrangeira não ultrapassava 15,7% (indústrias diversas).
Houve queda pronunciada na poupança pública após o segundo choque pe-
trolífero: se comparada ao início da década de 1970, caiu à metade, para 4% do
PIB no final da década, e aproximou-se de zero em 1983-85. A pressão para cortar
investimentos e subsídios governamentais foi intensa. É de certa forma sur-
preendente que em nenhum momento o investimento bruto tenha caído muito
abaixo de 17% do PIB durante a década de 1980, enquanto o PIB per capita per-
manecia estagnado. Parte da explicação é o fato de que o governo foi incapaz
de cortar investimentos de forma racional, ou seja, segundo uma ordenação de
taxas de retorno esperadas para cada projeto, e assim poder concentrar recur-
sos para concluir investimentos de melhor qualidade e congelar o restante. Cortes
generalizados resultaram no atraso da conclusão de praticamente todos os pro-
jetos públicos, com queda das taxas de retorno esperadas de todos os projetos
financiados pelo governo. Os investimentos cuja taxa de retorno já não era muito
alta desde o princípio tornaram-se desastrosos após longo período de cortes or-
çamentários violentos que afetaram a sua conclusão. O investimento privado tam-
bém sofreu com a redução acentuada do nível de atividade e com a estagnação
persistente que se seguiu, mas foi ajustado de maneira mais racional e imediata
à mudança nas perspectivas econômicas. De qualquer modo, a relação entre in-
vestimento e crescimento efetivo da capacidade produtiva tornou-se tênue.
Houve outras razões importantes para o aumento acentuado da relação mar-
ginal capital-produto, em especial durante a segunda metade da década de
1980. Há indícios de aumento significativo no custo dos investimentos em re-
lação ao deflator do PIB após 1986, em parte porque os preços dos bens de ca-
pital domésticos aumentaram substancialmente, com níveis mais baixos de uti-
lização de capacidade e proteção muito alta.
A inflação fora mantida relativamente sob controle durante os anos 70, mas
se acelerou após o segundo choque petrolífero em 1978-79, ultrapassando os
6 Comércio Exterior
100% anuais após 1979, e, em seguida, os 200% após 1984, alcançando pi-
cos de mais de 2.000% em 1990 e 1994 (deflator do PIB), com padrão ex-
tremamente volátil de taxas mensais à medida que fracassavam sucessivos
planos de estabilização. Com o Plano Real de 1993-94, as taxas anuais fo-
ram reduzidas abaixo de 10% após 1995. Maior incerteza com relação à es-
tabilidade das regras de indexação de preços, causada pelos esforços hete-
rodoxos de estabilização após 1986, provocou aumento significativo dos
preços da construção pesada, já que os fornecedores buscavam se proteger
de possíveis perdas futuras em contratos de longo prazo. A exemplo de outros
episódios de hiperinflação, os preços dos bens de capital também tenderam a
aumentar, pois os agentes econômicos buscavam proteger-se da aceleração
inflacionária.4
A confiança cada vez menor no modelo autárquico adotado durante um sé-
culo, aliada às restrições externas, acarretou lenta mudança na atitude em rela-
ção ao protecionismo e abriria espaço para a queda significativa da proteção.
2. Liberalização comercial
TABELA 1.1. Brasil: tarifas médias por setor, anos selecionados,1987-2002 (%)
Fontes: Kume, Piani e Souza (2000) e comunicação de Honório Kume para 1999 e 2002 (4o trimestre). Médias simples
por setor.
8 Comércio Exterior
TABELA 1.2. Brasil: cronograma de redução tarifária (médias simples), 1991-94 (%)
TABELA 1.3. Brasil: tarifas efetivas por setor, anos selecionados, 1987-99 (%)
Fontes: Argentina: 1985-91: GATT (1992b); 1991 (nov.): GATT (1992a); 1992-95: OMC (1999); 1997-2002: Alca, Banco
de Dados sobre Comércio e Tarifas nas Américas. Excluída a taxa estatística anterior a 1998 (de 3% na maior parte
do tempo).
Brasil: 1985-86: Azevedo e Portugal (1998); 1987-96: Kume, Piani e Souza (2000); 1997-2002: Alca, Banco de Dados
sobre Comércio e Tarifas nas Américas.
Chile: 1985-96: Meller (1993) e 1997-2002: Alca, Banco de Dados sobre Comércio e Tarifas nas Américas.
Colômbia: 1985 e 1988: GATT (1990); 1989-91, Ocampo (1993); 1994-95: UNCTAD TRAINS (Trade Analysis and
Information System);1996: OMC (1997c); 1997-2002: Alca, Banco de Dados sobre Comércio e Tarifas nas Américas.
Inclui sobretaxa de importação até sua extinção em 1992.
México: 1986, 1988 e 1990: Ros (1993); 1994-96, OMC (1998), 1997-2002: Alca, Banco de Dados sobre Comércio e
Tarifas nas Américas. A tarifa nominal inclui o equivalente ad valorem de impostos específicos e compostos sobre
produtos contendo açúcar.
12 Comércio Exterior
Penetração de importações
O impacto da liberalização comercial na economia brasileira foi abrangente e
significativo.20 A diminuição da proteção após 1988 levou ao aumento contínuo da
penetração de importações, medida como proporção do consumo aparente. Para
a indústria como um todo foi multiplicada por cinco, de 4,5% em 1989 para
22,5% em 1999, e em seguida diminuiu, respondendo à significativa depreciação
cambial no início de 1999 (Tabelas 1.5.A e 1.5.B).21 O maior aumento nas taxas
de penetração de mercado entre 1989 e 1999 foi relativo a material de transporte
e a outros bens de capital, com taxas multiplicadas por 10,3 e 5,8, respectiva-
mente. As taxas de penetração para bens intermediários menos sofisticados e bens
de consumo duráveis também aumentaram mais de cinco vezes no período.
Um critério alternativo para a medição do aumento da penetração é a dife-
rença absoluta entre suas taxas no início e no final do período de referência.
Capítulo 1 Liberalização comercial e economia política da proteção no Brasil, de 1987-2002 15
Setores classificados por categoria de uso 1989 1994 1998 1999 2000
Bens de consumo não-duráveis 2,6 4,4 8,2 10,3 9,1
Moagem de trigo 12,5 37,2 34,5 38,5 38,8
Indústria farmacêutica 6,9 11,4 14,5 21,3 19,4
Outras indústrias têxteis 1,0 2,8 13,1 15,3 14,4
Conservação de frutas e vegetais, incluindo sucos 2,3 7,2 9,9 12,8 11,5
Resfriamento e preparação do leite e laticínios 4,3 3,8 6,3 8,3 6,2
Artigos de material plástico 0,5 2,7 6,1 7,9 6,8
Artigos do vestuário e acessórios 0,3 1,0 7,7 7,5 6,4
Outras indústrias alimentares 3,0 4,0 7,6 7,4 6,5
Calçados 0,4 3,2 9,5 15,8 27,0
Indústria de perfumaria, sabões e velas 1,6 2,6 5,7 6,4 6,2
Indústria de bebidas 3,5 3,9 4,9 5,7 5,4
Refino de óleo vegetais 1,3 3,7 6,6 4,6 5,5
Abate de animais e preparação de carnes 8,4 3,3 5,5 4,3 4,8
Fabricação de alimentos para animais 0,3 0,7 1,5 1,7 1,5
Indústria do fumo 0,1 1,1 2,7 1,6 2,4
Indústria do café 0,0 0,0 0,1 0,1 0,2
Indústria do açúcar 0,0 0,4 0,0 0,1 0,1
Abate e preparação de aves 0,0 0,0 0,1 0,1 0,0
Bens de consumo duráveis 7,8 12,3 26,4 37,9 42,1
Fabricação de outros veículos 18,8 23,6 46,5 64,5 111,4
Aparelhos e equipamentos elétricos, incluindo 3,8 8,1 15,4 20,9 17,5
eletrodomésticos e máquinas de escritório
Aparelhos receptores de TV, rádio e equip. de som 4,9 11,4 14,0 18,0 16,2
Bens intermediários 2,2 7,5 10,4 12,7 14,4
Celulose e pasta mecânica 10,3 9,6 24,3 50,3 38,9
Vidro e artigos de vidro 4,0 9,0 15,1 18,8 19,9
Refino de petróleo 3,1 11,2 12,1 14,9 17,9
Indústria da madeira 1,2 3,9 15,0 246,4 52,5
Papel, papelão e artefatos de papel 1,4 5,1 11,1 9,5 8,2
Outros produtos de minerais não-metálicos 1,8 2,8 5,8 7,2 6,1
Peças e estruturas de cimento, concreto e fibrocimento 0,1 0,6 1,6 1,8 1,8
Cimento e clinquer 0,3 0,6 0,9 0,6 0,5
Setores classificados por categoria de uso 1989 1994 1998 1999 2000
Bens intermediários elaborados 5,2 12,2 20,7 23,5 21,9
Elementos químicos não-petroquímicos ou 41,4 39,5 57,9 63,1 54,4
carboquímicos
Resinas, fibras e elastômeros 6,3 16,1 32,6 34,6 32,1
Condutores e outros materiais elétricos excl. 8,8 17,7 26,5 33,0 32,9
para veículos
Adubos, fertilizantes e corretivos de solo 9,8 19,4 26,9 29,5 34,6
Metalurgia de não-ferrosos 8,0 16,1 27,0 33,0 29,6
Indústria da borracha 4,8 11,4 22,2 21,5 19,9
Fiação e tecelagem de fibras artificiais ou 0,8 10,5 17,7 20,2 23,2
sintéticas
Produtos químicos diversos 5,7 9,9 15,1 18,2 15,3
Beneficiamento, fiação e tecelagem de fibras 3,5 13,1 18,1 17,1 15,1
naturais
Outros produtos metalúrgicos 1,5 4,4 11,5 11,8 10,7
Petroquímica básica e intermediária 4,0 8,8 9,8 10,9 11,5
Siderurgia 1,9 3,8 8,8 8,0 8,0
Laminados plásticos 0,2 2,4 5,0 6,1 6,3
Fundidos e forjados de aço 0,5 1,0 6,2 5,1 4,3
Bens de capital 11,4 28,0 56,9 67,4 66,2
Material e aparelhos eletrônicos e de 11,6 33,5 65,9 81,0 95,9
comunicação
Máquinas, equipamentos e instalações, incl. 13,3 30,0 56,9 62,6 52,5
peças e acessórios
Equipamentos para produção e distribuição de
energia elétrica 8,2 15,0 43,4 54,7 46,9
Tratores e máquinas rodoviárias, incl. peças 1,7 5,5 24,3 34,1 20,2
e componentes
Equipamentos de transporte 2,1 11,6 22,4 21,9 20,4
Motores e peças para veículos 6,0 18,0 34,7 37,9 40,2
Automóveis, caminhões e ônibus 0,0 8,7 17,5 14,5 11,8
Total da indústria 4,5 10,6 19,1 22,5 21,6
Desse ponto de vista, os setores mais afetados foram os de bens de capital (com
exceção de equipamentos de transporte) e bens de consumo duráveis, com ex-
pansão de taxas de penetração de respectivamente 54,8% e 34,3% entre 1989 e
1999. A maior parte das taxas de expansão de penetração mais significativas ocor-
reu no setor de bens de capital. Em quase todos os casos, foi superior a 20%, e
atingiu mais de 40% em setores produtores de equipamentos eletrônicos e de
comunicações, máquinas, equipamentos elétricos e outros veículos, com um
pico de quase 70% para produtos eletrônicos e de comunicações. No setor de
tratores e máquinas rodoviárias, a penetração aumentou de 1,7% para 34,1%;
na produção de automóveis, caminhões e ônibus, de 0% para 17,5% em 1998
apesar da reversão da liberalização. No setor de motores e peças para veículos,
cresceu de 6% para 40,2% (em 2000). Em muitos setores produtores de bens in-
termediários mais elaborados, a expansão ultrapassou 20%.22
Produtividade
Houve muitas tentativas de medir o impacto da liberalização comercial na produ-
tividade brasileira. Estimou-se que o impacto da liberalização generalizada das po-
líticas econômicas teve como conseqüência o aumento da produtividade total dos
fatores de 58% entre 1990 e 1994, dos quais cerca de 56% podem ser relaciona-
dos à remoção de barreiras não-tarifárias e à redução de tarifas.23 Resultados mais
desagregados mostram uma forte relação entre o aumento da produtividade da
mão-de-obra e a produtividade total dos fatores, e maior abertura medida por va-
riáveis como proteção nominal, efetiva e relação importação-PIB.24 Segundo estudo
com base em amostra de empresas de médio e grande portes no Brasil, entre 1986
e 1998, a produtividade total dos fatores foi favoravelmente afetada pelo impulso
competitivo relacionado à maior penetração de importações. Os resultados indi-
cam que cada aumento de 1% na penetração das importações aumentaria a pro-
dutividade total dos fatores em 0,3%,25 resultado confirmado para amostra ainda
maior de empresas brasileiras no período entre 1996 e 2000: cada aumento de 1%
na penetração das importações elevava a produtividade total dos fatores em 0,1%,
e cada redução de 1% nas tarifas aumentava a produtividade total dos fatores em
mais 0,1%.26
Efeitos distributivos
Indícios dos efeitos da liberalização comercial sobre a distribuição de renda são
menos claros. Alguns estudos não conseguiram encontrar relação simples entre
liberalização comercial e diminuição na desigualdade de renda no Brasil.27 Ou-
tros verificaram que não existem vínculos estreitos entre redução tarifária, mu-
danças na estrutura salarial da indústria e mudanças na desigualdade de renda.28
Entretanto, a valorização crescente do trabalho qualificado no Brasil é explicada,
18 Comércio Exterior
porém, era muito mais limitada e temporária, se medida pelos níveis tarifários, em-
bora as taxas de penetração de importações não tenham caído (Tabelas 1.5.A e 1.5.B).
Existem fortes evidências qualitativas dos vínculos entre evolução da penetra-
ção de importações e estrutura da proteção. Quando o avanço foi mais signifi-
cativo no passado recente, os interesses protecionistas tenderam a reagir de modo
mais decisivo. A concentração na produção é, provavelmente, variável significa-
tiva na explicação do nível de proteção, com base nos argumentos tradicionais
relativos à concentração de interesses. É também possível que as variações tari-
fárias efetivas tenham sido mais relevantes do que as variações tarifárias nomi-
nais. Poder de mercado serviria de base não apenas para obter mais proteção para
bens finais, mas também para reduzir a proteção sobre partes e componentes.39
A literatura sobre a economia política da proteção segue duas tradições.
Uma delas ressalta a importância de grupos industriais restritos: “interesses
especiais”. A outra concentra a atenção em interesses relacionados a fatores
de produção ou “interesses de classe”. A mobilidade interindustrial dos fa-
tores de produção desempenha papel crucial para determinar se os efeitos do
comércio e da política comercial sobre a renda acarretam conflitos baseados
em discrepância de “interesses especiais” ou de “interesses de classe”. Caso
os fatores de produção tenham mobilidade entre diferentes indústrias, os efei-
tos do comércio tenderão a fazer com que os proprietários de diferentes fa-
tores da produção se oponham uns aos outros em todas as indústrias (capi-
tal versus trabalho, por exemplo). Já com fatores imóveis, os efeitos do
comércio levarão os proprietários do mesmo fator em diferentes indústrias a
se oporem uns aos outros.40 Quanto maior a heterogeneidade das taxas de
retorno de fatores entre diferentes indústrias, menor a mobilidade dos fato-
res, e vice-versa. Essa heterogeneidade pode ser medida por coeficientes de
variação (desvio-padrão dividido pela média) em diferentes indústrias em de-
terminada data: quanto maior o coeficiente de variação, menor a mobilida-
de de fatores.41
Em muitas experiências nacionais, a economia política da proteção tendeu
mais recentemente a concentrar-se no conflito entre “interesses especiais”. Isso
contrasta com o conflito “baseado em classes” entre organizações — por exem-
plo, partidos que representam capital e trabalho — com visões opostas sobre o
nível de proteção, típico do final do século XIX. Nos Estados Unidos, uma maior
mobilidade de fatores entre 1870 e, digamos, 1919, levou a apoio quase unâni-
me às altas tarifas por parte dos republicanos e à oposição por parte dos demo-
cratas, durante período em que a economia política da proteção era claramente
baseada em fatores ou em classes. Tais graus de coesão de classe jamais haviam
sido vistos antes de 1870, nem o seriam novamente após 1945, quando a opo-
sição de “interesses especiais” era a regra.42 Há evidência de que, para diversas
24 Comércio Exterior
TABELA 1.7. Brasil: coeficientes de variação de salários médios e dos lucros por
trabalhador em diferentes setores industriais, 1919-2000*
* CV-9 refere-se a nove setores definidos pelo Censo de 1919; CV-19 aos 19 setores definidos no Censo de 1939; e
CV-22 aos 22 setores definidos no Censo de 1949 e na Pesquisa Industrial.
Fontes: IBGE (1990) e pesquisa industrial anual no site do IBGE.
0,6
0,5
Coeficiente de variação
0,4
0,3
0,2
0,1
0,0
1900 1920 1940 1960 1980 2000 2020
Figura 1.1. Brasil: coeficientes de variação de salários médios nos setores industriais, 1919-2000
2,0
1,8
1,6
Coeficiente de variação
1,4
1,2
1,0
0,8
0,6
0,4
0,2
0,0
1900 1920 1940 1960 1980 2000 2020
Figura 1.2. Brasil: coeficientes de variação de lucros por trabalhador em setores industriais, 1919-2000
Capítulo 1 Liberalização comercial e economia política da proteção no Brasil, de 1987-2002 27
Apêndice estatístico
Fonte: Kume, Piani e Souza (2000). Médias simples para cada setor.
Capítulo 1 Liberalização comercial e economia política da proteção no Brasil, de 1987-2002 29
Setor 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Agropecuária 0,2 7,4 7,3 9,9 9,9 9,8 n.d. n.d. n.d.
