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•• r.· INSfflUTO FEOfllALDE

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••• IOUCAÇÃO,CIINOA I YICNOLOGUI

•• Cur.:m
(:!1.",Í, t 1,r �t·o �o Mcr·t:

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•• LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA

•• DISCIPLINA: Estrutura, políticas e Gestão educacional


3 º . Semestre - 60horas

•• PROF(a): Maria Madalena da Silva

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•• Janeiro/2016

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EDUCAÇÃO? EDUCAÇÕES:
APRENDER COM O ÍNDIO

Pergunto coisas ao buriti; e o que ele responde é:


a coragem minha. Burlti quer todo o azul, e nlio se
aparte de sua água - carece de espalho. Mestre mio
é quem 88mpre en1ina, mas quem d• repente aprende.
Joio Guimarães Rote/Grande Sertlo: Vereda,

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua,


na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos
todos nós envolvemos pedaços da vida com ela:
para aprender, para ensinar, para aprender-e·
-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para
conviver, todos os dias misturamos a vida com
a educação. Com uma ou com várias: educação?
Educações. E já que pelo menos por isso sempre
achamos que temos alguma coisa a dizer sobre
a educação que nos invade a vida, por que não
••

Carlos Rodrigues Brandão O que é Educação 9

r .....
começar a pensar sobre ela com o q'ue uns índios nossa lfngua muito mal. Eles eram, portanto,
uma vez escreveram? totalmente inúteis. Não serviam como guerreiros,
Há muitos anos nos Estados Unidos, Virgínia como caçadores ou como conselheiros.
e Maryland assinaram um tratado de paz com Ficamos extremamente agradecidos pela vossa
os índios das Seis Nações. Ora, como as promes­ oferta e, embora na�o possamas aceíttJ-la, para
sas e os símbolos da educaçâ'o sempre foram mostrar a nossa gratidllo oferecemos aos nobres
muito adequados a momentos solenes como senhores de Virg(nia que nos enviem alguns dos
aquele, logo depois os seus governantes mandaram seus jovens, que lhes ensinaremos tudo o que
cartas aos índios para que enviassem alguns de sabemos e faremos, deles, homens."
seus Jovens às escolas dos brancos. Os chefes
responderam agradecendo e recusando. A carta De tudo o que se discute hoje sobre a educação,
acabou conhecida porque alguns anos mais tarde algumas das. questões entre as mais importantes
Benjamin Franklin adotou o costume de divulgá-la estão escritas nesta carta de índios. Nlo há urna
aqui e ali. Eis o trecho que nos interessa: forma ,,única ,nem um. único modelo de educaçãp;
a escola não é o único lugar onde ela acontece
".. . Nós estamos convencídos, portanto, que e talvez nem seja o melhor; o ensino escolar não
os senhores desejam o bem para nós e agrade­ é a sua única prática e o professor profissional .
cemos de todo o coração. não é o seu único praticante. -'
Mas aqueles que são sábios reconhecem que dife­ Em mundos diversos a educação existe dife­
rentes nações têm concepções diferentes das coisas rente: em pequenas sociedades tribais de povos
e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos caçadores, agricultores ou pastores nômades;
ao saber que a voua idéia de educação não é em sociedades camponesas, em países desenvol­
a mesma que a nossa. vidos e industrializados; em mundos sociais sem
.. . Muitos dos nossos bravos guerreiros foram classes, de classes, com este ou aquele tipo de
formado.s nas escolas do Norte e aprenderam toda conflito entre as suas classes; em tipos de socie­
a vossa ciência. Mas, quando eles voltavam para dades e culturas sem Estado, com um Estado
nós, eles eram maus corredores, ignorantes da em formação ou com ele consolidado entre e
vida da floresta e incapazes de suportarem o frio sobre as pessoas.
e a fome. Não sabiam como caçar o veado, matar E�iste a,. ooucação de cada categoria de sujeitqs
o inimigo e construir uma cabana, e falavam a de um povo; ela existe em cada. pgvo, ·ou, entre
\.. \..
a••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Carlos Rodrigues Brandão

�,Ql,l�,,.. se . encontram. ,
que submetem e domi Existe entre povos
nam outros p ovos, de cada um de se
us
a educação como um recu usando
rso a mais de sua dom sem fim com a natur sujeitos, através de trocas
nância . Da família à
comunidade, a educaçã
i­ q ue existem den eza e entre os homens, trocas
existe difusa em todos o tro do mundo s
os mundos sociais, própria educação ocial onde a
as incontáveis prát icas entre habita, e desde
dos mistérios do apren explicar - às vez onde ajuda a
der; es a ocultar, às veze
primeiro, sem c lasses de geração em s a inculcar -
de alunos, sem livro geraç§'o, a nece
sem professores espe s e tência de su a orde ssidade da exis­
cialista s; mais adiante m.
escolas, salas, professore com Por isso mes mo -
s e mét dos pedagóg
A e duc1:1ção. POQI;! e><lUir liyr:o� icos. caçlo do coloni e os índios sabiam
zador, que conté - a edu­
pode ser uma das mane entre tod os, seu modo de vida m o saber de
iras que as pesso as cri e
para tornar comum, co
mo saber, como
am legalidade de seus ajuda a confirmar a ap arente
como crença, aquilo idéi a, atos de dom (nio,
que é comunitário co n§'o serve para na verdade
mo ser a educação
bem, como trabalho Não serve e existe do colonizad o.
ou como vida. ,,�.la;i;;; co
e..xJiUli,.Jmp,as�. por um sistema PQ(ijl não obstante dom ntra uma educação que ele,
poder, que usa o saber centralizado de inado, também
e o controle sobre o um dos seus recurs possui como
como armas que ref saber os, em seu mundo,
orçam a desigualdade sua cultura. dentro de
os homens, na div entre Assim, quando sã
isão dos bens, do tra o necessários guerr
dos direitos e dos sfmb balho, burocratas, ·� eiros ou
olos. ãQ é um dos meio
A educação é, como os homens lan s de qu e
outras, uma fraçã o çam mão para
modo de vida dos grupos do ou burocratas. Ela criar guerreiros
sociais que a criam ª-LY.
e recriam, entre tan
tas outras invenções Mais do que isso, ft§ §,,P,Q!ll�LtiPQ,UJ�JJÇ.f11{f,l
cultura, em sua soc de sua ela ajuda a criá-lo fi,
iedade. Formas de ed de p assar de uns s, através
que produzem e praticam ucação para os outros o
c onstitui e legitim sab
zam, entre todos os
, para que elas rep
rodu, a. Mais ainda, a edu er que os
que ensinam-e-apre c ipa do processo cação parti­
de
o saber que atra vessa
as palavras da trib
ndem, de qualificações e eprodução de crenças e idéias,
códigos sociais de con o, os as trocas de sím specialidades que
os segredos da arte ou
duta, as regras do tra
bal ho, bolos, bens e poder envolvem
conjunto, constro es
da religião, do arte
sanato em tipos de socieda que, e m
ou da tecnologia que q é a sua força. des. E esta
ualquer povo pre cisa
reioventar, todos os dia para
s, a vida do grupo "lo, ,.o�nto, Pen�nq
e a si Próprio, livre g às ve�e� que ijge, Poc
e em nome de
toc1os, o·,educador
·············�·············-························ -- - ---- .

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�1,,,gu1 11rve a.Q 1ib�J e a quem eo.sina,Jna�,
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"' , v�r�e, ele pode estar serv,indQ O . .,Q4lffi o i
conlitiJuiy prof�r. a fim de usá-lo.,. e JQ . ��u 1
trij�lhQ, P@ra os.u.,Pll flÇ,U"9$ que ocultam também 1:

1
n, ed1.,1c,ção - nas suas agências, suàs práticas
e nas idéias que ela professa - lniere�t,QPlí:
,1;:
tloos.j,mpostos sobf'"E! el. a e, atraYéa de seu exercício,
à sotjedE!de que �abita� E .esta é a sua fraqueza, :/
Aqui e ali será preciso voltar a estas idéias, 1

e elas podem ser como que um roteiro daqui 1j

1,

1/
para a frente. A educação existe no i mag inár i o
das pessoas e n a ideologia dos grupos sociais e,

1:
ali, sempre se espera, de dentro, ou sempre se
diz para fora, que a sua missão é transformar
sujeitos e mundos em alguma coisa melhor, de
acordo com as imagens que se tem de uns e outros:
" ...e deles faremos homens". Mas, na prática,
a mesma educação que ensina pode deseducar,
e pode correr o risco de fazer o contrário do que
pensa que faz, ou do que i nventa que pode fazer:
"...eles eram, portanto, totalmente inúteis".

1

11

1/

••••••
1:
.,J
Sofia Lerche Vieira

• Cláudio, Pedro,] oana e] ade, juntos no pensamento e


no coração.

