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A EVOLUCAO PEDAGOGICA EM FRANCA: Aigreja primitiva e 0 ensino fi uma ideia muita divulgada que qualquer pessoa que se preocupe com a Pratica deve distanciar-se em parte do passado para concentrar no presente todas as forcas da sua atengo, dado que 0 passado j& passou, dado que jf no podemos fazer nada por ele, parece que s6 nos pode interessar por curiosi- dade, Acteditamos que pertence ao Ambito da erudigao, Nao @ 0 que jf foi, mas sim o que é, que precisamos de conhecer, e melhor ainda, é o que tende a ser aquilo que temos de tratar de prever, para poder satisfazer as necessidades que nos preocupam. Na primeira lico dedicémo-nos a mostrar que este mé- todo é decepcionante. De facto, o presente, aquilo a que nos convidam a limi- tarmo-nos, esse presente nao vale nada em si mesmo; ndo é mais do que o pro- longamento do passaido do qual nfo se pode separar sem perder em grande parte 0 seu significado. O presente € formado por inumerdveis elementos, tao estreitamente emaranhados uns nos outros, que nos é dificil perceber onde comeca um, onde termina o outro, o que é cada um deles e quais as suas rela- Ges; deles, s6 temos, depois de uma observacdo imediata, uma impressao turva e confusa. A tnica forma de os distinguir, de os dissociar, de introduzir por consequéncia um pouco de clareza nesta confusio, € procurar na histéria como se foram progressivamente ligando uns aos outros, como se foram com- binando, organizando. Do mesmo modo que a sensacdo que temos da matéria 2 apresenta como uma extensio homogénea, apesar da anilise cientifica nos mostrar a sua sébia organizacio, a sensacao directa do presente nao nos per- mite suspeitar da sua complexidade até que a anilise hist6rica a possa revelar. Extracto do livro Histirla da Bducagdo ¢ das Dowtrinas Pedagéaicas, Texto teaduzido por Isabel Peceita da obra Historia de la Bdwcacitn y de las Doctrinas Pedagogicas, la evolncién pedagogtca en Francia, 1982, Colecgio Genealogia del Poder, drigida por Julia Varela e Fernando Alvarez Uta, Las Ediciones de La Piqueta, Madid, 1982 eoUOACay sociepape & cuirunas No entanto, o que para alguns parece ser mais perigoso € a importincia exage- rada que assim tendemos a atribuir as aspiragdes da hora presente quando nao as submetemos a nenhum control. Pois, precisamente, porque sdo actuais hipnotizam-nos, absorvem-nos e impedem-nos de sentir outra coisa que ndo sejam elas mesmas. O sentimento que temos de qualquer coisa que nos falta € sempre mais forte, por consequéncia, tende a ocupar na consciéncia um lugar preponderante e remete tudo mais para a sombra. Completamente voltados para 0 objecto que orienta os nossos desejos, este aparece-nos como a coisa preciosa por exceléncia, o que importa antes de mais, 0 fim ideal ao qual todo © ser deve estar subordinado, Sendo assim, muitas vezes, 0 que nos faz falta nao é mais essencial, nem menos essencial que o que temos; deste modo esta- mos expostos a sacrificar a necessidades passageiras secundérias, necessi- dades verdadeiramente vitais. Rousseau dé-se conta de que a educaclo do seu tempo no deixa muito espago 4 espontaneidade da crianga, faz do abstencio- nismo metédico, sistematico, a caracteristica de toda a sa pedagogia. Deste modo, s6 porque a crianga nao esté suficientemente em relaco com as coisas, faz do ensino pelas coisas 0 fundamento quase tinico de todo o ensino. Para fugirmos desta influéncia prestigiosa das preocupagées presentes que so necessétias @ unilaterais, é preciso car-Thes como contrapeso 0 conhecimento de todas as demais exig@ncias que é necessdrio ter igualmente em conta, e este conhecimento s6 0 pocemos adquirir através da historia que nos ensina a com- pletar o presente relacionando-o com o passado de que € continuagio, Estas razdes pelas quais mostrmos que o estudo histérico do ensino tem a sua utilidade pratica nao sto as tinicas. Este método no s6 nos permite preve- nit bastantes ertos possiveis no futuro, mas também podemos prever que nos proporcionard os meios para corrigir certos erros que se tenham cometido no passado © cujas consequéncias ainda sofremos. De facto, 0 desenvolvimento pedagdgico, como todo o desenvolvimento humano, nao foi sempre normal. No decurso das futas que libertaram as diferentes concepgdes que se suce- deram na historia, mais do que uma ideia justa foi ensombrada, embora o seu valor intrinseco a tivesse mantido. Aqui, como em outras alturas, a luta pela vida 86 produz resultados grosseiramente aproximativos. Em geral, so os mais dotados, os mais aptos que sobrevivem. Mas, ndo obstante, a par disto, quantos Exitos ilegitimos, quantas moztes e derrotas injustificadas, lamentiveis, devidas erUOAChg SOCIEDADE && CULTURAS a alguma combinago acidental de circunstincias! Sobretudo na histéria das ideias ha uma causa que contribui mais do que nenhuma outra para produzir este resultado. Quando se constitui uma concepgio nova, seja ela pedagdgica, moral, religiosa ou politica, tem naturalmente o ardor ¢ a vitalidade combativa da juventude presente, tende a mostrar-se violentamente agressiva para com as concepcOes antigas que aspira @ substituir, Nega-as, pois, radicaimente. Os campeées das ideias novas, transportados pela luta, acreditam de bom grado que nao tém nada que conservar das ideias antigas que combatem, fazem-lhes tuma guerra sem reservas ¢ sem piedade, E, contudo, na realidade, aqui como em outras alturas, o presente surge do passado, deriva dele ¢ dé-lhe continui- dade, Entre um estado hist6rico novo € aquele que o precedeu, nao ha um yazio, mas sim um vinculo estreito de parentesco, dado que, de certo modo, o primeiro nasceu do segundo. No entanto, os homens nao tém consciéncia deste vinculo, nao sentem mais do que a oposi¢a0 que 0s separa dos seus antecessores. Acreditam, pois, que nada suficiente para arruinar por completo esta tradicao a que se opdem e que lhes resiste, Dai derivam lamentiveis destruigdes. Desaparecem elementos do passado que se deveriam ter conver: tido em elementos do futuro. O Renascimento sucede a Escoldstica; os homens do Renascimento consideraram prontamente Obvio que nao havia nada que conservar do sistema escolstico. A nés cabe-nos perguntar se esta atitude revolucioniria nao tera dado lugar a lacunas no nosso ideal pedagdgico que se transmitiram até aos nossos dias, Além disso, o estudo hist6rico do ensino, 20 mesmo tempo que nos permitica conhecer melhor o presente, oferecer-nos-4 a oportunidade de rever 0 mesmo passado ¢ por em evidéncia alguns daqueles ros; importa que tomemos consciéncia deles j que somos seus herdeiros, No entanto, 4 parte este interesse pratico que devia assinalar antes que qualquer outra coisa por ser com mais frequéncia desconhecido, a investiga- ao que vamos empreender apresenta, além disso, um interesse teérico e cien- tifico que no é de desdenhar. A primeira vista, a historia do ensino secund’- tio em Franca pode parecer que é muito especial e que s6 deve interessar a ‘um corpo restrito de professores. No entanto, devido @ uma singularidade do nosso pais, acontece que, durante a maior parte da nossa histéria, 0 ensino secundario absorveu toda a vide escolar do pais, © ensino superior, depois de hascet, ndo tardou a enfraquecer completamente para renascer apenas a partir

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