Extrativa mineral 1,5 2,8 3,7 6,5 6,4 6,2 6,1 5,8 4,9
Extração de petróleo e carvão 0 0 0 0 0 - 0,0 0,0 0,0
Minerais não-metálicos 9,2 10,2 10,5 13,7 13,6 13,5 13,5 13,2 12,1
Siderurgia 6,3 7,1 7,8 10,2 10,2 10,1 10,2 9,9 9,0
Metalurgia de não-ferrosos 7,6 8,9 8,8 11,7 11,7 11,7 11,7 11,3 10,4
Outros produtos metalúrgicos 14,3 15,8 15,9 18,9 18,9 18,8 18,8 18,4 17,4
Máquinas e tratores 19 16,5 15,5 17,8 17,7 16,9 16,2 15,7 14,3
Material elétrico 18,4 21,3 17,2 19,8 19,5 19,0 19,0 18,6 17,3
Equipamentos eletrônicos 19 19,3 15,6 17,9 17,4 16,6 15,8 14,7 12,4
Automóveis, caminhões e ônibus 19,9 41 52,4 47,1 38,1 30,3 30,3 30,2 29,9
Peças e outros veículos 17,4 17,9 16,1 18,7 18,5 17,9 17,8 17,5 16,3
Madeira e mobiliário 8,8 10,7 11 14 14 14,0 14,0 13,6 12,6
Celulose, papel e gráfica 8,3 9,8 10,3 14,2 14,2 14,2 14,2 13,8 12,5
Borracha 12,1 12,6 12,5 15 14,8 14,8 14,8 14,5 13,5
Elementos químicos 8,5 7,6 6,5 16,7 21,1 20,2 17,0 15,9 12,7
Refino de petróleo 5,2 3,8 4,1 5,4 5,4 5,4 9,6 9,3 8,5
Produtos químicos diversos 7,1 7,6 7,8 10,9 10,9 10,8 9,3 9,0 8,0
Farmacêutica e perfumaria 4,6 8 8 10,7 10,8 10,6 10,6 10,3 9,4
Artigos de plástico 15,7 15,3 15,2 18,1 18,2 17,4 17,4 17,1 16,1
Têxtil 13,2 14,9 16,3 19,4 19,4 19,4 17,8 17,5 16,5
Vestuário 19,4 19,8 19,8 22,8 22,8 22,8 22,7 22,4 21,4
Calçados 13,2 17,9 15,3 18 17,2 16,8 16,8 16,2 14,5
Indústria do café 9,8 10 12 15 15 15,6 n.d. n.d. n.d.
Beneficiamento de produtos vegetais 10 12,1 12 14,8 14,8 14,7 14,6 14,3 13,3
Abate de animais 7,3 8,4 9,2 12,2 12,2 12,2 12,4 12,1 11,1
Laticínos 23,5 18,1 18,9 21,1 23 22,0 22,2 21,9 20,8
Açúcar 10,1 16 16 19 19 19,0 n.d. n.d. n.d.
Óleos vegetais 8 8,3 8,4 11,4 11,5 11,8 12,0 11,6 10,6
Outros produtos alimentares 13 14,6 15,1 18 17,9 17,9 20,5 20,2 19,3
Indústrias diversas 14,4 13,5 13,5 16,3 16,4 15,6 15,6 15,3 14,3
Média simples 11,2 12,8 13 15,6 15,5 15,0 15,0 14,7 13,5
Média ponderada pelo valor 10,2 10,8 10,8 13,4 13,4 13,2 n.d. n.d. n.d.
adiconado
Desvio-padrão 5,9 7,4 8,7 7,6 6,6 5,7 n.d. n.d. n.d.
Fonte: Kume, Piani e Souza (2000). Médias simples para cada setor.
30 Comércio Exterior
TABELA A1.4 Argentina: tarifas NMF por categoria CTCI*, 1998 e 2006 (planejada)
1998 2006
Agricultura, pecuária, caça, silvicultura e pesca 9,5 7,1
Extrativa mineral 6,1 3,3
Manufaturas 13,8 11,4
Alimentos, bebidas e tabaco 14,5 11,6
Têxteis, vestuário e indústrias do couro 20,2 17,0
Madeira e derivados, incluindo móveis 14,4 10,6
Papéis e derivados, impressão e edição 15,1 10,8
Produtos químicos, petróleo, carvão, borracha e plásticos 10,6 8,1
Produtos minerais não-metálicos, exceto petróleo e carvão 13,6 10,8
Indústrias metalúrgicas básicas 13,6 9,8
Produtos metalúrgicos elaborados, máquinas e equipamentos 14,6 13,0
Outras indústrias manufatureiras 19,7 16,5
Total 13,5 11,1
Notas
1
Para análise mais detalhada da posição brasileira no GATT, ver o Capítulo 4, adiante, no
qual baseiam-se este e os próximos parágrafos.
2
Ricúpero (1993), p. 30.
3
Ver Abreu (2004), p. 30 e 33.
34 Comércio Exterior
4
Carneiro e Werneck (1993), p. 60-66. Para uma abordagem teórica do vínculo entre infla-
ção acelerada e preços da construção, ver Loyo (1994). A discussão sobre o impacto da
liberalização comercial nos preços de bens de capital é retomada na Seção 3.
5
Ver Kume, Piani e Souza (2000) para as tarifas brasileiras após 1987. Para políticas
tarifárias imediatamente anteriores ao início do período de liberalização, ver Kume (1990).
6
Kume, Piani e Souza (2000), p. 3.
7
No início de 1992, o governo decidiu alterar o período de implementação inicialmente
acordado para que este terminasse seis meses antes do previsto. Ver Tabela 1.2.
8
Para mais detalhes ver Kume, Piani e Souza (2000).
9
As tarifas sobre outros produtos químicos eram baixas, mas refletiam sua composição
anormal em 1987.
10
GATT (1993), p. 143-9, OMC (1997a), p. 65-76, OMC (2000), p. 43-8, 135-7.
11
OMC (2000). Ainda acima do patamar de 10%.
12
Em algumas economias, as barreiras não-tarifárias eram relativamente mais importantes
do que em outras. A despeito do pioneiro programa chileno de liberalização comercial,
o país conservou por longo período um sistema de bandas de preços que resultava em
proteção variável de determinados produtos agrícolas que podia alcançar 31,5% ad valorem,
ver OMC (1997b). O mesmo se aplica à Colômbia, ver OMC (1997c). Os níveis tarifários
mexicanos referem-se a importações não-preferenciais que correspondem a menos de
10% das importações totais do México.
13
Sobre as complexidades do impacto do Mercosul nas políticas comerciais argentinas, ver
Berlinski (1998). O impacto do Mercosul sobre as políticas brasileiras não foi tão com-
plexo, já que não se recorreu a reintegros e outros instrumentos para compensar a falta de
competitividade das exportações devida à supervalorização cambial. Também existiam,
e existem, inúmeras exceções brasileiras à TEC do Mercosul, bem como produtos excluí-
dos da liberalização intrazona. Ver OMC (1997a), p. 39-40 e OMC (2000), p. 20-22 e 30-
34. Ver Tabelas A1.3 e A1.4, no Apêndice estatístico, para detalhes sobre a evolução da
tarifa nominal na Argentina..
14
Ver Berlinski (1998) e Tabela A1.5, no Apêndice estatístico.
15
Algumas reformas se fizeram notar por sua ausência, como por exemplo as relativas ao
mercado de trabalho.
16
Foram utilizados preços por atacado na indústria, para o Brasil, e preços ao produtor,
para os Estados Unidos. Agradecimentos a Dionísio Dias Carneiro pela série de taxa de
câmbio real.
17
Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), World
Investment Report 2000, p. 262.
18
Ver Abreu (2002), base para este parágrafo e os dois seguintes.
19
Números computados a partir de dados de estoque de capital do Censo de Capitais Es-
trangeiros, realizado pelo Banco Central Brasileiro (www.bcb.gov.br).
20
Ver a avaliação de Markwald (2001).
21
Com uma agregação diferente, é possível mostrar que, em 2001, em 18 dos 20 setores
industriais (segundo a Classificação Nacional de Atividades Econômicas), a penetração de
importações era maior do que em 2000. Dados fornecidos por Maurício Moreira.
22
Moreira e Puga (2001) analisam detalhadamente como as taxas de penetração foram afe-
tadas pela desvalorização de 1999 e mostram que, utilizando a taxa de câmbio de 1998,
a taxa de penetração para o setor industrial em 1999 seria 5 pontos mais baixa do que
os 22,5% computados por meio de preços correntes.
Capítulo 1 Liberalização comercial e economia política da proteção no Brasil, de 1987-2002 35
23
Hay (1997).
24
Rossi Jr. e Ferreira (1999).
25
Muendler (2002).
26
López-Córdoba e Moreira (2003).
27
Muendler (2000).
28
Pavcnik, Blom, Goldberg e Schady (2002).
29
Simulações realizadas por Moreira e Najberg (1999).
30
Gonzaga (1997).
31
Muendler (2002).
32
López-Córdova e Moreira (2003).
33
Ver Reis et al. (1996) e (2002). Contudo, essa reversão não é confirmada por dados mais
recentes; ver nota 37 adiante.
34
Tallman e Wang (1995).
35
A supervalorização do real em 1996-98 também teve seu papel na redução do custos dos
bens de capital importados.
36
Dados sobre contas nacionais e custos de construção mostram que, entre 1997 e 2002,
o preço relativo da formação bruta de capital fixo e do deflator do PIB caiu mais 34,2%
e o de máquinas e equipamentos caiu 32,2% (Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-
tística (2003) e Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices de Construção Civil, Si-
dra).
37
A maior parte dos investimentos de ISI esteve tradicionalmente concentrada no Sudes-
te do Brasil, especialmente no estado de São Paulo.
38
Ver de Negri (1999) para uma descrição detalhada do “regime automotivo” brasileiro.
39
Há claro espaço para projeto de pesquisa com foco no Brasil de acordo com a literatura
sobre os Estados Unidos e outras economias desenvolvidas. Seu objetivo seria analisar
a determinação simultânea da proteção (nível tarifário) e da penetração de importações,
usando dados cruzados sobre tarifas, em vez de dados sobre proteção não-tarifária. Ver
Ray (1981), Trefler (1993) e Goldberger e Maggi (1999). Existem trabalhos sobre prote-
ção endógena no Mercosul, como Olarreaga e Soloaga (1998), igualmente relevantes neste
contexto.
40
Sindicatos organizados em setores industriais diferentes ou industriais à frente de firmas
em setores diferentes. No Brasil a coalizão entre multinacionais no setor automotivo e
os sindicatos que representam os interesses dos trabalhadores no setor é um bom exem-
plo da tendência à substituição de “luta de classes” por “interesses especiais”.
41
Casos polares de hipóteses sobre mobilidade de fatores são os modelos de comércio de
Stolper-Samuelson (perfeitamente móveis) e de Ricardo-Viner (fatores específicos). Ver
Hiscox (2002), Capítulo 1.
42
Ver Hiscox (2002), Capítulo 1.
43
Idem, Capítulo 4 a 10.
44
Ver Fritsch e Franco (1993), p. 18 e 33-35, e Anderson (1999). Ver também Mello (1997)
para uma visão reveladora quanto às câmaras setoriais e o regime automotivo.
2 A economia política
da integração
hemisférica: interesses
latino-americanos
1. Introdução
2. Contrastes hemisféricos: tamanho e comércio
3. A economia política da proteção na América Latina: inércia da história
4. A economia política da proteção nos Estados Unidos: desenvolvimentos perniciosos
5. O processo de negociação da Alca
6. Conclusões
Capítulo 2 A economia política da integração hemisférica: interesses latino-americanos 39
1. Introdução
Negociações comerciais geralmente são conduzidas com base na troca de “con-
cessões”, sob a forma de redução recíproca de proteção (tarifas e barreiras não-
tarifárias). Não deixa de ser inquietante que “concessões” oferecidas por de-
terminado país, se adotadas unilateralmente, de fato favorecem seu bem-estar
líquido. Níveis existentes de proteção refletem o equilíbrio de processos na-
cionais de economia política que envolvem o impacto distributivo de custos e
benefícios por ela acarretados. A proteção subsiste em todos os países, sobre-
tudo devido ao desequilíbrio quanto ao poder de barganha de dois grupos an-
tagônicos. De um lado, produtores domésticos ineficientes ou que auferem al-
tos lucros devido à proteção, capazes de mobilizar lobbies eficazes. De outro,
consumidores de bens produzidos domesticamente, que arcam com a maior
parte dos custos da proteção — ou porque os produtos domésticos são mais caros
ou de pior qualidade do que as importações — e que têm menor estímulo para
mobilizar seus interesses.
Criar a Área de Livre Comércio das Américas (Alca), portanto, é encontrar
uma forma de perturbar o atual equilíbrio perverso, em que o protecionismo pros-
pera em praticamente todas as economias do hemisfério, rumo a equilíbrio com
proteção zero em todas as economias a ser alcançado após razoável período de
transição. Nas economias envolvidas nas negociações comerciais, o desman-
telamento recíproco da proteção depende de forma crucial da mobilização do
apoio político de grupos que poderiam se beneficiar da integração hemisférica
potencialmente, para enfrentar o peso político dos setores favorecidos pela pro-
teção, e que seriam prejudicados pela liberalização comercial.
Compromissos com a liberalização podem ser ineficazes caso continue sen-
do possível adotar políticas discricionárias unilaterais: ações antidumping ou re-
lativas à compensação de subsídios, ou salvaguardas. A questão de quão rígidos
são os compromissos relativos à redução da proteção, mesmo depois da conclusão
da Alca, é portanto fundamental.
Cada possível membro da Alca tenderá a favorecer uma estratégia que, no
início, minimize as ofertas de maior acesso ao próprio mercado e assegure acesso
39
40 Comércio Exterior
sua abrangência ser analisada em termos do leque de temas que poderia incluir.
Por fim, considera-se a interação, em termos de conteúdo e de cronograma, entre
os processos de negociação da Alca e outras negociações, especialmente da Ro-
dada de Doha na OMC. A Seção 6 serve de conclusão.
União Comunidade
Européia Andina Caricom CACM Mercosul Nafta Alca
Comércio Exterior
TABELA 2.2. Hemisfério ocidental: PNB-PPC e comércio total de bens – principais ZLCs e
principais economias, 2000
acima de 35%
04 Leite e laticínios 12,4 5,0 0,40 69,7 100
07 Produtos hortícolas 9,0 7,6 0,84 12,5 —
19 Preparações à base de cereais 9,1 5,8 0,63 58,3 100
20 Preparações de produtos hortícolas 11,3 21,9 1,94 18,2 25
24 Tabaco e seus sucedâneos manufaturados 90,7 156,3 1,72 40,0 33,3
52 Algodão 9,2 3,9 0,42 28,6 100
54 Filamentos sintéticos ou artificiais 10,9 3,9 0,36 0 0
55 Fibras sintéticas ou artificiais 11,4 4,0 0,35 100 —
60 Tecidos de malha 10,9 3,9 0,36 0 0
61 Vestuário e seus acessórios, de malha 12,7 8,4 0,66 21,7 0
62 Vestuário e seus acessórios, exceto de malha 10,7 7,4 0,69 37,8 —
64 Calçados 14,1 14,2 1,00 35,1 24
possível manter tarifa alta no Brasil porque custos de produção mais altos que
afetavam as exportações dela decorrentes podiam ser transferidos de forma sig-
nificativa para os consumidores de café.17 Isso se devia à combinação da posição
dominante no mercado mundial desse produto, à importância da economia ex-
portadora de café na economia brasileira e à baixa elasticidade-preço da deman-
da de café. Tentativas de aumentar a proteção em outras economias exportado-
ras de commodities enfrentaram a oposição dos exportadores, dado que não havia
possibilidade de afetar os preços mundiais, em contraste com o caso brasileiro.
O aumento de proteção resultaria em redução das margens de lucro dos expor-
tadores ou em redução na sua participação no mercado mundial. Não que o Bra-
sil tenha conseguido evitar totalmente os custos acarretados pela tarifa alta, mas
foi possível reduzir esses custos, ainda que parcialmente, graças aos consumidores
mundiais de café.18 À medida que o café perdeu sua importância na economia
brasileira, esses efeitos tenderam a se enfraquecer com o tempo.
