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Resumo
esumo: A segunda metade do século XX foi um período de intensas transformações na economia
internacional, com muitas inovações teóricas no campo da ciência econômica. Neste contexto, surgi-
ram as principais formulações teóricas dos pesquisadores da CEPAL. Os vários conceitos formulados
pelos cepalinos visaram o entendimento dos problemas relacionados ao subdesenvolvimento econô-
mico. Este trabalho objetivou reunir os principais conceitos teóricos formulados pelos cepalinos, sen-
do estes o da deterioração dos termos de troca, inflação, heterogeneidade estrutural e análise sobre a
tecnologia nas estruturas subdesenvolvidas. Para isto tais conceitos foram dispostos em três fases
visando explicitar a evolução cronológica do pensamento formulado na CEPAL: gênese, afirmação e
renovação do pensamento cepalino. Concluiu-se que há necessidade de se relembrar a contribuição
cepalina, a qual pode ser considerada uma teoria do subdesenvolvimento econômico.
Palavr
alavr as-cha
as-chavve: CEPAL. América Latina. Subdesenvolvimento. Desenvolvimento econômico.
vras-cha
Abstr ac
actt: The second half of the twentieth century was a period of changes in the world economy and
Abstrac
also in the economics science. It was in this context which appeared the main contributions of ECLAC
researchers to the economic theory. Most of the concepts formulated by these researchers were about
the problems of the underdeveloped economies. The paper aims to join the main concepts, like the
trade terms deterioration, the structural inflation and structural heterogeneity and the analysis about
technology in the periphery. These concepts were structured in three phases that describe the evolu-
tion of the ECLAC thought time, this are the genesis, the affirmation and the renewal of the ECLAC’s
though. The paper’s purpose is to remember the ECLAC’s contributions to the economics theory,
which may be consider a theory of economic underdevelopment.
Key-wor
y-words
ords
ds: ECLAC. Latin América. Economic development.Underdevelopment.
JEL classif ication
classification
ication: B2, History of economic thought since 1925. O1, Economic development. O54, Latin America;
Caribbean.
Nesse sentido, a partir da análise relaciona- lhos dos cepalinos, sendo derivada do termo “infla-
da à deterioração dos termos de troca a nascente ção estrutural”. Assim, esta pode ser considerada a
Cepal, de fins da década de 1940 e da década de fase de afirmação do pensamento cepalino.
1950, parte de um estágio em que a solução-chave A questão tecnológica toma real significân-
para conter os desequilíbrios relacionados ao de- cia durante a década de 1990. O contexto desta nova
senvolvimento das economias periféricas é a indus- fase no debate cepalino apresenta a conquista da
trialização. Sendo esta: “[n]ão a industrialização es- estabilização monetária a custas de rigorosas polí-
pontânea que se vinha desenvolvendo induzida por ticas de contenção fiscal por alguns dos países lati-
sucessivas crises no balanço de pagamentos, mas no-americanos, sendo que este período também
sim uma industrialização capaz de manter-se em abarcou uma série de reformas, incluindo privatiza-
ritmo intenso e em condições de eficiência ções e medidas com vistas à liberalização comerci-
máxima”(Rodriguez et al., 1995, p. 94-95). Essa vi- al e financeira. Neste contexto, a Cepal propôs uma
são foi a predominante nos primeiros trabalhos da nova agenda desenvolvimentista que não contra-
Cepal, sendo derivada das análises referentes ao riou as reformas pelas quais passaram os latino-ame-
comércio internacional e seus resultados para os ricanos, e que em muitos casos se vinculou a estas
países centrais e periféricos. Estas análises deram (Bielschowsky, 2000). A nova orientação cepalina,
origem à teoria da deterioração dos termos de tro- que deu origem ao neoestruturalismo, consiste na