Parte 1
Sofia Lerche Vieira
Fortaleza, março de 2008

Idéias &
Concepções

Uma coisa é pôr idéias arranjadas,


outra é lidar com país de pessoas,
de carne e sangue, de míl-e-tantas mísérias ...
Tanta gente - dá susto se saber -
e nenhum se sossega:
todos nascendo, crescendo, se casando,
querendo colocação de emprego,
comída, saúde, riqueza, ser importante,
querendo chuva e negôcios bons...
De sorte carece de se escolher
Goão Guimarães Rosa)

14 15
Capítulo 1
Definindo conceitos

Como observamos na Introdução, a disciplina Es­


tnm1ra e o Funcionamento do Ensino envolve conhecimentos
de diversos campos. Neste capítulo, faremos um exer,
cício de esclarecer algu mas noções imprescindíveis ao
conhecimento daqueles que irão atuar no magistério da
Educação Básica. Discutiremos os conceitos de estrutu­
ra e funcionamento da educação, assim como idéias so,
bre política educacional e gestão da educação.

1.1. Estrutura&: Funcionamento


As palavras estrutura e funcionamento têm raízes
distintas, ambas de natureza latina. Stn1ctura vem do
verbo strncrc, que significa construir. Funcionamento,
por sua vez, é originária do francês fonctionncmcnt, cuja
etimologia associa-se à palavra latina functio, ànis, que en,
tre outros termos está ligada ao ato de "cumprir, exercer,
desempenhar".
Para um entendimento inicial sobre o assunto, as,
saciemos a idéia de estrutura à "organização, disposição
e ordem dos elementos essenciais que compõem um
corpo (concreto ou abstrato)" (HOUAISS &: VILLAR,
2001, p. 1267). Os dicionários costumam ter longos ver,
betes para a palavra que possui inúmeros sentidos, com

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usos em c::i:11pos tlo diferenciados qu:mto a Engenluria,
trutura dos diferentes elementos constituintes do corpo
a Filosofi::i e outros. Funcionamento cli= respeito ao ":1to
humano" e no âmbito da Biologia refere-se à "morfologia
ou efeiw de funcionar" que, por su:1 ve=, também com­
interna ou externa elos seres vivos ou dos seus órgãos"
p,xta significados diversos. A idéia de "um bom e regubr
(HOUAISS & VILLAR, op. cit. p. 205). A segunda se
cksempenho" (Idem, p. 1403) é útil a urna comprcens::io
detém sobre o "estudo das funções e do funcionamento
elo s1g�ificado do termci n(, campo educacional.
normal dos seres Yirns" (ldem, p. 1350).
Para facilitar a compreenslo, é importante recorrer­
A estrutura e o funcionamento de uma escola e ele
mos a ilustrações. Qu:mclo se apont:1 a estn.1rnra de uma
um sistem:1 educacional n::io são imutáwis. Ao contrário,
escola, a rcferêncü costuma di=er respeito a prédios e
possuem natureza dinâmica, sujeita a transfo rmações.
instabções físicas - bibliotec1, laboratórios e outros.
As reformas educacionais, em geral introduzidas por
Quando nos reportamos ao seu funcionamento estamos
mudanças na legislaç::io, costumam ser medidas que cau­
nos referindo a :ispcctos que dependem da estrutura,
sam impacto tanto na estrutura, como no funcionamen­
mas têm uma climenslo própriJ. com claro sentido ope­
to do ensino. Há situações em que as reformas anunciam
racional. U 111J escob em funcionamento abre suas portas
mudanças que 11:1 prática n::io se realizam. Neste caso, as
a professores, alunos e funci�1n:.írios todos os dias elo ano
mudanças se cllo no plano da aparência e nlo n:1 essên­
escolar. É ó]y.'io, porém, ser insuficiente a escola estar em
cia das coisas. Esta é uma tendência comum em países
funcionamento. Eb precisa estar em bom funcion:imen­
de tradição ibérica como o Brasil. Volt:iremos ao tema
to. E isto depende, sobretudo, elo compromisso de todos
em outros momentos de nossa reflex::io.
com a :iprendi=agem.
Feitas essas considerações introdutórias, passemos
QL;ando a estrutura e o funcionamento s3.o bons
a explorar o significado ele outros conceitos importantes
uma escola tem os elementos nc:cessârios para promover
par:1 a estrntura e o funcionamento elo ensino. É hora ele
o sucesso ele seus alunos. É possível encontrarmos esco­
nos determos sobre noções ele Política Educacional, o
las com boa estrutura e m:ru funcionamento.Também o
que faremos no próximo tópico.
inverso pode ser wrclacleiro. Como "a educaç::io é uma
obra que n3.o tem1ina nunca" (LOURENÇO FILHO, 1.2. Política Educacional
1940, p. 15), a busca ele uma estrutura e funcionamento
plenos é um desafio permanente para os que trabalham A expressão Política Educacional pode assumir sig­
neste âmbito da atuaçlo humana. nificados clhusos. Quando usada com letras maiúsculas,
Saviani (1996) é um dos autores que se debruçou refere-se ao setor da Ciência Política que estuda as inicia­
sobre a complexidade desses termos, argumentando que tivas do Poder Público em educaç::io. Estas, por sua vez,
os contextos de sua utilizaç3.o também são definidores denominam-se políticas educacionais. As ações governa­
ele seu significado. Assim, estabelece uma analogia en­ mentais costumam ser denominadas de políticas públi­
tre a estrutura e o funcionamento e dois campos das Ci­ cas. Assim, há políticas públicas ele saúde, de educação e
ências Biológicas: a Anatomia e a Fisiologia. A primeira outras. No âmbito social, também são chamadas ele polí­
constitui o ·'ramo da medicina que estuda a forma e a es- ticas sociais. As políticas educacionais (com minúsculas),

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portanto, szí.o uma dímenszí.o das políticas sociais. Sobre a ficas. A educaçzí.o, tal como a saúde e a segurança são po­
diferença entre o sentido das palavras em maiúsculas ou líticas sociais de largo alcance que, em geral, envolvem
minúsculas, vejamos uma passagem esclarecedora: muitas dimensões e protagonistas.
O papel dos diferentes poderes (Executivo, Le­
A Política Educacional (assim, em maiúsculas) é gislativo e Judiciário) em relação às políticas é diverso
uma, é a Cíencia Política em sua aplicação ao caso e dinâmico. Se pensarmos na Constituição como uma
concreto da educação, porém as políticas educa­ expressão dos direitos políticos e sociais de uma nação,
cionais (agora no plural e em minúsculas) são nela encontraremos as bases das cliferentes políticas. As­
múltiplas, diversas e alternativas. A Política Edu­ sim, ao estabelecer que a educação é "direito de todos
cacional é, portanto, a reflexão teórica sobre as polí­
e dever elo Estado e ela família" (Constituição ele 1988,
ticas educacionais (. ..) se há de considerar a Política
Educacional como uma aplicação da Cíencia Políti­ Art. 205) o Legislativo aponta um caminho a ser seguido
ca ao estudo do setor educacional e, por sua parte, pelo Executivo, ao qual cabe assegurar através de ações
as políticas educacionais como políticas pú?lic�s específicas, o cumprimento deste direito social.
que se dirigem a resolver questões educac1omus Em princípio, as grandes linhas ela educação se ex­
(PEDRO & PUIG, 1998. Grifos nossos) pressam em leis, por isso, a legislação é importante maté­
ria no estudo da estrutura e do funcionamento do ensino.
As políticas educacionais referem-se a idéias e ações Mas, é oportuno registrar, as leis não bastam. É preciso
.- bi'to '-do .Poder Público. Ao estudarmos as políticas
no ctffi cumprHas. Daí a importância do Judiciário, que zela
públicas, portanto, nos detemos sobre "o govem_o em pelo cumprimento da lei maior - a Constituição - e de
- " (�OUZ
acao � A , -7003). Ao examinar uma determmada seus instrumentos correlatos e reguladores. Voltaremos
e�fera de intervenção estatal podemos falar de política a este assunto em outros momentos da reflexão do liwo,
ou de políticas de um governo, dependendo do ponto de em particular quando tratarmos da educação na Consti­
vista e da ênfase que se quer imprimir às ações em foco. tuição de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Diz-se, por exemplo, que o governo desenvolve políticas Nacional (LDB - Lei Nº 9.394/96). Isto será feito no ca­
para os diferentes setores de atuação do Estad�. No sin- pítulo 2 desta mesma Unidade. Aprofundemos um tanto
1mlar ou no plural, o importante é reter a noçao de que mais as noções relativas à política educacional.
� Poder Público desenvolve um conjunto de iniciativas Muitas vezes, tende-se a tomar o Poder Público
que se denominam políticas. _ . como única instância de formulação de política. É, con­
Esclarecidos os significados dos tem10s Política tudo, "na correlação de forças entre os atores sociais das
Educacional e política(s) educacional(is), é oportuno esferas do Estado - a sociedades política e civil - que se
prosseguir lembrando que o processo de formulação definem as formas de atuação prática, as ações governa­
de políticas, em geral, envolve muitos passos. Em sua mentais e, por conseguinte, se tran o jogo das políticas
oricroem' estas costumam expressar respostas do Poder sociais» (VIEIRA & ALBUQUERQUE, 2002, p. 26).
Público a demandas sociais diversas. Algumas dizem As políticas de educação podem se manifestar
respeito a todos, outras respondem a segmentos especí- em qualquer nível e não apenas no âmbito do gowrno