Após a recessão de 1929-33, a proteção na América Latina se tornou gene-
ralizada, em muitos casos sob a forma de restrições quantitativas atreladas a re-
gimes de controle cambial. A estratégia de substituição de importações por meio
de alta proteção foi adotada por muitas economias latino-americanas menores,
com participações reduzidas nos mercados mundiais de commodities, e cujo ta-
manho do mercado interno permitia apenas produção doméstica ineficiente. Os
regimes de comércio exterior adotados após a Segunda Guerra Mundial embu-
tiam, de novo, sério viés antiexportador. Todavia, é importante reconhecer que,
até certo ponto, essas políticas foram resultado da contração dos mercados
de exportação tradicionais, mais do que simplesmente resultado do primitivismo de
políticos populistas.19
A atração do IDE iniciada na década de 1950, mesmo nas economias maio-
res, incluiu políticas para garantir que a competição fosse limitada a poucos par-
ticipantes, protegidos por altas muralhas tarifárias. Criou-se, então, estranho fe-
nômeno latino-americano: empresas multinacionais que desempenharam, e
continuam a desempenhar, papel crucial na tentativa de retardar a liberalização
comercial, em vista de seu interesse há muito estabelecido na manutenção da pro-
teção. A partir de meados da década de 1960, versões mais extremas do mode-
lo autárquico começaram a ser abandonadas em muitas economias latino-ame-
ricanas, já que havia preocupação crescente em relação à manutenção do viés
antiexportador implícito nas políticas anteriores. No entanto, é equivocado afir-
mar que as políticas passaram a ser orientadas para o mercado externo — a ser
outward-looking —, pois os mercados nacionais foram abertos muito lentamente
e, na verdade, em reação aos choques petrolíferos da década de 1970 e às sub-
seqüentes crises relacionadas à dívida externa, a liberalização comercial foi em
muitos casos revertida. Em meados da década de 1970, as tarifas nominais eram
52 Comércio Exterior
tipicamente muito altas ou a proteção podia ser até absoluta, em decorrência dos
controles de importação. A isso aliava-se a distribuição discricionária de isenções
e reduções tarifárias, de modo que a receita dos impostos de importação não era
muito significativa. As exportações, por sua vez, eram pesadamente subsidiadas,
em especial para atrair capital estrangeiro direto, com o uso de incentivos fis-
cais relacionados a metas de desempenho exportador futuro. O aumento espe-
tacular da participação de produtos industrializados nas exportações totais de
economias como a brasileira, a partir de meados dos anos 60 até início de 1980,
foi resultado direto de tais subsídios. De certa forma, é possível dizer que a to-
mada de decisões relativas à política econômica externa continuou, em grande
medida, baseada em “escolha de vencedores”. As diferenças decorriam do sim-
ples revezamento daqueles que escolhiam: durante o longo período de contro-
le absoluto dos militares, em vez de escolher os vencedores tendo a substituição
de importações como foco quase exclusivo, como ocorreu até a década de 1960,
o leque de políticas foi ampliado para incluir aqueles que, acreditava-se, podiam
transformar-se em exportadores significativos. A busca de rendas da escassez (rent-
seeking), depois de concentrar-se durante longo período em projetos de substi-
tuição de importações e conseqüentes demandas por proteção, passou a ter pa-
pel decisivo também na distribuição de subsídios às exportações. 20
Desde o final dos anos 70, porém mais marcadamente a partir de meados da
década de 1980, a liberalização comercial passou a ser adotada como pilar de
abrangentes reformas econômicas na maior parte das economias latino-america-
nas, inclusive nas mais relutantes em mudar políticas tradicionalmente protecio-
nistas. Houve liberalização comercial unilateral significativa, com reduções
acentuadas de tarifas médias e desmantelamento de barreiras não-tarifárias. O re-
curso a restrições quantitativas sob o artigo XVIII:b do GATT, prática anterior-
mente freqüente, praticamente desapareceu. Na Rodada Uruguai, a maioria dos
países latino-americanos consolidou 100% de suas linhas tarifárias para produtos
industrializados em níveis que convergiriam para 35% em cinco anos. Em boa
parte dos casos, todavia, as tarifas aplicadas mantiveram-se muito abaixo dos ní-
veis consolidados.
Essa mudança nas políticas deveu-se ao reconhecimento de que a substitui-
ção de importações não conseguira continuar a proporcionar incentivos para o
crescimento rápido, mesmo nas economias em que a estratégia fora mais bem-
sucedida no passado. As importações haviam sido tão reduzidas que até mesmo
um aumento ainda mais espetacular da substituição de importações (muito mais
difícil de ser alcançado) não poderia ter impacto significativo. Além disso, os
custos da proteção a longo prazo tornaram-se explícitos, na medida em que as
exportações enfrentavam problemas crescentes, resultado da sua falta de
competitividade agravada por investimento em bens de capital produzidos do-
Capítulo 2 A economia política da integração hemisférica: interesses latino-americanos 53
clusão por parte do Mercosul foi contrabalançada por pressões crescentes pela
inclusão oriundas de Washington.
6. Conclusões
A partir de 2003 os Estados Unidos sinalizaram e depois explicitaram clara-
mente que reservariam negociações substantivas em relação a antidumping e sub-
sídios agrícolas para o âmbito da OMC, exatamente os temas que mais interes-
savam ao Mercosul. Isso se somava à anunciada diferenciação da oferta dos
Estados Unidos em relação a acesso a mercados com o Mercosul, sendo tratado
de forma particularmente desfavorável. O Mercosul, que já havia emitido claros
sinais políticos de ter havido redução do entusiasmo, que já era modesto, em
relação à Alca, marcou posição reservando in limine, também para negociação na
OMC, temas em relação aos quais os Estados Unidos eram demandeurs: regras
sobre investimento, propriedade intelectual, compras públicas, serviços e polí-
ticas de concorrência.
Como forma de romper o impasse aventou-se a possibilidade de flexibilizar
o formato final para acomodar os objetivos divergentes de diversos membros fu-
turos: a Alca dita light. Um acordo hemisférico básico, bastante modesto, seria
complementado por acordos plurilaterais com disciplinas mais estritas, que in-
cluiriam apenas os países interessados em participar de cada acordo. A conso-
lidação da possibilidade de uma Alca de geometria variável na Cúpula de Miami,
em 2003, abriu espaço para a cristalização de um processo do tipo olho por olho
(tit for tat) entre Brasil e Estados Unidos, e esvaziou a substância efetiva de um
possível acordo ambicioso. Depois das exclusões mútuas de temas reservados, ao
menos nominalmente, para negociação multilateral, o caminho estava aberto para
os Estados Unidos mencionarem que as negociações de acesso teriam como ob-
jetivo “substancialmente todo o comércio”, ou seja, que os Estados Unidos ex-
cluiriam produtos sensíveis do objetivo final a ser alcançado. Com o fracasso da
Rodada de Doha, em 2003, em Cancun, persistiu o congelamento das negocia-
ções da Alca, dada a inter-relação entre as duas negociações.
A arquitetura baseada em diferenciação da ambição dos acordos negociados
poderia, além de resolver o impasse Estados Unidos-Mercosul, remover outra
dificuldade envolvida nas negociações da Alca e nem sempre explicitada: as inú-
meras preferências preexistentes seriam afetadas de forma adversa pela
implementação de liberalização comercial generalizada. A erosão de preferên-
cias sub-regionais, especialmente aquelas relacionadas ao mercado norte-ameri-
cano, no Nafta, na América Central e no Caribe, no Chile, entre outros, pode
funcionar como obstáculo ao interesse mais efetivo por parte das economias que
seriam afetadas pela reversão do desvio comercial acarretado por seus acordos
preferenciais com os Estados Unidos.
62 Comércio Exterior
Notas
1
Tanto a Farm Bill quanto a TPA expirarão em 2007. A nova proposta do Executivo quan-
to à Farm Bill reduz o total dos subsídios para o próximo qüinqüênio de US$105 bilhões
para US$87 bilhões, em linha com a sua proposta na OMC, mas ainda bem acima dos
pagamentos efetivos no passado recente. Não há qualquer garantia de que o Congresso
norte-americano aprove esse total, nem ainda qualquer indicação quanto às condi-
cionalidades que estariam associadas à renovação da TPA.
Capítulo 2 A economia política da integração hemisférica: interesses latino-americanos 63
2
Aumenta para 0,5% se o grupo de 30 membros restantes incluir o Canadá.
3
A importância das exportações caribenhas para fora do hemisfério está relacionada às pre-
ferências tarifárias oferecidas pela União Européia.
4
As referências aqui são sempre a tarifas aplicadas. Na maioria das economias da América
Latina, as linhas tarifárias foram consolidadas na OMC em 35% para produtos indus-
trializados. Para alguns produtos agrícolas, os níveis consolidados são mais altos. Assim,
as tarifas aplicadas estão muito abaixo das consolidadas. Para Estados Unidos e Cana-
dá, as tarifas aplicadas geralmente são as consolidadas na OMC. A adoção de tarifas con-
solidadas como base para iniciar a redução tarifária no contexto da Alca equivaleria à acei-
tação, pelos Estados Unidos, de período de graça antes de a liberalização comercial co-
meçar a ter efeito concreto na América Latina.
5
Dados fornecidos por Marcos Jank. Cálculos com base em dados da Alca, Banco de Dados
sobre Comércio e Tarifas nas Américas, e da AMAD, Agricultural Market Access Database.
6
A abolição dos picos tarifários norte-americanos que afetam as exportações brasileiras de
outros produtos agrícolas e da indústria alimentícia, ou seja, sua redução a 15% ad valorem,
faria a tarifa média cair pela metade, de 18,2% para 9,1%. Ver Bouët, Fontagné, Mimouni
e Pichot (2001).
7
Muitas vezes, os picos tarifários norte-americanos sobre produtos agrícolas extremamente
altos são ocultos por desagregação inadequada dos dados. A tarifa extraquota tarifária da
posição de oito dígitos 24011065 (na nomenclatura dos Estados Unidos, Tobacco, not
stemmed or stripped, not or not over 35% wrapper tobacco, flue-cured burley) é 350%, mas ao nível de
seis dígitos a tarifa média comparável à da posição 240110 (fumo em folhas) é 42,5%,
de aspecto muito mais inocente. Ver Jank (2002). Com a implementação do Acordo de
Têxteis e Vestuário feito na Rodada Uruguai foram abolidas as quotas sobre tais produ-
tos a partir de 2004.
8
OMC (2002).
9
Esses são valores para o Brasil.
10
Esse é o caso mais extremo de inércia protecionista no Mercosul. É interessante obser-
var, no contexto da economia política da proteção, que a lista de demandantes no Mercosul
de tarifa externa comum alta inclui, em posição proeminente, multinacionais produto-
ras de automóveis e bens de capital, temerosas de perder seus mercados confortavelmente
protegidos. Isso é fator importante para explicar o desvio comercial causado pelo
Mercosul. Ver Yeats (1999).
11
Alca, Banco de Dados sobre Comércio e Tarifas nas Américas. Ver Jank, Fuchsloch e Kutas
(2003) para análise abrangente da proteção na Alca, com ênfase em produtos agrícolas.
12
Sandrey (2000).
13
Jank, Fuchsloch e Kutas (2003). As divergências no caso de outras economias do
Mercosul, da Venezuela e da Caricom também são significativas.
14
Essas economias estiveram na origem de 410 do total de 485 ações iniciadas por membros
potenciais da Alca em 1987-2000, ver Tavares (2000). No Brasil, há concentração de ações
que envolvem produtos químicos (www.mdic.gov.br/comext/decom/decom.html).
15
Ver Rodrik (1995a) para a análise-padrão de modelos alternativos de economia política.
Ver também Helpman (2002). Grande parte da literatura sobre economia política exige
ajustes substanciais para que se tente aplicá-la à formulação e implementação de políticas
comerciais em economias com características institucionais muito diferentes das que ca-
racterizam os Estados Unidos.
64 Comércio Exterior
16
Maddison (1989).
17
Abreu e Bevilaqua (2000).
18
Isso acarretou, é claro, importantes transferências de renda dos consumidores de impor-
tados para os cafeicultores.
19
O viés antiexportador da Argentina não se deveu exclusivamente à incompetência, na-
cionalismo ou oportunismo de Perón, como afirmam ou insinuam muitos analistas,
mas, pelo menos em parte, ao reconhecimento de que era preferível aumentar salários reais
e deixar as massas comerem mais carne a acumular ativos inconversíveis em bancos cen-
trais europeus. Ver Fodor (1975).
20
A mudança relativamente lenta em direção à liberalização comercial também esteve rela-
cionada à alta prioridade, na maioria das economias latino-americanas, de geração de
superávits comerciais para atender o serviço da dívida externa.
21
Hufbauer e Schott (1994), e subseqüentes revisões.
22
Schattschneider (1935), p. 292-3.
23
Putnam (1988).
24
Feinberg (2002).
25
Literalmente, enchimento, aumento artificial da proteção destinado a permitir que haja
folga para a sua redução futura.
26
Monteagudo e Watanuki (2002). Outros resultados, Dsiao, Díaz-Bonilla e Robinson
(2002), baseados em rendimentos de escala crescentes, e considerando apenas a elimina-
ção das tarifas, geram taxas de crescimento do PIB similares para a maior parte das eco-
nomias. Para o Nafta, porém, suas estimativas são mais altas e muito mais altas no caso
da América Central e Caribe e da Comunidade Andina. Em Monteagudo e Watanuki
(2001), resultados semelhantes aos de Dsiao, Díaz-Bonilla e Robinson (2002) foram ob-
tidos quando o cenário de liberalização também incluiu barreiras não-tarifárias.
27
Números condizentes com estimativas de equilíbrio parcial, ver Abreu (1995b) e Carva-
lho e Parente (1999).
28
Kowalczyk e Davis (1998).
29
Panagaryia (1998).
30
Por Honório Kume e Guida Piani.
31
Panagaryia (1998).
32
Staiger (1998).
33
Putnam (1998).
34
Existe muita ambigüidade quanto ao que significa “substancialmente todo o comércio”
no contexto do artigo XXIV do GATT 1994. Ver OMC ([1995ª), p. 824-7.
35
Segundo Grossman e Helpman (1994), negociações bem-sucedidas entre “governos po-
liticamente sensíveis”, ou seja, governos que levem em conta contribuições políticas de
grupos de interesse, tanto contra quanto a favor da zona de livre-comércio, assim como
o bem-estar médio dos eleitores, são tanto mais prováveis quanto mais equilibrado for o
comércio entre duas economias. O sucesso da negociação é mais provável quando o re-
sultado da ZLC for aumento da proteção — ou seja, quando há significativo desvio
de comércio —, em vez de redução da proteção na maioria dos setores. Maior viabilida-
de da ZLC está, portanto, relacionada à probabilidade mais alta de perda de bem-estar
agregado. Ver também Helpman (1997).
3 A economia política
da proteção no Brasil
e nos Estados Unidos
67
68 Comércio Exterior
que a proteção à maior parte dos produtos “sensíveis” pode ser preservada. Em
particular, quanto mais protecionistas forem as políticas comerciais antes da
integração, menores serão os volumes de comércio de “sensíveis” e menos efi-
caz será a zona de livre-comércio na redução da proteção, pois 10% ou 15% do
comércio pré-integração serão amplamente suficientes para acomodar pós-
integração às exceções de produtos sensíveis.
Muitas das dificuldades enfrentadas pela Alca têm a ver com diferentes ava-
liações do que podem ser consideradas concessões equivalentes pelo Brasil e os
Estados Unidos, os dois protagonistas que polarizam as negociações. Recipro-
cidade e equilíbrio de concessões são temas complexos, em particular quando
a liberalização comercial afeta economias de tamanhos diferentes e quando se
supõe que vá progredir até a completa extinção de tarifas, como ocorre com fre-
qüência na constituição de zonas de livre comércio.
Em negociações comerciais multilaterais, não há definição explícita e direta
de reciprocidade. A melhor aproximação é a opinião do assessor legal do dire-
tor-geral do GATT, no quadro de avaliação dos danos causados pela retirada de
concessões tarifárias que seriam equivalentes a “ganhos” relacionados a conces-
sões tarifárias com o sinal trocado.1 Em um marco de referência inteiramente
mercantilista, com base na hipótese de que concessões tarifárias devem ser neu-
tras do ponto de vista do impacto sobre o balanço de pagamentos, devem ser
levados em conta os níveis de comércio afetados, as magnitudes das variações
tarifárias e as elasticidades-preço relevantes.
Muitos economistas têm criticado o processo de negociação do GATT, argu-
mentando que os critérios são mercantilistas e não fazem sentido do ponto de
vista econômico. Por que uma redução tarifária teria de ser compensada por uma
“concessão” equivalente dos parceiros comerciais, se a liberalização unilateral
aumenta o bem-estar? Recentemente, as regras de negociação mercantilistas do
GATT-OMC foram ao menos em parte reabilitadas pela literatura especializada:2
são de fato mercantilistas, mas permitem que economias escapem de equilíbri-
os perversos na direção de outros equilíbrios que envolvam melhores níveis de
bem-estar. O equilíbrio perverso inicial existe porque economias grandes o bas-
tante para influenciarem os seus termos de troca tendem a adotar tarifas basea-
das no argumento da tarifa ótima. Há assim um equilíbrio perverso gerado por
um jogo do tipo “dilema do prisioneiro”, explicado por maximizações de ter-
mos de troca. As regras mercantilistas em que estão fundamentadas as negocia-
ções na OMC, baseadas na “troca de concessões”, permitem que essas economias
se movam para novo equilíbrio, caracterizado por tarifas menores e por níveis
de bem-estar superiores aos da origem.
Contudo, reciprocidade no contexto da OMC é tipicamente reciprocidade
na margem e o resultado de negociações comerciais multilaterais com certeza não
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 71
Suco de laranja
Açúcar de cana
Açúcar de beterraba
Milho
Fumo
Carne de frango
Carne bovina
Algodão
Calçados
Caminhões pesados
Total líquido tarifas
Estados
Alabama — AL (7) 0 0 0 0 0 57 0 0 0 0 57
Alasca — AK (1) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Arizona — AZ (8) 0 0 0 0 0 0 25 25 0 0 38
Arkansas — AR (4) 0 0 0 0 0 75 0 50 0 0 100
Califórnia — CA (53) 0 0 2 0 0 0 2 8 0 0 9
Carolina do Norte — NC (13) 0 0 0 0 31 23 0 0 0 15 62
Carolina do Sul — SC (6) 0 0 0 0 17 0 0 0 0 0 17
Colorado — CO (7) 0 0 0 14 0 0 29 0 0 0 29
Connecticut — CT (5) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Dakota do Norte — ND (1) 0 0 100 0 0 0 0 0 0 0 100
Dakota do Sul — SD (1) 0 0 0 100 0 0 100 0 0 0 100
Delaware — DE (1) 0 0 0 0 0 100 0 0 0 0 100
Flórida — FL (25) 24 8 0 0 0 0 0 0 0 0 24
Geórgia — GA (13) 0 0 0 0 0 62 0 23 0 8 62
Havaí — HI (2) 0 50 0 0 0 0 0 0 0 0 50
Idaho — ID (2) 0 0 50 0 0 0 50 0 0 0 100
Illinois — IL (19) 0 0 0 32 0 0 0 0 0 0 32
Indiana — IN (9) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Continua
TABELA 3.1. Estados Unidos: proporção de distritos congressuais com interesses protecionistas (tarifas), %* (cont.)
