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12/12/2018 A elaboração de um novo Código de Processo Civil: falsos e verdadeiros dilemas - Colunas | Carta Forense

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FLÁVIO LUIZ YARSHELL


PROCESSO CIVIL
A elaboração de um novo Código de Processo Civil: falsos e verdadeiros dilemas
02/ 03/ 2010 p or Fl á vi o L u i z Ya r s h e l l

Os trabalhos de elaboração de um novo Código de Processo Civil têm ocupado não apenas os
periódicos especializados, mas também aqueles dirigidos ao público em geral. Exemplifica vamente, a edição de
O Estado de São Paulo de 14 de fevereiro trouxe, em seu editorial, considerações acerca do que ali se qualificou
como a "polêmica reforma do CPC". Após o exame de alguns dos pontos relevantes da proposta a ser subme da
a audiências públicas, o Jornal ponderou que a celeridade nos processos "não deve inibir o direito pleno de Advogado. Professor Titular do Departamento

defesa". de Direito Processual da Faculdade de Direito da


Universidade São Paulo.
Embora o problema possa ser visto assim, a questão mais relevante não parece ser exatamente
essa. Pior do que isso: a iden ficação imperfeita dos valores que efe vamente se contrapõem no contexto da conteúdos anteriores
alteração da lei processual pode gerar distorções indesejáveis.
Com efeito, o conflito que se coloca ao Legislador não é exatamente entre celeridade, de um lado, e
garan as processuais, de outro. Busca...
O raciocínio constante daquele pres gioso periódico pecou por uma questão de lógica porque, ao
invés de contrapor dois escopos da a vidade jurisdicional, ele confrontou um obje vo e um instrumento, isto é,
um fim e um meio. Garan a processual não é resultado, mas meio pelo qual se busca controlar o exercício do
EDIÇÃO DO MÊS
poder - de sorte a evitar que ele seja exercido de forma arbitrária - e permi r que as partes possam contribuir
para a formação do convencimento de quem as julga. Garan as legi mam o resultado da a vidade estatal e não Extradição de Cesare Ba s

são exatamente um resultado, ao contrário da celeridade que - se não é exatamente um escopo da jurisdição - é
algo que o qualifica: busca-se um resultado rápido porque, sendo assim, ele é apto a pacificar.
O inconveniente de se contrapor celeridade e garan as processuais reside, dentre outros, na
circunstância de que vigora entre nós - inclusive dentre alguns dos operadores do Direito - a convicção de que
vivemos em um estado de quase total impunidade (conceito que, em perspec va genérica, se estende também
à matéria civil); daí a se sustentar que tal mazela decorre do excesso de garan as vai um passo. Vem assim a
solução ilusória: quanto menos garan as mais eficiência e, portanto, menos impunidade. Nesse contexto, não
raro são colocados num mesmo plano o "direito de defesa" e a indevida protelação do réu que não tem razão
(aquele mesmo que desfruta da impunidade).
É impressionante que muitos de nós - mesmo aqueles que são profissionais do Direito - aceitem
passivamente o sofisma. Custa a crer que não tenhamos aprendido com as lições da História: em momentos de
crise, em busca de segurança e de proteção (contra a impunidade!), consen mos em minimizar - ou até mesmo
em dispensar - mecanismos de controle do poder estatal. Não importa que, para tanto, criem-se condições de se
exercer o poder de forma arbitrária e que corramos o risco de nos submetermos a decisões para as quais não
pudemos contribuir de forma efe va. O que importa é que o resultado venha logo, seja ele qual for, superando-
se a "impunidade reinante". Amarga ilusão. Esse discurso só é bom quando é para os outros. NEWSLETTER
A verdadeira contraposição de valores que está subjacente à Reforma legisla va processual está nos RECEBA NOSSAS NOVIDADES
escopos a que o instrumento - que é o processo - pode conduzir. De um lado, há o escopo social: ele consiste na Nome...
pacificação que decorre da eliminação da controvérsia e, como é intui vo, clama por presteza. Quanto mais
E-mail...
demora houver, mais distante fica o processo da consecução daquele resultado. De outro lado, há o escopo
jurídico: busca-se decisão fiel aos fatos efe vamente presenciados e ao direito aplicável. Busca-se, por outras Cadastrar
palavras, uma decisão justa. Esse escopo, naturalmente, demanda tempo, para que as partes possam deduzir
suas alegações, produzir prova (que não é só delas, mas se dirige ao juiz) e, enfim, contribuir para a formação do
convencimento de quem as julga. Sob essa segunda ó ca, um recurso é um meio de aperfeiçoamento de uma EDIÇÕES
decisão e não uma forma de protelação.
AUTORES
Embora seja certo que os dois escopos se complementam, é igualmente correto que eles também
se repelem porque, como dito, uma clama por celeridade e outro exige tempo. Então, o desafio do Legislador CURSOS
não é buscar o equilíbrio entre celeridade e garan as, mas entre decisões rápidas e decisões justas.
CONCURSOS
Um exame - tão isento quanto possível - das reformas verificadas nos úl mos vinte anos mostra que
a ênfase do Legislador tem sido para o escopo social: ampliação das hipóteses de antecipação da tutela, MODELOS DE PEÇAS E CONTRATOS
limitação ao cabimento do agravo de instrumento, supressão (ao menos como regra) do efeito suspensivo da
impugnação ou dos embargos do devedor, redução dos recursos subme dos ao Supremo Tribunal Federal (agora
condicionados à presença da repercussão geral) são disso bons exemplos.
Sem desmerecer, em absoluto, todo o sério e proveitoso trabalho realizado ao longo desse tempo, é
caso de se indagar: temos hoje, por força de todas essas alterações que privilegiaram o escopo social, uma
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12/12/2018 A elaboração de um novo Código de Processo Civil: falsos e verdadeiros dilemas - Colunas | Carta Forense
Jus ça melhor? Se a resposta posi va fosse a opinião dominante, aparentemente o pais não estaria ocupado em
elaborar um novo Código de Processo Civil.
A assim denominada "rela vização da coisa julgada" é talvez o mais eloqüente dos exemplos:
empenhamo-nos em agilizar o processo e, paradoxalmente, acabamos nos deparando com a necessidade de
rever decisões já transitadas em julgado exatamente porque portadoras de graves injus ças...
A nova reforma virá e a técnica processual, ao que tudo indica, será ainda mais direcionada para o
escopo de rápida eliminação da controvérsia; até porque ele é que pode ser explorado perante o grande público,
sob a forma de esta s cas, relevantes na perspec va macroscópica, mas frias - quiçá dolorosas como lógica de
guerra - para as pessoas de carne e osso vinculadas pela decisão. Então, quando vermos eliminado
mecanismos predispostos à obtenção de decisões justas, nos perguntaremos: era mesmo o processo o grande
vilão da ineficiência da Jus ça?

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