20 21
central. Assim, sào objeto de interesse e de análise da professando um valor público qut. para ganhar nuteria
····1
polític� educacional as iniciativas do Poder Público, licbde, precis::i se traduzir em políticas. Estas, uma vez
em suas diferentes instâncias (União, Estados, Distri­ concebidas, sio operacion�üizacbs atra\·és de ações que
to Federal e Municípios) e espaços ( órgãos centrais e concretizam a gestJ.o.
intermediários do sistema e unidades escolares). Sua Parte ela dificulcbck cb :;::csUh, cli:::: respeito ac, fato
esfera de abrangência é ampla, dado que se referem a de eb se situar na esfera ch-\s coisas que têm que ser fei
"planos de educação de largo espectro" chegando à sala tas, o que nem sempre ag:acb a todos. As rnucbnças, por
de aula (CURY, 2001). menores que sejam, atingem pessoas. Por isso mesmo,
A escola, nesta perspectiva, não se reduz "a um mudar nunca é simples - chs coisas mais elemenLm:s,
mero reverso das políticas" (ALMANDOZ & VITAR, como a cor de unn parede ou inclusáo e retirada ele urna
2006, p. 16), mas antes se configura como um espaço disciplina. Gest:io se fa:::: em interação com o outro. [\J r
de reconstrução e de inovação, oferecendo elementos isso mesmo, o trabalbo de q1..1alqua gestor ou gestor:1
para a formulação de novas políticas. Sob esse ponto de implica sernprt: comers:1r e dülog:1r muito. Do contL'í­
vista, a análise da( s) política( s) de educação demanda rio, as melhores idéias umbém se inüabilizarn.
uma compreensão que não se contenta com o estudo A negociação é outro componente importante
das ações que emanam do Poder Público em suas dife, desse processo, porque gestão é arena de interesses
rentes esferas (União, Estados, Municípios). Esta deve contraditórios e conllituosos. Nesse sentido, o gestor
oentes e, num movimento
, a escola e seus acr
alcancar de ida que não é um líder em sua área ele atuação, por certo,
e volta, procurar apreender como as idéias se materializam enfrenta clificulcbdes adicionais no clesem'olúmento
em ações, traduzindo-se, ou não, m gestão educteional e de seu trabalho.
escolar. E, já que tocamos no assunto, é hora de buscar ek­ coísJ.s que pr�cisJn1 s�r e indc/
mentos para eÀrplicitar alguns conceitos relativos à gestão penclem de negociaçJ.o. C·esasro.,:::l..1111 ) ITl�ts s5ei necessá­
da educação, matéria sobre a qual há muito por explorar. rias. Fazer bem-feito o que tem que ser feito costuma
ser tarefa pouco fácil e impopular. A gestio. port:1nto,
1.3. Gestão da Educação requer humildade e aceitaçio. Administrar a escassez,
gerir confütos, tornar decisões em .situações complexas.
As intenções do Poder Público traduzidas em po­
E nada disso aparece nos manu,1is. A gestão, portanto,
líticas, ao serem transformadas em práticas, se materia,
demanda um exercício de toler:incía para mover-se nas
lizam na gestão. A gestão pública é integrada por três
zonas ele sombra ela impopularidade quando o desafio
dimensões: o valor público, as condições ele implemen,
ela prática assim exige.
tação e as condições políticas.
Essas são apenas algumas considerações relati\'as
O valor público, como a própria expressão reve,
ao terreno concreto ela gestzio, sobre as quais a literatu
la dá conta da intencionalidade das políticas. Quando
ra tende a silenciar. Depois desse breYe olhar em torno
a Constituição afirma a educação como um "direito de
delas, é oportuno retomar aspectos mais teóricos, elu­
todos e dever do Estado e da familia" (Art. 205) está
cidando o significado ele termos que fazem parte elo vo-

22 23
cabulário comum sobre este campo da tarefa educativa. planejamento, o acompanhamento e a avaliação. Outras
!

Para fins da presente discussão, explotaremos adjeti�'OS se inscrevem no campo da gestão escolar, de modo espe­
O o sicrnilicado
que lhe acrrecram o e valor. Trataremos, assim, cífico aquelas que envolvem a tarefa cotidiana de ensinar
da gestão educacional e da gestão escolar. e aprender. Nesta esfera da gestão, situam-se professo,
res, alunos e outros membros da comunidade escolar
• Gestão Educacional Fersus Gestão Escolar - funcionários que trabalham na escola, docentes que
ocupam cargos diretivos, famílias e integrantes da área
Como síntese preliminar, é pertinente dizer que a
de abrangência geográfica onde se localiza a escola. A
crestão educacional refere-se ao âmbito do(s) sistema(s)
grande maioria elas pessoas que atuam na gestão educa­
:ducacional(is) e, a gestão escolar, aos estabelecimentos
cional são também educadores e fazem parte de organi­
de ensino. A gestão democrática, da qual trataremos no
zações como secretarias de educação, órgãos normativos
próximo capírnlo, constirni-se em "eixo transversal" que
pode estar presente (ou não) em uma ou outra esfera. do sistema ou outras instituições integrantes elo sistema
A crestão educacional diz respeito a um amplo es­ educacional, nos diversos níveis do Poder Público.
Por vezes, existem problemas ele comunicação
pectro de iniciativas desenvolvidas pelas difere�t�s ins­
acerca das responsabilidades de cada parte entre os in­
tâncias de governo, seja em termos de responsabilidades
teITTantes da croestão educacional e os da gestão escolar.
compartilhadas na oferta de ensino, ou de outras aç�es o
. É verdade que muito pode, precisa e deve ser feito no
que desenvolvem em suas áreas específicas de arnaçao.
. _ sentido ele aproximar essas duas esferas ela gestão, mes­
A crestão escolar, por sua vez, como a própna expressao
su;ere, sirna-se no plano da escola e trata de atribuições mo porque sua finalidade última tem um norte comum
sob sua esfera de abrangência. - a educação como um "direito de todos", com o objetivo
A crestão educacional sirna-se na esfera macro, ao ele promover o "pleno desenvolvimento da pessoa, seu
passo q:e a gestão escolar localiza-se na esfera �c�o. preparo para o exercício da cidadania e sua qualifica­
Ambas articulam-se murnamente, dado que a pnmerra ção para o trabalho", conforme definem a Constituição
(Art. 205) e a LDB (Art. 2 , Observação: a LDB utiliza
º
justifica-se a partir da segunda. Noutras palavras, a ra­
zão de existir da gestão educacional é a escola e o traba­ a expressão "desenvolvimento do educando"). Esses são
lho que nela se realiza. A gestão escolar, por o�tro lado, conceitos fundamentais no campo da Estrutura e Fun­
orienta-se para assegurar aquilo que é própno de sua cionamento da Educação Básica.
_ _
finalidade - promover o ensino e a aprendizagem, viabi­
lizando a educação como um direito de todos, conforme
determinam a Constituição e Lei de Diretrizes e Bases.
• Síntese do Capítulo
No âmbito do sistema educacional há um signifi­
cativo conjunto de atividades próprias da gestão educa­ Neste capítulo, esrndamos alguns conceitos neces­
cional a exemplo de orientações e definições gerais que sários ao conhecimento da Estrurnra e Funcionamento
dão substância às políticas educativas, assim corno o do Ensino. Esclarecemos o significado de estrutura e
funcionamento discutindo sua aplicação no campo edu-

24 25
cacional. \ tencionamos a existência ele uma articulaçJo tal do \IEC, nele localizando a SEB. Acesse o texto: "A
recíproca entre uma e outra, destacando que quando uma Educaç5o Bc'tsica no Brasil", busc:mclo informações adi­
escola tem boa estrutura e funcionamento, apresenta as cionais àquelas tralxill1acbs no texto. Compartilhe com
condições necessárias à oferta ele um ensino ele qualich o grupo aquilo que rncê descobriu.
ele. Foram também discutidos os termos Política Ecluo­
cionJ.L políticJ.(s) eclucacional(is) e gestão ela educação, 3. Neste capítulo, trabalhamos a idéia de que a gestão
introduzindo-se idéias relatins à gestão educacional e pública é integrada por três dimensões: o valor pú·
à gestJo escobr. No Capínilo 2, desta Unicbde, retoma· blico, as condições ele implementação e as condições
remos a cliscuss5o, ao detalhar aspectos relatirns à base políticas. Busque, na Constituição, um exemplo ck
legal cb educaç5o brasileira. um "valor público'' em educaç5o. Discuta suas con ·
clições de implementação.