Suco de laranja
Açúcar de cana
Açúcar de beterraba
Milho
Fumo
Carne de frango
Carne bovina
Algodão
Calçados
Caminhões pesados
Total líquido tarifas
Estados
Iowa — IO (5) 0 0 0 100 0 0 20 0 0 0 100
Kansas — KS (4) 0 0 0 25 0 0 25 0 0 0 25
Kentucky — KY (6) 0 0 0 0 67 0 0 0 0 0 67
Luisiana — LA (7) 0 43 0 0 0 29 0 14 0 0 57
Maine — ME (2) 0 0 0 0 0 0 0 0 100 0 100
Maryland — MD (8) 0 0 0 0 13 13 0 0 0 0 25
Massachusetts — MA (10) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Michigan — MI (15) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Minnesota — MN (8) 0 0 13 25 0 0 0 0 0 0 25
Mississipi — MS (4) 0 0 0 0 0 75 0 25 0 0 75
Missouri — MO (9) 0 0 0 0 0 11 0 11 0 0 22
Montana — MT (1) 0 0 100 0 0 0 100 0 0 0 100
Nebraska — NE (3) 0 0 33 67 0 0 67 0 0 0 67
Nevada — NV (3) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
New Hampshire — NH (2) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Nova Jersey — NJ (13) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Novo México — NM (3) 0 0 0 0 0 0 33 0 0 0 33
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos
Continua
78
TABELA 3.1. Estados Unidos: proporção de distritos congressuais com interesses protecionistas (tarifas), %* (cont.)
Comércio Exterior
Suco de laranja
Açúcar de cana
Açúcar de beterraba
Milho
Fumo
Carne de frango
Carne bovina
Algodão
Calçados
Caminhões pesados
Total líquido tarifas
Estados
Ohio — OH (18) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 11 11
Oklahoma — OK (5) 0 0 0 0 0 20 20 20 0 0 40
Oregon — OR (5) 0 0 0 0 0 0 20 0 0 0 20
Pensilvânia — PA (19) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Rhode Island — RI (2) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Tennessee — TN (9) 0 0 0 0 11 0 0 11 0 0 22
Texas — TX (32) 0 0 0 0 0 9 13 16 0 0 25
Utah — UT (3) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Vermont — VT (1) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Virgínia — VA (11) 0 0 0 0 18 18 0 0 0 9 27
Virgínia Ocidental — WV (3) 0 0 0 0 0 33 0 0 0 0 33
Washington — WA (9) 0 0 0 0 0 0 11 0 0 0 11
Wisconsin — WI (8) 0 0 0 0 0 0 0 0 13 0 13
Wyoming — WY (1) 0 0 100 0 0 0 100 0 0 0 100
* O número total de distritos congressuais em cada estado está assinalado, entre parênteses, após o seu nome.
Fontes: Congressional Districts 108th Congress (www.nationalatlas.gov), 1997 Economic Census (www.census.gov) e 1997 Census of Agriculture (www.usda.gov).
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 79
Illinois, 15,9%; Nebraska, 12,3%; Minnesota, 9,1%; Indiana, 7,7%; Ohio, 5%;
Wisconsin, 4,2%; Kansas, 4,1%; Dakota do Sul, 3,5%; Missouri, 3,2%). A con-
centração da produção entre os condados, entretanto, é bem reduzida. Ne-
nhum deles ultrapassou 0,5% da produção total dos Estados Unidos, e os cem
principais condados produziram apenas 28,4% do total. O milho era impor-
tante em todos os condados de Iowa, e em dois dos três condados do Nebraska.
Era também importante na Dakota do Sul; não havia nenhum condado gran-
de produtor de milho, mas trata-se de um estado de um distrito só. Em um se-
gundo grupo estavam Illinois (32% dos distritos afetados), Kansas e Minnesota
(ambos 25%) e, bem abaixo na lista, Colorado (14%). Em Indiana, Wisconsin,
Ohio e Missouri não havia condados nos quais a produção de milho fosse tão
relevante quanto nos casos anteriores.8 Em 1997, mais de 68% dos 9.221 empre-
gos na refinação de milho (wet corn milling) estavam localizados em Iowa, Illinois
e Indiana (NAICS 311221). Ver a Figura 3.4 para a distribuição, por estado, da
participação de distritos protecionistas produtores de milho no total de distri-
tos do estado.
Cinco estados respondiam por 89,1% da produção de fumo em 1997: Caro-
lina do Norte (40,3% do total), Kentucky (28,9%), Carolina do Sul (7,1%), Virgínia
(6,7%) e Tennessee (6,1%). Em um distrito de Maryland, que não estava incluí-
vendas, e os dez maiores por 66,3%. Entre os vinte maiores produtores, os se-
guintes estados incluíam condados e, portanto, distritos protecionistas: Texas
(17,6%), Kansas (11,1%), Nebraska (9,7%), Oklahoma (5,9%), Colorado (5%), Iowa
(3,9%), Dakota do Sul (3,3%), Montana (2,2%), Idaho (2,1%), Novo México
(1,8%), Wyoming (1,5%), Washington (1,5%) e Oregon (1,3%). Distritos prote-
cionistas eram muito importantes nos estados de um só distrito eleitoral (Mon-
tana, Dakota do Sul e Wyoming), no Nebraska (dois de três distritos) e em Idaho
(um de dois distritos). Eram relativamente menos importantes no Arizona, no
Colorado, em Iowa, Kansas, Novo México, Oklahoma e Oregon (20-33% do total
de distritos) e de importância ainda menor no Texas e em Washington. Ver a
Figura 3.7 para a distribuição, por estado, da participação de distritos prote-
cionistas produtores de carne bovina no total de distritos do estado.
A produção algodoeira dos Estados Unidos em 1997 concentrava-se em dez
estados (91,7% do total). Destes, oito — Texas (27% da produção), Geórgia (9,6%),
Mississipi (9,6%), Arkansas (9,1%), Luisiana (5,4%), Arizona (4,7%), Tennessee
(3,5%) e Missouri (3,1%) — apresentavam pelo menos um distrito protecionis-
ta. Em outros estados — Califórnia (14,2%) e Carolina do Norte (9,9%) — não
havia distrito protecionista. Oklahoma, embora não incluído na lista dos dez mais
importantes produtores de algodão, era relevante. A metade dos distritos de
15%. Ver a Figura 3.10 para a distribuição, por estado, da participação de dis-
tritos protecionistas produtores de caminhões pesados no total de distritos do
estado.
É possível agregar a informação sobre distritos protecionistas, definidos com
base em proteção tarifária para os dez mais relevantes produtos de exportação
do Brasil, evitando dupla contagem. Isto é, se o distrito é considerado prote-
cionista sob a ótica de mais de um produto, é contado apenas uma vez. A últi-
ma coluna da Tabela 3.1 mostra a participação dos distritos protecionistas no
total de distritos do estado. A mesma informação é apresentada na Figura 3.11.
Em muitos dos estados de um ou dois distritos eleitorais, todos os distritos eram
protecionistas. São eles: o norte das Montanhas Rochosas (Idaho, Montana,
Wyoming, as Dakotas), Delaware, Maine, Arkansas e Iowa. O grupo dos 60-80%
inclui Nebraska, Kentucky, Mississipi, Geórgia e Carolina do Norte. Luisiana,
Alabama, Hawaí e Oklahoma estão no grupo dos 40-60%. Os dois estados mais
importantes no grupo dos 20-40% são Texas e Flórida, mas todas as outras re-
giões estão representadas. Estados com baixa participação de distritos prote-
cionistas se concentram no Nordeste, alguns na região Norte Central Oriental
(East North Central) e a maior parte do Pacífico Ocidental (West Pacific), inclusi-
ve Califórnia.
Continua
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 91
Fontes: Congressional Districts 108th Congress (www.nationalatlas.gov), 1997 Economic Census (www.census.gov) e
1997 Census of Agriculture (www.usda.gov).
Ver a Figura 3.15 para a distribuição, por estado, das participações de distritos
protecionistas na produção de soja.
A Figura 3.16 mostra o mapa agregado da proteção, levando em conta ta-
rifas, antidumping e apoio doméstico à agricultura. Não é muito diferente do
mapa agregado, que tem por base apenas tarifas e antidumping, pois estados pro-
dutores de milho são muitas vezes também importantes produtores de soja e
carne suína.
Uma forma alternativa de analisar os dados de proteção no nível do distrito
congressual é focalizar no número de distritos afetados por estado, e não na
proporção daqueles afetados no total de distritos de cada estado. É uma pers-
92 Comércio Exterior
Continua
95
96
TABELA 3.3. Estados Unidos: número de distritos congressuais “protecionistas”, por estado (proteção tarifária) (cont.)
Kentucky (6) 0 0 0 0 4 0 0 0 0 0 4
Luisiana (7) 0 3 0 0 0 2 0 1 0 0 4
Maine (2) 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 2
Maryland (8) 0 0 0 0 1 1 0 0 0 0 2
Massachusetts (10) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Michigan (15) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Minnesota (8) 0 0 1 2 0 0 0 0 0 0 2
Mississipi (4) 0 0 0 0 0 3 0 1 0 0 3
Missouri (9) 0 0 0 0 0 1 0 1 0 0 2
Montana (1) 0 0 1 0 0 0 1 0 0 0 1
Nebraska (3) 0 0 1 2 0 0 2 0 0 0 2
Nevada (3) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
New Hampshire (2) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Nova Jersey (13) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Novo México (3) 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 1
Nova York (29) 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 1
Ohio (18) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 2
Oklahoma (5) 0 0 0 0 0 1 1 1 0 0 2
Oregon (5) 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 1
Pensilvânia (19) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Continua
TABELA 3.3. Estados Unidos: número de distritos congressuais “protecionistas”, por estado (proteção tarifária) (cont.)
Figura 3.18. Estados Unidos — número de DCs protecionistas: carne de frango (tarifas)
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 99
Figura 3.19. Estados Unidos — número de DCs protecionistas: todos os produtos (tarifas)
Figura 3. 20. Estados Unidos — número de DCs protecionistas: todos os produtos (tarifas, AD e subsídios)
100 Comércio Exterior
Continua
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 101
importantes: Pensilvânia (11 distritos), Ohio (7), Michigan (4) e Indiana (3). Dos
140 deputados relevantes, 90 eram republicanos e 50 democratas.
TABELA 3.5. Estados Unidos: interesses exportadores definidos com base em picos
tarifários no Brasil
Continua
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 103
TABELA 3.5. Estados Unidos: interesses exportadores definidos com base em picos
tarifários no Brasil
Figura 3.21. Estados Unidos — interesses exportadores: produtos eletrônicos, inclusive computadores
Figura 3.26. Estados Unidos — balança de interesses: interesses protecionistas (tarifas e AD) versus
interesses exportadores, por estado
108 Comércio Exterior
Continua
110 Comércio Exterior
Figura 3.28. Estados Unidos — balanço de interesses: interesses protecionistas (tarifas) com peso
duplo versus interesses exportadores, por estado
Estados Unidos: elegem-se três senadores por estado e há grande contraste en-
tre as populações dos diferentes estados. Cada senador por Roraima representa
cerca de 110.000 habitantes, enquanto cada senador por São Paulo representa
12,5 milhões de habitantes. A razão entre os coeficientes de representação po-
lares entre Califórnia e Wyoming, nos Estados Unidos, é 72. Entre Roraima e
São Paulo, no Brasil, é 114.
Enquanto a representação na câmara baixa nos Estados Unidos é proporcio-
nal, no Brasil a proporcionalidade estrita é distorcida por regras relativas à re-
presentação estadual mínima de oito e máxima de setenta deputados, em um
total de 513. A população de São Paulo corresponde a 21,8% da população to-
tal mas apenas 13,6% dos deputados representam São Paulo. A população do
estado menos populoso corresponde a menos de 2% do total: um deputado por
Roraima representa 40.550 pessoas, ao passo que um deputado paulista repre-
senta 529.100 pessoas. As distorções são bem menores: a razão entre os coefi-
cientes de representação é 13, cerca de um décimo da razão senatorial.
Os produtos relevantes do ponto de vista dos interesses protecionistas no
Brasil são os que correspondem aos interesses exportadores dos Estados Uni-
112 Comércio Exterior
TABELA 3.7. Brasil: interesses protecionistas por estado e setores industriais mais
relevantes
dos. A distribuição da produção por estado em 2001 foi normalizada para o ta-
manho do PIB do estado, em uma escala entre 0 e 100. A Tabela 3.7 mostra os
dados relativos a três tipos de produtos industriais, que correspondem ao grosso
dos produtos relevantes — máquinas de escritório e equipamentos de informática,
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 113
Figura 3.29. Brasil — interesses protecionistas: máquinas de escritório e computadores, por estado
114 Comércio Exterior
Figura 3.30. Brasil — interesses protecionistas: material eletrônico e de telecomunicações, por estado
Acre 0 0 11 0 28 27 0 0 0 19
Amazonas 0 0 0 0 3 2 0 0 0 10
Roraima 0 0 0 0 36 34 0 0 0 22
Pará 0 0 14 0 24 27 0 0 0 19
Amapá 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Tocantins 0 2 17 0 14 82 0 0 0 51
Maranhão 0 5 20 0 46 27 1 0 0 21
Piauí 0 2 17 0 71 23 1 0 0 19
Ceará 0 2 7 0 31 6 0 100 0 9
Rio Grande do Norte 0 6 0 0 11 6 1 0 0 4
Paraíba 0 17 0 0 28 7 0 77 0 8
Pernambuco 0 15 0 0 22 3 0 0 0 3
Alagoas 0 100 3 36 14 6 1 0 0 7
Sergipe 0 5 3 8 14 6 0 0 0 6
Bahia 0 2 10 5 15 10 3 12 0 10
Minas Gerais 0 5 20 0 24 10 0 10 22 10
Espírito Santo 0 3 3 0 9 4 0 0 0 3
Continua
TABELA 3.8. Brasil: interesses exportadores definidos com base em proteção tarifária nos Estados Unidos (índice)
TABELA 3.9. Brasil: interesses exportadores definidos com base em produtos que
enfrentam tarifas, direitos AD e apoio doméstico à agricultura nos Estados Unidos (índice)
tos afetados por direitos antidumping (aço) e medidas de apoio à agricultura (carne
suína e soja), e os dois agregados relevantes. As Figuras 3.33 a 3.42 apresentam
graficamente os dados gerados, levando em conta a proteção tarifária; as Figu-
ras 3.43 e 3.44, os dados para aço e proteção relacionada a tarifas e direitos
antidumping; e as Figuras 3.45 a 3.47, os dados para carne suína, soja e prote-
ção, considerando tarifas, AD e subsídios agrícolas.
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 119
dos era o Rio Grande do Sul, mas recentemente parte expressiva da indústria
migrou para a região Nordeste (Ceará e Paraíba) em busca de salários mais bai-
xos. Caminhões pesados são produzidos principalmente nos estados indus-
triais tradicionais do Sudeste (Rio de Janeiro e São Paulo) e na região Sul (prin-
cipalmente Paraná). No agregado referente a produtos afetados por tarifas, os
interesses exportadores brasileiros estão concentrados nos produtores agríco-
las eficientes do Centro-Oeste (Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás) e do
Norte (Tocantins e Rondônia). Os demais interesses exportadores são difusos
em termos geográficos.
Os interesses exportadores relacionados a produtos siderúrgicos, afetados por
direitos antidumping nos Estados Unidos, estão preponderantemente localizados
em Minas Gerais e no Espírito Santo e, em menor medida, no Rio de Janeiro.
Os interesses afetados por subsídios agrícolas, além de produtos também afeta-
dos por proteção tarifária, são carne suína e soja. A identificação da distribui-
ção dos interesses exportadores de carne suína é complicada pela importância
da produção relacionada à subsistência, já mencionada, e fica clara na posição
proeminente do Maranhão e do Piauí, ambos inexpressivos como origem de
exportações de carne suína. Os interesses de exportadores são difusos em termos
geográficos: os relativos à soja estão concentrados nos estados do Centro-Oeste
e em supridores estabelecidos, como é o caso do Paraná.
A distribuição geográfica dos interesses exportadores é pouco afetada, no
geral, por outras formas de proteção além da tarifa. Como no caso de proteção
tarifária, os interesses exportadores estão concentrados no Centro-Oeste e no
Norte. A principal diferença entre a Figura 3.47 (ou 3.44), quando comparada
à Figura 3.42, é que Minas Gerais e Espírito Santo mostram interesses exporta-
dores mais intensos em decorrência de sua importância siderúrgica.
Figura 3.48. Brasil — balanço de interesses: interesses protecionistas versus interesses exportadores
(relativos a tarifas)
Figura 3.49. Brasil — balanço de interesses: interesses protecionistas versus interesses exportadores
(tarifas e AD)
130 Comércio Exterior
Figura 3.50. Brasil — balanço de interesses: interesses protecionistas versus interesses exportadores
(tarifas, AD e subsídios)
Figura 3.51. Brasil — balanço de interesses: interesses protecionistas versus interesses exportadores
(tarifas), excluindo o Amazonas
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 131
9. Conclusões
Este capítulo apresentou um marco de referência para a análise da distribuição
doméstica de interesses envolvidos na liberalização comercial dos pontos de vista
regional e setorial. Apresentou o balanço de interesses, no Brasil e nos Estados
Unidos, a favor da liberalização comercial, considerando três cenários: elimina-
ção dos picos tarifários no Brasil e nos Estados Unidos; eliminação dos picos
tarifários nos dois países e dos direitos antidumping nos Estados Unidos; elimi-
nação dos picos tarifários nos dois países, dos direitos antidumping e do apoio
agrícola doméstico nos Estados Unidos.
É claro que há deficiências metodológicas na análise aqui empreendida. As
avaliações de interesses protecionistas e exportadores por estado e setor, com base
em vendas ou produção corrigidas pelo tamanho do estado, podem ser
criticadas. A determinação dos interesses líquidos é, por sua própria natureza,
frágil, pois não há critério de agregação claramente preferível a outros. A aná-
lise exclui atividades a jusante e a vazante daquelas diretamente consideradas e,
portanto, subestima a magnitude dos interesses protecionistas. A liberalização
comercial também afetaria a localização de facilidades de processamento de pro-
dutos agrícolas que, nos Estados Unidos, são muito concentradas em pequeno
número de empresas. Quatro empresas respondem por cerca de três quartos da
produção de matadouros (carne bovina), farinha, esmagamento de soja e refino
de milho. Outras atividades relacionadas à agricultura, que seriam afetadas por
redução da produção agrícola, também não são consideradas: insumos (fertili-
zantes, sementes, tratores); armazenamento; processamento, marketing e venda
de alimentos; e transporte. No caso de produtos industriais, não foi levado em
conta o impacto de regras de origem.