ca. Esta temática foi a base das discussões cepali- proposta de transformação produtiva com eqüida-
nas entre o fim da década de 1940 e se concentran- de. Logo, as palavras de ordem no âmbito da nova
do na maior parte dos anos de 1950, constituindo, contribuição cepalina foram progresso técnico e
assim, a primeira fase da produção teórica cepali- competitividade internacional. Essa nova orienta-
na. Esta fase pode ser identificada como a fase da ção cepalina buscou se adequar ao quadro vigente
gênese do pensamento da Cepal. na América Latina, onde as principais economias já
A partir da inserção da indústria na periferia apresentavam estagnados seus processos de subs-
e dos conseqüentes problemas estruturais causa- tituição de importações com utilização de tecnolo-
dos pela falta de planejamento e estrutura em tais gias defasadas frente ao desenvolvimento tecnoló-
economias, a Cepal iniciou uma nova fase que vai gico internacional. Em tal situação os países latino-
de fins da década de 1950 até a década de 1970. americanos já industrializados poderiam ser identi-
Nesta fase, os focos de análise foram os problemas ficados como uma nova periferia, não mais somen-
que obstruíam o desenvolvimento econômico dos te produtora e exportadora de bens de consumo pri-
países periféricos, a partir do processo de industri- mários, mas também de produtos industrializados
alização que já se intensificara naquele período em de qualidade e tecnologia inferiores àqueles produ-
alguns países da América Latina. Assim, surgiram zidos pelos países centrais. Esta terceira e última
as teses cepalinas a respeito da inflação e da hete- fase pode ser considerada como a fase da renova-
rogeneidade estrutural. Estas novas contribuições ção do pensamento da CEPAL.
tiveram importância especial ao considerarem es- Assim, podem-se organizar as idéias cepali-
pecificidades presentes nos países subdesenvolvi- nas, seguindo uma linha histórica, como a que se
dos para a compreensão de seus problemas econô- tentou aqui traçar, a partir da teoria da deteriora-
micos fazendo, desta forma, frente às teorias e polí- ção dos termos de troca, dos anos de 1950, até a
ticas econômicas produzidas nos países centrais, as análise sobre evolução tecnológica, da década de
quais se caracterizaram pela generalização de di- 1990. A seguir, os principais argumentos cepali-
agnósticos e das medidas corretivas. Durante esta nos, constitutivos da teoria do subdesenvolvimen-
segunda fase a denominação “estruturalismo” é uti- to econômico.
lizada pela primeira vez como referência aos traba-
Porém, como foi identificado por Prebisch, presários da periferia elevem a produção para au-
esse processo não ocorreu; pelo contrário, o autor mentar seus lucros.
identificou um processo oposto que decorreu ao lon- Porém, a fase descendente do ciclo econômi-
go dos anos em perdas para a periferia, mesmo com co traz conseqüências muito ruins para a periferia
a evolução tecnológica mais acentuada no centro. na medida em que, da mesma forma em que au-
Este autor verificou, através de uma série histórica mentam com maior rapidez na fase ascendente, os
que refletia a relação de preços entre os produtos preços primários tendem a cair de forma mais ace-
primários e industriais entre 1876 e 1947, que hou- lerada nesta fase. Isso ocorre devido às interações
ve queda significativa do poder de compra da peri- entre os empresários e os trabalhadores ao longo do
feria, o que favoreceu claramente aos países cen- ciclo econômico. Nesse sentido, o aumento da de-
trais (Prebisch, 1949). Ou seja, os preços dos produ- manda na fase ascendente converte-se em aumen-
tos industriais não caíram como se esperava em re- to na demanda por mão-de-obra e salários na peri-
lação aos preços dos produtos primários. Assim, a feria (CEPAL, 1949). Já a fase descendente demons-
renda do centro cresceu mais do que a sua produti- tra uma queda nos lucros, reflexo da pressão exer-