� Atividades
1. Identifique se as alternativas a seguir são falsas ou
wrdacleiras: LIBANEO,J. C.; OLIVEIRA.,]. F.; TOSCHI, M. S.. Edu­
a) O \línistério ela Educação é o órg5o encarregado das cação escolar: politica, estruhlra e organização. 2 ª ecli­
diferentes políticas educacionais desenvolvidas pelo ÇJO. São Paulo: Corte:::, 2005.
governo federal neste campo.
SANDER, B. Políticas públicas e gestão democrática
b) A Política Educacional pode ser entendida como a re· da educação. Brasília, Líber Li\To Editora, 2005.
flexão teórica sobre a.s polític,s eduocionJis.
\ IEIR.'\, S. L: ALBLQCERQLE, \l G. \!.. Política e
c) As políticas educacionais são múltiplas, cli\-ersas e
planejamento educacional. Y edição reüsu e modifi­
altem;,tins.
cada. Fortaleza, Edições Demócrito Rocha; EclUECE,
2. Para os estudiosos da estrutura e do funcionamento do 2002.
ensino, os portais elos órgãos federais, estaduais e mu­
nicipais ligados à educação costumam ser uma preciosa
fonte ele informações. Como este livro trata ele questões
� Sites recomendados
nacionais, iremos recorrer, sobretudo, ao portal elo .\ili·
nistério da Educação (MEC) e, nele, particularmente, os
http://portal.mec.gm·.br · IlÍ\'eis e modalidades de ensino
linhs ela Secretaria da Educação Básica (SEB), elo Fundo
Nacional de Desenrnhimento ela Educação (FNDE) e http//ww\v.planalto.gov.br - legislação
do Instituto Nacional ele Estudos e Pesquisas Educa­
cionais Anísio Teíxeira (INEP). A orientação para nossa
primeira atividade ele esrndos é fazer uma visita ao por-

26 27
,,

Unidade I

Educação básica: articulando


o passado e o presente

O passado não conhece o seu lugar.


Está sempre no presente.
(Mário Quintana)

Uma forma de começar a discussão sobre a Estrutura


e o Funcionamento da Educação Básica é refletir acerca
do significado do conjunto de palavras que formam o
título desta disciplina, integrante do núcleo de estudos
básicos dos cursos de formação de professores.
A palavra estrutura, originária do latim structura, é
derivada do verbo struere (construir). As análises exis­
tentes sobre seu significado indicam a natureza polissê­
mica deste termo. Reconhecendo tal característica,
SAVIANI (1996) aponta que seu significado deve ser
definido a partir dos contextos de sua utilização. Deste
.modo, sua compreensão exige considerar a articulação
dos conceitos de estrutura e funcionamento, assim
explicitado por SILVA (1999):
21
a estrutura e a função são provisórias, ainda Introdução, tal movimento não pretende esgotar o tema,
que a função seja relativamente mais durável e mas antes fornecer pistas para a compreensão de um
a estrutura relativamente mais provisória; são campo de estudos complexo como é estrutura e funcio­
contraditórias e como tal estão ligadas por uma namento da educação. A reflexão tem início por um
relação indissolúvel e, por fim, são influencia­ exame de como a educação foi concebida no passado.
das pelos movimentos de transformação da
Isto porque o presente é, de fato, fruto de uma constru­
realidade produzidos em determinados contex­
tos (p. 21).
ção histórica que determina circunstâncias próprias
para a- educação. Nesse sentido, é legítimo lançar um
Sendo importante não se perder no emaranhado dos olhar, ainda que breve, sobre aquilo que já passou, para
termos, já que "função" e "funcionamento" não signifi­ compreendermos álgo que o hoje por si nem sempre é
cam exatamente a mesma coisa, podemos recorrer à capaz de descobrir. Comecemos, portanto, por buscar
analogia que SAVIANI (1996) estabelece entre a respostas para a pergunta:
Estrutura e o Funcionamento do Ensino e a Biologia. O
autor associa a 'estrutura' do ensino à Anatomia, visto Que herança recebemos?
que focaliza os diversos órgãos que o constituem, suas
características básicas. O "funcionamento" do ensino, Quem se orienta para o estudo da educação brasileira
pm 'sua vez, relaciona-se à fisiologia, dado que enfatiza no passado não deixa de se surpreender ao encontrar uma
o modo como funcionam os diversos órgãos que consti­ certa lacuna no sentido da definição de políticas específicas
tuem o ensino. Nesse sentido, podemos inferir que, para a educação básica. Na verdade, algo das origens deste
sendo ambas provisórias, a estrutura e o funcionamento vazio pode ser buscado em nossa construção histórica que
dizem respeito à organização do sistema escolar, tal até o princípio do século XX desconsiderou a importância
como existe em um determinado contexto. da educação da grande maioria da população.
Se é verdade que tanto a estrutura quanto o. funcio­ Ao percorrermos as páginas dos livros de história da
namento podem mudar, a primeira (a estrutura) possui educação, é possível perceber que estes contêm muito
um caráter determinante sobre a segunda (o funciona­ mais referências ao anúncio de providências voltadas
mento). Quando uma reforma educacional modifica a para o ensino superior do que para a educação básica.
organização geral do ensino, prevendo novas formas de Isto não acontece por acaso. Estudos têm mostrado que
acesso, de financiamento etc, podemos dizer que esta é a idéia de universidade esteve presente no País desde os
uma reforma estrutural. Com certeza, implicará mudan­ primeiros tempos do Brasil colonial, muito embora a il
ças no funcionamento do ensino. A recíproca, todavia, universidade propriamente dita seja uma construção
não é verdadeira. Várias formas de funcionamento republicana (CUNHA, 1988). Não se pode fazer afirma­
_ :p.odem corresp6nder a uma mesma estrutura. ção semelhante em relação à educação básica, de modo
Feitas essas considerações iniciais, é oportuno dizer específico ao ensino fundamental.
que a Unidade I tem por finalidade estabelecer uma · Se é verdade que o exame das iniciativas do século
base para compreender o papel que vem sendo exercido XIX permite constatar intenções governamentais signifi­
pela educação básica no País. Como esclarecemos na cativas em relação às escolas secundárias, a exemplo da
22
©
criação do Colégio Pedro II e dos liceus, instituídos nas alterações subseqüentes no campo educacional. A queda
províncias, o mesmo não se verifica em relação ao ensino da bolsa de No;.a Iorque, fenômeno ocorrido nos
fundamental. Às escolas de primeiras letras, no passado, Estados Unidos (1929) que provocou efeitos nefastos
nunca se imprimiu um caráter prioritário, senão pela sobre as exportações brasileiras, gerou não apenas a
declaração de intenções que, no mais das vezes, não crise do café, mas do próprio modelo econômico e da
ultrapassava o papel. A educação das crianças pequenas, ordem política vigentes até então. Tais circunstâncias
por sua vez, manteve-se ao longo da história como uma propiciam condições favoráveis para que o País ingres-
tarefa do lar ou destinada aos desvalidos. Só muito mais se em novo modelo econômico - o de substituição das t
tarde seria concebida como política educacional. importações, o que significa uma industrialização relati-
Ao remeter às províncias o encargo do ensino fun­ va e dependente.
damental e médio e circunscrever como responsabilida­ Coincidindo com o fenômeno da urbanização e a
des do Poder Central a educação elementar e secundária emergência de uma classe média, a nascente indústri3
if