Muitas conclusões relativas à identificação de interesses exportadores e pro-
tecionistas relacionados a produtos específicos estão distribuídas pelo texto, e não
serão repetidas aqui. Em termos gerais, os interesses favoráveis à liberalização nos
Estados Unidos estão localizados principalmente na Califórnia, em alguns dos
estados do Rust Belt e no Texas. Isso reflete o fato de que os interesses exporta-
132 Comércio Exterior
10. Anexos
Notas metodológicas
Interesses protecionistas nos Estados Unidos
1. Seleção de produtos: exportações totais brasileiras a cinco ou seis dígitos
no Sistema Harmonizado acima de US$50 milhões em 2001, de acordo
com o World Integrated Trade Solution WITS (Banco Mundial), que en-
frentavam picos tarifários (tarifas superiores a 15%) conforme a US
International Trade Commission.
2. Alvos de medidas antidumping: WTO, US International Trade Com-
mission, Embaixada do Brasil, Washington.
3. Mercados agrícolas distorcidos por medidas de apoio doméstico nos
Estados Unidos: Jank, Fuschloch e Kutas (2003).
4. Determinação de DCs protecionistas para produtos agrícolas com base no
Agricultural Census de 1997, identificando-se os condados nos principais
estados produtores (até 20) onde as vendas do produto excediam 10% das
vendas de produtos industriais. Para produtos industriais, identificaram-
se os condados onde as vendas do produto excediam 10% das vendas de
134 Comércio Exterior
Brasil
Interesses protecionistas no Brasil
1. Produtos selecionados correspondem a exportações dos Estados Unidos.
2. Distribuição por estado da produção relevante (três dígitos).
3. Normalização para o tamanho do estado.
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 135
TABELA A3.1. Critérios para incluir estados específicos dos Estados Unidos como
produtores relevantes de produtos selecionados*
Continua
136 Comércio Exterior
TABELA A3.1. Critérios para incluir estados específicos dos Estados Unidos como
produtores relevantes de produtos selecionados*
25
137
Continua
138
TABELA A3.2. Estados Unidos: distritos congressuais (DC) afetados por tarifas, AD e subsídios (cont.)
Geórgia (13) 9 0 0 0 0 0 DC 1, 2, 0 DC 2, 0 DC 8 0 0 0
3, 6, 7, 3, 4
9, 10, 12
Havaí (2) 1 0 DC 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Idaho (2) 1 0 0 DC 2 0 0 0 D C2 0 0 0 0 0 0
Illinois (19) 8 0 0 0 DC 11, 0 0 0 0 0 0 DC 12, DC 11, DC 15,
14, 15, 14, 16, 14, 15, 17, 19
17, 18, 17 17, 18,
19 19
Indiana (9) 3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 DC 2 D C1 DC 8
Iowa (5) 5 0 0 0 DC 1, 0 0 DC 5 0 0 0 0 DC 1, DC 1,
2, 3, 2, 3, 2, 3,
4, 5 4, 5 4, 5
Kansas (4) 1 0 0 0 DC 1 0 0 DC 1 0 0 0 0 0 0
Kentucky (6) 4 0 0 0 0 DC 1, 0 0 0 0 0 0 0 0
2, 3, 4
Luisiana (7) 4 0 DC 3, 0 0 0 DC 4, 5 0 DC 5 0 0 0 0 0
5, 6
Maine (2) 2 0 0 0 0 0 0 0 0 DC 1, 2 0 0 0 0
Maryland (8) 2 0 0 0 0 DC 5 DC 1 0 0 0 0 0 0 0
Massachusetts (10) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Continua
TABELA A3.2. Estados Unidos: distritos congressuais (DC) afetados por tarifas, AD e subsídios (cont.)
Continua
139
140
TABELA A3.2. Estados Unidos: distritos congressuais (DC) afetados por tarifas, AD e subsídios (cont.)
Pennsylvania (19) 11 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 DC 3, 4, 0 0
5, 6, 7,
9, 12, 14,
16, 17, 18
Rhode Island (2) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Tennessee (9) 2 0 0 0 0 DC 6 0 0 DC 8 0 0 0 0 0
Texas (32) 8 0 0 0 0 0 DC 1, DC 13, DC 13, 0 0 0 0 DC 13
2, 14 14, 17, 15, 17,
19 19, 27
Utah (3) 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 DC 3
Vermont (1) 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Virgínia (11) 5 0 0 0 0 DC 4, 5 DC 2, 7 0 0 0 DC 9 0 0 0
Virgínia Ocidental (3) 3 0 0 0 0 0 DC 0 0 0 0 DC 1, 3 0 0
Washington (9) 1 0 0 0 0 0 0 DC 4 0 0 0 0 0 0
Wisconsin (8) 1 0 0 0 0 0 0 0 0 DC 7 0 0 0 0
Wyoming (1) 1 0 0 DC 1 0 0 0 DC 1 0 0 0 0 0 0
Capítulo 3 A economia política da proteção no Brasil e nos Estados Unidos 141
Notas
1
Documento GATT C/M/220, p. 35-6, citado em WTO (1995a) p. 949, mencionado por
Bagwell e Staiger (2002), Cap. 4.
2
Bagel e Staiger (2002).
3
Há um estudo pioneiro relativo à posição de membros do Congresso dos Estados Unidos
quanto à Alca, com ênfase no Brasil, ver Cebri (2001). No entanto, a atenção está centrada
nos interesses protecionistas nos Estados Unidos, definidos com base na participação de
estados específicos na produção de determinados produtos, e não na identificação da im-
portância dos interesses protecionistas em distintos distritos congressuais. O estudo apre-
senta ainda material relativo a padrões de votação de congressistas, bem como ao peso
relativo de diferentes lobbies referentes a produtos específicos, partindo da base de dados
do Center for Responsive Politics, Washington D.C.
4
Fontes: para as tarifas dos Estados Unidos, US ITC, e para exportações brasileiras, WITS,
Banco Mundial, e Jank, Fuchsloch e Kutas (2003) para subsídios agrícolas dos Estados
Unidos. Ver, no anexo, notas metodológicas sobre os critérios utilizados nas diferentes
seções deste capítulo.
5
Quando este capítulo foi elaborado, as informações completas referentes ao Economic
Census de 2002 ainda não estavam disponíveis.
6
Ver Tabela A3.1, no anexo, para critérios usados para incluir estados específicos.
7
Ver a Tabela A3.2, no anexo, para informação sobre distritos congressuais específicos afe-
tados por proteção.
8
No caso do milho, realizou-se esforço para determinar se distritos congressuais relevan-
tes haviam sido excluídos, dada a dispersão geográfica da produção. O número de con-
dados selecionados foi expandido para incluir, nos estados relevantes, todos os conda-
dos que tivessem atingido pelo menos a metade da produção física daquele colocado em
centésimo lugar nacional em 1997. O número de distritos congressuais selecionados não
foi afetado por esta expansão do critério original. Os critérios utilizados para a seleção de
produtos levam à exclusão do etanol, que só se tornou produto relevante no passado
recente. Contudo, é improvável que a economia política do etanol seja muito diferente
da economia política do milho.
9
As vendas estaduais foram distribuídas de acordo com o emprego estimado.
10
Troca de votos entre congressistas com o envolvimento de votações para viabilizar a apro-
vação de legislação em relação às quais há grande disparidade de interesse entre eles.
142 Comércio Exterior
11
Ver Hiscox (1999). Para visões alternativas, ver Gilligan (1997). Ver também Irwin (2002).
12
Mais republicanos do que democratas votaram pela malograda concessão do fast track para
o presidente Clinton, tanto em 1993 quanto em 1998.
13
O autor agradece a Flavio Marega o comentário sobre este ponto.
4 O Brasil no GATT
e na OMC: história
e perspectivas
145
146 Comércio Exterior
mos, já que suas exportações, especialmente soja e frango, eram afetadas desfa-
voravelmente pelos efeitos de programas tais como o Programa de Incentivo à
Exportação (“Export Enhancement Program”) norte-americano. Tratamento es-
pecial e diferenciado beneficiaria os países em desenvolvimento por meio da li-
mitação de seus compromissos ou através de extensão dos períodos de imple-
mentação. A principal ameaça enfrentada pelos interesses exportadores brasileiros,
porém, era por parte da CE, de “rebalancear” sua política agrícola de forma a
se adaptar aos efeitos da liberalização. Isso acarretaria quotas tarifárias em pro-
dutos como a soja e o melaço de cana e derivados da soja e pelotas cítricas apli-
cadas a volumes equivalentes à média de 1986-88. Além desses patamares, as ta-
rifas ad valorem equivalentes extraquota aplicadas seriam de 84% e 190%,
respectivamente.30
As principais propostas sobre antidumping se referiam ao aprimoramento de
disciplinas em relação à definição dos critérios para determinar a construção
de preços, relação entre dumping e dano à produção doméstica, e procedimen-
tos que poderiam ser adotados na abertura de investigações e na aplicação de im-
postos retroativos. Os impostos compensatórios estariam sujeitos a cláusula de
suspensão destinada a limitar sua aplicação, a menos que o processo de anti-
dumping fosse revisto. Alguns aspectos relativos a medidas compensatórias de
subsídios, como as de suspensão, eram semelhantes às relativas a antidumping.
Apenas os subsídios “específicos”, ou seja, os aplicados a empresas, indústrias
ou grupos empresariais ou industriais específicos estariam sujeitos a disciplinas.
Subsídios que dependessem do desempenho de exportação e do uso de insu-
mos domésticos seriam proibidos. Subsídios “acionáveis” eram aqueles que cau-
sassem dano à indústria doméstica de outros signatários. As economias em de-
senvolvimento, com PIB per capita inferior a US$1.000, teriam oito anos para
implementar as novas regras. Cláusula de suspensão também se aplicaria às sal-
vaguardas e todas as restrições voluntárias à exportação ou medidas semelhan-
tes seriam descontinuadas em quatro anos, sendo permitida uma exceção por país
até sua eliminação em 31 de dezembro de 1999. As medidas de salvaguarda de-
veriam ser aplicadas sem discriminação de fonte e previam-se consultas para es-
tabelecer a alocação de quotas entre fornecedores afetados. As salvaguardas não
deveriam ser aplicadas contra exportações de países em desenvolvimento, a me-
nos que fossem excedidos determinados patamares relativos à participação no
mercado de determinado país em desenvolvimento ou à participação agregada
de países em desenvolvimento.
O desmantelamento do AMF ocorreria lentamente. No início da fase 1, so-
mente 12% do volume total de importações seriam retirados do AMF e integra-
dos ao GATT. A inclusão de 4% adicionais estava em negociação. Depois de três
anos, a fase 2 incluiria mais 17%. Após um período adicional de quatro anos,
Capítulo 4 O Brasil no GATT e na OMC: história e perspectivas 153
mais 18% das importações seriam cobertas pelo GATT. Dez anos após o início
do processo, todas as importações seriam integradas ao GATT. Durante a fase 1,
as quotas aumentariam anualmente a taxas 16% maiores do que sob o AMF; na
fase 2, as taxas anuais de expansão de quotas seriam 25% maiores do que as da
fase 1; na fase 3, 27% maiores do que as da fase 2.
O acordo sobre serviços incluía três elementos essenciais: um conjunto de
obrigações básicas para todos os signatários; iniciativas nacionais que especifi-
cassem cronogramas adicionais de liberalização; e um conjunto de anexos para
tratar de exceções e setores específicos. O escopo do acordo compreendia uma
variedade de modos de prestação alternativos. As exceções à cláusula de NMF
seriam limitadas a dez anos. Dada a importância da legislação nacional, have-
ria medidas específicas relacionadas à transparência e forma de aplicação. Os
compromissos quanto a acesso a mercados e tratamento nacional seriam incluí-
dos em cronogramas nacionais. Sucessivas rodadas de negociações objetivariam
liberalização progressiva. Anexos específicos regulariam movimento da mão-
de-obra e serviços financeiros, de telecomunicações e de transporte aéreo. O
anexo sobre serviços definia os direitos dos participantes à adoção de medidas
preventivas, obrigações detalhadas sobre acesso a mercados e tratamento nacio-
nal relativo a pagamentos e a sistemas de compensação operados por entidades
públicas, bem como a financiamentos oficiais e facilidades de refinanciamento.
O anexo sobre telecomunicações concentrava-se no acesso a serviços e redes pú-
blicas de telecomunicações e no seu uso. Embora o anexo sobre transporte aé-
reo excluísse os direitos de tráfego, incluía amplo leque de atividades ancilares.
Os focos do acordo preliminar sobre TRIPs foram a eficácia dessas normas e
a resolução de conflitos multilaterais. Os princípios gerais mais importantes in-
cluíam tratamento nacional e NMF. Os padrões de proteção eram mais rígidos do
que os estabelecidos pelas convenções de Berna e Paris quanto à proteção de obras
literárias e artísticas e à propriedade intelectual, bem como no tratado de Washing-
ton sobre circuitos integrados; programas de computador e avanços biotec-
nológicos seriam protegidos; a indicação de origem seria melhorada; proteção
a patentes de vinte anos estaria disponível para quase todos os produtos e pro-
cessos; obrigações adicionais seriam criadas em relação a informações confiden-
ciais, práticas anticompetitivas e licenciamentos. Os países em desenvolvimen-
to teriam período de transição de cinco anos; e os menos desenvolvidos, período
de onze anos para se ajustar às novas regras. Os procedimentos em relação a
patentes de produtos farmacêuticos e produtos químicos agrícolas que se encai-
xassem nesse caso, porém, começariam no início do período de transição, pre-
servando a novidade da invenção e a possibilidade do uso futuro da patente.
O acordo preliminar sobre TRIMs listava medidas que divergissem do trata-
mento nacional e a proibição de restrições quantitativas, em especial relaciona-
154 Comércio Exterior
dos anos 70, foram abolidas. A remoção das fontes bilaterais de atrito com os
Estados Unidos tornou-se uma prioridade, em situação marcada por esforço ge-
neralizado para recuperar credibilidade, esforço que também incluiu iniciativas
de desregulação, privatização e estabilização de preços. Embora as tentativas de
estabilização tenham fracassado e o presidente Collor tenha sofrido impeachment
em 1993 por práticas corruptas, a liberalização comercial tinha vindo para ficar.
Esperava-se que proteção mais baixa facilitasse a estabilização, contribuísse para
aumentar a competitividade da indústria doméstica e que um bom comportamen-
to bilateral e multilateral em relação a questões de política comercial pudesse
melhorar as chances de alcançar resultado razoável na demorada negociação da
dívida externa. A oposição à liberalização começou a ganhar força somente após
o final de 1994, depois que foi implementado o cronograma de redução tarifária
unilateral e a Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul.
A avaliação da nova política econômica externa adotada no início dos anos
90 sugere que houve apoio inicial indevidamente automático das políticas pro-
movidas pelos Estados Unidos, sem grande preocupação com reciprocidade,
mesmo levando-se em conta a assimetria do poder de barganha dos dois países.
Seria possível até pensar em bom comportamento não-recompensado. Entretanto,
será que é razoável avaliar a política econômica externa sem considerar o qua-
dro global relacionado ao programa de estabilização e à reestruturação da eco-
nomia? É pouco provável que tal posicionamento crítico perdurasse caso a ten-
tativa de estabilização tivesse sido bem-sucedida. Mais tarde, com o fracasso do
programa de estabilização e desgaste ainda maior da credibilidade política, quan-
do tornou-se impossível esconder o lado mais sombrio do governo — que, na
verdade, para quem quisesse ver, estava aparente desde o início —, ficou mais
fácil detectar o entusiasmo excessivo em alinhar-se à outrance com os Estados
Unidos. De toda forma, é difícil exagerar a importância da mudança na tradi-
cional política comercial protecionista.
A reunião ministerial do GATT de 1990, em Bruxelas, marcou a consoli-
dação da transição brasileira para uma pauta positiva nas negociações. Nova-
mente o país teve papel relevante na negociação da liberalização agrícola.68 O
fracasso de Bruxelas, planejada como reunião final da rodada, teve a vantagem
de conceder mais tempo para a transição da política brasileira em direção a
uma pauta substancial como demandeur. Os críticos dessa transição ressaltaram
a posição subordinada do Brasil em relação aos Estados Unidos. No centro das
críticas está a natureza das relações entre a coalizão de Cairns, os Estados Uni-
dos e a CE. Não há dúvida de que a convergência entre Cairns e os Estados
Unidos foi fator vital para o sucesso limitado dos que apoiavam a liberalização
na agricultura. Como as divergências ficaram centradas na agricultura, a apro-
ximação entre os Estados Unidos e Cairns tornou-se inevitável. Além disso, ao
Capítulo 4 O Brasil no GATT e na OMC: história e perspectivas 169
7. Perspectivas
Como grande país em desenvolvimento, o Brasil tem grande interesse em um
sistema de comércio multilateral que assegure o acesso de suas exportações a to-
dos os mercados. O país está entre os membros da OMC com interesses mais
diversificados em diferentes grupos de negociação. Isso é resultado de seu tama-
nho, de sua geografia, de seus recursos naturais, de sua diversidade climática e
da diversificação geográfica de seu comércio. Todos esses fatores, combinados
com uma tradição diplomática sofisticada, contribuem para realçar o papel po-
tencial do Brasil na OMC, além do que poderia ser avaliado com base em sua
participação modesta de cerca de 1,1% no comércio mundial. Ainda assim, tec-
nicamente, continua a ser uma “economia pequena” com forte interesse na apli-
cação de disciplinas multilaterais.78 O papel da OMC e das disciplinas multila-
terais é provavelmente mais importante para países como o Brasil, com poder
de barganha limitado, do que para grandes economias ou blocos comerciais como
Estados Unidos, CE e Japão. Em princípio, as grandes economias têm melho-
res condições de explorar o seu poder de barganha bilateralmente do que em
negociações multilaterais. Além disso, quanto maior o compromisso brasileiro
com disciplinas multilaterais, mais importante será seu papel na OMC e maior
a sua capacidade de influenciar a formulação de regras e de garantir o uso ade-
quado dos mecanismos de solução de controvérsias.