vidade; enquanto na periferia o processo foi oposto. cida pelo excesso de oferta e baixa demanda, ou
“Em outras palavras, enquanto os centros preserva- seja, a disparidade se inverte. Contudo, no centro
ram inteiramente o fruto do progresso técnico de esta queda nos lucros não é repassada diretamente
sua indústria, os países periféricos transferiram para aos salários, pela rigidez salarial, fruto da organiza-
eles uma parte do fruto do seu próprio progresso ção dos trabalhadores desses países; por outro lado,
técnico” (Prebisch, 1949, p. 83). Essa interpretação isso não ocorre na periferia:
do processo de deterioração dos termos de troca é A desorganização característica das massas tra-
conhecida como abordagem contábil, sendo apre- balhadoras na produção primária, especialmen-
te na agricultura dos países da periferia, impe-
sentada no Estudio Económico de America Latina de-as de conseguirem aumentos salariais com-
1949 (CEPAL, 1949). paráveis com os que vigoram nos países in-
A segunda forma de interpretar o processo dustrializados, ou de mantê-los com amplitu-
de similar. A contração da renda – seja ela sob
de deterioração dos termos de troca, a abordagem a forma de lucros ou salários –, portanto, é
dos ciclos, busca explicitar as causas do fenômeno menos difícil na periferia (Prebisch, 1949, p. 87).
da deterioração dos termos de troca (Rodriguez, Sabe-se que a maior parte do processo pro-
1981). Segundo esta abordagem, durante a fase as- dutivo ocorre no centro, onde os salários constitu-
cendente do ciclo há um aquecimento da deman- em a maior parte dos custos de produção (CEPAL,
da, que possibilita uma situação em que as rela- 1949). Porém, a já citada rigidez faz com que a pres-
ções de preço passam a favorecer os produtores de são sobre o lucro exercida no centro seja transferida
bens primários. Isso ocorre porque há uma dispari- para a periferia onde é mais fácil a contração dos
dade entre oferta e demanda, principalmente no caso custos de produção através da contração dos salári-
dos bens primários; há uma certa demora no ajuste os, face à desorganização sindical e à correspon-
da oferta após a modificação da demanda, elevan- dente falta de rigidez salarial, aliada à grande ofer-
do os preços desses bens em caso de aumento da ta de trabalhadores. Este último fator pode ser con-
procura. Com isto, a combinação entre demanda ele- siderado uma característica estrutural determinan-
vada e oferta com demora em se ampliar levaria a te para o sucateamento da renda interna nos perifé-
uma transferência da lucratividade dos centros para ricos e que, se não eliminada, tende a perpetuar a
a periferia através da maior velocidade com que ocor- deterioração dos termos de troca ao longo do tempo
rem os aumentos dos preços primários em relação nessas economias.
aos preços dos produtos industriais (Prebisch, 1949). Esta forma como o centro transfere a pressão
Este aumento da lucratividade faz com que os em- ocorrida na fase descendente do ciclo econômico
de maior valor agregado e maior densidade tecno- na periferia. Assim, a adoção pela indústria da peri-
lógica, mais especificamente bens de produção. En- feria o padrão tecnológico do centro gera um mode-
tretanto, tais demandas seriam atendidas pela pro- lo econômico incapaz de absorver o excedente de
dução do centro. Deste modo, teríamos um quadro trabalhadores. Logo, mesmo com crescimento vol-
pelo qual, dada uma expansão da renda nos dois tado para dentro, a periferia apresenta um quadro
pólos do modelo, as exportações da periferia perde- de baixos salários e com grande parte da popula-
riam importância na composição da demanda do ção fora das relações de produção capitalistas, man-
centro, enquanto que suas importações de produ- tendo ainda um setor industrial incapaz de maximi-
tos finais, provindos do centro, aumentariam cada zar seu potencial produtivo.