no município da Corte e o ensino superior, através do brasileira passa a demandar uma educação capaz de
Ato Adicional de 1834, os governantes brasileiros impri­ fazer face ao novo quadro de desenvolvimento. Assim,
miram um tom que iria marcar a política educacional no é somente a partir de tal época que podem ser reconhe­
País. Na verdade, pode-se dizer que, com o pr�)Cesso de cidas inic:rativas no sentido de propiciar educação para
descentralização definido pelo Ato Adicional, a oferta diferentes segmentos da população. Um exame da legis­
do ensino fundamental torna-se ainda mais precária lação daquele período permite constatar que as orienta­
, visto depender das condições de cada província. Nesse ções se dirigem muito mais para o ensino médio e supe­
sentido, as razões do caráter fragmentário assumido rior do que para o ensino fundamental, a exemplo da
pelas políticas de educação básica no passado não deve­ reforma Francisco Campos, nos anos trinta, e da
riam, pois, ser atribuídas apenas à relação centraliza­ Reforma Capanema, nos anos quarenta.
ção/ descentralização. Na verdade, é na dinâmica da A reforma Francisco Campos, que teve como viés '!
economia - e de como nela se movimentam as classes ideológico a formação de mão-de-obra e a formação das
' sociais - que devem ser buscados os principais determi­ individualidades condutoras, instituiu dois ramos de
nantes da presença/ ausência de tais políticas. ensino médio, rígidos e fechados entre si: o secundário e
O modelo agrário-exportador, adotado no Brasil dos o profissionalizante. O argumento da necessidade de
primórdios de sua história até os anos vinte (séc. XX), preparação de mão-de-obra voltada à industrialização
com efeito, prescindia de uma mão-de-obra qualificada. foi utilizado, apesar de a incorporação das massas imi­
Isto iria se traduzir na ausência de um interesse mais grantes (campo-cidade) na cultura urbana brasileira ter
explícito das elites dirigentes pela definição de uma sido feita sem grande interferência da escola. A reforma
política de educação voltada para as massas, contribuin­ Capanema, por sua vez, embora tenha aprêsentado pro­
do para o jogo de omissões entre as diferentes instâncias postas ambiciosas para organizar a educação brasileira,
do Poder Público. . foi efetiva na organização do ensino mêdio, ao instituir
As mudanças no panorama econômico brasileiro, a as leis orgânicas específicas para os àiferentes ramos de
partir da primeira metade do século XX, iriam imprimir ensino: industrial (Decreto n.º 4.073/1942), secundário
24 25
º
(Decreto n.º 4.244/1942), comercial (Decreto n. 6.141/1943), adultos, ligadas aos Movimentos Populares de Cultura
º
normal (Decreto n.º8.530/1946) e agrícola (Decreto n. (MPC) e aos Centros Populares de Cultura (CPC). Tais
9.613/1946). Esta reforma destaca-se pelo seu caráter iniciativas, todavia, são interrompidas pelo movimento
fragmentário ao negar a perspectiva do sistema de t;du­ político que veio a traduzir-se no golpe militar de 1964,
cação que emergiu, mesmo timidamente, na Consti­ resultando em longo período de ditadura.
tuição de 1934 - "que fixava a educação como direito e A ditadura militar, fundamentada na ideologia e na
responsabilidade do Estado", reforçando uma clara doutrina de segurança nacional e desenvolvimento, instau­
divisão entre ensino profissionalizante e ensino secun­ rou uma política econômica fortemente voltada para a atra­
dário (ROMANELLI, 1989). ção do capital externo. O novo regime extinguiu, com vio­
No início da década de sessenta (séc. XX), após lência, as manifestações e possibilidades de atendimento
., longa tramitação no Congresso Nacional, foi aprovada a às expectativas dos projetos e variados segmentos sociais.
primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional A proposta educacional desse período é apoiada na
(LDB) - a Lei n º 4.024/ 61. De acordo com esta LDB, o concepção pragmática e tecnicista de que o ensino deve
.ensino obrigatório restringia-se à escola primária, de estar integrado às necessidades econômicas e exigências
quatro anos, organizando-se a estrutura do sistema edu­ do mercado de trabalho. A teoria do capital humano,
cacional nos seguintes níveis: que fundamenta esta concepção, compreende a educa­
Quadro 1 ção como um dos principais fatores para explicar econo­
ESTRUTURA DO ENSINO NA LDB N. 4.024/61 0 micamente as diferenças de capacidade de trabalho,
Faixa Etária
produtividade e renda.
Nível Duração
De 4 a 6 anos
O projeto desse período se expressa em duas leis
Pré-Escola 3 anos
que perseguiram novo perfil para o sistema educacional
Escola Primária
brasileiro: a Lei nº 5.540 / 68, que sistematizou o projeto
obrigatória 4 anos De 7 a 10 anos
de reforma universitária, e a Lei nº 5.692/71, que preten­
Ginásio 4 anos De 11 a 14 anos
deu implantar co11;pulsoriamente a profissionalização
Colégio 3 anos De 15 a 17 anos
do ensino médio. E bem verdade que esta segunda lei
Ensino Superior Variável Após 18 anos
Fonte: Brasil. MEC. INEP 2000, p. 11
contemplava também o ensino fundamental, através de
uma série de determinações curriculares, a exemplo da
Aqui cabe chamar atenção para a natureza da oferta introdução de um núcleo comum e uma parte diversifi­
da educação pré-escolar nesse período. Embora esta etapa cada e de uma nova seriação escolar.
de escolarização seja definida no texto da lei, é oportuno Com a promulgação da Lei nº 5.692/71, passa a
observar que a grande maioria da população que freqüen­ vigorar um sistema que articula o antigo curso primário
tava a escola não tinha acesso a qualquer tipo de educação ao ginásio, criando-se o ensino fundamental de oito
pré-escolar, muito menos com duração de três anos. anos, a partir de então, denominado 1º grau. Ao mesmo
O início dos anos sessenta é também marcado por tempo, institui-se o 2º grau, de três séries que, por sua
breve florescimento de projetos alternativos para os vez, substitui os cursos secundários anteriormente exis­
excluídos, através de campanhas de alfabetização de tentes, como se vê no quadro a seguir:
26 27
Quadro li
tes curriculares da parte diversificada e sobre o trata­
ESTRUTURA DO ENSINO NA LDB N.25.692/71 mento a ser dado à preparação para o trabalho. A partir
Nível· Duração Faixa Etária da segunda metade dos anos oitenta, com a redemocra­
Pré-Escola 3 anos De 4 a 6 anos tização do País, o debate sobre o ensino fundamental é
1 º grau obrigatório 8 anos De 7 a 14 anos retomado. Sua expansão é associada a uma significativa
2º grau 3 anos De 15 a 17 anos perda de qualidade.·
Ensino Superior Variável Após 18 anos Como síntese, pode-se dizer que a herança recebida foi
Fonte: Brasil. MEC. INEP. 2000. p. 11 caracterizada, em um primeiro momento, por uma oferta
precária de educação, tanto em termos quantitativos como
A Lei nº 5.692/71 amplia a escolaridade obrigatória qualitativos, beneficiando segmentos muito restritos da
de quatro para oito anos. A despeito dessas modifica­ população brasileira. Mudanças produzidas fora do
ções importantes qu� afetam tanto o ensino fundamen­ campo educacional, por sua vez, foram elementos impor­
tal como o ensino médio, é predominantemente para tantes na definição de novas prioridades educacionais.
este último que o legislador dispensa o cerne de sua As demandas no sentido da redemocratização do
atenção, instituindo a profissionalização obrigatória. País começaram a ocorrer já no final dos anos setenta,
Objeto de controvérsias e críticas, essa não foi uma vindo a expressar-se com vigor na primeira metade dos
reforma de saudosa memória. Mais apropriado é talvez anos oitenta- a exemplo do movimento "Diretas-Já" que,
dizer que esta foi uma reforma que não houve. O tempo iria em 1984, levou centenas de milhares de pessoas dos
provar sua ineficácia, à medida em que não obtinha suces­ grandes centros urbanos do País a ocupar praças públi­
so em resolver os problemas que se propunha. Eliminou cas em defesa de eleições diretas para a Presidência da
o que havia de .bom no sistema existente, sem pôr em República. Este contexto é propício ao questionamento
seu lugar uma estrutura capaz de fazer face às novas da política educacional e da escola pública, período ao
demandas de desenvolvimento que passaram a surgir. qual temos denominado de "tempos de transição" (VIEI­
Paralelamente aos problemas da chamada profissio­ RA, 2000 e VIEIRA e ALBUQUERQUE, 2001: 73-93).
nalização, cresceram as pressões sociais por educação, Em 1985, o Brasil volta a ter um presidente civil,
havendo progressivo aumento da oferta de escolaridade ganhando corpo a idéia de convocação de uma Assem­