Os períodos de crescimento rápido combinado com alta proteção no Brasil
não voltarão mais. Foram possíveis, no passado, porque o poder de mercado do
Brasil no mercado internacional de café permitia que parte do ônus da prote-
ção alta no Brasil fosse transferida aos consumidores de café. E, mais recente-
mente, porque os competidores brasileiros também adotavam políticas prote-
cionistas. Continua a ser difícil encontrar argumentos críveis para negar o fato
de a política econômica externa que melhor serve aos interesses gerais da po-
pulação brasileira dever estar baseada na adoção de políticas comerciais liberais
que aumentem a eficiência da produção doméstica.
Importantes temas não-tradicionais, como direitos trabalhistas e meio am-
biente, continuam a ser potencialmente relevantes no processo de negociação e
sinalizam problemas futuros. É difícil ver um papel de demandeur para as eco-
nomias em desenvolvimento em relação a esses temas e até mesmo posições, em
futuras negociações, que se afastem da tentativa de obstrução da agenda das eco-
nomias desenvolvidas. Isso se aplica em especial ao caso dos direitos trabalhis-
tas. É difícil encontrar um país em desenvolvimento no qual não exista descon-
fiança quanto ao possível uso protecionista pelas economias desenvolvidas de
políticas de harmonização de padrões trabalhistas. Isso explica por que a insis-
tência dos Estados Unidos na criação de um grupo de trabalho sobre padrões
Capítulo 4 O Brasil no GATT e na OMC: história e perspectivas 173
Notas
1
Para as negociações iniciais da OIC e do GATT, ver Brown (1950) e Mark, Weston (1988).
Para os primeiros vinte anos do GATT do ponto de vista das economias em desenvol-
vimento, ver Lafer (1971).
2
Ver Acordo Geral em OMC (1995b).
3
Ou pessoas ricas, como exigiria a adaptação para adequar a expressão ao vocabulário do
século XXI.
4
Ver Golt (1978).
5
Ver UNCTAD (1968), p. 94. Ver também Preeg (1970), p. 202, para as reclamações for-
mais ao final da rodada sobre a assimetria dos resultados obtidos.
6
Ver Balassa (1980), p. 97-8, e GATT (1979), p. 120-22.
7
A declaração, no final da rodada, de que a cláusula NMF condicional incluída nos códi-
gos não afetava o comprometimento com o tratamento NMF incondidional, conforme
o artigo I do GATT, sublinha a incerteza em torno da questão.
8
Ver Lima (1986), p. 330-6.
9
Ver Hufbauer (1983), p. 341-2, e Winham (1986), p. 222-3.
10
Ver Maciel (1978) e Winham (1986), p. 144-6. O documento original que contém as pro-
postas brasileiras é o Statement by the Representative of Brazil, H.E. Embaixador George
A. Maciel, 21 de fevereiro de 1977, GATT MTN/FR/W/1, mesma data. Ver Winham
(1986), p. 274 e seguintes.
11
Ironicamente, quanto à questão da divisão do trabalho entre diferentes agências interna-
cionais em 1982, as economias desenvolvidas e as em desenvolvimento estavam em posi-
ções exatamente opostas em relação às suas posições nas negociações da OIC em 1947-48.
Naquela ocasião, os países em desenvolvimento eram a favor da inclusão de serviços na
Carta de Havana, enquanto os desenvolvidos insistiam que havia agências especializadas
para lidar com tais questões. Ver Brown (1950), p. 130-1 sobre os artigos 46 e 53 da OIC.
12
Ver Maciel (1986), p. 84-5.
13
Ver Lima (1986), p. 338 e seguintes.
14
Formavam o G-10: Argentina, Brasil, Cuba, Egito, Índia, Nicarágua, Nigéria, Peru,
Tanzânia e Iugoslávia. Não há controvérsias quanto à importância da diplomacia brasi-
leira no GATT em 1983-87. Existe, porém, grande divergência quanto à natureza dessa
ação diplomática, explicitada, por exemplo, na comparação entre artigo do Financial Ti-
mes de 16.12.1993, sublinhando o comprometimento brasileiro com a obstrução, e a
auto-avaliação, bem mais positiva, do embaixador Nogueira Batista, embaixador do Brasil
no GATT à época, em Tachinardi (1993), p. 240.
176 Comércio Exterior
15
Ver Batista (1987).
16
A posição obstrucionista do Brasil em Genebra foi enfraquecida quando Olavo Setúbal,
então ministro das Relações Exteriores, declarou em reunião em Estocolmo, em 1985,
ser favorável à inclusão dos serviços na pauta. Ver Oxley (1990), p. 122-3, e os comentá-
rios do embaixador Flecha de Lima sobre o que era considerada a posição obstrucionista
adotada pelo Brasil em Tachinardi (1993), p. 232 e 238.
17
Para detalhes sobre a minuta suíço-colombiana, ver Low (1993), p. 211, e Oxley (1990),
p. 135-6.
18
A literatura sobre a Rodada Uruguai é imensa. Schott e Buurman (1994) e Das (1998)
apresentam avaliações de perspectivas radicalmente diferentes. Dixit (1996) inclui análise
muito interessante do GATT como estudo de caso sobre aspectos políticos dos custos
de transação.
19
Oxley (1990), p. xvi, menciona que, embora os ministros de comércio europeus tivessem
concordado que o principal objetivo tático era isolar a Índia e o Brasil, os negociadores
da CE chegaram secretamente a acordo com esses dois países quanto ao formato de duas
partes, que se revelaria o consenso em Punta del Este. Ver também Preeg (1995), p. 7.
20
Para uma tentativa contemporânea às negociações de avaliar o interesse brasileiro nas ques-
tões em pauta na rodada, ver Abreu e Fritsch (1989).
21
Para detalhes sobre as negociações, ver News of the Uruguay Round, publicado pelo GATT,
e Boletim de Diplomacia Econômica (anteriormente Boletim de Negociações Comerciais Multila-
terais), publicado pelo Ministério das Relações Exteriores brasileiro.
22
Em 1985, foi formada coalizão incluindo a maior parte dos produtores eficientes de pro-
dutos agrícolas temperados, fora os Estados Unidos. Incluía: Argentina, Austrália, Bra-
sil, Canadá, Chile, Colômbia, Fiji, Filipinas, Hungria, Indonésia, Malásia, Nova Zelândia,
Tailândia e Uruguai. Ver Oxley (1990), p. 156-7, para a ação do grupo de Cairns na reunião
do GATT em Montreal em 1990.
23
Ver Marconini (1990), p. 19-21
24
O texto de Montreal, MTN.TNC/7(MIN), 9.12.1988, está em News of the Uruguay Round,
23, 14.12.1988, p. 40-3.
25
Idem, p. 26-39.
26
Ver MTN.TNC/11, 21.4.89, News of the Uruguay Round, 27, 24.4.89, p. 8 e 21.
27
Ver Preeg (1995), p. 115, para o discurso de Rubens Ricupero em nome de todos os
países em desenvolvimento, expressando sua insatisfação com a falta de resultados
substantivos.
28
Ver Preeg (1995), p. 120.
29
GATT, “The Draft Final Act of the Uruguay Round: Press Summary”, News of the
Uruguay Round, 55, 3.12.1992. Para os documentos acordados definitivamente, ver WTO
(1995b) e, para a versão em português, Brasil (1994).
30
Ver Aide-Mémoire, Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais, “Rodada Uru-
guai do GATT — Proposta da CEE”, setembro de 1990.
31
Ver UNCTAD (1990).
32
Ver Lopes (1992a) e (1992b).
33
Ver Anderson (1993), p. 14-15.
34
Boletim de Negociações Multilaterais, 9, p. 37, e Hoekman (1993), p. 13. A oferta brasileira
foi mais tarde ampliada para incluir compromisso de manutenção (standstill) das regras
com relação a serviços bancários e de seguros.
Capítulo 4 O Brasil no GATT e na OMC: história e perspectivas 177
35
Ver Tarragô (1993), p. 145-6.
36
Dentre as muitas peculiaridades envolvendo taxonomias aplicadas às negociações da Ro-
dada Uruguai está o uso freqüente, na imprensa internacional e até mesmo em obras aca-
dêmicas, da expressão “linha dura” (hard liners) para se referir às posições de Brasil e à Índia
quanto aos novos temas. Não houve simetria na aplicação do termo para caracterizar a
extrema falta de sensibilidade demonstrada pelos países desenvolvidos em relação a ques-
tões como agricultura (CE) ou determinados serviços (Estados Unidos).
37
Ver Abreu (1996) para os contrastes entre cortes tarifários em diferentes mercados para
diferentes grupos de fornecedores de manufaturados.
38
Ver Harrison, Rutheford e Tarr (1996) que também inclui discussão de outros resulta-
dos e explicações para discrepâncias em estimativas. Para tentativa anterior, ver Goldin,
Knudsen e van der Mensbrugghe (1993). As críticas de Allais (1993) à abordagem de equi-
líbrio geral computável foram, em grande parte, respondidas por Waelbroeck (1993).
39
Ver Raffaelli (1992), p. 32-3, e Abreu (1996), p. 68-72.
40
Ver Lampreia (1994) para a avaliação dos resultados da Rodada Uruguai pelo represen-
tante do Brasil no GATT-OMC em 1993-94.
41
De acordo com Bevilaqua e Loyo (1998). O cronograma de compromissos está em
GATS/SC/13/Supl. 3, 26.2.98.
42
Ver Ministerial Conferences 1996: Singapore em WTO Gateway, no site da OMC.
43
Os parágrafos a seguir estão baseados em Abreu (2003).
44
Ver Ministerial Conferences 1999: Seattle em WTO Gateway, no site da OMC.
45
Ver Abreu (1999). O processo de negociação no GATT e na OMC é notoriamente res-
trito, em momentos cruciais das negociações, a subconjuntos de partes contratantes.
Assim são convidados a negociar informalmente apenas protagonistas considerados prin-
cipais, no green room, no jargão do GATT-OMC, no salão verde de conferências do dire-
tor-geral.
46
O progresso das negociações pode ser acompanhado na seção Services Negotiations (Ne-
gociações sobre Serviços), em Services Gateway, no site da OMC.
47
Ver Ministerial Conferences 2001: Doha (Conferências Ministeriais 2001: Doha) em The
WTO Gateway, no site da OMC.
48
Ver TRIPS and Public Health (TRIPS e Saúde Pública) em TRIPS Gateway, no site da
OMC.
49
Ver Ministerial Conferences 2003: Cancún (Conferências Ministeriais 2003: Cancún) em
WTO Gateway, no site da OMC.
50
Ver Carta de Genebra, Informativo sobre a OMC e a Rodada Doha, 2 (6), setembro de 2003 e
2 (7), outubro de 2003.
51
Para detalhes sobre essas ações, ver GATT, Activities, vários anos, e Jackson (1997), p.
163, para um conflito interessante do Brasil com a Espanha em relação aos impostos
sobre o café.
52
Ver a intervenção do embaixador brasileiro, Rubens Ricupero, no Conselho do GATT,
22.9.1988.
53
Ver WTO. Annual Report, vários anos.
54
Para a documentação completa sobre esse conflito, ver os documentos relevantes da
OMC: WT/DS46 (Brazil — Export Financing Programme for Aircraft), WT/DS70 (Canada
— Measures Affecting the Export of Civilian Aircraft), WT/DS71 (Canada — Measures
178 Comércio Exterior
Affecting the Export of Civilian Aircraft) e WT/DS222 (Canada – Export Credits and Loan
Guarantees for Regional Aircraft). Há também bons resumos na seção Key Facts relaciona-
da aos conflitos.
55
Respectivamente Export Development Corporation Assistance, Technology Partnership Canada
e Canada Account.
56
Industry Canada.
57
Para a documentação completa sobre a controvérsia em relação ao algodão, ver os docu-
mentos com a marcação WT/DS267 (United States – Subsidies on Upland Cotton) no site
da OMC. Há também um bom resumo na seção Key Facts relacionada a DS267.
58
A Austrália e a Tailândia registraram reclamações contra o regime do açúcar da CE seme-
lhantes às do Brasil. Para a documentação completa, ver os documentos com a marca-
ção WT/DS265, WT/DS266 e WT/DS283 (European Communities – Export Subsidies on
Sugar) no site da OMC. Há também um bom resumo na seção Key Facts relacionada ao
conflito DS266.
59
Ver documento WT/L/625 da OMC, 27.10.2005.
60
Ver Abreu (1995a), seção 1.
61
Ver Abreu (1989).
62
Ver “Aposta no consenso no GATT”, Gazeta Mercantil, 30.8.1985, sobre o que os diplo-
matas brasileiros esperavam que fosse o resultado da segregação das negociações. Essa
posição mudou drasticamente: em 1993, por exemplo, o Brasil não teve sucesso ao ofe-
recer aos Estados Unidos melhor acesso ao mercado brasileiro para serviços financeiros
e de telecomunicações, em troca de maior acesso para as exportações de suco de laranja,
têxteis, calçados, cerâmicas e bens de capital; ver “GATT: Pressão do Brasil”, Gazeta Mer-
cantil, 10.12.1993.
63
Ver Abdenur (1992), p. 15-16.
64
Oxley (1990), p. 112, menciona a relutância brasileira inicial em juntar-se ao primeiro nú-
cleo do grupo de Cairns (Argentina, Austrália, Brasil, Nova Zelândia e Uruguai), e sua
insistência para que o objetivo fosse coordenar posições, e não negociar posição conjun-
ta. A aceitação, por parte do Brasil, da primeira proposta de Cairns, em 1987, exigiu ga-
rantia prévia da Austrália de que medidas sobre tratamento especial e diferenciado para
países em desenvolvimento seriam preservadas no processo de liberalização.
65
Ver Ricupero (1993), p. 30.
66
Sobretudo por motivos políticos, pelo menos no início.
67
Ver GATT (1993).
68
Ver Ricupero (1993), p. 30.
69
Segundo outros, porém, o Brasil alinhou-se com os Estados Unidos em Bruxelas, par-
ticularmente na controvérsia agrícola com a CE, “na qual não temos grande interesse
[e] acabaríamos agindo como elenco coadjuvante para a delegação norte-americana, de-
sempenhando o papel de porta-voz de atitudes procedurais (sic) contra a CE, geralmente
reservadas a países de importância secundária, com interesses limitados em jogo”, Ba-
tista (1993), p. 114-5.
70
Ver Batista (1993), p. 120.
71
A tarifa efetiva sobre automóveis de passeio chegou a superar 270%.
72
Isso também se refletiu em aumento da tarifa média desde 1994, de 11,2% para mais
de 15% em 1997-98, ver Tabela 1.1.
Capítulo 4 O Brasil no GATT e na OMC: história e perspectivas 179
73
Ver, por exemplo, o discurso do ministro Lampreia na Escola Superior de Guerra, “País
evitará ‘exposição precoce’ da sua economia”, Gazeta Mercantil, 4.7.1996.
74
Ver “Brasil recebe crítica por ficar fora do ITA”, Gazeta Mercantil, 29.4.1997.
75
Ver, por exemplo, Abreu e Fritsch (1992).
76
Ver a seção “Política Externa — Mercosul”, no site do Ministério de Relações Exteriores
brasileiro.
77
Abreu (2005).
78
Ver Abreu e Fritsch (1992) e Lafer (1993).
79
A tarifa industrial máxima consolidada no Brasil seria reduzida de 35% para 12,72%, a
menos da exclusão de produtos “sensíveis”. Ver Background Fact Sheet, WTO Agriculture
Negotiations, agosto de 2003, no site da OMC, para detalhes sobre a fórmula suíça e
congêneres.
5 A escolha de
“políticas industriais”
na América Latina
1. Políticas industriais
2. Busca de paradigmas
3. Paradigmas de crescimento econômico: políticas industriais e seus resultados
4. Limites do possível
5. Construção de instituições, macroeconomia e políticas industriais
6. Alternativas de políticas
7. Recomendações de políticas
Capítulo 5 A escolha de “políticas industriais” na América Latina 183
183
184 Comércio Exterior
TABELA 5.1. América Latina: PIB-PPC per capita, crescimento anual do PIB-PPC
per capita, PIB-PPC total, população e densidade populacional por economia, 2001
e 1990-2001
sem ter sido insuficientes para mudar o desolador histórico de crescimento re-
cente da América Latina começou a se propagar.
Em muitos círculos, incluindo setores influentes do establishment acadêmico
das economias desenvolvidas, começou a ganhar terreno a idéia de que, no fi-
nal das contas, pelo menos algumas das antigas “políticas industriais” — ou talvez
outras políticas inovadoras ad hoc promotoras do crescimento — ainda pudes-
sem ter papel importante a desempenhar no estímulo ao crescimento sustenta-
do nas economias da América Latina. Essa literatura certamente tem legitimidade
em seu questionamento das limitações de receitas ortodoxas. Mas também teve,
por meio de suas reverberações locais, especialmente na mídia e entre políticos
populistas, influência bastante negativa sobre decisões recentes em muitas eco-
nomias em desenvolvimento. Fornece ampla munição para os que são a favor do
retorno às “políticas industriais” do tipo “escolha do vencedor”. A evidência
histórica é que estas se baseavam simplesmente em garantir subsídio contínuo a
produtores ineficientes, os quais nunca foram capazes de se tornar competitivos
nos mercados internacionais, em processo que nada tinha a ver com a tentativa
de atenuar divergências entre custos e benefícios sociais e privados.