vez mais. Esta situação configura um quadro de A versão industrialização, portanto, conclui
déficits na balança comercial nas economias de in- que permanece um processo de deterioração dos
dustrialização tardia, decorrendo em problemas em termos de intercambio para a periferia, porém re-
seus balanços de pagamentos. sultantes de novos entraves estruturais relaciona-
Pelo lado da oferta podem ser observados dois dos ao modelo industrial que se instalou na maior
problemas estruturais relacionados à debilidade do parte destas economias. Com isto, a versão indus-
mercado interno e ao padrão tecnológico adotado trialização pode ser considerada um avanço na teo-
pela indústria periférica. No primeiro caso, um mer- ria inicialmente proposta por Prebisch se adequan-
cado interno suficientemente forte faz com a indús- do ao novo quadro estrutural presente nas econo-
tria periférica atue com altas margens de capacida- mias latino-americanas entre fins dos anos 1950 e
de ociosa. Deste modo, incorrem em maiores cus- início dos anos 1960.
tos e perdem em termos de produtividade. No que Como já foi citado, as características especí-
tange ao segundo aspecto enquanto avança o tem- ficas da periferia levam a observar que os seus pro-
po os desequilíbrios observados na evolução da in- blemas não podem ser solucionados através das
dústria periférica e a incorporação de inovações tec- mesmas medidas corretivas que são utilizadas para
nológicas no centro, em velocidade muito maior que solucionar os problemas presentes nos países já
a observada no outro pólo do modelo, levam a uma desenvolvidos. Seguindo esta idéia, pode-se fazer
situação de diferenciação das produtividades. Ou referência ao conceito de “inflação estrutural”, que
seja, a produtividade do trabalho aumentaria mais surgiu como uma nova forma de interpretação dos
rapidamente no centro que na periferia. Em tal situ- desequilíbrios inflacionários dos países periféricos.
ação os produtos industrializados provindos do cen- Este conceito buscou confrontar a visão tradicional
tro teriam maior competitividade que os produzidos da inflação, “que, na melhor das hipóteses, permite
internamente. Com isto, para manter a competitivi- apenas delinear a trajetória da inflação na esfera
dade da produção industrial da periferia em relação financeira, nunca conseguiu explicar suas causas e
à produção do centro, os empresários buscariam persistência, e muito menos suas características lo-
reduzir os custos de produção, o que se daria, prin- cais” (Sunkel, 1958, p.312). Assim, além de propor
cipalmente, através do achatamento dos salários. uma nova visão sobre o processo inflacionário, ba-
Some-se a isto o fato de a tecnologia utilizada pela seada na análise dos problemas estruturais que se
indústria periférica seguir os mesmos padrões tec- concentram na periferia, o conceito de inflação es-
nológicos dos países desenvolvidos. Cabe, então, trutural foi uma crítica à interpretação monetarista
ressaltar que tal tecnologia é por natureza poupa- da inflação.
dora de mão-de-obra, devido às condições estrutu- Seguindo o método de análise estruturalista,
rais das economias centrais, onde se verificou ao as pressões causadoras da inflação podem ser clas-
longo da sua industrialização uma crescente escas- sificadas em três frentes: as pressões inflacionárias
sez do fator trabalho, situação inversa ao ocorrido básicas ou estruturais, as pressões inflacionárias cir-
básicas. O raciocínio é semelhante ao da teoria da canais por onde se propagam os movimentos infla-
deterioração dos termos de troca, apresentada an- cionários. Deste modo, deve-se ter claro em mente
teriormente, onde periferia exporta bens primários a distinção entre as formas de pressão inflacionária
de baixo valor agregado, importando bens finais de e os mecanismos de propagação para que se pos-
alto custo. Os déficits comerciais periódicos levam sam desenvolver formas eficientes de combate às
a constantes desvalorizações cambiais que aumen- elevações sistemáticas nos níveis de preços. Dada
tam os preços das importações incrementando, esta distinção, tem-se que as formas tradicionalmen-
desta maneira, a inflação. Isto devido à falta de te utilizadas de combate à inflação não atuam, ou
diversificação das exportações e à dependência es- atuaram, sobre as suas fontes, mas sim sobre as suas
trutural de importações, ou seja, da incapacidade formas de propagação. Por isso, as medidas que res-
do setor produtivo interno em atender a demanda tringem a demanda interna, com vistas a estabilizar
gerada internamente. Portanto, as pressões infla- os níveis de preços, têm resultados passageiros, dado
cionárias básicas, ou estruturais, provêm dos gar- que seus efeitos recaem somente sobre as manifes-
galos estruturais que se avolumaram durante a for- tações monetárias da inflação, ou seja, sobre os me-
mação destes sistemas econômicos subdesenvolvi- canismos de sua propagação.