nos diferentes graus de ensino nos anos setenta e oiten­ bléia Nacional Constituinte (ANC), que põe em pauta o
ta (séc. XX). Neste contexto, é promulgada a Lei nº debate das grandes questões nacionais. A educação não
7.044/ 82. Essa Lei, ao desobrigar a profissionalização no fica à margem desse processo. A sociedade se organiza,
ensino de 2º grau, alterando dez dos dispositivos da empenhando-se na busca de opções para equacionar as
LDB 5.692/71, converteu a habilitação profissional em questões sociais e econômicas, convergindo todas as
opção para a escola, estabelecendo que "a preparação atenções para a Constituinte, instaurada em início de
-1
para o trabalho poderá ensejar habilitação profissional, 1987. Em outubro de 1988, o novo texto constitucional é
a critério do estabelecimento de ensino" (Art. 4°, pará­ aprovado, representando um momento decisivo na his­
grafo 2°). Delegou ainda competência aos conselhos tória política do País e da educação brasileira. Posteri­
estaduais para expedirem normas sobre os componen- ormente, em 1996, novas e importantes mudanças no
28 29
campo educacional iriam se configurar através da apro­ gógicos concebidos a partir da realidade dos atores.
vação de uma emenda constitucional (EC nº 14/96) que Com a eleição de Fernando Collor de Mello, que
constitui marco de uma reforma educacional; de uma governaria de 1990 a 1992, o Brasil vive um mato negativo
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº em termos de educação (VIEIRA, 2000: 89-113). Com tan­
9.394/96); e da Lei nº 9424/96 que institui o Fundo de tas questões a estremecerem a vida do País, tais como o
Manutenção de Desenvolvimento do Ensino Funda­ confisco da poupança nacional e, posteriormente, o
mental e de Valorização do Magistério/Fundef. Pela sua impeachment do presidente eleito, a educação fica à deriva.
importância, esses temas serão objeto de reflexão especí­ Desse período restaram intenções de um Programa
fica, através da análise da nova legislação (Unidade II), Nacional de Alfabetização e Cidadania - o PNAC (Brasil.
do financiamento da educação (Unidade III) e dos pro­ MEC/SENEB, 1991) e o ambicioso projeto inspirado no
fissionais da educação (Unidade V). modelo de escola que Leonel Brizola buscara implantar no
Estado do Rio de Janeiro - os CIEPs (Centros Integrados
Que perspectivas os tempos de transição de Educação Pública), batizados de CIACs (Centro
anunciam? Integrados de Assistência às Crianças) no governo Collor
e renomeados de CAICs (Centro de Atenção Integrada à
O período compreendido entre 1985 e 1995 demarca Criança e ao Adolescente) pelo governo Itamar, que con­
os tempos de transição, conforme discutido no livro cebe a política de atenção integral.
Política e Planejamento Educacional (VIEIRA e ALBU­ É importante assinalar que, no período Itamar
QUERQUE, 2001). Trata-se de momento importante para (1992 - 1994), alguns redirecionamentos significativos ocor­
a educação brasileira, pois começam a ser geradas condi­ rem, a exemplo da elaboração do Plano Decenal de Edu­
ções que propiciam o conjunto de mudanças legais e ins­ cação para Todos (Brasil. MEC, 1993). O debate que se
titucionais explicitadas e deflagradas a partir de 1996. trava em torno do Plano Decenal, por sua vez, articula-se
O debate em tomo da Constituição de 1988 levou edu­ com a Conferência de Jomtien, na Tailândia, em 1990-Ano
cadores e segmentos organizados da sociedade, não ape­ Internacional da Alfabetização. Naquela oportunidade,
nas a questionar o modelo educacional vigente, como tam­ o País assumira um compromisso internacional, anteci­
bém a buscar novo estatuto para a educação. Este primei­ pado pela Constituição de 1988 (ADCT, Art. 60), de até
ro momento é fértil em propostas de mudanças que coinci­ o ano 2000 erradicar o analfabetismo e universalizar o
dem com governos de oposição em importantes estados, ensino fundamental.
como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Paraná, Como desdobramento do Plano Decenal, realizou-se a
assim como em mudanças cujas origens devem ser locali­ Conferência Nacional de Educação para Todos (Brasil. MEC,
zadas na periferia do Estado (CUNHA, 1991). Nesse con­ 1994), oportunidade em que se firma o Acordo Nacional
texto, florescem experiências inovadoras em gestão escolar, que estabelece o Pacto pela Valorização do Magistério e
a exemplo de práticas de eleição de dirigentes escolares Qualidade de Educação, assinado em outubro de 1994.
e de constituição de conselhos nas escolas, assim como Pelo referido Pacto, define-se, dentre outras medidas,
de iniciativas que buscam oferecer espaços de autono­ proposta de piso salarial para docentes dos diversos sis­
mia à escola, incentivando a definição de projetos peda- temas de ensino fundamental (Brasil/MEC, 1994: 1047).
30 31
As idéias advindas do Pacto anteriormente mencionado iniciativas inaugura nova orientação governamental
seriam retomadas pelo governo seguinte, através do para a agenda da política educacional brasileira, explici­
Fundo de Manutenção de Desenvolvimento do Ensino tando assim os compromissos assumidos junto à agenda
Fundamental e de Valorização do Magistério - Fundef, o qual internacional promovida pelo Banco Mundial ao longo
será detalhado na discussão sobre o financiamento da da década de 1990. Temos denominado esse momento da
educação (Unidade III). educação de tempos de explicitação. Isto porque, se no
O governo Fernando Henrique Cardoso, iniciado em período anterior - "os tempos de transição" - o governo
1995, consignatário de compromissos internacionais federal esboçava de forma tímida suas propostas de polí­
assumidos na década de noventa, volta sua atenção para tica, sob os governos de Fernando Henrique Cardoso, o
a escola e para o ensino fundamental, elegendo este nível Ministério da Educação não apenas faz a divulgação de
de escolaridade como foco central, movimento que se suas propostas como também desenvolve uma estratégia
expressa em um conjunto de mudanças legais, já referi­ para sua implantação de norte a sul do País.
das aqui, assim como uma série de projetos e programas, É oportuno registrar que ao anúncio de novas práti­
tais cgmo: a definição de "uma extensa reforma curricu­ cas e iniciativas nem sempre correspondem transforma­
lar, em todos os níveis de ensino", expressa através da ções no interior do sistema escolar. Ao contrário, muitas
elaboração de Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs); o vezes a escola rejeita as inovações propostas - seja por­
fortalecimento do Sistema Nacional de Avaliação da que a cultura escolar resiste a mudanças impostas a par­
Educação Básica (Saeb); a implantação do Exame Nacional tir de fora, seja porque a busca de novas formas de orga­
de Ensino Médio (Enem); a implantação do Programa de nização vem sendo feita de maneira improvisada, sem a
Avaliação Seriada (PAS); a consolidação e ampliação de devida contrapartida financeira e pedagógica.
programas federais permanentes, como o Programa A despeito de todos os investimentos que têm sido
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa divulgados como gastos na educação básica, em final de
Nacional do Livro Didático (PNLD). Outras ações deflagra­ 2000, ao anunciar os resultados do SAEB-99, o MEC
das a partir de 1995 foram: o Programa Dinheiro Direto na expõe para o País uma realidade pouco animadora da
Escola; o Programa TV Escola; o Programa Nacional de situação educacional brasileira. Em grande número de
Informática na Educação (Proinfo); e o Programa de estados brasileiros, o desempenho dos estudantes em tes­
Formação de Professores em Exercício (Proformação). tes de habilidades em Português e Matemática foi inferior
Mesmo sem um exame mais cuidadoso de seu ao biênio anterior. Este tema será tratado nas Unidades IV
impacto sobre o sistema educacional, tais medidas têm e VI. Situações como estas indicam a permanência de
sido amplamente divulgadas. O governo federal, hoje, um conjunto de desafios a serem enfrentados na agenda
dispõe de "poderosos esquemas de comunicação e mar­ das políticas educacionais atuais e futuras, alguns dos
keting que estão sendo incorporados à ação política". quais serão apontados ao longo deste estudo.
Neste contexto, a política educativa tende a transfor­
mar-se "num turbilhão de eventos e ações que se esgo­
tam em si mesmos" (GARCIA, 2000: 31).
A definição e encaminhamento desse conjunto de
32 33
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AS TRANSFORMAÇÕES DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA :o
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a globalização, suas caracteristicas e princípios fundamentais; e, na