A principal preocupação deste capítulo é avaliar que “políticas industriais”
fariam sentido na América Latina hoje. A primeira seção considera as defi-
nições de “políticas industriais” e sua natureza no passado, analisa políticas
criadas para corrigir falhas de mercado e examina como novas propostas am-
pliaram a compreensão tradicional do escopo dessas políticas do tipo second
best (“segunda melhor política”). A segunda concentra-se em experiências de
crescimento que poderiam servir de paradigma para as economias da América
Latina. Considera o crescimento em perspectiva de longo prazo, mas concen-
tra-se nos períodos pós-1960, e em particular pós-1990, em um esforço para iden-
tificar experiências paradigmáticas baseadas no desempenho de crescimento de
diferentes economias. A terceira seção é sobre economias que constituem
paradigmas de crescimento e suas políticas relevantes. Analisa as políticas espe-
cíficas adotadas por economias particularmente bem-sucedidas e examina até que
ponto outros fatores podem ter explicado esse crescimento. Essa seção inclui
comparações do tamanho das economias da América Latina e das economias que
poderiam servir como paradigmas de crescimento.
A quarta seção trata das restrições multilaterais atuais às “políticas indus-
triais”, em especial no caso dos subsídios e das medidas de investimento rela-
cionadas ao comércio, dado que tais restrições foram consideravelmente am-
pliadas em decorrência da Rodada Uruguai de negociações comerciais
multilaterais. A seção seguinte analisa o vínculo entre macroeconomia e “polí-
ticas industriais”, tanto no que diz respeito às limitações impostas à política
industrial pela instabilidade macroeconômica quanto em relação ao custo de
186 Comércio Exterior
1. Políticas industriais
O primeiro problema com a expressão “política industrial” é que exclui agri-
cultura e serviços dos “esforços governamentais para alterar a estrutura [econô-
mica], de modo a promover crescimento baseado em produtividade”.2 O viés a
favor de crescimento puxado pela indústria é óbvio apesar de não parecer sequer
razoável à luz das evidências históricas, pois muitas histórias de sucesso depen-
deram pouco do desempenho industrial. Talvez fosse preferível utilizar o termo
“políticas microeconômicas”, em oposição a políticas macroeconômicas e
institucionais. Neste capítulo, a não ser quando explicitamente sinalizado, as
referências a “políticas industriais” são a políticas microeconômicas.
Quais foram as políticas industriais adotadas no passado na América Latina?
Em sua maioria, eram de natureza vertical, ou seja, estavam baseadas em seleção
de alvos. Em determinadas economias, como a do Brasil em relação ao café,
preços de commodities foram sustentados por maciça estocagem desde o início do
século XX com implicações também para economias “caronas” em outras par-
tes da América Central e do Sul, que foram extremamente significativas. Para os
bens não-agrícolas, até a Grande Depressão de 1928-33, a política vertical mais
importante era baseada em tarifas de importação muito altas. A proteção alta
continuou após a Segunda Guerra Mundial com as licenças de importação de-
sempenhando papel fundamental, já que os governos mantinham taxas de câm-
bio supervalorizadas e necessitavam de instrumento adicional para racionar as
importações. Essa restrição era sancionada pela concessão pouco criteriosa de
exceções em situações de dificuldades de balança de pagamentos por parte do
General Agreement on Tariffs and Trade (GATT), com base no artigo XVIII:b.
À medida que a industrialização substitutiva de importações (ISI) se aprofun-
dava, um vasto número de instrumentos veio se somar ao arsenal das políticas
industriais. Sem qualquer esperança de reproduzir a longa lista de forma exaus-
tiva, é possível mencionar: acesso seletivo ao crédito, com freqüência altamente
subsidiado; exigências relacionadas a conteúdo nacional; estímulos a investimen-
tos estrangeiros diretos (IDE) (incluindo tratamento fiscal favorável; acesso a divi-
sas a taxas de câmbio em condições mais favoráveis; e limitações do direito de
estabelecimento para competidores); subsídios à exportação.
No entanto, as velhas políticas, que muitas vezes resultaram em subsídio
continuado, enfrentaram não apenas restrições multilaterais legais cada vez mais
Capítulo 5 A escolha de “políticas industriais” na América Latina 187
2. Busca de paradigmas
A insatisfação com o desempenho das economias latino-americanas provocou a
busca de experiências nacionais bem-sucedidas, das quais se pudesse, com sor-
te, extrair algumas lições. Existe, porém, espaço para insatisfação com a maior
parte dessa literatura baseada em critérios discricionários, incapaz de levar em
conta as especificidades nacionais que estão na raiz das histórias de sucesso na
obtenção de crescimento rápido e sustentado.
Crescimento rápido não é uma experiência nova na economia mundial. O
que é novo é que após a Segunda Guerra Mundial muitas economias foram ca-
pazes de sustentar crescimento rápido, com freqüência de forma continuada, em
diversas regiões: nas chamadas economias de “colonização recente”, na Europa
Ocidental e, sobretudo, na Ásia. Neste último continente, taxas de crescimento
extremamente altas se tornaram corriqueiras. Antes de 1870, as taxas de cresci-
mento anual do PIB-PPC per capita raramente ultrapassavam 1% na Europa. Na
Ásia, ficavam na faixa de 0,1-0,2%. Foi na periferia da economia mundial, em
especial na Austrália e na Nova Zelândia, e também, em menor escala, nos Es-
tados Unidos e Canadá, sobretudo no período 1820-50, que as taxas de cresci-
mento mais altas foram alcançadas (Tabela 5.2).4
188 Comércio Exterior
TABELA 5.2. Economias selecionadas: PIB-PPC per capita, taxas médias de crescimento
anual, 1820-50 a 1928-45, e população, 1945*
Continua
Capítulo 5 A escolha de “políticas industriais” na América Latina 189
TABELA 5.2. Economias selecionadas: PIB-PPC per capita, taxas médias de crescimento
anual, 1820-50 a 1928-45, e população, 1945* (cont.)
TABELA 5.3. Economias selecionadas: PIB-PPC per capita, taxas médias de crescimento
anual, 1945-2001*
Continua
192 Comércio Exterior
TABELA 5.3. Economias selecionadas: PIB-PPC per capita, taxas médias de crescimento
anual, 1945-2001* (cont.)
Depois de 1960, os níveis do PIB-PPC per capita em quase toda a Ásia cres-
ceram em taxas muito mais altas do que em qualquer outro lugar do mundo. O
crescimento do PIB-PPC per capita foi particularmente acelerado no Japão du-
rante a década de 1960 — 9,2% ao ano —, caindo para pouco acima de 3% nos
anos 70 e 80. Em Hong Kong, Coréia, Cingapura e Taiwan, a taxa foi de 5-8%
ao ano entre 60 e 1990, e em seguida caiu para a faixa de 3-5% durante os anos
90, com exceção de Hong Kong, onde caiu ainda mais. O desempenho da
Malásia e da Tailândia ficou no geral 1-2 pontos percentuais abaixo desse de-
sempenho em 1960-90, o mesmo ocorrendo ao longo dos anos 90. A taxa de
crescimento anual do PIB-PPC per capita da China aumentou de 3,1% durante
os anos 70 para 6,6% durante os anos 90. A Índia cresceu muito pouco até 80,
e então – deixando de ser uma economia outsider na Ásia – passou a uma taxa
de mais de 3% ao ano. Na Ásia, mesmo durante os anos 1990, apenas no Japão
e nas Filipinas o PIB-PPC per capita cresceu menos de 1%.
O contraste com a América Latina é gritante. Durante os anos 60, quase to-
das as economias latino-americanas aumentaram seus PIB-PPC per capita a taxas
na faixa de 2-3% ao ano, em contraste com a faixa de 3-9% na Ásia. Apenas as
grandes economias mais atrasadas — China, Índia e Indonésia — ficaram para
trás, com taxas na faixa de 1-2%. Durante os anos 70, o Brasil se aproximou do
desempenho asiático, com o PIB-PPC per capita crescendo 5,5% ao ano, e diversas
outras economias latino-americanas tiveram desempenhos na faixa de 2,4-3,8%
— ainda que outras tenham ido consideravelmente menos bem, como Argenti-
na, Chile, Peru e Venezuela. A década de 1980 foi desastrosa para a América La-
tina, com queda do PIB-PPC per capita na maioria das economias, enquanto nos
anos 1990 os únicos casos em que o crescimento do PIB-PPC per capita ultrapas-
sou os 2% foram Argentina, Chile e Costa Rica. Dadas as distorções macroeco-
nômicas que acompanharam o crescimento argentino, é duvidoso se esse caso
específico pode ser usado como exemplo. Um dos aspectos mais atraentes da
história de sucesso chilena após meados da década de 1980 é que a alta taxa de
crescimento foi acompanhada por políticas macroeconômicas bastante virtuosas,
com ênfase em disciplinas fiscais e evitando desalinhamentos da taxa de câm-
bio. Isso representou um contraste nítido com algumas das histórias de sucesso
anteriores na América Latina.
tem tido um desempenho extremamente favorável nos últimos vinte anos, e cons-
titui outra experiência que deve ser levada em conta. Na Europa, há o já men-
cionado caso da Irlanda, cujo PIB-PPC per capita cresceu 6,2% ao ano em
1990-2001. A Finlândia é outro caso de sucesso, embora seu ritmo de crescimen-
to tenha diminuído durante os anos 90. Talvez o papel central das empresas de
alta tecnologia explique por que a experiência finlandesa é citada com tanta fre-
qüência. Apesar de as taxas de crescimento anual terem declinado recentemen-
te em Portugal e na Espanha, seu desempenho a partir de 1960 foi excelente.
De 1960 em diante, Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha expandiram seu PIB-
PPC per capita de quatro a cinco vezes, comparado a um crescimento de seis a
treze vezes nas economias asiáticas mais bem-sucedidas. Na América Latina, o
Brasil, a economia mais bem-sucedida no período 1960-2001, multiplicou por
2,4 seu PIB-PPC per capita, comparado a 2,6 na Índia, a menos bem-sucedida
das economias asiáticas para as quais existem informações de longo prazo. Por
fim, o caso do Chile se apresenta como paradigma, pelo seu desempenho mui-
to bom durante a década de 1990.
A busca por paradigmas de experiências de crescimento deve levar em con-
ta muitas especificidades, tanto das economias escolhidas como exemplos de
crescimento rápido quanto daquelas em busca de lições que possam servir para
formular políticas mais bem-sucedidas. Entre essas especificidades, as mais re-
levantes talvez sejam: tamanho da população e área, localização em relação aos
principais mercados, condições de acesso preferencial a esses mercados, fatores
“culturais” (língua, tamanho da diáspora), dotações de fatores, taxa de poupan-
ça, entre outros. A Tabela 5.4 apresenta taxonomia, baseada no tamanho de po-
pulações, das economias que representam paradigmas de crescimento, bem como
de economias em busca de lições para acelerar o seu crescimento.
É sempre possível argumentar que China e Índia representam categoria à
parte, já que seu tamanho não tem equivalente na América Latina. No entanto,
a discussão dos problemas enfrentados por Brasil e México, as duas grandes eco-
nomias da região, ambas com histórico de crescimento bastante medíocre nos
últimos 25 anos, pode se beneficiar de alguma forma das experiências de su-
cesso da China e, talvez ainda mais, da Índia.
Economias asiáticas
Existem alguns fatos estilizados, comuns a todas as economias asiáticas bem-
sucedidas. A formação bruta de capital fixo (FBCF) em geral é ou foi bastante
alta, ou pelo menos cresceu entre a década de 1960 e a de 1980. Durante os
anos 60, somente na China e na Coréia a FBCF era superior a 20% do PIB
(média decenal). Nos anos 70 e 80, ultrapassou 40% em Cingapura e 30-35%
na China. Na Coréia, em Hong Kong e na Tailândia permaneceu na faixa de
Capítulo 5 A escolha de “políticas industriais” na América Latina 195
Seguidores Paradigmas
Muito grandes: Muito grandes:
Brasil 177 China 1288
México 102 Índia 1064
Grandes: Grandes:
Colômbia 44 Coréia 48
Argentina 38 Espanha 41
Tailândia 62
Intermediários: Intermediários:
Equador, Guatemala, 10-26 Chile, Malásia, Portugal 16-25
Venezuela, Peru
Pequenos: Pequenos:
Bolívia, Honduras e Uruguai 3-10 Costa Rica, Hong Kong, 4-7
Finlândia, Irlanda e Cingapura
Índia
A melhora do desempenho de crescimento da Índia desde o início da década
de 1980 surpreendeu muitos analistas. As taxas de crescimento do PIB-PPC per
200 Comércio Exterior
Espanha e Portugal
As duas economias ibéricas tiveram histórico de crescimento notável, especial-
mente nos 25 anos após o final da Segunda Guerra Mundial, mas também a par-
tir de 1970. Isso esteve relacionado, em parte, ao alto nível de investimento nas
duas economias. No caso de Portugal, a emigração provavelmente contribuiu
para melhorar significativamente o desempenho da economia. Ao final da dé-
cada de 1970, a FBCF representava, nos dois casos, algo como 30% do PIB. Re-
centemente, sua queda foi apenas modesta: em Portugal ainda representa 27-28%,
e na Espanha, 25%. Tanto a Espanha quanto Portugal, é claro, se beneficiaram
das oportunidades abertas por uma Europa integrada. Isso precedeu sua admissão
formal à Comunidade Européia (CE) na década de 1980, uma vez que acordos
de livre comércio haviam sido assinados com a então Comunidade Econômica
Européia (CEE) e com a Associação Européia de Livre Comércio (AELC) durante
os anos 60 e 70. Em 1960, as duas economias eram bastante fechadas: a parti-
cipação das exportações no PIB espanhol era de apenas 8%, comparada a 15%
em Portugal (e à média mundial de 12%). A Espanha começou a abandonar seu
modelo autárquico no final dos anos 50, durante as negociações de entrada na
OCDE, cortando as tarifas de importação que, em 1980, haviam baixado para
6-8%. No início da década de 2000, a participação das exportações no PIB ha-
via crescido, em ambos os casos, para perto de 30%. Na verdade, a partir de
1960, o desempenho das exportações espanholas foi semelhante ao das irlande-
sas, já que sua participação no mercado mundial aumentou de 0,63% para 2,28%.
No entanto, como a evolução da participação espanhola foi monotônica, se es-
colhermos meados dos anos 70 como origem, o desempenho recente das expor-
tações da Irlanda foi muito melhor, já que a Irlanda perdeu participação nas
exportações mundiais até meados dos anos 70.
Houve também, em relação à maioria do resto da Europa, convergência ibé-
rica em termos da composição das exportações, pois a participação dos manu-
faturados no total das exportações aumentou para 78% na Espanha e para 87%
202 Comércio Exterior
Irlanda
Análises recentes destacaram a importância da Irlanda como história de suces-
so de crescimento, com base no aumento pronunciado da participação do país
no total mundial de exportações e no espetacular aumento recente do PIB per
capita.18 Um bom desempenho sustentado após a Segunda Guerra Mundial, es-
pecialmente após 1960, quando o PIB-PPC per capita cresceu mais de 3% ao ano,
culminou na taxa média anual de mais de 6% após 1990. Alguns aspectos do
“milagre” irlandês, porém, o tornam bastante peculiar e de difícil reprodução.
A Irlanda já era uma economia bastante aberta em 1960, com participação das
exportações no PIB de 30%, comparada a, por exemplo, 8% na Espanha. No
início dos anos 60, dois terços do total de exportações eram alimentos, em con-
traste com a participação atual de 90% de manufaturados. Em 1960, a economia
britânica absorvia 75% do total das exportações irlandesas, comparados a 18%
em 2003. A União Européia (EU), incluindo o Reino Unido, compra hoje 61%
das exportações irlandesas. A formação bruta de capital fixo caiu de quase 30%
do PIB nos anos 80 para a faixa de 23-24% no início da década de 2000.
Há mais especificidades no caso irlandês. O Acordo de Livre Comércio
Anglo-Irlandês de 1965 e a entrada na CE em 1973 desempenharam papéis
importantes na abertura de mercados para a Irlanda. O apoio financeiro da UE
aumentou para quase 6% do PIB irlandês em 1979, permaneceu acima de 3,5%
até 1997 e continuou a decrescer. Em 2003, a Irlanda ainda recebia de Bruxe-
las quase 400 euros por habitante. Existe significativa diáspora irlandesa no Rei-
no Unido e nos Estados Unidos. A Irlanda foi também a única economia de
língua inglesa de baixa renda a tornar-se membro da CE. Não é fácil encon-
trar, digamos, economia centro-americana que pudesse ocupar posição seme-
lhante em relação aos Estados Unidos. A economia irlandesa é pequena: com
uma população em torno dos quatro milhões, apesar de seu excelente desem-
penho recente de crescimento, o PIB-PPC total ainda é, por exemplo, 20%
inferior ao PIB português.
Na base do milagre irlandês está o grande sucesso de sua política macroe-
conômica. As evidências citadas com mais freqüência são a drástica queda da
participação da dívida no PIB, de taxas superiores a 112% no início dos anos
80 para pouco mais de 90% em 1990-94, depois caindo de forma monotônica
até atingir 32% em 2003, uma vez que o nível da dívida permaneceu estável e o
crescimento do PIB foi muito significativo.19 Uma sucessão de pactos salariais
promoveu profunda reforma no mercado de trabalho irlandês. A ação mais im-
portante do período inicial foi um pacto salarial nacional de três anos, o Pro-
grama de Recuperação Nacional (Programme for National Recovery). Apoiado por
patronato, sindicatos e governo, o pacto limitou o aumento salarial anual a 2,5%
204 Comércio Exterior
entre 1988 e 1990. Como parte dele, o governo concordou em compensar as res-
trições salariais com cortes no imposto sobre a renda e aumento dos gastos com
previdência, saúde e habitação. O seguro-desemprego foi restringido. O gover-
no irlandês aumentou em 1,8% do PIB os gastos com programas destinados a
mobilizar a oferta de mão-de-obra, melhorar a capacitação profissional e au-
mentar a eficiência dos mercados de trabalho. O desemprego caiu de mais de
17% para algo em torno de 4%. O sucesso do pacto inicial levou a cinco pactos
subseqüentes.20 O sucesso também foi facilitado por oportuna reforma educacio-
nal, que aumentou a oferta de mão-de-obra qualificada.