dos e que permaneceram ao longo dos anos. A insistência na utilização destas medidas
As pressões inflacionárias circunstanciais de- corretivas traz conseqüências amargas para o de-
correm de fatores exógenos ao sistema econômico senvolvimento das economias subdesenvolvidas,
interno. Assim, podem-se destacar os aumentos nos pois freiam o crescimento econômico, sem que seja
preços das importações e nos gastos do governo mo- solucionada a questão inflacionária (Sunkel, 1958).
tivados por fatores variados, como guerras ou desas- Dado que as medidas de cunho restritivo, utilizadas
tres naturais. Já as pressões inflacionárias cumulati- para a contenção inflacionária, têm como resultado
vas provêm a própria inflação. Ou seja, trata-se da efetivo para a economia o resfriamento do processo
realimentação da inflação, ou inflação inercial. Com de desenvolvimento. Para que seja controlado o pro-
isto, nota-se que as pressões inflacionárias estrutu- cesso inflacionário conciliando crescimento e esta-
rais devem ser consideradas como as principais cau- bilidade de preços deve-se, acima de tudo, buscar
sas da inflação nas economias subdesenvolvidas, en- corrigir os problemas estruturais que resultam nas
quanto as pressões inflacionárias circunstanciais e elevações de preços. Ou seja, a disparidade entre
cumulativas são fontes complementares num processo oferta e demanda não pode ser corrigida somente
de desequilíbrio nos níveis de preços. pelo lado da demanda, como tradicionalmente pro-
Já os mecanismos de propagação inflacioná- posto, mas também pelo lado da oferta. Dessa for-
ria dizem respeito às formas como as diferentes par- ma, segundo o arcabouço de análise da inflação
tes do sistema econômico buscam diminuir os im- estrutural, dever-se-ia buscar diminuir a rigidez de
pactos da inflação sobre si. Em outras palavras: oferta, aumentando a disponibilidade de bens es-
o mecanismo de propagação vem a ser a capa- senciais no mercado interno, o que deve se dar pelo
cidade de os diferentes setores ou grupos eco- aumento e reorientação dos investimentos em seto-
nômicos e sociais reajustarem sua renda ou gas-
res estratégicos com vistas a eliminar os pontos de
to real relativo: os assalariados, através dos re-
ajustes nos soldos, salários e outros benefíci- estrangulamento presentes na economia. Aliado a
os; os empresários, através do aumento dos pre- isto, é preciso buscar soluções para pressões cumu-
ços; e o setor público através do aumento do
lativas e formas de prevenção para pressões inflaci-
gasto tributário nominal (Sunkel, 1958, p. 317).
onárias circunstanciais.
Logo, pode-se entender que as respostas con- Na mesma linha do conceito de inflação es-
cedidas pelos participantes do processo econômico trutural foi também desenvolvido no ambiente da
às elevações nos níveis de preços constituem os CEPAL o conceito de heterogeneidade estrutural. Tal
regiões mais ricas transbordem até as regiões mais teóricas de Fernando Fajnzylber, autor de maior rele-
atrasadas. vância na chamada nova Cepal (Welters, 2004), que
Temos que esta segunda fase do pensamen- a tecnologia passou a figurar com maior intensidade
to cepalino se distinguiu da anterior por um motivo nos trabalhos da instituição. Fajnzylber trouxe a tec-
especial: seu contexto histórico. Contexto este, fins nologia para o centro da discussão cepalina como
dos anos 1950 até a década de 1960, no qual a in- ferramenta fundamental para a busca do intitulou
dústria já poderia ser considerada uma realidade crescimento com equidade (Fajnzylber, 1990;
presente nas maiores economias latino-americanas. Schwarzer, 1993).