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seqüência, o texto apresenta algumas reflexões sobre a política neoliberal '­

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e suas conseqüências para o trabalho educativo.
No final do século XX, o capitalismo entra em um processo de

•• reestruturação e integração econômica, que envolve o progresso científico


em áreas como as telecomunicações e informática, a privatização de

•• amplos setores de bens e serviços pertencentes ao Estado, a busca pela

••
eficiência e competitividade e a desregulamentação do comércio entre
os países, com o enfraquecimento das fronteiras econômicas e procura

••
de liberdade de trânsito tanto para pessoas como para mercadorias,
uma espécie de comércio universal. Isso tudo vem sendo chamado de
: Globalização tem
globalização. sido usada para

••
:
• expressar uma
Segundo Santos e Andrioli (2005) a globalização é uma tendência : gama de fatores

••
internacional do capitalismo que, juntamente com o projeto neoliberal, : econômicos, sociais,
: políticos e culturais
impõe aos países periféricos a economia de mercado global sem restrições, : que expressam
: o espírito de

••
a competição ilimitada e a minimização do Estado na área econômica e
• desenvolvimento do
social. : capitalismo.
: Neoliberalismo -

••
Vários estudiosos discutem esse tema. Leia, a seguir, o que os : pressupõe O mercado
: como princípio
autores LIBÂNEO, OLIVEIRA e TOSCHI (2005, p.81) têm a dizer:
fundador, unificador

••
"As transformações gerais da sociedade atual apontam a e auto-regulador da
sociedade.
inevitabilidade de compreender o país no contexto da globalização, da

••
revolução tecnológica e da ideologia do livre mercado (neoliberalismo) .
A globalização é uma tendência internacional do capitalismo que,

••
juntamente com o projeto neoliberal, impõe aos países periféricos a
economia de mercado global sem restrições, a competição ilimitada e a

••
minimização do Estado na área econômica e social. Concretamente, isso
leva ao domínio mundial do sistema financeiro, à redução do espaço de

••
ação para os governos. Com isso, os países são obrigados a aderir ao
neoliberalismo, ao aprofundamento da divisão internacional do trabalho

••
••
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Historicamente, o neoliberalismo é filho do liberalismo. Segundo ·'º
Santos e Andrioli (2005), o liberalismo surgiu e se desenvolveu nos
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séculos XVII e XVIII em oposição à monarquia absoluta, esta fundada na .\JJ
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idéia de hierarquia divina, social e natural, baseada na estrutura feudal :l)
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de produção, bem como numa concepção teocrática do poder. Baseado na •C
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idéia de que os seres humanos são, por natureza, livres e iguais, o direito :E
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liberal rompe com a idéia de direito divino do monarca e, portanto, com •Ü
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a hierarquia estabelecida. Em lugar de uma submissão cega ao poder e à • :::i
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vontade do rei, criou-se a noção de direito civil, onde há regras que valem :. o(\)

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para todos, privilegiando o indivíduo, sua liberdade e seu direito natural • :::i

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à propriedade. Nasce o Estado liberal, com a função de legislar e garantir


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a ordem pública.
No entanto, o liberalismo, como modelo de Estado, não teve
eficácia, devido a vários fatores, dentre os quais destaca-se o fracasso
das suas politicas de desenvolvimento para os países do Terceiro Mundo,
fazendo com que a falência desse modelo fosse inevitável. Os teóricos
do liberalismo afirmam que esta falência ocorreu porque a liberdade,
enquanto valor central, ainda estaria sofrendo restrições. Sendo então
necessário redimensionar este Estado e rever quais eram realmente suas
atribuições, sempre visando à expansão da liberdade individual. É neste
contexto histórico que surge o neoliberalismo.

Como o neoliberalismo se caracteriza?


Segundo BIANCHETTI (2005, p.11) O neoliberalismo, como
arcabouço teórico e ideológico não é algo novo. Nasce como combate,
no início da década de 1940, às teses de Keynes e ao ideário do Estado
de Bem-estar , sobretudo aos direitos sociais e aos ganhos de renda da
classe trabalhadora, ou seja, o neoliberalismo vem sendo concretizado em
orientações de governo e na disseminação de valores em tomo do mito do
"Estado-mínimo".

Por que o neoliberalismo é implantado?


Porque a partir da década de 1970, o capitalismo sofreu um enorme
desgaste ,principalmente com a incorporação da tecnologia aumentando
a "crise de superprodução", houve então uma gradativa redução na taxa
de lucros e no crescimento econômico. Como solução ao problema, foram
••
••
'1 m:·�: trazidas idéias de economistas como Friedrich Hayek e Milton Friedman,
o:
• 1).
reforçando o ideal da competitividade no livre mercado e a retirada da
o.
• t:: (9
• influência do Estado sobre a economia.
• a:.
.D. Em termos de estrutura social, no neoliberalismo vigora a

••• �=
(9
1).
manutenção da sociedade burguesa, com suas características básicas,
�-
• :

• 12: conforme salientam Santos e Andrioli (2005): a) trabalho como mercadoria;
• >.
(9.
b) propriedade privada; c) controle do excedente econômico; d) mercado
como centro da sociedade; e) apartheid, exclusão da maioria; f) educação

'•
regulada pela divisão social de classes .

•'
Qual o papel do Estado neste modelo?
Na sociedade contemporânea, cabe ao Estado garantir a harmonia

••
entre a liberdade máxima de escolha dos indivíduos e o compromisso com
a eficiência e a qualidade. Porém, o que se vê no cotidiano não é bem

••
isso: apenas tem liberdade de escolha quem tem poder aquisitivo e este,
por sua vez, só é alcançado por meio de uma economia estável, em que é

••
possível manter-se num emprego com uma relativa estabilidade salarial.
A intervenção do Estado, na atividade econômica, é marcada por periodos

••
perfeitamente delineados, conforme apresenta MAURANO {2004, p.2) a
seguir:

•'
"O Estado liberal foi marcado pelo não-intervencionismo. O objeto
central do Estado era o indivíduo e o seu papel era garantir a liberdade

•'
das pessoas. Ocorre que essa intervenção mínima do Estado gerou
conseqüências desastrosas, tais como a criação de monopólios que

••
praticamente dizimaram as pequenas empresas, bem como desigualdades
sociais acentuadas, marcadas por um proletariado vítima da miséria e

••
ignorância"
Já em contraposição ao Estado liberal, surgiu, após a segunda

•• grande guerra, o denominado Estado Social, em que a preocupação com


o princípio da liberdade foi superada pela necessidade de se assegurar

••
o cumprimento de outro princípio, o da igualdade. Então, no Estado
do Bem-Estar, o ideal de igualdade, que fora tomado como pressuposto

••
pelo pensamento liberal, é reconhecido como algo a ser implementado,
adquirindo maior importância do que a liberdade individual e econômica.

••
Assim, para alcançar essa igualdade, entendia-se que o Estado deveria
intervir na ordem econômica e social, passando a atuar diretamente na

••
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A ciência e a tecnologia adquiriram nesta nova realidade uma ,o
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grande importância, tanto que têm levado os estudiosos a chamarem .u


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a sociedade atual de "Sociedade do Conhecimento", "Sociedade .\1)


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T écnico-Informacional" ou "Sociedade Tecnológica". Isso significa que :"'O
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o conhecimento, o saber e a ciência adquirem um papel muito mais
.
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destacado que anteriormente. Hoje as pessoas aprendem na fábrica, na ·E
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televisão, na rua, nos centros de informação, nos vídeos, no computador ·
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e, cada vez mais, vão se ampliando os espaços de aprendizagem. .
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Nesta sociedade marcada pela revolução tecnológico-científica,
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curiosamente, a centralidade do processo produtivo está no conhecimento :)
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e, portanto, também na educação.


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Como fica a educação neste contexto?


Até agora você leu sobre as características da globalização, seus
traços predominantes e as relações entre globalização e educação. A seguir,
você encontrará mais subsídios para entender as políticas neoliberais, bem
como as devídas implicações para a educação no contexto brasileiro.

SEÇAQ 2
AS INFLUENCIAS INTERNACIONAIS NA ATUAL
PROPOSTA DE EDUCAÇÃO
• • • • • • • • • • • • • • • • • • • � � a

Dando continuidade ao seu estudo, agora você vai ler sobre as


políticas internacionais e as suas implicações na política econômica e
conseqüentemente na política educacional brasileira.
O neoliberalismo defende para a educação uma proposta de escola
básica, universal, laica, gratuita e obrigatória a todos. Essa mesma
proposta é apresentada para os países da América Latina e para o
Brasil, ou seja, uma educação de formação geral e polivalente visando a
qualificação de mão-de-obra para o mercado. Essa idéia de preparação
de mão-de-obra está voltado para o atendimento ao mercado e não com
fins humanitários.
••
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•• , Capítulo V
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••
•• Os PROGRAMAS DO FUNDO
•• NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
•• DA EDUCAÇÃO
••
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••
Os programas· do Fundo
Nacional de Desenvolvimento
••
l

da Educação
i

••
••
O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE) foi criado em novembro de 1968 e está
vinculado ao Ministério da Educação (MEC).

••
A finalidade da autarquia é captar recursos financeiros
para projetos educacionais e de assistência ao estudante.

••
A maior parte dos recursos do FNDE
provém do Salário-Educação, com o qual todas as
empresas estão sujeitas a contribuir.