As políticas industriais irlandesas evoluíram com o tempo, adotando instru-
mentos compatíveis com as regras internacionais. Antes da entrada na CE, ha-
via isenções de imposto de renda condicionadas a exportações. Estas foram
substituídas por imposto de renda corporativo de 10% (hoje 12,5%) na produ-
ção de manufaturados, comparado à taxa corporativa padrão em torno de 35%.
No final dos anos 90, houve redução da carga fiscal equivalente a 4,3% do PIB
com a introdução de taxas corporativas diferenciadas e possibilidade de depre-
ciação acelerada. As políticas industriais eram bastante abrangentes, incluindo
também políticas ativas para apoiar empresas nacionais, apoio à coleta de informa-
ções comerciais, subsídios a juros, garantias de empréstimos e transferências a
fundo perdido para treinamento de mão-de-obra e para pesquisa e desenvolvi-
mento. A Autoridade para o Desenvolvimento Industrial21 (IDA) tem tradicional-
mente usado transferências parciais a fundo perdido para aquisição de ativos fi-
xos como instrumento de política industrial. No início dos anos 80, estas podiam
alcançar 45-60% dos custos elegíveis e respeitavam um teto. As variáveis levadas
em conta no processo decisório incluíam geração de empregos, qualificação da
mão-de-obra, valor adicionado, crescimento potencial, encadeamento na cadeia
produtiva, localização e potencial de exportação.22 A Irlanda também tem tido
grande sucesso na atração de IDE, sobretudo após 1997: as entradas anuais em
anos de pico recentes alcançaram 24% do PIB.
Finlândia
A Finlândia, embora tenha aderido relativamente tarde ao processo de inte-
gração européia — o país entrou para a UE em 1995 —, teve livre acesso ao
mercado da então CE desde 1977, na condição de membro da AELC. O país
também gozou de alguns benefícios por seus vínculos econômicos com a União
Soviética antes de 1990, uma vez que estes possibilitavam a exploração de eco-
nomias de escala por setores selecionados da indústria finlandesa.23 No entanto,
sua participação nas exportações mundiais desde 1960 caiu marginalmente:
0,63% das exportações mundiais em 2002, comparados a 0,7% em 1960. A par-
ticipação das exportações no PIB finlandês quase dobrou — de 20% para 38%
Capítulo 5 A escolha de “políticas industriais” na América Latina 205
4. Limites do possível
As disciplinas multilaterais em relação a políticas industriais tornaram-se mais
restritivas com a Rodada Uruguai de negociações multilaterais. Isso afetou os
graus de liberdade de que gozavam as economias em desenvolvimento para a
implementação de políticas baseadas em subsídios e no tratamento preferencial
do IDE. O bem-sucedido histórico de crescimento de muitos dos paradigmas
evocados com mais freqüência apoiou-se em políticas que se tornaram ilegais sob
as novas disciplinas multilaterais.
Um dos resultados mais significativos da Rodada Uruguai de negociações
comerciais foi o novo conjunto de regras sobre subsídios contido no Acordo
sobre Subsídios e Medidas Compensatórias. Estes foram classificados como proi-
bidos, acionáveis e não-acionáveis. Os proibidos são os condicionados ao desem-
penho de exportação ou ao uso de insumos domésticos em detrimento de pro-
dutos importados. Os subsídios acionáveis para bens industriais incluem os que
causam dano à indústria doméstica, anulação ou redução de benefícios de ou-
tros membros do GATT 1994 e sérios danos aos interesses dos outros membros.
Os subsídios não-acionáveis são os não-específicos e os específicos desde que
relacionados a atividades de pesquisa, ajuda para regiões desfavorecidas e pro-
moção da adaptação de infra-estrutura existente a novas exigências ambientais.
São permitidos subsídios às atividades de pesquisa por parte de empresas,
ou estabelecimentos de ensino superior ou pesquisa contratados por empresas,
caso a assistência não cubra mais de 75% dos custos da pesquisa industrial29
ou 50% das atividades de desenvolvimento pré-competitivas. A natureza des-
sa ajuda é detalhada no acordo (Artigo 8.1a).30 A assistência a regiões desfa-
vorecidas deve ser não-específica no âmbito de regiões determinadas, cujo PIB
Capítulo 5 A escolha de “políticas industriais” na América Latina 209
per capita não ultrapasse 85% da média nacional e cuja taxa de desemprego re-
presente pelo menos 110% da média nacional. A assistência relacionada ao
meio ambiente deve ser não-recorrente e limitada a 20% do custo da adapta-
ção. Existem complexas exceções à proibição de subsídios que concedam tra-
tamento especial e diferenciado aos países-membros em desenvolvimento. En-
tretanto, a maioria das economias em desenvolvimento foi excluída desse
regime após 2002, em vista da extinção, por decurso de prazo, de tratamento
especial e diferenciado transitório.
A Rodada Uruguai também estabeleceu disciplinas que limitaram as medi-
das de apoio domésticas e os subsídios à exportação relacionados a produtos agrí-
colas. Estas, porém, foram sujeitas à “cláusula da paz”, a ser aplicada durante
dez anos. Como os subsídios agrícolas são um aspecto importante das políticas
dos países desenvolvidos, e bem menos significativos nas economias em desen-
volvimento, não é provável — ao contrário do caso dos produtos industrializa-
dos — que esses últimos sejam alvo de medidas compensatórias nos mercados
das economias desenvolvidas.31
O Acordo sobre TRIMs que resultou da Rodada Uruguai estipulava que as
economias em desenvolvimento deveriam suspender qualquer medida relaciona-
da a investimento que violasse o GATT 1994 e conflitasse com o tratamento na-
cional e com a obrigação de eliminar restrições quantitativas.32 Isso afetou prin-
cipalmente os esquemas de atração de IDE que ofereciam tratamento preferencial
com base no desempenho futuro nas exportações.
6. Alternativas de políticas
Taxonomias de políticas industriais tendem a ser baseadas na distinção entre
aplicação universal ou seletiva: políticas horizontais ou verticais. Políticas hori-
zontais têm sido baseadas tipicamente em isenções fiscais para despesas rela-
cionadas ao desenvolvimento tecnológico ou ao apoio direto a atividades de pes-
quisa e desenvolvimento, seguindo as linhas das exceções contidas nas regras da
OMC sobre subsídios não-acionáveis.34 A vantagem das políticas horizontais, é
claro, é que são evitados os perigos envolvidos na discriminação de alguns
agentes econômicos em detrimento de outros. Não é preciso tentar escolher os
vencedores, atividade um tanto traiçoeira na qual as taxas nacionais de sucesso
variam de forma bastante significativa entre experiências nacionais e são parti-
cularmente baixas na América Latina.
Mesmo economistas não reconhecidos por sua ortodoxia — Paul Krugman
é um dos primeiros nomes a vir à mente — finalmente acabaram por evitar re-
comendar políticas industriais baseadas em medidas seletivas, em função das di-
ficuldades de obter a informação necessária para viabilizar decisões abalizadas
e de boa qualidade. O resultado é que, embora se reconheça que as políticas se-
letivas são muito eficazes para compensar falhas de mercado, que agem como
poderosas cunhas afastando custos e benefícios sociais e privados, é pouco pro-
vável que os responsáveis pela formulação de políticas sejam capazes de ter acesso
à informação necessária para selecionar seus alvos com propriedade.
212 Comércio Exterior
claro de que forma isso poderia ser conciliado com a minimização dos custos de
implementação. É sabido que os custos de implementação de políticas indus-
triais aumentam exponencialmente à medida que diminui o tamanho médio das
empresas afetadas.
A economia política do clustering em economias com grandes populações
e áreas tende a ser bem mais complexa do que a das muito pequenas, onde as
conseqüências nacionais de uma única decisão de investimento estão destina-
das a ter muito maior importância. A interação entre políticas industriais e re-
gionais é provavelmente mais importante no caso das economias relativamen-
te maiores. A discussão de experiências nacionais específicas de crescimento
rápido, e das políticas industriais a elas relacionadas, deveria ocorrer levando
em conta essas considerações relacionadas a tamanho, embora seja perfeitamen-
te possível que um instrumento de política usado com sucesso em uma econo-
mia pequena seja usado também em uma economia grande ou muito grande
com resultados semelhantes.
As políticas destinadas a fazer frente às dificuldades vividas por empresá-
rios no que foi denominado sua “autodescoberta” são controversas.39 Políticas
de “autodescoberta”, por sua própria natureza, devem ter base ampla. Se elas não
forem de fato horizontais, deveriam pelo menos afetar muitos setores. Não existe
na verdade nenhum bom motivo para limitar os subsídios à “autodescoberta” às
empresas e não estendê-los aos indivíduos. Também não existe garantia de que
a “autodescoberta” realçaria apenas aspectos socialmente positivos das iniciati-
vas empresariais. Certamente aumentaria a capacidade de pressão dos setores
afetados e exigiria instituições e processos decisórios melhores para dar conta do
aumento de apetites rentistas.
A crença de que “o incrível sucesso da Fundación Chile ... alcançado com
o salmão possa pagar por muitos erros subseqüentes”40 no processo de seleção
de projetos é condicional à escolha de caso em que se acertou em cheio na de-
cisão inicial. Sem dúvida, é possível lembrar outras experiências nacionais com
menos probabilidade de fornecer base para tal otimismo quanto à qualidade do
processo decisório. Em muitos casos, é pouco provável que as dificuldades acar-
retadas pelo subsídio ao investimento em indústrias não-tradicionais, tal como
tem sido proposto, sejam solucionadas por alguma combinação de exigências
de desempenho, monitoramento criterioso do uso de recursos ou mecanismos de
suspensão de subsídios.41 A crucial “capacidade de cortar perdas uma vez reco-
nhecidos os erros” se encaixa mal com a evidência histórica na maioria dos paí-
ses latino-americanos, cujos governos têm demonstrado ser notoriamente incom-
petentes quando se trata da retirada de subsídios. De toda forma, o exemplo do
salmão chileno, citado com freqüência, é contra-exemplo de estratégia centrada
em clusters em setores ou produtos para os quais seja possível mostrar que um país
teve vantagem comparativa no passado.
214 Comércio Exterior
7. Recomendações de políticas
Antes de tudo, é importante reconhecer o papel crucial da estabilidade
macroeconômica como precondição para o crescimento rápido e sustentado. De
modo geral, histórias de sucesso de crescimento baseadas em políticas indus-
triais específicas foram precedidas por estabilizações bem-sucedidas. Não existe
caso de economia com problemas de estabilização crônicos e significativos e
com bom desempenho de crescimento. Pode ser possível, é claro, criar e imple-
mentar novas políticas industriais enquanto as políticas de estabilização ainda
Capítulo 5 A escolha de “políticas industriais” na América Latina 215
ocupam papel central na pauta econômica. Na maior parte dos casos, porém,
as limitações fiscais restringiriam significativamente o escopo das políticas indus-
triais que exigem gastos significativos ou que acarretam redução da renda.
Somente em casos raros houve crescimento significativo e sustentado sem
melhora substancial do nível anterior de investimento e da capacidade de pou-
pança. Aumentar os níveis de poupança e de investimento devem ser objetivos
centrais da política macroeconômica. Isso automaticamente suscita questões re-
lativas ao custo do investimento, que afeta o custo tanto dos bens de capital
quanto da construção, e também sua qualidade. As políticas microeconômicas de-
vem ter como alvo preços e qualidade de bens de capital, para garantir a eficá-
cia do investimento do ponto de vista do seu custo, ou seja, garantir que a
contribuição para a capacidade produtiva seja maximizada, dada uma taxa
de investimento. Não se trata de tarefa simples, especialmente nas economias
maiores, onde é de se esperar que haja capacidade doméstica significativa de pro-
duzir bens de capital por firmas com poder de barganha para lutar contra a
liberalização comercial.
Outra questão, relacionada à primeira, que também é zona cinzenta entre as
políticas macro e micro: quanto menor a variância nas taxas de crescimento de
uma economia, menor a probabilidade de que os planos de investimento sejam
afetados pelo ciclo econômico. As flutuações na taxa de crescimento no passa-
do afetaram gravemente a poupança do governo e o nível de gastos públicos,
pois geram queda de receita. Como as obras de infra-estrutura são atrasadas, as
taxas de retorno previstas são adversamente afetadas, o que pode afetar também
o investimento privado.
No reino das políticas industriais, bom ponto de partida é reconhecer que
as restrições internacionais impedem, em princípio, o uso de muitos instrumen-
tos que se mostraram eficazes em experiências passadas de países bem-sucedidos:
acesso preferencial a cobertura cambial, créditos subsidiados, regras relativas a
conteúdo nacional de insumos, critérios de desempenho de exportação, entre
outros. Isso naturalmente desvia o foco para políticas direcionadas a falhas de
mercado, que estão cobertas pelas regras da OMC sobre subsídios não-acionáveis
relacionados a ciência e tecnologia, pelo menos alguns aspectos de disparidades
regionais, e projetos relacionados ao meio ambiente. Por outro lado, já que as
políticas horizontais são não-específicas na ótica da OMC, existe forte argumento
em sua defesa, dado que não configuram subsídios que possam ser alvo de par-
ceiros comerciais insatisfeitos.
Outros argumentos sugerem que as políticas horizontais não deveriam ser
eliminadas. As políticas horizontais podem ser pouco direcionadas e ensejar o
disfarce de despesas que, por exemplo, não estejam relacionadas ao desenvol-
vimento da ciência e tecnologia para se beneficiar de incentivos fiscais. No en-
216 Comércio Exterior
Notas
1
Base de dados World Development Indicators do Banco Mundial.
2
Tal como definido por um influente estudo do Banco Mundial (1993).
3
Ver Rodrik (2004) e também Corden (1974), p. 248-64.
4
Informações de longo prazo comparáveis às de outras regiões existem apenas para um
grupo limitado de economias latino-americanas.
5
Banco Mundial (1993).
6
Banco Mundial (1993).
7
Moreira (1995).
8
Idem.
9
Ver Abreu (2004) para as políticas brasileiras anteriores a 1987 e o Capítulo 1 para as polí-
ticas liberalizantes após 1987.
10
Apesar do que afirma Rodrik (1995b).
11
Com base em Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) (2004).
12
Metodologia de Avaliação de Conhecimento (Knowledge Assessment Methodology) 2004. Ver
http://info.worldbank/etools/kam2004.
13
Chen e Dahlman (2004).
14
Rakshit (2004).
15
Rodrik e Subramanian (2004).
16
Singh (2004) e www.nasscom.org.
17
Price Waterhouse (1982) e Price Waterhouse (1981).
18
Redrado e Lacunza (2004), p. 12-14.
19
Dados do site do Agência de Administração do Tesouro (National Treasury Management
Agency), www.ntma.ie.
20
Este parágrafo está baseado em Tille e Yi (2001). Houve seis acordos nacionais sucessi-
vos: o Programa de Recuperação Nacional (Programme for National Recovery) em 1988, o
Programa de Progresso Econômico e Social (Programme for Economic and Social Progress)
em 1991, o Programa de Competitividade e Trabalho (Programme for Competitiveness and
Work) em 1994, a Parceria 2000 (Partnership 2000) em 1997, o Programa para Prosperida-
de e Justiça (Prosperity and Fairness) em 2000 e o Sustentando o Progresso (Sustaining
Progress) em 2003. Ver também Baccaro e Simoni (2004).
21
Industrial Development Authority.
22
É importante observar que essas transferências relativas a investimento, embora não se-
jam proibidas in limine pela Organização Mundial de Comércio (OMC), estão sujeitas a
processos segundo o acordo sobre subsídios. No entanto, existe brecha para pequenas
e médias empresas na área cinzenta, com base em interpretação da nota de rodapé 2 do
artigo 2 do Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias.
23
Ver Kokko e Haavisto (1990).
Capítulo 5 A escolha de “políticas industriais” na América Latina 219
24
Ver Hajmarsson (1990).
25
Ver Price Waterhouse (1989), Cap. 4.
26
Finish Funding Agency for Technology and Innovation.
27
Ver www.tekes.fi e OECD (1987).
28
Para este parágrafo e os seguintes sobre a Costa Rica, ver OMC (1995c) e (2001).
29
A pesquisa agrícola, assim como a pesquisa relacionada ao meio ambiente, e os progra-
mas agrícolas de assistência regional são tratados como isenções em relação aos compro-
missos de redução dos apoios domésticos sob o Anexo 2 do Acordo sobre Agricultura.
Ver OMC (1995b).
30
Ver OMC (1995b), p. 264-314.
31
Ver OMC (1995b), p. 39-68. A possível extensão da cláusula da paz, atualmente no limbo,
ocupava ainda, no início de 2007, lugar central nas negociações relativas à agricultura na
Rodada de Doha.
32
Ver OMC (1995b), p. 163-7. As economias menos desenvolvidas receberam um prazo
de sete anos para se ajustar.
33
Ver o Capítulo 1, Seção 3, para a discussão mais detalhada do aumento dos custos de
investimento no Brasil na década de 1980.
34
Créditos subsidiados concedidos por bancos públicos, como o Banco Nacional do Desen-
volvimento Econômico e Social (BNDES), podem ser considerados por alguns como
política horizontal, já que estão, em princípio, abertos a (quase) todos os setores. Exis-
tem, porém, áreas cinzentas quanto aos critérios adotados para racionar acesso a emprés-
timos, bem como limitações explícitas baseadas em tamanho da empresa postulante.
35
Ver, por exemplo, Rodrik (2004) e Rodríguez-Clare (2004b).
36
Rodríguez-Clare (2004a).
37
Idem.
38
Baseado em Rodríguez-Clare (2004a).
39
Ver Rodrik (2004).
40
Idem.
41
As exigências relativas ao desempenho de exportação relacionadas a subsídios são de qual-
quer forma proibidas pela OMC.
42
Rodríguez (2004b), seções I e III, citando Audretsch e Feldman (2003).
43
Ver Barreix e Villela (2003), seção V, para uma discussão desses problemas no Mercosul.
Ver também Fernández-Arias, Houseman e Stein (2001).
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