Porém, como visto, essa industrialização em ambi- Essa nova perspectiva da introdução da tec-
entes periféricos foi fonte de novos problemas es- nologia no processo de desenvolvimento fundamen-
truturais ou de transformação dos antigos. Foi em ta-se na influência da escola neoschumpeteriana
busca de identificar e propor soluções para tais pro- (Schwarzer, 1993; Welters, 2004). Segundo essa es-
blemas que ascendiam frente ao subdesenvolvimen- cola, haveria os países lideres e os seguidores. Os
to que foram construídos os argumentos cepalinos primeiros seriam os responsáveis pela introdução
constituintes da fase de consolidação do pensamento das inovações técnico-científicas, ou seja, pelo des-
nesta instituição. Assim, enquanto na primeira fase locamento da fronteira de conhecimento científico,
a industrialização ainda podia ser considerada em- e os últimos seriam os imitadores que buscariam
brionária, na segunda fase já eram percebidos por seguir os lideres. O desenvolvimento econômico dos
estes pesquisadores os efeitos da industrialização seguidores seria uma conseqüência da criação de
desequilibrada. Cabe ressaltar que durante este pe- um sistema nacional de inovação (Freeman, 1995);
ríodo o estruturalismo latino-americano já ganhara a partir daí seria possível a estas economias absor-
espaço entre as correntes de pensamento, difun- ver e decodificar os avanços na fronteira do conhe-
dindo-se não só neste continente, mas em boa par- cimento científico ao deter condições para aprovei-
te do mundo. tar as janelas de oportunidade (Perez; Soete, 1988).
Isso possibilitaria estas economias fazer o catching
up tecnológico. Este processo avançaria, permitin-
5 Renovação do pensamento da CEP AL: a
CEPAL:
do o sistema nacional de inovação amadureça a
tecnologia no debate cepalino
ponto de levar um determinado país da condição de
A tecnologia sempre esteve presente nas dis- seguidor à condição de líder ao longo do tempo.
cussões cepalinas (Pinto, 1976), podendo ser encon- Foi a partir desta influência teórica que se
tradas referências a este tema já no estudo de 1949, criou uma concepção cepalina dos problemas tec-
entre os primeiros escritos de Prebisch e nas dis- nológicos na América Latina em meados da década
cussões que se estenderam no âmbito desta insti- de 1970 e suas implicações para o processo de sub-
tuição ao longo dos anos. Entretanto, até meados da desenvolvimento (Schwarzer, 1993). Nesse sentido,
década de 1970 a questão tecnológica não foi o foco a análise de Fajnzylber se direciona a investigar dois
dos trabalhos técnicos da CEPAL. As discussões ce- problemas presentes nas economias periféricas: a
palinas, que se voltavam essencialmente para as dis- transferência da tecnologia criada nos centros e a
paridades no comércio internacional (Prebisch, 1949; necessidade da criação de um núcleo endógeno de
CEPAL, 1949), para os problemas inflacionários dinamização tecnológica (Fajnzylber, 1979; 1990).