•• O Salário-Educação (SE), criado pela Lei 4.462, de

••
1964, e previsto no art. 212, parágrafo 52 da Constituição ,

Federal, é cobrado das empresas vinculadas à Previdência


Social. O cálculo é feito com o percentual de 2,5% apli­

••
cado sobre o total da remuneração paga ou creditada
aos empregados durante o mês. O Instituto Nacional de

••
Seguridade Social (INSS) é o intermediário, cobrando
1o/o do valor arrecadado como taxa de administração. A
distribuição dos recursos é feita pelo FNDE, observada

••
a arrecadação em cada estado e no Distrito Federal.
Pelo sistema do SE, a empresa contribuinte deve ofe­

••
recer o ensino fundamental a seus empregados e depen­
dentes. Esse atendimento pode ser feito das seguintes
formas: a) escola própria; b) aquisição de vagas (o valor

••
mensal da vaga é de 21 reais, fixado desde junho de 1995);
c) indenização de dependentes. A indenização de empre­

••
gados foi extinta, sendo vedada a inclusão de novos alu­
nos a partir de 1997, em atenção à modificação da Cons­
tituição Federal, por meio da Emenda Constitucional n2

••
14 de 1996, e à lei do Fundef de 1997. O parágrafo 32 do
_18_3_____�

••
••
••

••
••
••
••
•• Os PROGRAMAS DO FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO

•• cipal, bem como do Distrito Federal, com mais de 20


alunos e às escolas de educação especial mantidas por

••
organizações não-governamentais.
Os recursos podem ser usados para aquisição de

••
material permanente e de consumo, para manutenção e
conservação do prédio escolar, para capacitação e aper­
feiçoamento de profissionais da educação, para avaliação

••
de aprendizagem, para implementação de projetos peda­
gógicos e para desenvolvimento de atividades educacio­

••
nais diversas, que visem colaborar com a melhoria do
atendimento das necessidades básicas de funcionamento
das escolas.

•• O objetivo desse programa, além de melhorar a quali­


dade do ensino fundamental, é envolver a comunidade

••
escolar a fim de otimizar a aplicação dos recursos. As
escolas os recebem de acordo com sua localização regio­

••
nal e com o número de alunos, conforme dados do Censo
Educacional.
Para receber o dinheiro, a instituição escolar deve ter

••
uma unidade executora (UEx) própria; caso não tenha
uma UEx, o repasse dos recursos é feito às Secretarias

••
Estaduais de Educação e às prefeituras. Manuais de orien­
tação do Programa de Manutenção e Desenvolvimento
do Ensino (como o PDDE era chamado) podem ser

••
obtidos nas Delegacias do MEC ou na sede do FNDE
em Brasília.

••
As unidades executoras têm diferentes denomina­
ções, tais como Associação de Pais e Mestres, Caixa Es­
colar, Conselho Escolar, Cooperativa Escolar, Círculo de

•• Pais e Mestres, etc.

•• 2. Programa Nacional de
Alimentação Escolar (PNAE)

•• O PNAE fornece suplementação alimentar aos alu­

••
nos da educação pré-escolar e do ensino fundamental
185

••
••
••

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••
••
••
•• As POÚTICAS EDUCACIONAIS, AS REFORMAS DE ENSINO E OS PLANOS E DIRETRIZES

•• das escolas públicas federais, estaduais e municipais. As


escolas filantrópicas podem participar do programa se

••
estiverem registradas no Conselho Nacional de Assistên­
cia Social. O objetivo do PNAE é garantir pelo menos
uma refeição diária nos dias letivos. Cada alimentação

•• deve oferecer 350 quilocalorias e 9 gramas de proteínas,


ou seja, 15% das necessidades diárias de proteínas. Para

••
isso, o custo é de 0,13 real para crianças do ensino fim­
damental e de 0,06 real para a pré-escola e para enti-
. dades filantrópicas.

•• O parâmetro para a liberação dos recursos do PNAE


é o número de alunos levantado pelo Censo Escolar (pes­

••
quisa do MEC/Inep) do ano anterior.
Valores em "vigor em �QOl.
Para estabelecer convênio com o FNDE, os munic�­
pios devem criar um Conselho de Alimentação Escolar

•• (para fiscalizar e controlar o uso dos recursos) e apre­

••
sentar um projeto. Mais informações sobre a descentra­
lização - nome que o MEC dá aos programas do
FNDE - podem ser obtidas nas delegacias do MEC

••
nos estados.

••
3. Programa Nacional Biblioteca
da Escola (PNBE)

••
º º º
Há, no Brasil, apenas uma
biblioteca para cada 40 �
o ObJeº tlVO dO PNBE é dlStrlbUlr
· O bras de 1·1teratura e
habitantes, enquanto 25% : de referência ( enciclopédias e dicionários) às escolas de

••
dos municípios brasileiros ensino fundamental da rede pública. Criado em 1997,
não possuem biblioteca (cf. i
Isto é, 25 abr. 2001). esse programa, que visa incentivar a leitura e melhorar

••
1
o conhecimento dos professores e dos alunos, já aten­
deu 36 mil escolas.
A criação do PNBE ocasionou a desativação dos Pro­

••
gramas Sala de Leitura e Biblioteca do Professor.
Uma comissão especial, criada em 1996, selecionou
as obras a ser adquiridas. Em 1998, foi concluída a pri­

•• meira fase de implementação do projeto, com a aquisição


de obras de literatura e de textos sobre a formação histó­

••
rica, econômica e cultural do Brasil.
186

••
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••
••

••
••
••
••
••
Os PROGRAMAS DO FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO

••
4. Programa Nacional do
Livro Didático (PNLD)

•• O PNLD procura suprir as escolas públicas de ensi­


no fundamental com livros didáticos, escolhidos pelos

•• professores com base em guia que traz as obras selecio­


nadas por equipe de especialistas da Secretaria de Ensino

••
Fundamental do MEC.
Os livros são classificados por categorias, indicadas
pelo número de estrelas. Livro com três estrelas é reco­

•• mendado com distinção, com duas estrelas é recomen­


dado e com uma estrela é recomendado com ressalvas.

••
Livros distribuídos aos alunos da segunda à oitava sé­
. rie do ensino fundamental devem ser reutilizados nos
anos subseqüentes. Os de primeira série são repostos

•• anualmente.
Há duas formas de atendimento desse programa. Na

••
centralizada, o FNDE cuida de tudo: pedido das escolas,
aquisição e distribuição. Na descentralizada, os estados

••
adquirem os livros e os distribuem às escolas. Esta últi­
ma modalidade é utilizada nos Estados de São Paulo e
Minas Gerais.

•• 5. Programa Nacional

•• Saúde do Escolar (PNSE)

••
O PNSE consiste no repasse de recursos aos municí­ O Comunidade Solidária,
pios no intuito de apoiar a promoção da saúde nas esco­ programa governamental
criado em 1995, visa

••
las públicas de ensino fundamental - prioritariamente, mobilizar esforços
às prefeituras participantes do programa Comunidade disponíveis no governo e na
sociedade para melhorar a
Solidária.

••
qualidade de vida dos
O PNSE visa desenvolver ações de saúde -que de­ segmentos mais pobres da
tectem e sanem os problemas que interferem na aprendi­ população.

zagem de alunos pobres das capitais. Essas ações incluem

•• atividades educativas, preventivas e curativas. O progra­


ma prevê também a aquisição de materiais para alunos

••
da primeira à quarta série, tais como os de higiene

_____
187

••
--,

••
••

•1
••
••
••
•• As POLITICAS EDUCACIONAIS, AS REFORMAS DE ENSINO E OS PLANOS E DIRETRIZES

•• pessoal e de primeiros socorros, sendo vedada a aquisição


de medicamentos.

••
Os exames e tratamentos auditivo e oftalmológico são
prioritários para que o aluno possa acompanhar adequa­

••
damente as aulas. As principais campanhas do programa
são a Campanha Nacional de Reabilitação Visual Olho no
Olho e a Campanha Quem Ouve Bem Aprende Melhor!,

••
para detectar problemas de audição nos estudantes.
Para fazerem parte das ações do PNSE, as prefeituras

••
devem firmar convênio com o FNDE. Participam do
programa alunos de ensino fundamental das escolas esta­
duais e municipais do programa Comunidade Solidária,

••
dos assentamentos rurais criados pelo Instituto Nacio­
nal de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e dos pro­

••
gramas federais de erradicação do trabalho infantil.

•• 6. Programa Nacional de

••
Transporte do Escolar (PNTE)

O PNTE objetiva melhorar o ensino fundamental

••
das escolas rurais, garantindo o acesso e a permanência
dos alunos da zona rural na escola. Para isso, o programa
efetua o repasse de recursos aos municípios em vista da

••
aquisição de veículos novos, até o limite de 50 mil reais
por município .

••
Para se beneficiar do PNTE, os municípios devem
participar do programa Comunidade Solidária ou com­
provar que aglutinaram ou nuclearam a rede escolar. Os

•• projetos, elaborados sob a forma de plano anual de tra­


balho, devem ser entregues ao governo federal.

••
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•• 188

••
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••

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