(Sunkel, 1958) e para a heterogeneidade estrutural Os países subdesenvolvidos apresentam ex-
(Pinto, 1970), trataram os problemas relacionados ao pressivo atraso tecnológico frente aos países desen-
atraso tecnológico nos países subdesenvolvidos ape- volvidos, mesmo sendo grande parte da tecnologia
nas como parte das causas ou implicações dos pro- utilizada na produção interna dos países periféricos
blemas acima citados. Foi a partir das contribuições desenvolvida nos países centrais. Esta condição gera
deu concomitantemente com a melhora na eqüida- firma também que as contribuições cepalinas par-
de. Esta situação é por ele chamada de “conjunto tiram da análise de problemas inerentes à condição
vazio”. Neste sentido, o progresso técnico seria a de subdesenvolvimento, e, portanto de problemas
peça chave para chegar a este objetivo: históricos vivenciados pelos latino-americanos que
Diversamente do crescimento esporádico, o mudaram de aspecto ao longo dos anos, mas nunca
crescimento sustentado exige uma sociedade deixaram de criar desequilíbrios ao desenvolvimento
internamente articulada e eqüitativa, o que cria
destas economias. Neste sentido, a divisão das prin-
as condições propicias para um esforço contí-
nuo de incorporação do progresso técnico e de cipais idéias formuladas pelos cepalinos em fases
elevação da produtividade e, por conseguinte, visou simplificar a estruturação destas ao longo do
para o crescimento (Fajnzylber, 1990, p. 883-
884) tempo, sendo estes três pontos, a gênese, a afirma-
ção e a renovação do pensamento da CEPAL, cha-
Desta forma, o que se pode concluir diz res-
ves para o entendimento da formação do estrutura-
peito a uma evolução nas discussões cepalinas no
lismo latino-americano.
sentido de levar o progresso técnico ao centro da
Entretanto, a partir da década de 1980, o que
discussão sobre o subdesenvolvimento e a adoção
se observou nos países latino-americanos foi um
da nova proposta, a do crescimento com eqüidade.
processo de detrimento dos ideais desenvolvimen-
Isto demonstra que, após os trinta primeiros anos
tistas, em termos de política econômica como res-
de existência desta instituição, o estágio de desen-
quício do avanço do liberalismo sobre a América
volvimento da América Latina demandava novas pro-
Latina. Nesse sentido, mesmo havendo, ainda, uma
postas e interpretações para seus problemas econô-
consistente produção teórica voltada para o desen-
micos, que foram supridas a partir das contribui-
volvimento econômico, esta foi paulatinamente su-
ções de Fajnzylber. Portanto, podemos assumir esta
focada pela ascensão das teorias alinhadas ao ma-
terceira fase como a fase da renovação do pensa-
instream economics. Identificou-se, então, um pro-
mento cepalino.
cesso intenso de importação de fontes teóricas pro-
duzidas fora da realidade do subdesenvolvimento e
6 Conclusão que por isto não se adequaram às demandas estru-
turais destas economias.
Esta breve estruturação das idéias-chave do
Frente a isto, a teoria cepalina do subdesen-
pensamento cepalino objetivou demonstrar que a
volvimento, apesar de ser, na maior parte, desen-
evolução desta teoria do subdesenvolvimento foi,
volvida entre as décadas de 1950 e 1970, tem gran-
sobretudo, vinculada aos acontecimentos históri-
de relevância ainda hoje, dado que muitos dos pro-
cos que se desencadearam ao longo de mais de 50
blemas apresentados durante sua criação ainda per-
anos. Assim, da teoria da deterioração dos termos
manecem. Com isto, rever estas idéias buscando
de troca à abordagem sobre tecnologia no debate
adequá-las aos problemas atuais coloca-se como
cepalino fica explícita a evolução teórica das idéi-
uma tarefa de demasiada importância, não só ideo-
as estruturalistas ao longo da segunda metade do
lógica, mas teórica, na medida em que se compre-
século XX.
ende a necessidade de que sejam sanados os pro-
Esta linha histórica das idéias cepalinas con-
blemas referentes ao subdesenvolvimento, e que
firma a correlação entre a produção teórica desta
para isto deve-se buscar primeiramente entender
instituição e a realidade econômica das economias
esta condição a que estão submetidos os países que
que foram o principal alvo de estudo da CEPAL. Con-
não figuram no grupo dos desenvolvidos.